Poema que Fale da Vida

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Das delicadezas que a vida ensina, o mais bonito sempre fica:
Os laços que se formam entre duas almas também são formas de abraço.
É assim que é o abraço: coração com coração, tudo isso cercado de braçanão.

A nossa vida é truculenta: nasce-se com sangue e com sangue corta-se a união que é o cordão
umbilical. E quantos morrem com sangue. É preciso acreditar no sangue como parte de nossa vida.
A truculência. É amor também.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Nossa truculência.

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É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mórula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livor da língua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha plúmbea, meu casaco rosso.
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, góticas, altas de corpo e copos.
A vida é crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é líquida.

Hilda Hilst
Alcoólicas

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

Vinicius de Moraes
Antologia poética

Nota: Trecho de "Soneto do amigo"

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Na convivência, o tempo não importa.
Se for um minuto, uma hora, uma vida.
O que importa é o que ficou deste minuto,
desta hora… desta vida...

Cada um de nós escreve com cuidado o capitulo da propria vida,
mas nem todos nós somos capazes de le-los com os olhos do coração.
Porque quando entendemos uma passagem desse livro, quando percebemos
que ela está ali por algum motivo maior, então ela é muito mais do que um amontoado
de palavras ou acontecimentos. Ela passa a fazer parte daquilo que somos na essência.

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Manuel Bandeira
BANDEIRA, M. Poesia Completa e Prosa, Ed. Nova Aguilar, Rio de Janeiro

...Se eu tivesse que contar hoje minha vida para alguém, poderia fazê-lo de tal maneira que iriam me achar uma mulher independente, corajosa e feliz. Nada disso: estou proibida de mencionar a única palavra que é muito mais importante que os onze minutos** - amor.
Durante toda a minha vida, entendi o amor como uma espécie de escravidão consentida. É mentira: a liberdade só existe quando ele está presente. Quem se entrega totalmente, quem se sente livre, ama o máximo.
E quem ama o máximo, sente-se livre.
Por causa disso, apesar de tudo que posso viver, fazer, descobrir, nada tem sentido. Espero que este tempo passe rápido, para que eu possa voltar à busca de mim mesma - encontrando um homem que me entenda, que não me faça sofrer.
Mas que bobagem é essa que estou dizendo? No amor, ninguém pode machucar ninguém; cada um de nós é responsável por aquilo que sente, e não podemos culpar o outro por isso.
Já me senti ferida quando perdi os homens pelos quais me apaixonei. Hoje estou convencida de que ninguém perde ninguém, porque ninguém possui ninguém.
Essa é a verdadeira experiência da liberdade: ter a coisa mais importante do mundo, sem possuí-la...

Será que a liberdade é uma bobagem?...
Será que o direito é uma bobagem?...
A vida humana é alguma coisa a mais que ciências, artes e profissões.
E é nessa vida que a liberdade tem um sentido,e o direito dos homens.
A liberdade não é um prêmio, é uma sanção. Que há de vir .

Mário de Andrade
ANDRADE, M., Aspectos da Literatura Brasileira, São Paulo, Martins, 1947

pelos caminhos que ando
um dia vai ser
só não sei quando

Pergunte ao pó
Cresce a vida
Cresce o tempo
Cresce tudo
E vira sempre
Esse momento
Cresce o ponto
Bem no meio
Do amor seu centro
Assim como
O que a gente sente
E não diz
Cresce dentro
Razão de Ser
Escrevo.
E pronto.
Escrevo porque preciso,
Preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
Retrato de lado
retrato de frente
de mim me faça
ficar diferente
Segundo consta
O mundo acabando,
Podem ficar tranquilos.
Acaba voltando
Tudo aquilo.
Reconstruam tudo
Segundo a planta dos meus versos.
Vento, eu disse como.
Nuvem, eu disse quando.
Sol, casa, rua,
Reinos, ruínas, anos,
Disse como éramos.
Amor, eu disse como.
E como era mesmo?
Sem Budismo
Poema que é bom
acaba zero a zero.
Acaba com.
Não como eu quero.
Começa sem.
Com, digamos, certo verso,

veneno de letra,
bolero, Ou menos.
Tira daqui, bota dali,
um lugar, não caminho.
Prossegue de si.
Seguro morreu de velho,
e sozinho.

