Poemas de Morte
A morte não me assusta.
Não mais.
Ela chega de mansinho,
puxa uma cadeira, cruza as pernas
e me observa em silêncio,
como quem espera o fim de um café frio.
Eu respiro fundo e finjo que não a vejo.
Acendo um cigarro, mexo na xícara,
brinco de ignorar o inevitável.
Mas sei que ela está ali — talvez sempre estivesse.
E isso me arranca um riso sincero.
Não que eu não ame a vida.
Amo. Mas, às vezes, a vida pesa,
vira conta vencida na gaveta,
pedra no sapato.
Às vezes, ela pede trégua,
e eu, sem jeito, sigo a marcha dos desesperados.
Então, a morte chega sem anunciar.
Não bate na porta, não tosse no batente.
Apenas entra, senta,
ajeita o capuz do manto
e me olha, como quem diz:
"Você sabia que eu vinha."
E eu sabia.
Desde sempre.
Ela não é susto, nem castigo, nem fim.
É como uma palavra mal dita
que o poeta decide engolir.
Um fardo que escorrega dos ombros,
um corpo que desaperta e, enfim, flutua.
E, no fim, talvez seja isso.
Não um adeus, mas um aceno comedido.
Só morre quem viveu, quem gastou os sapatos,
quem aprendeu a tropeçar sem medo.
E eu?
Eu aceito.
Porque talvez só quem morre entenda, por fim,
que viver sempre foi um jeito
— sutil, distraído, inescapável —
de ir embora.
Medo da morte
Você é um babaca que sai de casa
Achando que irá causar confusão
Talvez algum incidente lá na praça
Você fala que é fogo, mas é brasa
Tentando se destacar na multidão
Foge quando ocorre uma desgraça
Medo da morte, medo da morte
O seu fim está muito próximo
Medo da morte, medo da morte
Todos os outros achariam ótimo
De quantos você já correu até hoje
Depois de tentar expor a sua visão?
Humildade serve como um lema
A alguém que tenha consideração
Mas o seu nada merece repúdio
Ninguém gosta de se aproximar
Medo do depois, medo do depois
Não existirá par a lhe consolar.
VIDA E MORTE
"Muitos pobres de coragem e audácia, se apegam a vida e por isso morrem cedo, como miseráveis, com uma vida miserável.
Mas há aqueles cuja a ambição é tão verdadeiramente pura, que se apegam a morte, com sua certeza inevitável.
Por isso amam, descobrem, inventam, desfrutam, por isso vivem."
AMOR E DESEJO
"Não desejo você, pois o desejo foi atrelado a morte, para que os homens pudessem matá-lo, entrego a você o meu amor, pois foi atrelado a vida, para que pudéssemos vivê-lo."
Na contemporaneidade, observa-se uma tendência preocupante: a utilização da morte de indivíduos, especialmente celebridades, como uma ferramenta de autopromoção.
Nesse cenário, o luto autêntico e genuíno é relegado a segundo plano, dando lugar a uma pressa desenfreada em capitalizar o evento, buscando não apenas aumentar a visibilidade pessoal, mas também impulsionar as vendas.
Esse fenômeno revela um viés utilitarista e egoísta, no qual a morte é vista como um recurso a ser explorado em prol de benefícios individuais, como ganho financeiro e reconhecimento público.
DINHEIRO
Oh! Dinheiro, de uma coisa não temos sorte; não podes deter a morte.
Oh! Dinheiro, não tem jeito; sem você, sofremos preconceito.
Oh! Dinheiro, contigo inimigos tornam-se amigos; amigos tornam-se inimigos.
Oh! Dinheiro, o que importa é que estás sempre na moda.
Oh! Dinheiro, sem você ninguém escuta; com você, a verdade torna-se absoluta.
Oh! Dinheiro, aonde se escondes? Desejo achá-lo aos montes.
Oh! Dinheiro, te quero de janeiro a janeiro.
Oh! Dinheiro, sem distinção, para bem ou para mal, sempre te buscarão.
