Coleção pessoal de Eliot

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⁠Breve -

Nos meus olhos não há vida!
Criança fechada
de sonho em sonho
de sonhar calada ...

Grito por dentro
tudo me prende
saudade das rosas
que levou o vento!

Que sabor agreste ...
Corpo inútil, sem empenho.
Está frio!
Morte breve!

NINGUÉM VIU

Há saudades nos meus dedos
De quem passou sem ter passado
Trago dores e segredos
Em silêncios magoados.

Como a ave que partiu
Pra lugares além da vida
Fui tão só que ninguém viu
Que passei de Alma perdida.

Tenho as mãos presas ao vento
Como o vento preso ao mar
Como a vida presa ao tempo
Como o amor preso ao penar.

E agora as mãos fechadas
Trazem noites, trazem Lua
Trazem pássaros sem asas
Trazem sombras pela rua.

⁠Fosse o que fosse -

Fosse o que fosse não era tédio
Nas asas loucas do vento
Uma dor sem ter remédio
Um desejo ou um lamento.

Fosse o que fosse não eras tudo
Temos agora a mão fechada
Na verdade não me iludo
Eras tudo sem ser nada.

Fosse o que fosse o coração
Era mais que a dor sentida
E do tédio à solidão
Damos mais sentido à vida.

E afinal este desgosto
Nem uma lágrima me trouxe
Estava em pé mas estava morto
Fosse lá isso o que fosse.

- AMOR DAS HORAS VÃS -

Meu amor das horas vãs
Acorda, não tenhas medo
Vem dar cor ao meu segredo
Como a aurora às manhãs.

Vem dormir no meu regaço
Vem dar luz ao meu olhar
Faz de mim o teu lugar
Do meu corpo o teu abraço.

Mas ao vires não te apresses
Deixa os medos no caminho
Passo a passo há um destino
Fado a fado há tantas preces.

Ao meu peito irás voltar
Como a aurora às manhãs
Não te importes de acordar
Meu amor das horas vãs.

- OLHOS DE PEDRA -

Trouxe comigo, ao nascer,
Olhos de pedra, não me via,
E o meu corpo de saudade
Já nem tinha claridade
P'ra decidir o que fazer!

Acreditei que ia passar
Mas a pedra aumentou
E o peso dos meus passos
O frio dos meus abraços
Parecia não parar!

Vi sorrir quando chorava
Em momentos de solidão
E o meu corpo só tremia
Por sentir a nostalgia
De não verem que eu amava!

Olhos de pedra, fechados,
Sem coragem de os abrir
E das coisas por dizer
Tantas feridas, triste ser,
Nos meus olhos embaciados!

Morreram sonhos um a um
Nas veias grita o sangue
Tantos passos pelo chão
Tantas dores, solidão,
Pois d' amor estou em jejum!

Não podendo ser mais nada
Inventei sonhos suspensos
E das tardes de Setembro
O que fiz já não me lembro
Só vivi de madrugada!

E pensava, só pensava
E sofria, só sofria
E quando a vida em vão passava
Olhos de pedra, mal a via,
Pobre criança rejeitada!

VAGA INQUIETAÇÃO

A noite era o silêncio dos teus passos
Tu não vinhas e era já de madrugada
A inquietude era o silêncio sem abraços
E afinal à minha porta não há nada.

Era o sonho de sonhar e de querer ver-te
Esperança vaga numa vaga inquietação
Quanto dói ao lembrar e ao saber-te
Lá longe tão distante em solidão.

És mais frio que a frieza que há na rua
Sou mais triste que a tristeza que me dás
Teu olhar vem do silêncio que há na Lua
Ou talvez da solidão que o vento traz.

Não encontro outro caminho além de ti
Não me sinto no calor dos teus abraços
Adeus que já não te quero como quis
Quando a noite era o silêncio dos teus passos.

ENGANOS

De saudade eu vou morrendo
Porque não esqueço o teu olhar
Ai de mim que vou sofrendo
Tantas dores por te amar.

E quem dorme no meu leito?
Quem se aninha no meu corpo?
Ai de mim perdi-lhe o jeito
Que palidez no meu rosto.

E neste mundo d'enganos
É tão triste o que se sente
Passa a vida em poucos anos
Quanto dói dentro da gente.

