Coleção pessoal de Eliot

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O que mais me dói ao saber que vou morrer
é pensar que o amanhã já não é meu
e que o mundo há-de continuar a correr
como se eu 'inda fosse eu!

O que mais me dói ao saber que vou morrer
é pensar que a madrugada nunca mais
há-de chegar, só porque não a irei ver,
nesse mundo onde só existem vendavais!

O que mais me dói ao saber que vou morrer
é ter que me esquecer do cheiro a terra molhada,
não ouvir os regatos pelos campos a correr
ou a chuva que bate levemente na vidraça!

Nunca mais hei-de falar dos meu Poetas!
Nunca mais hei-de sentir ou hei-de ler
os seus Poemas, suas palavras de profetas.
Só por isso e nada mais terei pena de morrer!

Afinal o que me pode mais doer do que não
ouvir o som da poesia?! Não a ver!!!
Não sentir no corpo o toque da sua mão!!!
O que me pode mais doer ao saber que vou morrer!

Na solidão dos dias cansados
há sempre em mim, de noite,
um verso por escrever,
há em mim algo de oculto,
intenso e indiferente!
Na ilusão das horas marcadas
há em mim um poeta
que reconheço mas não
entendo nem desejo!
Estou triste como a noite
embora o dia 'inda agora
tenha começado ...

⁠Não sou mais -

Não sou mais do que o vento passageiro
ou a brisa do horizonte que se sente
no olhar, num instante triste mas inteiro,
numa hora infeliz, fria e permanente!

Não sou mais do que um grito de infinito
por sobre as manhãs frias que nos cercam
cheias de névoa e solidão, num desejo perdido,
de não ser um daqueles que todos deserdam!

Não sou mais do que a distância imprecisa,
vagamente perturbadora que nos rodeia
de rosas negras, numa hora apetecida
de Primaveras, num sonho que se alteia!

Não sou mais do que estes versos que escrevi
nas folhas do silêncio que vou lendo
ou estas linhas que não falam de ti
porque tudo se apagou na voz do vento!

⁠Instante de mim -

Meu amor tu não te lembras
daquelas horas, das penas,
das ilusões que a vida tem;
das tristezas sem carinho
de tantas pedras no caminho
que o teu amor me deu também.

Trago tanto por escrever
muita coisa por dizer
na solidão dos dias vagos;
dou ao Fado o meu destino
e os meu olhos de menino
trazem sonhos magoados.

Se eu soubesse que esquecendo
apagava o que fui sofrendo,
acredita, seria o fim;
nunca mais me encontrarias
porque afinal tu não merecias
nem um instante de mim.

⁠Esta noite -

Lado a lado, frente a frente,
nós, a Morte, o destino e a saudade!
Quem diz que não sofre, mente,
pensando que vive em liberdade!

Não passa tudo d'um instante
entre o desejo de ficar e ter que partir;
o ritmo é binário, constante,
vivendo a vida da vida a fugir.

Olha docemente em teu redor,
a vida não acaba, simplesmente,
quem nasce p'ra morrer não é pior
do que quem vive infeliz no meio da gente.

Esta noite tocarás para as estrelas,
esta noite, tocarás ao som do vento ...
Tudo porque as Estrelas são belas
e a vida não passa d'um momento!

⁠Hoje mas só hoje -

Hoje inclino-me ao fulgor dos dias luminosos
caiados de sol, cheios de noite e solidão,
inclino-me às dores, aos olhares saudosos
da minha triste juventude etérea sem razão!

Hoje! Mas só Hoje! ...

Hoje inclino-me às crianças que passeiam pela rua
cheias de sonhos e vontades, como eu já tive,
e penso na amargura que vão sentir, tão crua,
ao verem, crescendo, que sem a morte ninguém vive!

Hoje! Mas só Hoje! ...

Hoje inclino-me às guerras porque delas se faz paz,
uma paz armada, bem sei, porém uma semente,
inclino-me à fome e à tristeza de que a traz,
à dor e ao silêncio de quem a vê, de quem a sente!

Hoje! Mas só Hoje! ...

Hoje e só hoje me inclino ao coração dos homens,
por vezes, tão negros, cheios de maldade e podridão,
cheios de angustia e amargura, cheios de nuvens
que lhes encobrem a Voz de Deus e lhes tiram a razão!

Hoje! Mas só Hoje! ...

⁠Aquela Ponte -

Ainda hei-de encontrar
aquele amor que não vivi
aquele toque que não senti
alguém que me há-de amar.

Hei-de ser o Sol poente
que arde no horizonte
hei-de ser aquela ponte
onde passa toda a gente.

E hei-de ser todas as coisas
do principio ao fim da vida
uma esperança concebida
como são as coisas doidas.

