Poemas de Dostoiévski

Cerca de 150 poemas de Dostoiévski

Sou filho da descrença e da dúvida, até ao presente e mesmo até à sepultura. Que terrível sofrimento me causou, e me causa ainda, a sede de crer, tanto mais forte na minha alma quanto maior é o número de argumentos contrários que em mim existe! (...) Nada há de mais belo, de mais profundo, de mais perfeito do que Cristo. Não só não há nada, mas nem sequer pode haver.

Fiódor Dostoiévski

Nota: Trecho de carta a Natália Fonvizina, escrita em fevereiro de 1854.

Às vezes, o pensamento mais estranho, mais impossível na aparência, apodera-se de nós com tal poder, que acabamos por julgá-lo realizável... Mais ainda: se a ideia se associa a um desejo violento, apaixonado, tomamo-la às vezes, no fim das contas, por algo fatal, inelutável, predestinado.

Um erro original, vale mais que uma verdade banal. A verdade se encontra sempre, ao passo que a vida pode ser enterrada para sempre. (Crime e Castigo)

Dizem que aqueles que estão nas alturas como que são atraídos por si mesmos para baixo, para o abismo. Creio que muitos suicídios e homicídios só foram levados a cabo porque o revólver já estava na mão. Aqui também há um abismo, aqui também há um declive de quarenta e cinco graus, do qual é impossível não escorregar, e algo incita irresistivelmente a puxar o gatilho.

Agora pergunto-lhe: o que podemos esperar do homem enquanto criatura dotada de tão estranhas qualidades? Faça chover sobre ele todos os tipos de bênçãos terrenas; submerja-o em felicidade até acima da cabeça, de modo que só pequenas bolhas apareçam na superfície dessa felicidade, como se em água; dê a ele uma prosperidade econômica tamanha que nada mais lhe reste para ser feito, exceto dormir, comer pão-de-ló e preocupar-se com a continuação da história mundial — mesmo assim, por pura ingratidão, por exclusiva perversidade, ele vai cometer algum ato repulsivo. Ele até mesmo arriscará perder o seu pão-de-ló e desejará intencionalmente o mais depravado lodo, o mais antieconômico absurdo, simplesmente a fim de injetar o seu fantástico e pernicioso elemento no âmago de toda essa racionalidade positiva.

Fiódor Dostoiévski
Notas do Subterrâneo

É sabido que grupos completos de pensamento atravessam instantaneamente as nossas cabeças, na forma de certos sentimentos, sem tradução para a linguagem humana, menos ainda para uma linguagem literária... porque muitos dos nossos sentimentos, quando traduzidos numa linguagem simples, parecem completamente sem sentido. Essa é a razão pela qual eles nunca chegam a entrar no mundo, no entanto todos os tem.

Eu não quero nem posso crer que a maldade seja o estado normal do homem pensador

Deus, no Céu, cada vez que vê um pecador o invocar com todo o coração tem a mesma alegria que uma mãe quando vê o primeiro sorriso no rosto do filho.

O mistério da existência humana não está apenas em permanecer vivo, mas em encontrar algo pelo qual viver.

Fiódor Dostoiévski
Os Irmãos Karamázov, São Paulo: Editora 34, 2008.

Ocorreu-me certa vez o pensamento de que se alguém quisesse arruinar e destruir totalmente um homem [...] bastaria obrigá-lo a dedicar-se a um trabalho absolutamente desprovido de utilidade e sentido.

A Palavra No Momento Certo
Uma grande parte da infelicidade no mundo tem sido causada por confusão e fracasso de se dizer a palavra certa no momento certo. Uma palavra que não é proferida no momento certo é prejudicial, e tem sido sempre assim. Porque é que uma classe da população deveria ter medo de ser honesta com outra? De que é que têm medo?

Fiódor Dostoiévski
In Escritos Ocasionais

No início do verão às vezes faz dias encantadores em Petersburgo - claro, mornos, serenos. Como que de propósito aquele dia era um desses tais dias raros. O príncipe perambulou algum tempo a esmo. Conhecia mal a cidade. Às vezes parava nos cruzamentos das ruas diante de outros edifícios, nas praças, nas pontes; em certo momento entrou em uma padaria para descansar. Vez por outra olhava atentamente para os transeuntes com grande curiosidade; contudo, o mais das vezes não notava nem os transeuntes nem aonde exatamente estava indo. Estava em uma tensão angustiante e intranquilo e ao mesmo tempo sentia uma necessidade inusual de estar só. Queria estar só e entregar-se a essa tensão sofredora de modo absolutamente passivo, sem procurar a mínima saída. Com asco negava-se a resolver a pergunta que desabara sobre sua alma e seu coração. "E daí, por acaso eu tenho culpa de tudo isso?" - balbuciava de si para si, quase sem ter consciência das suas palavras.

Naquele instante eu também a amava de maneira alguma a odiava, no entanto acontecia o que sempre acontece: a pessoa que a gente mais ama é a primeira que a gente ofende.

Fiódor Dostoiévski
O adolescente. São Paulo: Editora 34, 2015.

⁠Cem coelhos nunca fizeram um cavalo, como cem presunções não fazem uma prova.

Fiódor Dostoiévski
Crime e Castigo. São Paulo: Jardim dos Livros, 2020.

(...) Eu sou um homem ridículo. No momento dizem que estou louco. Seria um título excelente, se para eles eu não permanecesse nada mais que ridículo. Mas de ora em diante eu não me zango mais, todo mundo é assas e gentil pra comigo, mesmo quando caçoa de mim, e, dir-se-ia, mas gentil ainda naquele momento. Eu riria de bom grado com eles, não tanto de mim mesmo quanto para lhes ser agradável, se não sentisse tal tristeza ao contemplá-los.

Fiódor Dostoiévski
O Sonho de um Homem Ridículo

⁠Se não existe a imortalidade da alma, então não existe tampouco a virtude, logo, tudo é permitido.

Fiódor Dostoiévski
DOSTOIÉVSKI, F. Os Irmãos. Karamázov. São Paulo: Abril Cultural, 1970.

Oh, queria tanto olhar para ela, ainda que fosse de relance, ainda que fosse de longe! "Agora ela está com ele; pois bem, dou uma olhadinha para ver como está agora com ele, com o seu primeiro amado, e é só disso que preciso." Nunca antes brotara de seu peito tanto amor por essa mulher fatídica em seu destino, um sentimento tão novo e jamais experimentado, um sentimento inesperado até para ele mesmo, um sentimento de ternura que o fazia quase suplicar, sumir diante dela.

Quanto mais amo a humanidade em geral, menos amo os homens em particular, ou seja, em separado, como pessoas isoladas.

⁠O que os homens mais temem acima de tudo? O que for capaz de mudar-lhes os hábitos.

Fiódor Dostoiévski
Crime e Castigo. São Paulo: Jardim dos Livros, 2020.

Oh, que baixo eu caí! Não, do que eu necessitava era das suas lágrimas; o que eu precisava era de ver o seu medo, ver como o coração lhe doía e se despedaçava! Eu precisava de agarrar-me a qualquer coisa, de pactuar, de contemplar um ser humano! E tinha-me a resumir em mim mesmo tantas ilusões, e sonhar tantas coisas de mim, eu, que sou um mendigo, insignificante e reles, reles!"