Gustave Le Bon
Desde que os assuntos sobre os quais se quer raciocinar caem no campo da crença, a reflexão perde o seu poder crítico.
Sendo lenta e penosa a elaboração de um julgamento, o homem se contenta, em geral, com as primeiras impressões, isto é, com as sugestões da simples intuição. (...) Abandonar-se a elas sem exame, como muitas vezes se procede, é atravessar a vida na persuasão de um erro. Elas só têm, efetivamente, por sustentáculo simpatias e antipatias instintivas que nenhuma razão ilumina. É, entretanto, sobre bases tão frágeis que, às mais das vezes, se edificam as nossas concepções do justo e do injusto, do bem e do mal, da verdade e do erro."
Afirmação e repetição.
Suficientemente repetida, a afirmação acaba por criar, primeiramente, uma opinião e, mais tarde, uma crença. A repetição é o complemento necessário da afirmação.
O nosso máximo esforço de independência consiste em opor, por vezes, um pouco de resistência às sugestões ambientes. A grande massa nenhuma resistência opõe e segue as crenças, as opiniões e os preconceitos do seu grupo. Ela lhe obedece sem ter mais consciência do que a folha seca arrastada pelo vento.
Enquanto a ciência não revela as imutáveis verdades, ocultas talvez sob as aparências das coisas, cumpre que nos contentemos com as certezas acessíveis ao nosso espírito.
A queda do nivel intelectual e moral na classe especial qualificada de politicos se acentua a cada dia em proporcões inquietantes para o futuro da Republica. Isso se deve tambem ao fato de que, sendo as funcões politicas geralmente desdenhadas pelas pessoas capazes, so são exercidas pelos desclassificados de todos os partidos.
Uma lógica afetiva demasiada leva a ceder sem reflexão a impulsos frequentemente funestos. Uma lógica mística excessiva suscita as exigências religiosas, dominadas pela preocupação egoísta da sua salvação, e sem utilidade social. Uma lógica coletiva exagerada promove a predominância dos elementos inferiores de um povo e o conduz à barbárie. Uma lógica racional em demasia provoca a dúvida e a inação.
Tão irredutível quanto a necessidade de crer, a necessidade de explicações acompanha o homem desde o berço até ao túmulo. Ela contribuiu para criar os seus deuses e diariamente determina a gênese de numerosas opiniões. Essa necessidade intensa facilmente se satisfaz. As respostas mais rudimentares são suficientes. (...) Sempre ávido de certezas definitivas, o espírito humano guarda muito tempo as opiniões falsas fundadas na necessidade de explicações e considera como inimigos do seu repouso aqueles que as combatem. O principal inconveniente das opiniões baseadas em explicações errôneas é que, admitindo-as como definitivas, o homem não procura outras. Supor que se conhece a razão das coisas é um meio seguro de não a descobrir. A ignorância da nossa ignorância tem retardado de longos séculos os progressos das ciências e ainda, aliás, os restringe. A sede de explicações é tal que sempre foi achada alguma para os fenômenos menos compreensíveis. O espírito tem mais satisfação em admitir que Júpiter lança o raio do que em se confessar ignorante em relação às causas que o fazem rebentar.
É evidente que entre a democracia e o socialismo existe uma oposição. Não existe a mínima possibilidade da existência combinada do socialismo e da democracia. Ainda, infelizmente, a democracia permite que o socialismo seja criado de forma indireta.
Assim, não se pode pensar, como já se propôs algumas vezes, em deixar o socialismo tentar suas experiências a fim de por em evidência sua fraqueza. Ele geraria imediatamente o cesarismo, que suprimiria rapidamente todas as instituições democráticas. Não é no futuro, mas hoje, que os democratas devem combater seu temível inimigo, o socialismo. Ele constitui um perigo contra o qual deveriam se unir todos os partidos sem exceção.
Pode-se contestar o valor teórico das instituições que nos regem, pode-se desejar que a marcha das coisas seja outra, mas tais desejos devem permanecer platônicos. Diante do inimigo comum todos deveriam se unir, quaisquer que sejam suas aspirações. (...)
Certamente que as ideias democráticas não têm, sob o ponto de vista teórico, uma base científica mais sólida do que as ideias religiosas. Mas essa lacuna, que não teve outrora nenhuma influência na sorte de uma, não poderia entravar o destino da outra. O gosto pela democracia é universal em todos os povos, qualquer que seja a forma de seu governo. Estamos, aqui, portanto, diante de uma das grandes correntes sociais que seria inútil querer represar. O principal inimigo da democracia atualmente, o único que poderia vencê-la, é o socialismo.
(Psicologia do Socialismo)
As democracias favorecem, pelos seus próprios princípios, a liberdade e a concorrência que fazem triunfar necessariamente os mais capazes, enquanto que o socialismo sonha, ao contrário, com a supressão da concorrência, o desaparecimento da liberdade e uma equalização geral. Existe oposição evidente e irredutível entre os princípios socialistas e os princípios democráticos.
