Tag negro
Radin:
Sobre as redes que permeiam
Ventre negro em branca tela
Engrenagens estilhaços
Sementes flutuantes
Vultos da mesma esfera
Pontilhado centelha
Olhando pela janela
AMOR NO ESPAÇO
Astronautas comemoram,
num planeta bem distante,
o Dia dos Namorados,
porque eles são amantes.
Vendo um buraco negro
e todo o seu segredo,
se amando a todo instante.
É urgente reagir se realmente desejamos integrar a sociedade brasileira de modo que, num futuro próximo, ser negro no Brasil seja, também, ser plenamente brasileiro no Brasil.
[O negro] tem que se dar o valor e não se olhar com pena. Nem usar a cor como justificativa para as suas falhas. A conscientização tem que começar na gente. Temos que saber nosso valor e nosso poder.
Vozes da Periferia: Um Grito por Igualdade e Oportunidades
No camburão, o jovem negro foi levado,
E o repórter, com intenção cruel e desvairada,
Buscava audiência em humilhar o "Criminoso",
Mas foi a resposta do jovem que ecoou de modo grandioso.
"Já não sou nada mesmo", disse ele com pesar,
"Quem quer comer vale", suas palavras a ecoar,
"Aceito qualquer salário", um grito de desigualdade,
A juventude negra, periferia em dificuldade.
Oportunidades escassas, sonhos postos à prova,
A luta pela sobrevivência, árdua e renhida trova,
Sem carteira fichada, sem seguro de vida ou amparo,
A juventude negra enfrenta um caminho tão amargo.
Que ás periferia seja um eco, uma voz a clamar,
Por justiça, igualdade e oportunidades a brilhar,
Que todos tenham chances, que todos possam alçar voo,
E que a juventude negra encontre um futuro.
Entre águas e encantos
O Boto
Deslizando
Entre águas e encantos
Sigo navegando pelo Solimões
Não estou bicho nem homem
Estou
À tua espera
Num tempo
Suspenso na correnteza
Remos parados no momento
De tua ausência
Não preciso de rede
A me prender
Tua falta é corrente mais eficaz
A me segurar
Sou soma de encantos
Amontoado de lendas
Esperanças e sombras
Tudo o que me resta
Pesado numa balança
De um só prato
Seguindo
O curso de um rio de histórias
Não desisto
De te buscar entre as águas
Teu amor
É o que me leva a existir
A Virgem
Meus passos ecoam as margens do Rio Negro
Minha voz já é parte da floresta
Meu coração habita entre vitórias-régias
Busca-me
Perco-me em ti
Para me tornar inteira
O espetáculo
Na junção de nossas águas
Lenda viva
Amazonas
Existiremos
Como o encanto perfeito
Horizontal
Assim como o rio que rasga a floresta
Nossa fertilidade
Garantida
Na umidade dos dias
Ecos de canções
Rios, igarapés e os guardiões da flora serão testemunhas
Os peixes e as feras verão
Nosso mistério
Existo, existiremos
Apressa-te,
Leva-me
Para dentro da lenda
Nesse mundo somos todos iguais. Feitos de carne e osso. O nosso sangue tem a mesma cor. Um dia todos nós teremos o mesmo destino nessa vida: a morte. Portanto, que diferença fará se somos de cor branca, parda ou negra?
Sem que eu perceba ou me dê conta, a noite chega de mansinho, pinta o dia de negro e enche o céu de estrelas.
Um encontro perfeito!
Rio que encanta e seduz, passeias por onde andei: São Gabriel da Cachoeira, Barcelos e lugares fantásticos, com um arquipélago no seu leito e uma floresta maravilhosa, próximo de montanhas e cachoeiras, até chegar ao encontro perfeito com outra grande força da natureza, tendo Manaus como sua cúmplice.
Aquarela
Sob um céu negro o Chevette amarelo corria jogando barro vermelho pra trás, e ao longe estava em azul o lugar que ela foi de branco colorir sua vida.
Buraco negro
Seu buraco é negro, vorazmente profundo.
Seu apego gravitacional curva o tempo
e todo o espaço a minha volta.
Mesmo distante milhões de anos-luz
meu corpo cósmico é atraído voluptuosamente
por sua singularidade densamente infinita.
No seu horizonte de eventos me perco,
é a partir de onde não regresso
e as leis da física não mais existem,
nada mais faz sentido algum
e nada escapa do seu centro-coração
denso, gélido e sombrio.