Mas porém se não chegar
esse amor de que vos falo
acreditem vou espera-lo
bem no fundo do meu olhar.

⁠É inútil acreditar -

É inútil acreditar
quando alguém já nos mentiu
fere sempre até sangrar
da mesma forma que já feriu.

Uma espada de dois gumes
que trespassa até matar
duas chamas num só lume
é inútil acreditar.

É inútil acreditar
em olhos que já mentiram
insistem sempre até magoar
num amor que não sentiram.

Mas um dia há-de haver fim
o que começa há-de acabar
nessa história, ai de mim,
se voltar a acreditar.

⁠Perguntei ao teu olhar -

Perguntei ao teu olhar
se tinhas por mim amor
mas dissestes a chorar
não perguntes por favor.

Quando a Alma nos agita
e as palavras contradizem
as verdades que não ditas
só os olhos no-las dizem.

Mas se os olhos nunca mentem
porque o faz a tua boca
que eles digam o que sentem
pois a vida é tão pouca.

O silêncio também fala
quando tira a voz da gente
quando a tua boca cala
o teu rosto nunca mente.

- Desabafo -

Há coisas que não doem porque já doeram,
medos que chegam sem chegar, e quando chegam,
não passam de temores, agruras, enfados, abanões ...

Há gente que vai e vem num continuo movimento de cumprimento e despedida,
e é nesse tempo do meio, entre chegarem e partirem, que estamos nós, parados, incólumes, em silêncio, a apreciar uma viagem circular.

Porque quem se vai, um dia torna, mas quando volta, já nem sempre os esperamos ... e adeus, sigam o destino ...

E há milhares de sentimentos que já sentimos: desilusões, tristezas, altos e baixos, momentos de solidão ...

Os sentimentos são como as pessoas, vão e veem, chegam e partem, mas quando voltam, já não os recebemos do mesmo modo. Tudo porque já um dia os acolhemos e já um dia nos abandonaram.

Hoje tenho medo! E não é fraco quem diz ser! É forte! Coragem não significa ausência de medo. Porque todo o corajoso tem medo, por isso é corajoso ...

Hoje visto-me de medo! Como com o medo! Bebo com o medo! E durmo com o medo, vivo com o medo ...

Um medo diferente, bem o sei, mas medo!

Minha casa, minha cama, meu fado, meu jardim d'angustias e solidão!
Dou-te a minha mão, olho-te nos olhos e desabafo: AMO-TE!

Ricardo Maria Louro
Café a Brasileira
Chiado/Lisboa

- AO VER-TE DAQUI -

É tão estranho hoje ver-te, ao ver-te daqui,
O amor quando chega a gente não espera,
A vontade de amar que um dia perdi
Talvez volte por ti, ai quem me dera!

Nem mar ou silêncio ou vendavais que vivi
Nada é mais triste que o amor que matei
Mas tenho medo de sofrer o que já sofri
Passar por aquilo que um dia passei.

Não quero voltar a chorar por ninguém
Nem mesmo que a vida um dia mo pessa
O amor que te tenho não veste o desdém
Haja o que houver, aconteça o que aconteça.

Já nada me espanta, já nada me espera
Já não quero sentir o que um dia senti
Acabou o Inverno, já é Primavera
E assim nasceu este amor que sinto por ti!

- QUEM DERA PODER NASCER DE NOVO -

Quem dera poder nascer de novo!
Ser diferente do que sou -mais feliz!-
Voltar alegre ao colo de meu Avô
E não lembrar a vida que já vivi ...

Quem dera poder nascer de novo!
Rasgar os tristes horizontes que guardei,
Deixar partir o passaro perdido, o corvo
adormecido, que ao meu destino acorrentei.

Quem dera poder nascer de novo!
Esquecer de quem um dia me fez mal
Sentir dentro de mim que os absolvo
E acreditar que nada mais será igual...

Mas tal coisa não irá acontecer!
Sou assim: vivo à margem deste povo,
Só esperando pela hora de morrer,
P'ra quem sabe, poder nascer de novo ...

- CERTEZA VAGA -

Na solidão dos dias parados
Há esperas inúteis que nos doem
E há olhares do tipo cansados
Que nos entristecem e consomem.

No peso das horas marcadas
Há em nós suspiros profundos
E há mágoas que pesam, cansadas,
Em busca d'encontrar outros mundos.

Na loucura d'encontrar o amor
Fiz d'amargura um grito maior
E no passar dos dias, à dor,
Conheci-lhe os sonhos de cor.

Afinal ... Nem sei bem da onde vim!
Nas esperas inúteis que nos doem
Tracei um caminho de ti a mim
E meus sonhos já não vivem só morrem!