As instituições democráticas só podem prosperar entre os povos que tenham bastante iniciativa e vontade para se saber conduzir e fazer seus negócios sem a intervenção constante do Estado. A corrupção dos funcionários tem consequências infelizes quando a influencia e grande, a desmoralização se estende a todos e a desorganização esta próxima. O sombrio exemplo das republicas latino americanas mostra a sorte que espera as democracias entre os povos sem vontade, sem moralidade e sem energia. O espírito autoritário, a intolerância, o desprezo pela legalidade, a ignorância das questões praticas, o gosto inveterado pela pilhagem, se desenvolvem então rapidamente. A anarquia vem logo e à Anarquia sucede sempre a ditadura.
Muitos espíritos que a luta assusta parecem dispostos cada vez mais a deixar o socialismo se desenvolver. Não podendo ver além do horizonte que os rodeia, não se dão conta do que está do outro lado. Porém, o que está além é ameaçador e terrível. Se querem ainda sobreviver, os povos latinos não devem mais arriscar experiências, nem revoluções. Novas necessidades econômicas estão em vias de tumultuar as condições de existência das nações e logo não haverá mais lugar para os povos muito fracos. Porém a fraqueza da maior parte dos povos latinos irá proximamente atingir o limite extremo, abaixo do qual não há mais recuperação possível. Não é se embriagando com frases brilhantes, que se impedirá as coisas de serem o que são. A era da cavalaria, dos sentimentos heróicos e soberbos, da dialética engenhosa, está morta há muito tempo. Realidades implacáveis nos cercam cada vez mais e sobre essas realidades os discursos mais sutis, os ditirambos mais sonoros sobre o direito e a justiça têm tanto efeito quanto tinham as varas de Xerxes sobre o mar, que ele mandou espancar, em punição por ter destruído seus navios.
Os povos latinos, por motivos culturais, sempre tiveram a necessidade de alguém marcante que os dirigisse. É esta necessidade de direção que deixa os latinos tão tímidos diante das responsabilidades, sua inaptidão em conduzir bem toda empresa que não seja fortemente conduzida por chefes e sua tendência atual rumo ao socialismo. Quando os latinos têm a sua frente, grandes homens de Estado, grandes generais, grandes diplomatas, grandes pensadores, grandes artistas, eles se mostram capazes dos mais enérgicos esforços. Mas os mestres geniais não se encontram sempre e, na falta deles, os povos latinos perigam. Com um Napoleão eles dominaram a Europa. Comandados mais tarde por generais incapazes, eles foram vítimas dos mais incríveis desastres e não conseguiram resistir áqueles que tinham vencido outrora.
Não é sempre sem razão que tais povos estão tão prontos a jogar sobre seus chefes a responsabilidade de suas derrotas. Eles valem o que valem seus senhores e eles têm consciência disso.
Sob pena de logo perecer, os latinos devem aprender a se conduzir. Os campos de batalha, militares ou industriais, são hoje em dia muito vastos para que um pequeno número de pessoas, por mais notáveis que sejam, possam comandar os combatentes. Na fase do mundo em que entramos, a influência das grandes capacidades não desaparece, mas ela tende cada vez menos a ser a diretora. A autoridade está muito dispersa para não desaparecer. O ser humano moderno não pode mais contar com nenhuma tutela e menos ainda com a do socialismo, acima de todas as outras. Ele deve aprender a só contar com ele mesmo. É para essa necessidade fundamental que a educação deveria prepará-lo.
Existem países - as repúblicas hispano-americanas, por exemplo - que possuem admiráveis constituições escritas, constituições perfeitas e que estão mergulhados, no entanto, na mais completa anarquia, sob o despotismo absoluto de pequenos tiranos, cuja insignificância não limita as fantasias.
Em outros pontos do globo encontram-se, ao contrário, países que vivem sob um regime monárquico e aristocrático e possuem constituição menos clara e mais imperfeita que um teórico possa imaginar. No entanto, a liberdade, as prerrogativas e a ação pessoal dos cidadãos são mais desenvolvidas do que jamais foram em qualquer povo.
Os socialistas acreditam que as massas serão facilmente manipuladas por eles, mas logo descobrirão que é no meio delas que se encontrarão não seus aliados; mas seus mais irredutíveis inimigos. As massas poderão sem dúvida, com suas cóleras de um dia, derrubar furiosamente o edifício social, mas no dia seguinte elas aclamarão o primeiro César que verem e que lhes prometer reconstruir o que elas acabaram de quebrar. O que predomina, na realidade, nas massas, entre os povos que possuem um longo passado, não é a mobilidade, mas a rigidez. Os instintos destrutivos poderão permitir ao socialismo triunfar por um instante, mas os instintos conservadores não lhe permitirão durar.
O ser humano moderno está ligado pelas suas vontades inconscientes ao passado, enquanto sua razão busca sem cessar se subtrair dele. Esperando a aparição de crenças fixas, ele só tem crenças que, pelo único fato de que não são herdadas, são transitórias e momentâneas. Elas nascem espontaneamente sob a influência dos acontecimentos de cada dia, como as ondas crescem com a tempestade. Elas são às vezes violentas, mas são também efêmeras. Circunstâncias quaisquer as fazem nascer, a imitação e o contágio as propagam. No estado de nervosismo em que se encontram hoje em dia certos povos, a mais pequena causa provoca sentimentos excessivos. São explosões de ódio, fúria, de indignação, de entusiasmo, que, a propósito do menor acontecimento, explodem como trovoadas. Países, acontecimentos, emoções e simpatias diversas nos faz enviar para longe somas que necessitamos para aliviar nossas próprias misérias.
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