Coleção pessoal de Eliot

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⁠Overdose -
(o Corpo entre o "demónio e a Alma" )

Abre-se uma estranha porta ao desconhecido ... um infinito de punhais, um demónio sem rosto.
Algo entra - profundo, intenso, poderoso, dominador.
A Alma humana é empurrada a um precipício de trevas internas angustiantes. Desce-se aos infernos da psiqué num continuado estado de permanência, um purgatório interior que sufoca, controla, manipula, por tempo indeterminado.
Uma dificil luta interior entre esse estranho que se instala e nós próprios que queremos, exigimos o corpo de volta.
É ser caçado dentro de nós mesmos sem ter meio de fuga. Só a força interior nos pode proteger, a fé e a vontade de voltar a ter "a casa" de volta e expulsar o invasor.
E nessa batalha travada no corpo evidenciam-se o demónio e a Alma.
A eterna luta entre o Bem e o mal. Aproximam-se Seres. Alguns querem proteger-te outros querem ter oportunidade de tomar-te o corpo também.
E tu, ali estás, como um vidro partido, parado a meio tempo, estático, diminuido, num passo de impasse sem saber o teu destino ... rezando ... porque parte de ti está consciente mas a outra já foi tomada.
É um medir de forças injusto e doloroso. Altera-se a percepção da realidade. Há paranóias, alucinações, desorientações sem espaço nem tempo, estados de pânico continuos e progressivos. A ansiedade parece lentamente diminuir ... mas volta sem piedade.
E há náusias, vómitos, tonturas, não te sentes nem te vês.
Uma espiral que ora sobe, ora desce, conforme a tua força interior sobe para a tua fuga e desce para te enterrar. Um vai e vem onde a meio da luta a tua já pouca humanidade consciente te traz à parte do cérebro que pouco dominas, imagens, histórias, pessoas, vivências, sonhos, planos, saudades dos mortos, medo de perder os vivos, é um quase descontrolo que o outro lado te gera pelo medo, pela ângustia, pela ansiedade.
E é aí nesse limbo que te situas!
Não adormeças, não podes adormecer, não deixes que "ele" te convença que adormecendo vai passar, é mentira, se adormeceres "ele toma-te", todo, por inteiro.
E a questão não é se acordas, mas sim, como acordas.
Podes nunca mais voltar a ser o mesmo.
Enfrenta-o, sê tu, determinado a deteres o teu corpo de novo mas verás que nada voltará a ser como foi. Não serás o mesmo mas serás mais forte ...

⁠Gonçalo Salgueiro
por Ricardo Maria Louro-

Quando tu nasceste
no céu da tua noite
cintilaram as estrelas mais doces
ouviram-se as melodias mais ternas.
Fixaram-te os horizontes fugidios
dançaram os poentes sobre o mar
e até a Lua, envergonhada,
se ocultou do firmamento!
O vento, ora vento brando, ora vento Norte
cantou ao menino d'oiro ...
És tu o vento! Um sopro de saudade...
E há quimeras, há silêncio - pausa e silêncio,
obtusas lágrimas por chorar, carentes em galgar-te a face!
Porque as seguras?! Porque as susténs?!
Porque as não derramas se quando caem
transformam-te o canto, moldam-te os versos,
abrem-te a Alma ...
Deixa que docemente te humedeçam a face
e te possuam o timbre da voz.
Por ti! Por mim! Por todos nós!
E depois ... depois sorri ... sorri chorando
nas margens de um rio junto ao tronco
de um Salgueiro, aí, onde morrem e renascem
as lendas dos amores ...
... eternas, sagradas, intemporais.
Tu estás vivo, tu és vida!
"Deixa que os mortos sepultem os seus mortos ..." e segue, veste a roupagem das andorinhas
e canta, canta, porque dás mais vida à vida
com teu canto e tudo renasce,
tudo é novo, de novo!
Não os oiças! "Eles" não sabem o que dizem!
Avança no trilho do coração ...
E um dia ... um dia tudo será como antigamente
porque voltarás aos braços quentes da tua Mãe ... para sempre!

*Para o cantor, fadista e autor Gonçalo Salgueiro.

