Ja Chorei de tanto Rir
TRISTEZA
Hoje, não estou triste.
De que vale a tristeza
Se ela já existe
Na correnteza
Da vida em riste?
Vá, gostariam,
Preferiam,
Que eu fosse
Homem de ardileza?
De que vale a tristeza
Se a vida é certeza
De uma incerteza
Atroz?
Por nós
E por mim,
Ainda assim
E pelo meu fadário
Eu viro a tristeza ao contrário,
E antecipo-lhe o fim.
E se ela me perseguir
No cimo do meu calvário:
Vou-me rir
Tanto, tanto,
Como se fosse um pranto
Tornado falsário.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 19-03-2023)
DESCOBRIR A VIDA NA MORTE
Eu já faleci, há uns anitos...
Fizeram-me todas as encomendações
E recomendações conforme a fé familiar...
Segui, por fases, todos os trâmites legais
E funcionais, entre os quais:
Como era grande pecador,
Passei primeiro pelo crivo
Doloroso da peneira das penas do Inferno,
Que me chamuscava os sovacos da primavera ao inverno.
Passaram-me depois a outra repartição:
Esta, bem mais animadora,
Graças minhas a Nossa Senhora!
Eram os tempos do Purgatório,
Onde me fizeram purgar tudo e o acessório.
Mas, senhores, puseram-me tão magrinho!
Chegada a hora de melhor sorte,
Fizeram-me chegar de elevador ao piso seguinte,
Numa manhã luminosa e serena,
Ao Céu, aos Pés de Nosso Senhor da Boa Morte!
Olhou contristado para mim e falou:
Que purga! Que magrinho e tão tristinho!
Aí, eu fiz uma cara de anjinho e Ele continuou:
Rapaz! Vais ter direito a banho de sais e mais...
Vão dar-te calção de praia, óculos de sol e t-shirt.
Depois, vais mas é divertir-te!...
Respondi, com decisão:
Não, Meu Senhor!
Se estou no Céu, quero primeiro ver a minha mãe, meu pai, irmãzinha e tantos mais!
Não é que Nosso Senhor, começou a arrotar
E a deitar pelos olhos luzes fatais!?...
Sentei-me no chão e comecei a chorar, a chorar...cada vez mais!
Senti uma mão no ombro, tão leve e serena, como uma pena...
Era o Nosso Senhor a dizer: Vamos lá, rapaz, vamos à nossa vigília.
Não demora muito e verás a tua família. E eu sosseguei!...
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 09-05-2023)
PÁSSARO LIBERTADOR
Na linha imaginária do horizonte,
Filtrada pelo sol já passageiro,
Vejo um vulto, asa de anjo
Que me chora logo defronte
A esta janela do meu derradeiro
Olhar cativo no monte
Do meu penar,
Sem te poder mais amar.
Anda, passarita Clara.
Com o teu bico de beijo,
Inicia-me no teu solfejo
E liberta-me desta amarra.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 27-05-2023)
IRMÃO
Será que sê-lo já basta
Sem sermos de sangue igual,
Meter na mesma canastra
A força que nos anima a tal?
Irmão, é sempre aquele jeito
Entre o belo e o imperfeito,
Que nos foge nos entretantos
Das vidas às cambalhotas
Entre demónios e santos
Em sociedades de apostas...
E quando a força desanima
Vem a angústia e a revolta,
A gente quer passar por cima,
Mas a irmandade não volta.
Surge então que a própria vida,
Aos que fez de sangue irmãos,
Arranja em contrapartida
Outros de sentir, mais sãos.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 12-10-2023)
DIVAGAÇÕES
Eu já nem sei o que sou,
Porque vim e aqui estou,
Para onde vou
Neste barco que me castrou
Sem remos de princípio ao fim.
Só sei que não vim por mim...
Se viesse, não estaria aqui,
Neste degredo,
De vos revelar o segredo
De uma vida que vivi,
Sempre na escuridão do medo.
E é por isso que vou
Com meu pincel e apenas,
Borrar um quadro de penas
Na tela que Deus traçou.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 21-10-2023)
ESPERANÇA E VIDA
Ando por cá, pela esperança,
Já porque a vida
Prometida,
Foi-se esvaindo
Desde o passado findo,
Rumo a um sonho de mudança.
Um poeta jamais descansa,
Sempre que descreve as dores
Que o espetam como uma lança,
No peito dos seus fervores.
Foi uma vida de dissabores,
De desgostos e alguns amores,
Num nascimento talhado
Debaixo dum pobre telhado,
Numa noite fria e breve
E dizem que caía neve
Gélida, branca e borralheira,
Nas mãos da minha parteira.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 26-11-2023)
RESISTÊNCIAS sei lá quantas já escrevi
Resisto,
Porque quero
E não por acaso mero,
Porque sou tão teimoso
Que até as pedras da rua
Quando me sentem mancando
Pelas dores negras e cruas
Que me vão martirizando,
E mostrando que nada valho,
Dizem em jeito jocoso:
- Que resistente bandalho!
Resisti,
A promessas de riquezas vãs,
Prometidas por gentalhas
Canalhas, com olhos de rãs;
Seres avaros, repugnantes
Com cartões de governantes,
Sei lá por graça de quem
Foi o santo que os pôs na cripta
De donos de tantas parvónias
Que mencioná-las irrita
E revolta até também
Algumas orquestras sinfónicas.
Continuo a resistir,
Ao meu relógio sem horas
Porque só me traz a desoras,
Sem saber que mal lhe fiz,
As notícias mais pandoras
Deste meu ledo País.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Triste Por Escrever, em 17-11-2024)
Acho que já perdi a lucidez quanto ao fato de saber se estou doido ou estou ficando, assim como o resto da humanidade que acredito já ter perdido também essa lucidez. (Wolner C. De Faria)
Já vi tanta coisa bonita por aqui, vejo direto, e sinto também, o vento que as árvores trazem, a linda cor do céu, o desenho nas nuvens, é tudo muito lindo e tranquilo.