Oh! Dinheiro, na busca por ti, muitos vão mentir, trair, agredir e destruir.
Oh! Dinheiro, tenho pena de quem faz cena, afirmando que dinheiro não vale a pena.
Oh! Dinheiro, acabe com a fome que muitos consomem.
Oh! Dinheiro, contigo toda alma se acalma.
Oh! Dinheiro, és um verdadeiro Deus; tens o mundo inteiro a teus pés.
Em vida, constantemente ignorado, desprezado, criticado...
Em morte, eternamente elogiado, celebrado, adorado...
“CUGINA” FLÁVIA
Se da morte predomina a saudade
Da saudade a lembrança de porte
Doce menina, nunca pela metade
Tenho na falta uma saudade forte
Um vazio tão cheio de recordação
Que invade a todo momento o dia
Pulsa abafante, árduo. Tristura não
Pois deixaste aquela boa simpatia
E, tenho da privação aquele pesar
O teu olhar arraigado no passado
Numa carência do silêncio a surrar
Ah! o tempo distância mais e mais
Mas também abrevia o reencontrar
Pois, tivemos a regalia de te amar...
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
05 de março, 2022 – Araguari, MG
*data natalícia da prima Flávia Magalhães Nogueira (In Memorian)
MORTE REDENTORA
Ter o amar é dar-se em sofrimento
É tolerar a agonia por estar doído
Sem clamor vão, sem um gemido
No suspiro doloroso e mais cruento
É ser condenado, do pecado isento
Pôr a palavra naquele sumo sentido
Ser sugerido, e da ideia esquecido
Sem fazer do teu pesar um fomento
É vir da simplicidade e ter podido
Filho de carpinteiro, bem amado
Do suplício não se fazer perdido
Viver enfado e ter a firmeza ao lado
Sem valia, e por moedas, vendido
Sendo amor, pastor, foi crucificado!
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
29 março, 2024, 15’00” – Araguari, MG
*paráfrase José Albano
A MINHA MORTE
Eu quero, quando me for, ser enterrado
ao pé da saudade de tempos de outrora
que tinha poética de verso apaixonado
aí, então, possa ter uma festiva aurora
Há de cantar galardão a um cavalheiro
de quem o amor cantou no seu existir
valei um amador de um amor inteiro
imutável sensação, o coração a sentir
E a dor não há de lá ir, só sentimento
e que serena melodia venha me velar
sem aperto, choro, suspiro e lamento
E, assim, então, com a poesia minha
está, o adeus possa a casta encontrar
e lá a prosa não mais perecer sozinha....
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
20/09/2021, 09’58” – Araguari, MG
Ontem eu me via sem sorte
Sem direção, amigo da morte
O destino queria somente o medo
As palavras desenhavam este enredo
Num coração vazio, escuro de ilusão
Tudo parecia enorme, uma imensidão
Queria desistir nesta circunstância
O horizonte estava sem fragrância
E neste sentimento de abandono e dor
Percebi que maior era o meu amor
Versos Para Minha Morte
O tempo na hora, suponho
Traga condolência para o fim
E me cubra com filó e vigonho
Apaziguando os sonhos, enfim...
E nesta batalha vencida, de partida
Levarei os versos para minha morte
Desobrigarei lamentos na despedida
E os deixarei ao contento da sorte
A lágrima fica para os que orem
E os que com minha alma importe
Em cada conta do rosário roguem
Meus pecados, assim suporte
Deus, e que me possa perdoar
Com compaixão, e faça meu transporte
Se desacertei, sempre quis amar
Talvez nesta hora peça aporte
Para o silêncio, para me libertar...
E na rixa do fado, a sorte, da minha morte
Será sem saber como, fico a imaginar.
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
Data indeterminada
fodo da minha morte
o tempo na hora, suponho
me cubra com filó e vigonho
na partida,
desobrigo lamentos na despedida
levarei os versos para minha sorte
lágrimas, aos que comigo importe
e orem aos meus pecados perdoar
sem saber quando, fico a imaginar
o fado da minha morte...