No seu vácuo turvo e absoluto
é onde você guarda os segredos de tudo,
é onde se esconde multiversos
que se revelam em múltiplos versos.
O Olho Negro da Superação"
No centro da pequena vila de São Miguel, vivia um jovem chamado Pedro. Ele era conhecido por sua paixão pelo esporte, especialmente pelo boxe. Desde criança, Pedro sonhava em se tornar um grande pugilista, inspirado pela história de lendários campeões que superaram inúmeras adversidades.
Um dia, ao se preparar para um importante torneio, Pedro enfrentou um desafio que testaria sua resiliência como nunca antes. Durante um treinamento rigoroso, ele sofreu um duro golpe que resultou em um doloroso olho negro. Com o rosto marcado pela contusão, Pedro precisava decidir se continuaria ou desistiria de seu sonho.
Enquanto o mundo o aconselhava a descansar e se recuperar, Pedro não se deixou abater. Ele viu o olho negro como uma prova do esforço que estava dedicando para se tornar um campeão. Cada vez que se olhava no espelho, via o reflexo de sua coragem e determinação.
Semana após semana, Pedro treinava com foco redobrado, superando a dor e as dificuldades. A cada luta, ele deixava sua marca no ringue e nos corações daqueles que o assistiam. Sua persistência e dedicação inspiravam a todos, mostrando que o verdadeiro significado da vitória estava além de troféus e medalhas.
Chegou o dia do tão esperado torneio. Pedro subiu ao ringue, olho negro ainda visível, mas sua confiança e garra eram inabaláveis. Lutou como nunca, dançando entre os golpes adversários e revidando com coragem.
Ao final do torneio, a vitória não lhe foi concedida pelo título, mas por sua capacidade de se superar e enfrentar todas as adversidades. Pedro se tornou um símbolo de perseverança e coragem para sua comunidade.
A partir desse momento, cada vez que alguém via um olho negro, lembrava-se da história de Pedro e do poder da vontade humana. Seu espírito resiliente continuou a inspirar gerações, provando que, assim como o sol sempre brilha após a tempestade, a superação é possível mesmo nas situações mais difíceis.
Portanto, quando o mundo olhar para um olho negro, lembre-se da história de Pedro e permita que ela o motive a enfrentar seus próprios desafios com valentia e determinação, porque a verdadeira força está em nunca desistir de seus sonhos.
No cetim negro das noites...
Os anjos só vem quando chamamos...
Breve é o coração acalentado pela inocência...
Que sonha e anseia...
Por viver e muito amar...
Ninguém sabe o que vai
por este mundo...
Com destino certo e sem destino aos tombos...
Cai o pó em dias assolados...
Enquanto o vento faz um rumor frio e alto...
E nada tem sentido...
Em nada que se queira ter...
Tudo são apenas momentos...
Não há nada a compreender...
Deixo que em minhas mãos cresçam os sonhos...
É o que posso fazer...
Haverá coisa que se lhe compare...
No mistério da inocência a perder?
Em vão já procurei me restituir...
O que duramente perdi...
Não sou mais que uma brisa...
Se vejo coisas que nunca antes tinha visto...
Coisas que sempre soube mas que nunca quis olhar...
Mas como se fosse o milagre pedido...
Nos destinos que não desvendo...
Os anjos me tem atendido...
Ensinando-me a sonhar...
Sandro Paschoal Nogueira
Só avisa para o racista o seguinte: quando o corpo dele virar pó, terá a mesma cor que a minha.
Isso não me incomoda nenhum pouco!
Bem-vindo.
Besouro Negro
Sou um gafanhoto verde, várias pernas.
Devoro plantações inocentes e indefesas.
O Besouro Negro me ajuda, na lerdeza.
Se revira, ali fica em tua agonia eterna.
Mas existem as danadas das rapinas
Que num sopapo arrancam-me as ancas.
As formigas cinzudas respeitam a rotina,
Não tardam a derrear minha matança.
Se não bastasse, ali vem as baratas:
Asquerosas e incompetentes companheiras.
Só trazem o nojo de sua forma e cor asca.
Nem são azuis, nem verdes, nem vermelhas.
São marrons... Cor inferior e sem graça.
Se fossem brancas, talvez tivessem alguma beleza.
(Besouro Revirado)
TODAS AS FORMAS DA ESCRAVIDÃO
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Desde que somos país, já estava aqui este povo,
contraparte de sua carne, de sua alma e seus valores.
