Ser poeta
POEMA MENDIGO
Estou cheio de ser poeta,
de sonhar com as estrelas,
estou cansado de me apaixonar
dez vezes por dia
e me desiludir quarenta,
estou cheio de ser poeta,
estou cheio de escorregar no arco Iris,
e mergulhar no buraco negro,
estou cheio de jardins
com abelhas venenosas
e acácias carnívoras
estou cheio de velhas palavras,
de doces rimas ,
do poema água com açúcar,
quero a verdade
de acordar as cinco da matina,
do imprensado do coletivo,
do odor de axilas expostas,
do martírio dos aproveitadores no metrô,
quero a verdade de mendigos sob viadutos
da epidemia de drogados,
quero ouvir a miséria vicejando,
as margens de alagados e palafitas,
quero sentir viciados definhando,
escravizados pelo poder da fumaça e do pó...
quero o meu poema chorando e gritando,
um poema bem inconveniente,
que consiga incomodar
essas assembléias dolentes ,
quero um poema que cheire mal,
que se vista mal ,
um poema mendigo
com a podridão das nossas realidades...
Quando eu crescer quero ser poeta
Para entender a linguagem das aves
E a devoção das ave-marias
Pra aproveitar as noites vazias
E entender os seus mistérios
Quando eu crescer eu quero ser poeta
Pra entender de saudade
E descrever as lembranças com minúcias,
Belezas e prazeres vividos
Quando eu crescer eu quero ser poeta
Para ter noção do que é ser triste,
Porque só quem tem essa noção
Sabe distinguir o que é felicidade
Não queira ser poeta todos os dias
Seja poeta um dia
no outro seja a poesia...
Não queira ser feliz todos os dias
Seja feliz um dia
no outro seja você mesmo.
Ser Poeta é ser nós mesmos. É levar o que temos de melhor e distribuir boas sementes para que elas germinem poesia. É admirar o que os nossos olhos alcançam. É ter a sensibilidade de ver nas pequenas coisas e extrair delas a essência e a pureza. Ser Poeta é ver o mundo com olhos internos e transmitir através deles a paz e a harmonia...
Quem quiser ser poeta que seja. Afastar o substantivo feminino pode mim é a mesma coisa que negar a musa o direito de ser musa, já que não sou musa de ninguém, me deixem ser poetisa. Obrigada, de nada.
Nada neste mundo tirará
o meu direito de ser poeta,
Nenhum infortúnio roubará
o teu direito de ver inteira:
- A poesia inabalável.
Nada neste lugar julgará
o nosso direito e leveza de ser
- unidos -
Pela poesia [inabalável;
Porque nada nos desamparará
do nosso dever romântico,
Que mesmo sem escrever
a inspiração não deixa abandonar,
O amor valente e [imensurável].
Os nossos olhares não se perderão,
Os dois estão presos pelo coração.
As nossas bocas sempre irão arder:
Os beijos jamais irão [esquecer].
Os nossos corpos não se desgrudarão,
Os dois jamais apagarão.
Os carinhos que ninguém há de negar,
As vontades jamais hão de [passar].
No fundo, sei que não se sente seguro,
porque confiava estando ao meu lado
Um protegia o outro do desdouro:
de todos, de tudo e do mundo.
No profundo de ti não sossegas,
sente muito a minha falta...,
Porque não sente sequer o teu sonho
velado com amor e toda a calma,
Sei também que estás sofrido,
carente, desprotegido e sem afago.
- Não te enganes mais! -
Sou o teu doido amor,
A chaga aberta e em chamas:
- Não cicatrizarei jamais!-
Ser poeta em plena
quarta-feira é fazer
da rotina a real poesia
do seu dia-a-dia,
Se não tiver caneta
e papel na mão,
Beba café e coma
um docinho gostoso
para alegrar o coração.
Você não precisa depender de ninguém para ser poeta ou artista. Você precisa de você mesmo, do material que você pode conseguir e da sua criatividade.
Propaganda de Guerra I
O mal do século é a solidão,
melhor mesmo ser poeta
que até sem sair do lugar
com a sua poesia sempre
acaba se entregando a multidão,
O poeta é quem acende
o lampião no meio da escuridão,
e está sempre presente
ao chamado para a rebelião.
Um poeta nunca fará nenhuma
guerra porque ele é a própria
guerra que com intimidade
chama o próprio Deus da Guerra
para dançar ou se afastar.
Não é qualquer um que coloca
um poeta no bolso
para dizer o quê é e o quê
não é propaganda de guerra,
Porque se escandalizar
com a violência, se solidarizar
com quem sofre ou pedir um
cessar-fogo jamais nesta
vida será propaganda de guerra.
Ser poeta é sempre não ter falado para ninguém, depois da nítida impressão de ter falado para todo o mundo.
LICENÇA POÉTICA
Demétrio Sena, Magé - RJ.
O poeta não tem que ser poeta
nem sereno, ajustado, cavalheiro,
quando a raiva se alastra em seu terreiro
e uma curva provoca sua reta...
Se lhe cumpre ser bárbaro, guerreiro,
o poeta não tem que ser poeta,
porque sua caneta vira seta
onde o vento provoca o seu braseiro...
Todo anjo estagia pra demônio;
o divórcio nasceu pro matrimônio
como toda ilusão se rende ao fato...
Manda o mundo pras favas ou pro inferno;
mesmo sendo sensível, frágil, terno,
o poeta não tem que ser um chato...
MEUS DOIS EUS
Demétrio Sena, Magé - RJ.
Passei muito tempo sem entender como ser poeta me fazia tão feliz e mesmo assim havia um buraco. Sentia falta, não sabia de quê. Só dei por mim sobre o que faltava, quando ganhei de presente uma boa câmera fotográfica.
Nas primeiras fotos que fiz, com a mesma loucura do poeta que sou, concluí que passei muitos anos fazendo poesia como quem fotografa. O buraco fez sentido, e foi sanado, quando passei a fotografar como quem faz poesia.
Tinha que ser poeta e fotógrafo. Tão fotógrafo poeta quanto poeta fotógrafo. Caneta e câmera se completam como me completo intimamente com os meus dois eus.
