Coleção pessoal de Eliot

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⁠Bailado de Silêncio -

Há um bailado de silêncio
num palco d'ilusões.
Longe, fora do tempo,
talvez um murmúrio de vozes...
Pássaros voam em meus voos
rasantes,
desce sobre mim a angústia
da madrugada
cheia de punhais que se
entrechocam.
Nascem manhãs sanguíneas
do silêncio e das grades.
E o bailado continua ...
A vida não consente mais soluços.
Meu coração batendo vai além
de tudo,
bebendo das angustias de cada dia,
envenenando o meu destino!
Fechou-se o pano...
O bailado terminou ...

⁠Imagens Paradas -

Há retratos feridos nas pedras
lisas (duras) do chão,
povoados de silêncio, por detrás
dos olhos fechados,
em ruas quase desertas!

Imagens paradas à superficie dos
lagos que pairam nos meus sentidos.

Uma imagem se destaca, teu rosto,
liquida imagem que perfura o meu
destino como a folha d'um punhal.

Pedras se entrechocam nas
profundezas da minha Alma porque
só no extremo da noite se comunga
na fome dos gestos ...

Há retratos feridos nas pedras lisas (duras)
do chão, e eu, permaneço em silêncio!

⁠Há uma Tarde -

Há uma tarde fechada por dentro
caiada de sonhos e cansaços ...

Um quase silêncio vestido de Fado
que ultrapassa a solidão de quem
o canta.

Um quase poema feito de palavras
que não há mas que a Alma sente
e vê.

Um suspiro de marujo num barco
em alto mar ao sabor das ondas
indiscretas.

Uma vontade de ir mais além,
p'ra lá da vida, p'ra lá da morte,
numa busca incessante.

Que triste tarde fechada por dentro
caiada de sonhos e cansaços ...

⁠Nos meus Lábios de Mágoa -

Nos meus Lábios de Mágoa
Há saudade minha e tua
Trago os olhos cheios de água
Sem destino pela rua ...

Trago os sentidos cansados
Trago a Lua sobre os ombros
Trago os meus olhos parados
Na tristeza que hoje somos.

Bate ao longe um coração
Traz saudades a boiar
E no cais da solidão
Vou chorando sem parar.

Passa o vento apressado
Sem vontade de me escutar
Porque amei o amor errado,
Nada resta, há-de passar.

A saudade não passará
Trago os olhos cheios de água
Esse amor só viverá
Nos meus Lábios de Mágoa.

⁠Mãos do meu Destino -

Há em mim um grito de infinito
no silêncio que me veste a solidão
há qualquer coisa de vento
numa voz que me fala ao coração.

E há um suspiro feito de água
num olhar que me toca o pensamento
há um gesto ferido e meigo
que pesa triste sobre o tempo.

Há um adeus de asas paradas
junto às mãos do meu destino
que me acena com um lenço,
desde sempre, no caminho ..

⁠- Versos no Espelho -

Ontem escrevi um poema
Guardei-o bem no peito
Sem passado nem presente
Ao meu gosto, ao meu jeito
Dormi com ele no meu leito!

Hoje sinto-me diferente ...
É que os versos são presságio
D'uma Alma sem descanso
Que se canta num Adágio
Profundo, triste e manso!

Amanhã a vida seguirá
Outros versos nascerão
O silêncio será voz
Vestirei a solidão
Estarei de novo a sós!

E depois? O que virá?
Terei Alma? Terei corpo?
Só Deus sabe o meu destino ...
E as maselas do meu rosto
Hei-de vê-las no caminho!

É Inútil -

É Inútil que nos barrem os caminhos!
É Inútil que digam que o amor não vencerá!
É Inútil que os pássaros não venham na Primavera!
É inutil que o dia não avance e a noite não se evada!
É Inútil que o tempo passe ... vá passando!
É Inútil que os homens já não sonhem!
É Inútil que os sonhos não se toquem, que as pessoas não se encontrem, que os corações não se procurem ...
É Inútil! Será p'ra sempre inútil enquanto houver uma poesia ...

Deixa-me -

Deixa-me gritar ao mundo que te amo,
quero gritar todos os sonhos inúteis,
todos os desejos estéreis!
Que estou cansado de estar mudo ...

Deixa-me limpar as lágrimas dos meus olhos humedecidos, cheios de noite e de silêncio!
Que estou cansado de estar preso ...

Deixa-me chamar todos os mortos que ganhei, todos os vivos que perdi!
Que estou cansado de estar velho ...

Deixa-me ver a luz do dia em pedaços destroçados e elos que se fundem!
Que estou cansado de estar cego ...

Deixa-me morrer em paz - na paz do leito!
Que estou cansado de estar vivo ...

Noite -

A sua força vem de longe
os seus olhos estão mortos
suas palavras tristes , frias,
seu toque calmo e sombrio!

Quando chega,
esmaga sonhos no vazio,
encosta sombras na parede
e tudo é vago, tudo é estéril,
quando a noite se aproxima!

Deixem-na passar ...
Traz passos indecisos!
Leva a morte dentro dela!
Não fujam! É Inútil ... é em vão ...

Eu Sou o Último de Mim Mesmo -

Eu sou o último de
mim mesmo
que sucede a outro
que me habitou,
antecipado e frio,
sem vontade de viver!

Eu sou o último de
mim mesmo
que traz nas costas
o peso de um passado,
que ainda me persegue,
longo e rejeitado!

Eu sou o último de
mim mesmo
nascido de uma morte
de um veneno apetecido
de uma escrita indecifrável
vaga e baça!

Eu sou o último de
mim mesmo
o que vivi depois de mim
sem querer nem desejar
a Linhagem dos Poetas,
a rejeitada descendência!

