Preconceito Racial
Por me acharem arrogante, as pessoas vivem fechando as portas para mim, mas a única coisa que eu quero nesta vida, é ter oportunidade para trabalhar honestamente e com dignidade. Não me vitimizo, sou qualificada, esperta, inteligente, trabalhadora, mas a verdade é que sou massacrada todos os dias pelos que dizem não ser racistas e são.
A mitologia é um conjunto de narrativas que nos atravessam e coloca em cada "eu" o sentido da vida contribuindo com a nossa representação como sujeitos de si.
TODAS AS FORMAS DA ESCRAVIDÃO
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Desde que somos país, já estava aqui este povo,
contraparte de sua carne, de sua alma e seus valores.
O último deles aqui chegou – proibido, em contrabando.
As correntes – do mar e ferro – trouxeram-no quase ao fim
da forma antiga da escravidão.
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Talvez fosse mulher, talvez homem...
Vou supor seu retrato: porém, jamais revelado;
vou pensar o seu corpo: ferido-acorrentado.
Para nome, darei Maria,
para não dizer que é João.
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Vocês queriam canções: doce-brancas como açúcar...
Mas, do oceano que lambe as praias, eu só quero falar destas gentes:
dos males que lhes fizeram, do pouco que lhes demos, do tanto
que lhes devemos
(vou me ater, no entanto, a Maria – aos seus filhos e pentanetos
Vou lhes seguir cada passo, geração a geração).
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Deste povo, “Todas e Todos”,
todos nós temos um pouco.
Levante a primeira gota quem souber ou achar que não,
e depois disso se cale, ou se vá para a Grande Casa,
se não se sentir como irmão.
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Primeiro nasceu Pedro, já depois da Abolição.
Filho enfim liberto de Maria, quase ficou famoso
por ser primo do já célebre Operário em Construção.
Mas não encontrou trabalho,
e, por isso, roubou um pão.
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Foi linchado em via pública
por gente de bom coração,
e isso na mesma época, em que num país mais ao norte
– entoando canções patriotas – matava-se à contramão.
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Pedro, coitado, nascera
na Era dos Linchamentos.
Já longe, entregue ao rio dos tempos,
ia-se a Era Primeira – a da velha Escravidão.
Ao norte, matava-se à farta – aqui, por um pouco de pão.
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Mas então nasceu Jorge – de uma nova geração.
Chamaram-lhe para uma guerra, para defender o país
dos tais fascistas que nos queriam impor outra escravidão.
Como neto tão direto de Maria, não lhe deram qualquer patente,
mas lhe atribuíram missão: deveria buscar minas (quando fosse a folga
de ser bucha de canhão).
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Em um passo em falso, pisou na morte!
Não teve sequer a sorte – o bravo soldado forte –
de merecer uma Missa Breve, ou de ganhar um monumento
(“É um pracinha desconhecido, de fato, mas não é da cor que queremos;
o mármore que temos é branco, passemos a honra ao próximo:
eis aqui a solução”).
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Iam-se os tempos da Escravidão,
fora-se a Era dos Linchamentos,
acabara (de acabar) a Idade da Desrazão.
Abria-se novo momento: A Era-Segregação!
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Datam de então as Favelas
tão próprias para todos; mas especialmente talhadas
para os bisnetos de Maria.
E ali, no calor de um dia,
nascia o nosso João:
finalmente um João!
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Pouco sabemos dele
por falta de documentos.
Dizem que morreu das meninges
no mais duro chumbo dos anos tristes,
na época em que a doença – proibida nos jornais –
aceitava a segregação.
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Só sabemos que foi pai
do Trineto herdeiro de Maria.
Este, por falta de qualquer emprego,
e por vergonha de pedir esmola,
tornou-se um bom ladrão.
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Roubava dos ricos para dar a pobres,
ainda que nem precisasse tanto:
seu destino já fora traçado,
indiferente à profissão,
nesta Era da Prisão.
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Também ele deixou filho
– o brilhante e sábio Tetraneto de Maria –.
A vida deste bateu na trave: quase recebeu a cota!
Mas então soube que já chegava
a Era da Assombração.
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[BARROS, José D'Assunção. publicado na revista Ensaios, 2024].
Biologicamente, não existe divisão de raças entre seres humanos.