E agora fica a solidão
Nas promessas que fizemos
Guarda a dor em tua mão
Que em mim fica o que vivemos.

O QUE SOBRA?!

Vou dormir no teu silêncio
Vou morrer na minha cama
Adeus amor, estou cansado
Muito padece quem ama.

E desce a noite lentamente
Em mim desce um estranho medo
Desce a Lua sobre o mar
Quero contar-te um segredo.

Meu coração está parado
Nem de mim te despediste
E os meus olhos magoados
Desde a hora em que partiste.

E a saudade é um vendaval
É um barco em alto mar
Que se afunda em Solidão
Na solidão do teu olhar.

Muito doem os meus lábios
Na ausência dos teus beijos
E mordo flores, mordo rosas
No calor dos teus desejos.

Vou pra lá deste sofrer
Destas noites sem dormir
Meu amor o quanto dói
Saber que finges não sentir.

Já gastámos nossos sonhos
Até a voz de quem nos chama
E o que sobra meu amor?!
Só morrer na minha cama ...

⁠Não leves a mal -

Não leves a mal, meu amor,
a tristeza que ponho nos versos,
não é mais do que toda a dor
a do aroma dos cravos
que deixaram teus beijos...
Não leves a mal, meu amor!

Não leves a mal, meu amor,
mas o meu amor arrefeceu
cai chuva do Céu sem cor
e não se define o que morreu
tudo em nós só fala em adeus ...
Não leves a mal, meu amor!

Não leves a mal, meu amor,
mas o que era já não é
e o que foi não tem sabor
só me alembra a noite fria
em que em ti perdi a Fé ...
Não leves a mal, meu amor!

- TRISTES BADALADAS -
(Aos sinos da Velha igreja de
Santo Antão em Évora)


Batem Tristes, magoadas
Madrugadas, badaladas
Na igreja de Santo Antão
E a minh'Alma nesta Praça
Não se cansa e abraça
Cada instante de solidão!

Há um pedinte que passa
De olhar triste, sem graça
E soa o sino no torreão
Ai que triste Madrugada
Junto às velhas badaladas
Da igreja de Santo Antão!

Tudo passa, tudo sofre
E até daquele pobre
Que se arrasta pelo chão
Sinto passos e tormentos
Que me vem dos lamentos
Dos sinos de Santo Antão!

E oiço uma badalada
Oiço duas badaladas ...
Morri! Parou meu coração!
Batem tristes, magoadas
Madrugadas, badaladas
Na igreja de Santo Antão!

⁠Nome que é meu -

Nada no mundo me prende
perdi-me no sofrimento
e quanto dói dentro da gente
não saber dar tempo ao tempo!

Sou como a folha caída
que se perdeu do mundo inteiro
sou como a flor esquecida
em manhã de nevoeiro!

A tristeza que me abraça
dá mais voz à minha fome
sou como tudo o que passa
não me chamem pelo nome!

Porque esse nome sem carinho
foi o destino quem mo deu
deixem-me Ser pelo caminho
longe desse nome que é meu!

Évora - Portas de Moura.


Há uma fonte ondulada
Entre portas na cidade
Uma janela trabalhada
E um mirante de saudade!

No mirante dessa casa
Ou na fonte engalanada
Uma só cousa nos abraça
Outra Era já passada!

Lá de fronte, essa Janela,
Traz Garcia de Rezende
Um Poeta, uma Estrela
Diz a voz de toda a gente!

Mas na casa Cordovil
Antepassados 'inda moram
Cavaleiros de Perfil
Qu'inda rezam, 'inda choram!

E a saudade é tão discreta
Nos olhares de quem passa
Que só o punho d'um Poeta
Nos dá corpo e nos abraça!

- MANDEI CAIAR A MORTE -

Mandei caiar a morte
Na Luz dos olhos fundos
No suspenso dos meus lábios
Onde a vida não se esconde
Nem se dá a outros mundos!

E das searas ao vento
Que de lágrimas reguei
Mandei colher a noite
Contra mim e contra a vida
A que afinal nunca me dei!

Nada é inútil, nada é vão
Rios de sombra, rios de lume
Nestas linhas do meu canto
Velas de todos os ventos
A que dei o meu ciúme!

Poeira de ventos, apenas
Que desejo mas não ponho
Na raiz de cada espiga
Ao passar por mim o vento
No olhar de cada sonho!