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
Data indeterminada
Como chorar a vida
Se a morte vai além
O tempo é corrida
Incertezas, porém
Tudo é começo, meio e fim
E eu tão pouco sei de mim.
UM ANO SE PASSOU, naquela madrugada, o seu silêncio escreveu saudades e com ele sua morte trazia...
Acordaste do sonho da vida, e tuas lembranças nós acolhia.
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
CORTEJO
De que vale evitar a morte, indesejada
Se para o silêncio do chão é o fado
Pois, o que parte, no óbito é calçado
E com solidão a personagem é levada
Com que cortejo desfilar no cerrado
Se o culto deveria estar na jornada
No forrar o cascalho da árida estrada
E não suspiros ao morto derramado
Que importância terá a vida finalizada
Se o elo no amor, então, não foi selado
E tão pouco, a vida, daquele, foi amada
Pra nada adianta ter tarde vazio agrado
Se de volta ao pó, a alma é consagrada
Deixe as rosas de lado, e avance calado
Luciano Spagnol
Agosto de 2016
Cerrado goiano
ORAÇÃO (DO CERRADO)
Senhor, que és a diversidade, que és a vida e a morte!
O cerrado és tu, o por do sol encarnado és tu, o chiado do vento és tu.
Tu és a sequidão no lamento, do chão árido, agonizante em tormento, tortos galhos, tu és!
Tu és o mistério da folha seca no bale do fado, falta e aporte, desenhando a sua sorte.
Onde tudo parece deserto, tu habitas, eis a variedade e o concreto.
Onde nada está tu rege a tua toada.
Dá-me entendimento pra te seguir, nos teus passos os meu passos, amar sem desistir.
Dá-me água pra aguar a secura, e assim, ouvir-te límpido na vastidão do sertão em agrura.
Dá-me olhos pra ver, a benção dos ipês, escasso da chuva, e tão formosos e frondes.
Faze com que eu ame como a natureza, diversa, cada qual com a sua beleza.
Respeitando. Amando!
Que eu seja irmão e serva-te como pai. Adonai!
Torna-me seco para o pecado, e aquoso no amor, pra ser amado.
Torna-me fértil como a terra, afim, pra eu rezar tu em mim.
Que não haja cascalho nos caminhos do bem, onde a boa fé possa ir além.
Senhor, protege-me e ampare-me.
Dá-me alegria na melancolia, enfim,
pra eu me sentir teu, na tua glória.
Senhor, habitas em mim!
© Luciano Spagnol
Poeta do cerrado
2017, abril. 05'40"
Cerrado goiano
paráfrase Fernando Pessoa
Ah! Se todos entendessem,
que a alma transmuta e a morte vence.
Teriam o amor como pertence...
Luciano Spagnol
poeta do cerrado
Cerrado goiano
A MORTE
Oh! dor negra! O adeus tal breve fumaça
Chora o pesar, a despedida em romaria
E vê despedaçar, amealhar a mágoa fria
Por onde o cortejo da saudade passa...
Mói o aperto no peito, sentenciado dia
A noite sem sossego, o acosso devassa
E só, trevoso, e o silêncio estardalhaça
No horror desta ausência, lamúria vazia
Oh! Jornada! A sofrer, fado de hino forte
Olhar molhado, e a alma cheia de pranto
Tinhas junto a vida, tendo tão junto a morte
Partiste! Denotando está infesta loucura
Trocaste o vital por este sossego santo
Desenhando na recordação tanta tristura
© Luciano Spagnol
poeta do cerrado
03/09/2019, cerrado goiano
Despedida de meu irmão Eugênio
Olavobilaquiando
Ir-se
Escandalizo a tal sorte
Afetação cruel e triste
Espera, alma e morte
Do gabo nada existe
Mesmice reescrevo
E o passo aí, passa
Na saudade relevo
Nos olhos fumaça
Nasci pra renascer
Das cinzas ressurgir
Morro e tento viver
Afeito. Outro partir!
© Luciano Spagnol
poeta do cerrado
2017, maio
Cerrado goiano
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