Eu sou o último de mim mesmo,
o último depois de mim ...

O Sangue Apodrecido -

O Sangue apodrecido nas
minhas veias
não me deixa cantar a Alma!

Trago fome nos meus dedos.

O vazio que me veste o corpo
não me deixa amar a vida!

Mas outros dias virão...

Eu sou um moribundo!
Descalço de amarguras,
despido de ilusões.

Sou o batente de uma casa,
a baldraga de uma porta,
o erro de um ditado,
um verso por ser verso
que é tonto e rejeitado ..

Sonhos sobre o Mar -

Tantos são os sonhos que persigo,
Com eles, a ilusão de alcançá-los,
Só eu sei, na verdade, porque o digo,
Hei-de um dia, sobre o mar, deixá-los!

Vem o vento! Nas suas asas subo!
E ascendo ao anseio de voar-me ...
O sonho é voar! E isso é tudo.
A alegria de poder cantar-me ...

É longa a viagem do Poeta
Porque vem de fundos, longe de si,
Não sabe o seu destino, a sua meta,
E as suas ilusões não tem fim.

Talvez um dia possa ultrapassar
A vida que vai e vem sem jeito
Talvez possa pôr os sonhos sobre o mar
E guardar os versos no seu peito.

Poema Triste -

Há uma musica triste, distante,
um quase silêncio
que me toca no rosto
que me acaricia a Alma,
uma angústia fria e vaga
uma sombra profunda
um grito cansado
um destino por viver
um sonho por sonhar.

Há uma voz doce, presente,
uma quase alegria
que me envolve o coração
um triturar de gestos quentes
um quase vento de asas
um leve entendimento
uma breve lonjura
um poema que acaba de nascer!

Serei Sempre -

Serei sempre um pobre Poeta
sem destino,
um deserdado dos outros,
um esquecido, abandonado,
filho do silêncio
sem vontade de viver!

Serei sempre um triste
que só sabe fazer versos
com garras frias, contra a vida
negando o coração ...
Terra mordida de Sol ...
Noite vivida de Lua ...
Morto que procura a solidão ...

Confissões em Cruz -

Apetece-me gritar ao vento que
estou vivo! (Ou não ...)
Apetece-me gritar que não sinto
o corpo ...
A minha morte veio, agora, intima,
embebida em lençóis de madrugada!
Estou cansado ...
Minha cama, meu dossel, minha carne
junto ao osso, coração de marinheiro
afogado no mar alto.
Trago uma cruz ao peito!
Apetece-me chorar, dizer adeus e não
partir,
não ter que chegar a lugar nenhum ...
Mar de mágoas sem destino,
rio de sangue sobre pedras,
meu corpo, minhas veias,
Minh'Alma de Poeta!

Não deixes Mãe que me fechem os olhos -

Por trás de cada espelho há um olhar
Por trás de cada corpo há uma Alma
Por trás de cada ilusão há um sonho ...

Olha Mãe, quando a morte vier e
virá cedo,
não deixes fecharem-me os olhos
nem porem-me as mãos em cruz
sobre o peito.

Não pode a vida negar-se a quem a
Viveu - obscura - dia-após-dia ...

Quero ir de olhos abertos para a terra
com as mãos livres para os versos ...

Eu sei que hei-de morrer como quem vive!
Não deixes Mãe que me fechem os olhos!

Nos lábios e nos dedos -

Trago suspensa nos lábios
A palavra poesia,
Trago, na ponta dos dedos,
Todos os versos por escrever,
Nos olhos, trago estrofes,
Métricas, rimas e tercetos ...

Tantas quadras d'ilusão
Que na forma nunca rimam
Mas que enquadram um sentir
Vasto e profundo,
Cheio de sucalcos no caminho,
À beira de um abismo!

Existo p'ra sofrer em minha
Própria dor,
Destruo-me e renasço
A cada instante, para em seguida,
Voltar a morrer e depois a renascer!

Sou assim em cada verso!
Porque trago suspensa, nos lábios,
A palavra poesia e na ponta dos dedos
Todos os versos por escrever ...

Deixem os Poetas -

Deixem-se de palavras vãs
Aos ouvidos rebeldes
Dos poetas renegados!

O mundo está velho,
Os homens cansados,
A carne está gasta ...

Deixem os poetas ao vento.
Que gritem liberdade
P'ra lá dos muros da prisão!

A esperança perdeu-se,
A fé caiu por terra,
Não há sonhos nem vontades ...

Caem silêncios infinitos por
Sobre as Almas ...
E nada é verdadeiro além de
Sermos nós frente ao mundo ...
Porque só os poetas vivem para
sempre!

Uma Rosa, um Suspiro e um Silêncio -

Entre uma memória e outra
O teu olhar é neutro!
Toco-te no rosto com mãos
De vento
E o teu corpo delira ...

Tudo o que me deres,
Te devolvo, sem pensar,
A ganância de um olhar
O gúme de uma espada
A pena de uma ave
Uma rosa e um Silêncio!

E quando nada restar de
Nada,
Quando o último momento
Me chegar ,
Antecipado e vago,
Cheio de vingança
Num impeto de morte,
Será por ti o meu
Último suspiro!

Visão Errante -

Meu Amor, quando chegas como um sonho na noite pálida,
caído sobre os braços da madrugada,
debruçado sobre o mundo,
trazes o silêncio das horas
num bater descompassado do coração,
a fecundar de poesia as nossas vidas
ignoradas ...
Horas e horas a fio esperando
amargamente por ti
e quando finalmente vens, que pena,
não passas, meu amor, de uma visão
errante ...