Senhor,

Aceita-me como sou!
Com esta sede de amor
Que me consome o viver
Que me tira o fulgor
E antecipa o morrer ...

Aceita o vidro partido
De que é feito o meu coração
A alma entornada
Sem casa nem chão
Cheia de noite, vazio e nada ...

Aceita os versos que te canto
Que no caminho te dou
Os que ponho no pranto
Por não ver o eterno
No transitório que sou ...

⁠Outro fado -

Adeus gentes, minha terra
adeus campos, adeus serras
que em criança me viram;
adeus versos que escrevi
aos amores que não vivi
adeus fados que me ouviram.

Meu coração como louco
sente triste, pouco a pouco
que ao partir não volta mais;
e no meu peito de espuma
esta dor é só mais uma
outra dor entre as demais.

e o meu corpo feito lume
já não tem quem o inunde
d'ilusões, esperanças fagueiras;
e entre pedras e cansaços
caem penas pelo espaço
como cai água das beiras.

E a saudade que me amarra
prende minh'Alma à guitarra
numa angustia de deixar-te;
e toda a história perdida
e toda a vida sem vida
vai nos olhos de quem parte.

Ó minh'Alma onde vais?!
Porque sofres tanto e mais
se o destino está marcado?!
Diz adeus a quem ficou
diz adeus a quem passou
parte em busca d'outro fado ...

PALAVRAS INQUIETAS

Há palavras inquietas
A bailar na minha mente
É o sangue dos Poetas
Minha terra, minha gente.

Bailam versos nos meus dedos
Tempestade que me acalma
O que sinto é meu segredo
Bailam rimas na minh'Alma.

Eu não sei o que me prende
Ao desejo de te amar
A minh'Alma não entende
Se há-de rir, se há-de chorar.

E como baila a solidão
Há palavras inquietas!
Porque bailam sem razão
Nas Almas dos Poetas?!

⁠Era outro -

Ah se eu pudesse não ser eu ...
Acreditem ... era outro!
Pois quem este me deu
deu-me à vida jaz morto.

E se estas pedras falassem
se este chão tivesse boca
talvez todos soubessem
que a minha vida é tão pouca.

E o porquê de ser assim?!
Se eu fosse fariseu
matava em mim
este peso de ser eu ...

Nem eu sou o que sou
nem sou o que queria
desta angustia a que me dou
vou morrendo dia a dia.

⁠O melhor de mim -

Sinto que o melhor de mim 'inda não veio!
Mas de que horizontes há-de esse bem chegar?!
Há magoas a bailar no vale do meu seio
e tantas dores que sinto ainda aconchegar ...

E é ter fome de ser alguém diferente
é ter sede d'encontrar outro caminho,
procurar outro destino, ir em frente,
recordar as ilusões de pequenino.

E é sentir uma vontade de te amar
num campo de açucenas a florir
que se dá, por dar, aos olhos de quem chegar.

Que vontade de adormecer nesse teu seio
que vontade de chorar, contigo rir ...
Serás tu o melhor de mim qu'inda não veio?!

⁠Desconversa -

Pela vida houve alguém
que me falou em ser feliz
mas eu disse-lhe a bem
que também era um aprendiz ...

Manda fora essa tristeza
que puseste nos teus versos
rasga a dor, a incerteza
e encontra outros desejos!

Nada tive p'ra dizer
quem não sente o que outro sente
nunca tem como entender
o que vai dentro da gente.

E falou! Deixei falar ...
Achava velho o que ia ouvindo
fui-me embora sem pensar
disse adeus e fui sorrindo!

HÁ UMA SEDE EM MIM QUE NÃO ENTENDO


Há uma sede em mim
Que não entendo!...

Como se pudesse sentir
Toda a secura das fontes
O grito amargo dos poços
O choro triste das pontes
E tantos, tantos remorsos!

Há uma sede em mim
Que não entendo!...

Sede imensa sem destino
Cujo o destino é dar-me sede
Uma sede que me turva
Que me impele no caminho
E me esbate em cada curva!

Há uma sede em mim
Que não entendo!...

É uma sede de infinito
É uma sede de verdade
Uma sede que vou sofrendo
Uma sede de saudade
Que no fundo não entendo!