⁠Silêncios e matizes -

Sem ti, meus dias tristes são lilases,
sempre à espera daquilo que nunca dizes
do tanto que de ti anseio e nunca fazes
do teu olhar pintado de silêncios e matizes.

Lá longe mal te vejo mas ainda ouço
o som dos poemas que te compus
sinto um aperto, uma corda no pescoço,
como se fosse um Sol em contra luz.

Há nos campos flores brancas e amarelas
de toda a parte oiço a voz das ventanias
há gente espreitando p'las janelas
encostada à sombra dos seus dias.

E o vento traz o eco do teu nome
um estranho odor de oliveira e de mel
mas hoje, de ti, ainda tenho fome
louco que sempre fui p'la tua pele.

⁠À Porta das Manhãs -

Fixei no espelho o meu reflexo, reparei
que p'lo meu rosto havia passado o tempo
mas não me reconheçi, não me encontrei
e apenas me invadiu um pensamento:

a vida fez-me parar à porta das manhãs
porque nunca fui capaz de ser o primeiro
a penetrar os sonhos em horas vãs
para conseguir ser um Ser inteiro!

No espelho pus a mão na minha mão
os dedos pareciam retesados, hesitantes,
nesse instante tremi, cai no chão
e lá estava eu como sempre, como dantes.

Senti medo, fel, solidão, fome ...
Noutro tempo, quando eramos os dois,
bastava chamar pelo teu nome
e desvaneciam o antes e o depois.

Quis partir, pus a vida sobre a mesa
com dor, amargura, sofrimento,
e quis morrer ali, tive a certeza
mas adormeci nesse momento.

Se já não posso estar contigo
ter de volta tudo o que foi nosso
embora ninguém oiça o que digo
chorar sobre este espelho ainda posso.

⁠Calado simplesmente -

Ao despertar a vida parece-me hedionda,
um barco sem horizonte nem Luar...
Será talvez por ver nas vagas ondas
uma imensa vontade de naufragar.

Quando desperto dormem as fontes
e as gaivotas ao vento perdem penas
a saudade manifesta-se nos poentes
e eu visto todo o corpo de poemas.

Às vezes o silêncio sabe a chuva
e o peso do destino sobre os ombros
cheira a malvasia, sabe a uvas,
parece um cair de tarde sobre pombos.

Ninguém me há-de saber os medos
os que trago em abismos infinitos
a frieza retesada dos meus dedos
e a agonia penitente dos meus gritos.

Porque a vida na verdade é uma pluma
em que sou um vendaval, subitamente,
talvez nunca seja coisa alguma
sendo eu calado simplesmente.

⁠Linhas desoladas -

Se a vida tivesse sido outra
outra teria sido a nossa história,
agora, a memória é tão pouca,
triste, permanente, obrigatória.

Meus olhos de mágoa e leite
cheios de chuva, silêncios e cansaços
e a sombra do teu corpo num tapete
aconchegada nos meus braços.

A solidão ardendo ao pé do lume
o espelho sem reflexo nem paisagem
e a vontade de subir, chegar ao cume,
contemplando a tua imagem.

Que saudade de estarmos sempre assim
vestidos de paixão - doce, intacta,
hoje, escrevo versos sobre ti
nas linhas desoladas de uma carta.

⁠Despojado de mim -

Despojado de mim
aqui me encontro
mártir do tempo;
oblíquo, amargo fim
a que chega um conto
na voz do vento ...

Despojado de mim
aqui me entrego
à dor da despedida;
digo não, digo sim
nada vejo, estou cego
nos caminhos da vida.

Despojado de mim
aqui termino
com vontade, sem pena;
a vida é assim
mas de mim germino
de Alma limpa, plena.

Despojado de ti
leda noite fria
sem Lua nem luar;
(noite que te perdi!)
o vento gemia
fechou-se o meu olhar.

⁠Ledas horas -

Esta fria e densa solidão
feita de silêncios e saudade
possuiu-me logo o coração
desde o principio da idade ...

Cheia de caminhos, sem nada,
tirou-me da vida claridade
e minha mãe, pobre; coitada,
pariu-me sem vontade ...