O último deles aqui chegou – proibido, em contrabando.
As correntes – do mar e ferro – trouxeram-no quase ao fim
da forma antiga da escravidão.
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Talvez fosse mulher, talvez homem...
Vou supor seu retrato: porém, jamais revelado;
vou pensar o seu corpo: ferido-acorrentado.
Para nome, darei Maria,
para não dizer que é João.
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Vocês queriam canções: doce-brancas como açúcar...
Mas, do oceano que lambe as praias, eu só quero falar destas gentes:
dos males que lhes fizeram, do pouco que lhes demos, do tanto
que lhes devemos
(vou me ater, no entanto, a Maria – aos seus filhos e pentanetos
Vou lhes seguir cada passo, geração a geração).
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Deste povo, “Todas e Todos”,
todos nós temos um pouco.
Levante a primeira gota quem souber ou achar que não,
e depois disso se cale, ou se vá para a Grande Casa,
se não se sentir como irmão.
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Primeiro nasceu Pedro, já depois da Abolição.
Filho enfim liberto de Maria, quase ficou famoso
por ser primo do já célebre Operário em Construção.
Mas não encontrou trabalho,
e, por isso, roubou um pão.
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Foi linchado em via pública
por gente de bom coração,
e isso na mesma época, em que num país mais ao norte
– entoando canções patriotas – matava-se à contramão.
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Pedro, coitado, nascera
na Era dos Linchamentos.
Já longe, entregue ao rio dos tempos,
ia-se a Era Primeira – a da velha Escravidão.
Ao norte, matava-se à farta – aqui, por um pouco de pão.
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Mas então nasceu Jorge – de uma nova geração.
Chamaram-lhe para uma guerra, para defender o país
dos tais fascistas que nos queriam impor outra escravidão.
Como neto tão direto de Maria, não lhe deram qualquer patente,
mas lhe atribuíram missão: deveria buscar minas (quando fosse a folga
de ser bucha de canhão).
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Em um passo em falso, pisou na morte!
Não teve sequer a sorte – o bravo soldado forte –
de merecer uma Missa Breve, ou de ganhar um monumento
(“É um pracinha desconhecido, de fato, mas não é da cor que queremos;
o mármore que temos é branco, passemos a honra ao próximo:
eis aqui a solução”).
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Iam-se os tempos da Escravidão,
fora-se a Era dos Linchamentos,
acabara (de acabar) a Idade da Desrazão.
Abria-se novo momento: A Era-Segregação!
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Datam de então as Favelas
tão próprias para todos; mas especialmente talhadas
para os bisnetos de Maria.
E ali, no calor de um dia,
nascia o nosso João:
finalmente um João!
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Pouco sabemos dele
por falta de documentos.
Dizem que morreu das meninges
no mais duro chumbo dos anos tristes,
na época em que a doença – proibida nos jornais –
aceitava a segregação.
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Só sabemos que foi pai
do Trineto herdeiro de Maria.
Este, por falta de qualquer emprego,
e por vergonha de pedir esmola,
tornou-se um bom ladrão.
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Roubava dos ricos para dar a pobres,
ainda que nem precisasse tanto:
seu destino já fora traçado,
indiferente à profissão,
nesta Era da Prisão.
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Também ele deixou filho
– o brilhante e sábio Tetraneto de Maria –.
A vida deste bateu na trave: quase recebeu a cota!
Mas então soube que já chegava
a Era da Assombração.
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[BARROS, José D'Assunção. publicado na revista Ensaios, 2024].
Fui à guerra e conheci o medo, a insanidade e a morte.
E foi no campo de batalha que descobri uma verdade:
Na guerra coragem nada mais é que desespero por sobrevivência.
A mente de um inimigo sagaz é uma odisséia de maquinações,
mas nenhum mal pode se comparar ao coração frio de uma mulher magoada. O inimigo mata seu oponente dentro das regras e honra que norteiam as ações de um guerreiro. A mulher magoada, porém, é um oceano de ira ardente que só se aplaca com a insanidade.
Nós, negros, não descendemos de escravos
Nós, negros e negras, descendemos de reis e rainhas africanos,
de líderes tribais...
Somos a herança viva de um povo guerreiro!
O negro que se empenha na conquista da ascensão social paga o preço do massacre mais ou menos dramático de sua identidade.