Somos todos uma única espécie.
Racismo é, portanto, um conceito equivocado
que apenas ajuda a perpetuar segregações e acentuar diferenças.
O termo correto para designar preconceito
contra pessoas com características físicas, étnicas,
sexuais ou religiosas diferentes
é discriminação.
Trocar alhos por bugalhos, neste caso,
além de ser um desserviço ao idioma,
só alimenta o ódioeaconfusão.
De origem jornalística
À Manuel Bandeira e seu
personagem “João Gostoso”.
Zé Negão, ajudante de pedreiro,
Andava na madrugada de sábado,
Na saída do baile pela polícia foi abordado,
Revistado
Interrogado
Surrado
Seu corpo foi encontrado
Pelas crianças
Que brincavam no terreno ao lado
Cheio de mato
Próximo à avenida do Estado,
num terreno abandonado.
Quando a gente nasce, as pessoas vão nos ensinando conforme crescemos o que elas pensam, se elas acham que todos tem que estar dentro dos padrões de beleza, de vida, ou de comportamento totalmente superficiais que elas criam, elas ensinam isso, e na inocência nós aprendemos. E se vermos alguém fora desses padrões é claro que vamos julgar porque nos ensinaram que isso é errado. Ou seja, sem nem saber ao menos o que é ser preconceituoso, racista ou xenofóbico, nós pegamos a lição para si e nos tornamos um deles... Porém isto acontece porque somos influenciados a acreditar nestes padrões e não poque nascemos assim.
E do mesmo jeito que aprendemos a odiar as pessoas que não se encaixam nos padrões impostos pela sociedade, podemos aprender a amá-las mesmo com tantas diferenças.
Não sei por que tentam excluir nossa cor,
se uma mão branca e a outra negra juntas
fazem sombras iguais como uma poesia de amor!
Abro os olhos
Nem tudo é claro
Fecho olhos
A escuridão me toma
O medo me consome
A bala nem sempre perdida
As palavras sempre doidas
Me fazem dormir
E não querer acordar
E mesmo querendo,
Talvez eu não acorde
Me sinto sufocado
Me sinto preso
Ao preconceito
A violência
A indecência
De quem me julga pela cor
Sem ar
Preciso acordar
Luto
Com o medo
Com o mundo
Devolvam meu ar
Preciso viver
Mudar o rumo
Da minha vida
Da minha história
É preciso lutar
Traçar um destino
Diferente deste
Que o teu preconceito
Tenta me dar
Louco, desatino,
Ainda acredito, mas
Será que viverei preso
Ao sonho de liberdade
Que muitos querem roubar?
Continuo preso
Preso em casa
Preso em mim
Ou numa cela
Preso em pensamentos
Julgamentos
Que crime cometi
Que me tira tudo?
Até o direito
De está onde estou
De ser livre
De sonhar?
Ao que parece,
Meu crime é minha cor
Sou criminalização
Sou julgado
Condenado
A cela
A morte
A dor
Por carregar comigo
A legitimidade de uma história
De lutas,
Conquistas,
Por carregar
Além de sonhos, minha cor.
Grito
Não me ouvem, ou
Querem me calar
Me roubam tudo
E o crime,
O que não cometi,
Querem me ver pagar
Tu cometes,
Eu pago,
Não importa
Sou ferido
Contido
Punido
Querem me ver ajoelhar
Querem me ver caído
E assim comemorar
Ainda resisto
Preciso levantar
A autoestima
A voz
O ânimo
A confiança
Pra mim, tudo importa
Meu lugar no mundo
Meu lugar de fala
A ferida no peito
A dor na alma
O ar que me falta
Tento me manter vivo
E vivendo, me sinto morto
Preso
Quero sair
Vamos encher este mundo de amor
Vamos esvaziar todo estoque de mau humor,
De ódio, de falta de esperança, de azar, de pessimismo;
Vamos sabotar a mentira, o preconceito, o racismo,
A falta de empatia, o egoísmo;
Vamos abastecer os olhos de poesia,
O coração de melodia, o ar de alegria…
Vamos transmitir somente os bons sentimentos,
As boas notícias, o que realmente faz sentido;
Fazer de nosso jeito;
Espalhar o amor,
Viver as nossas diferenças
E respeitar o que não nos diz respeito.