E as lágrimas em fio
cairam-me cansadas,
tremendo à noite, cheias de frio!

E tantas ... ledas horas magoadas
que vi pairando no vazio
por ver minh'Alma abandonada ...

⁠Outro Começo -

Neste mal sentir em que me encontro,
mal estar profundo e inacabado,
sou de mim cativo, por isso conto,
sou um prisioneiro do Passado!

Quem me dera ser outro além de mim
alguém firme e certo do caminho
capaz de fazer da vida Não ou Sim
traçando as linhas do destino!

Mas há pedras! Tantas! Tantas! Tantas!
Buracos, vales, covas e cabeços
e o cemitério cheio de campas ...

Eu vendo solidões a bons preços,
quem dera mas comprassem almas Santas
para que eu tivesse outro começo!

⁠O Amor é o alicersse
onde se apoiam os abraços,
os sorrisos e os olhares.
Faz pontes, destrói barreiras,
únifica Almas, amplia Vidas ...

⁠É Noite -


É Noite! E é noite na minh'Alma ...
É noite adentro ao meu coração
carregado de saudade.
É noite - em breve madrugada e o
dia chegará!

É Noite! E é noite em minha casa ...
É noite à minha mesa num abismo
etéreo e profundo.
É noite - em breve madrugada e o
dia chegará!

É noite! E é noite em meu olhar ...
É noite no meu corpo, nos meus gestos.
É noite - em breve madrugada e o
dia chegará!

É noite! E é noite em minhas mãos...
É noite em minhas veias, nos meus ossos, nos meus dedos.
É noite - em breve madrugada e o
dia chegará!

E é noite em minha cama ...
É noite nos meus sonhos ...
Noite austera e profunda
sem ter principio nem ter fim ...
É noite - chegou a madrugada mas
o dia não virá!

⁠É melhor tomar uma decisão radical
do que assinar um mau acordo!

⁠Quem adiciona (+) sem dividir (÷)
subtrai (-) a igualdade (=)
e multiplica (×) a separação ...

⁠E a vida é assim -

E a vida é assim
cheia de principios e de fins
cheia de alegrias e de mortes
e até a própria sorte
está cansada de ter fim ...

Mas a vida é assim
um abismo entre ti e mim
da juventude à velhice
vou dizer o que já disse
a vida é assim!

Às vezes cheira a jasmim
há o não e há o sim
talvez o sim uma saudade
o não uma vaidade
porque é que a vida é assim?!

Por vezes feita de cetim
nem sempre é um jardim
um silêncio, uma quimera
e na verdade, quem nos dera
que não fosse tão ruim.

Mas a vida é assim
tem principio e tem fim
nós nascemos a chorar
não passamos sem amar
'inda bem que a vida é assim!

⁠Sobre as infâncias:

Há muitos tipos de familia ...
Familias de muitas naturezas ...
Damos e recebemos o amor
que é possivel!

⁠Ainda ontem me lembrei
que se tornármos mais tranquilos
os momentos difíceis
talvez possamos viver a vida
mais inteiramente!

⁠Rés-do-Chão da Vida -

Eu vim do rés-do-chão da vida
de uma vontade inconcebível
do instante sem despedida
de tudo o que não é possivel.

Eu vim com asas quebradas
e na vontade de voar
vi a Alma abandonada
nas margens da vida a soluçar.

Eu vim de onde ninguém vem
da estranha noite dos meus medos
da vontade que ninguém tem
de ver a nú os seus segredos.

Eu não sei de onde vim ...
Trago a Alma em sangue, ferida,
tão perto e tão longe de mim
eu vim do rés-do-chão da vida.

⁠Sobre Amália:

Quando a voz de um Povo,
a Alma de uma Nação
habitam num só corpo,
num só coração ...

⁠Um amigo quando gosta de nós
é um prolongamento da nossa
identidade.

⁠Farei de cada momento da minha vida
uma incessante de apenas viver aquilo
que me faz bem!
O resto não vale nada ... seja palha que o
vento leva!
Serei, no entanto, sempre submisso à
Vontade Deus, o Único que me Guia.