⁠Mais vida -

I

A vida é um mistério sem tamanho
Às vezes uma pressa que nos cansa
Quem ama por amar tem tudo ganho
A vida é um poema que nos alcança.

A vida é como um rio que segue o leito
O sonho no olhar de uma criança
Um forte coração dentro do peito
A vida numa palavra é confiança.

REFERÃO

E um dia hei-de dar mais voz à vida
Saber que a solidão não é mais forte
Romper qualquer amarra com a morte
E um dia hei-de dar mais vida à vida!

I I

Há vida no olhar de quem se ama
Na boca quando fala uma verdade
No corpo de um poeta feito lama
Há vida em cada gesto de saudade.

Há vida num silêncio feito grito
Num pássaro que voa sem destino
No eco de um adeus que não foi dito
Há vida em cada passo do caminho.

⁠Outro dia -

I

É triste sentir que a esperança é coisa rara
ninguém encontra um caminho ou direcção
tanta gente que se dá e só embala
saudades, lado a lado, a par de coração!

E quando passam todos há silêncio
na raiz da noite tudo é em vão
e já ninguém se esconde, é permanente
viver amargurado em solidão!


Refrão

Mas sei que a vida traz sempre um caminho
creio no amor mais forte que o vazio
pois sinto que sonhar não é fantasia ...
Porque pomos tantas dores no destino
se a vida vai passando como um rio
nas margens do silêncio, dia-a-dia!


II

Há tantos ódios pelo mundo a dançar
penetrando o amanhã, 'inda por vir
e é fácil ser diferente, basta amar
como o Sol que se levanta a sorrir!

A esperança nunca morre, diz o Povo,
a vida nunca acaba, diz a esperança!
O que falta a cada Homem é amar de novo,
sorrir, acreditar, voltar a ser criança...

⁠(Des)Campanha politica -

Há p'las ruas da cidade
Muitas caras em cartazes
Uns sinceros, com verdade,
Outros disso tão incapazes!

Quem são uns ou quem são outros
Não me cabe a mim saber
Mas que saibam aqui todos
Há um ratado a bem d'zer!

Que haja ratos na cidade,
Já sabemos, teem manhas!
Mas comem por maldade
Os cartazes das campanhas?!

Ainda há uns impecáveis
Limpos, claros, sedutores,
Mas os mais indesejáveis
São rasgados por doutores!

Foi só um o maltratado!
Até um dente lhe faltou!
Mas quem seria o irritado
Que ao seu charme se curvou?!

Ora deixa lá Henrique
Que o teu nome já é Sim
Que este gesto prejudique
Quem traçou nele o seu fim!

Há muito que nesta Praça
Não se vê que haja Lei
O que irritou foi teres Graça
Só por teres o ar d'um Rei!

⁠Fiz um poema -

Fiz um poema:

Rimei esperança com virtude
saudade com cegueira
distância com regresso
nada com vazio
e água com poeira!

Fiz um poema:

Rimei silêncio com amor
alegria com paixão
medo com pavor
e o teu olhar
com coração!

⁠Aquela Cruz -

Lá no alto, aquela Cruz
tem um Cristo cansado;
pobrezinho, não tem luz
abandonado, ó Bom Jesus
por mal do nosso pecado!

E uma tão bela Mulher
chorando ao ver tanta dor;
disse, não posso viver
sem a vida me dizer
porque mataram o meu Senhor!

Tristemente Jesus morreu
numa tarde sem amor;
e uma voz se ouviu do Céu
vem a Mim ó Filho Meu
que esse mundo só traz dor!

E os homens desde então
por este gesto numa Cruz;
puderam ter em comunhão
a cada Passo da Paixão
o Corpo e Sangue de Jesus

Conversão -

⁠É loucura não saber de onde se parte
sempre que se parte de algum lado,
para amar, precisamos de ter arte,
ser fortes p'ra fugir do que é errado!

Tantas vezes que afinal nos enganamos
com olhos que nos olham sem verdade
porque erradamente acreditamos
que esses olhos são olhos de saudade!

Deixa Deus falar-te ao ouvido
só Ele te pode encaminhar na vida
e mostrar-te qual é o teu sentido ...

Entrega em oração o teu penar
e abre o Coração a Esse Amigo,
pois Ele, jamais te irá abandonar!

⁠Sino da Fome -

Quando se ouvem badaladas
Desse sino solitário
Fala a fome das consagradas
De Santa Helena do Calvário!

No silêncio da cláusura
Entre o dia e a penumbra
Grita o sino por ternura
Contra a fome que se apruma!

E as Trindades vão soando
E a fome vai batendo
Toca o sino de quando em quando
E à Abadessa vai morrendo!

E não há quem não pereça
Ao saber que num Sudário
Morre a última Abadessa
De Santa Helena do Calvário!