Vamos, todos juntos, fazer diferente,
Reconstruir dessas ruínas da fatalidade,
Um mundo sem o instinto primitivo da maldade;
Agora é hora,
O universo nos dá uma nova chance
De viver com dignidade
Para construir um futuro diferente,
Sem olhar os erros do presente
E reconstruir uma nova realidade.
Não ousem pensar que estes obstáculos impedirão nossos anseios!
Nenhum passo atrás, carregamos o antídoto para todos os males, pois somos filhos daqueles que sobreviveram ao frio, fome e a dor...
Parece que o sonho de Martin Luther King Jr de que seus quatro filhos na época pequenos,um dia iriam viver em uma nação onde não seriam julgados pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter, está longe de virar realidade.
Ao que parece é que o tão sonhado I HAVE A DREAM (Eu tenho um sonho) jamais irá se realizar completamente nesta terra cheia de pessoas maldosas e com ódio no coração, onde ALGUNS de pele branca e almas podres, continuam a julgar a cor da pele como mais importante.
Íntimo Dado (A Senha)
Cada vez que gritam: pobre!
me assusto. Recuo ao canto
mais perto do rés do chão.
Negro, fico sem cor.
Fúria, fico sem fala.
Pois sei que as balas dos patrões,
que as balas dos políticos, da polícia
correm atrás de mim sem-terra,
correm atrás de mim sem-teto,
correm atrás das minhas razões
por esses labirintos finitos
enredados de justiça e democracia,
só para eu sair nos jornais,
morto na foto,
sangue vazando pelos ouvidos.
Toda vez que eles gritam: pobre!
é a tortura, é o estampido, é a vala.
É a nossa dor que tranquiliza os ricos.
Alô rapaziada... tem de antenar o dia:
o vento que venta lá, venta cá.
Você nunca vai se chocar com um preto apanhando por um policial.
Por que você aprendeu que na escola o patinho feio, é preto.
Branco não é uma cor. Branco é uma definição política que representa históricos privilégios sociais e políticos de certo grupo que tem acessos às estruturas dominantes e instituições da sociedade. Branquitude representa a realidade e história de certo grupo. Quando nós falamos sobre o que significa ser branco, então falamos sobre políticas e absolutamente não sobre biologia. Assim como Negro corresponde a uma identidade política que se refere à historicidade das relações políticas e sociais, não à biologia.
O mundo é feito de todas as etnias, de todas as gentes, temos a obrigação de aceitar isso.
(Cruzeiros do Sul, 1991)
Nella città III - A cor da carne
Há dores que nascem antes do grito.
Não do corpo, oráculo por vezes calado,
nem da alma, que cedo se curva ao pranto.
Mas da identidade, lançada à sombra, à face do repúdio,
antes mesmo de saber-se ser.
Nasce, então, a dor sem nome,
antes que a luz do mundo pudesse tocar a pele — nua.
É o peso de um tom que destoa,
aviltado pela violência do olhar.
A cor da carne, que não é da alma,
não é identidade,
mas adorno passageiro —
incompreendido por olhos de cárcere,
que desferem o açoite mudo da ignorância,
a face vertida.
Vê:
a cor sublinha o corpo,
e não pede perdão pelo que é.
Aqueles que esperam que a cor se renda
não entendem o enigma da pele — nua,
que nenhuma voz pode enunciar.
Às vezes, a convivência nos leva a crer que conhecemos o outro o suficiente para o entender, algo que é verdadeiro até certo ponto, podendo às vezes conhecermos o outro melhor que ele mesmo e que nós mesmos. Porém, a arrogância humana nos leva a crer que conhecemos o outro totalmente e assim tomamos decisões erradas com base em nossos delírios sobre o outro. Mas claro que existem os ignorantes que, antes mesmo de conviver, acreditam conhecer o outro como a palma da mão.
As pessoas que mais precisam de auxílio terapêutico são aquelas que se dizem intolerantes a preconceitos. O preconceito está tão forte dentro delas que elas começam a ver preconceito em tudo.
Na sociedade contemporânea já não há mais espaço para capitães do mato, e negar-lhe espaço de crescimento é responsabilidade de cada um de nós.
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