Felismente existe o álcool na vida.
Uns tomar éter, outros, cocaína.
Eu tomo alegria!
Minha ternura dentuca é dissimulada.
Tenho todos os motivos menos um de ser triste.
Estou farto do lirismo comedido.
Como deve ser bom gostar de uma feia!
Pura ou degradada até a última baixeza
eu quero a estrela da manha.
... os corpos se entendem, mas as almas nao.
- Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres.

Há um momento na vida
de terror definitivo,
de fracasso tremendo,
de sangrar a ferida.
Nada rende,
não há remendo,
nem consolo,
nem saída,
luta perdida,
a lágrima não significa,
o amor cruza os braços,
a saudade diz que vai
e fica.

A morte chega cedo

A morte chega cedo,
Pois breve é toda vida
O instante é o arremedo
De uma coisa perdida.
O amor foi começado,
O ideal não acabou,
E quem tenha alcançado
Não sabe o que alcançou.

E tudo isto a morte
Risca por não estar certo
No caderno da sorte
Que Deus deixou aberto.

Seiscentos e Sessenta e Seis

A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...
Quando se vê, já é 6ª feira...
Quando se vê, passaram 60 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado...
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre em frente...
e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.

Mario Quintana
Antologia poética. Rio de Janeiro: Objetiva, 2015.

Nota: O poema costuma circular pela internet com algumas alterações no texto e com o título O tempo.

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A vida é uma ópera, e uma grande ópera. (...)
Deus é o poeta; a música é de Satanás. (...)
O êxito é crescente.
Poeta e músico recebem pontualmente os seus direitos autorais,
que não são os mesmos.

Machado de Assis
Dom Casmurro (1899).

Qual a razão de viver
se não for para tornar a vida
menos difícil para os outros?

Almas em reencontro

Na imensidão do vazio da minha vida,
eu me procuro em alguma parte que não acho.
Eu vasculho nas minhas coisas em busca de algo que eu não sei.
Ando pelas ruas sem o “GPS” do meu coração,
afastando-me assim do medo de uma nova ilusão.
Mas me perco em estreitos becos da minha insanidade.
E a sua ausência de pessoa que eu não conheço, mas busco,
que não sei como se chama, mas que grito o nome vagamente…

Não tenho a menor idéia de como nos encontraremos,
mas sinto que há um fio, uma linha que hoje está cruzada,
que me levará até você em linha reta,
e quando nossos olhos se encontrarem,
quando as nossas buscas se reunirem,
talvez na praça perto de casa,
ou naquela viagem distante onde fugi de mim mesmo,
mostrarão o tamanho das nossas necessidades.

Nos entregaremos então,
na volúpia do desejo da alma,
que muito além do prazer da carne ansiosa,
da boca sedenta e sequiosa,
se entrega em doces devaneios,
sonhos de apaixonados em uma tarde qualquer,
de um ano qualquer,
em um ponto do mapa,
onde só os corações que se entregam ao amor sabem onde é.

Eu já sou parte de você,
ainda que você não saiba.
Almas prometidas, guardadas um para o outro.
Amor além do tempo, amor de reencontro.
No exato espaço de tempo que chamamos de futuro,
que pode ser extamente agora,
quando nos permitimos viver o amor mais de uma vez

CANÇÃO EXCÊNTRICA

Ando à procura de espaço
para o desenho da vida.
Em números me embaraço
e perco sempre a medida.
Se penso encontrar saída,
em vez de abrir um compasso,
protejo-me num abraço
e gero uma despedida.

Se volto sobre o meu passo,
é já distância perdida.

Meu coração, coisa de aço,
começa a achar um cansaço
esta procura de espaço
para o desenho da vida.
Já por exausta e descrida
não me animo a um breve traço:
- saudosa do que não faço,
- do que faço, arrependida.

Cecília Meireles
MEIRELES, C. Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

Isso é a vida real?
Isso é só fantasia?
Pego num desmoronamento
Sem poder escapar da realidade.

Oh, baby, não chore
Foi apenas um corte
A vida é bem mais perigosa do que a morte