Oswald de Andrade
O Amor – Poesia futurista
A Dona Branca Clara
Tome-se duas dúzias de beijocas
Acrescente-se uma dose de manteiga do Desejo
Adicione-se três gramas de polvilho de Ciúme
Deite-se quatro colheres de açucar da Melancolia
Coloque-se dois ovos
Agite-se com o braço da Fatalidade
E dê de duas em duas horas marcadas
No relógio de um ponteiro só!
O Capoeira
- Qué apanhá sordado?
- O quê?
- Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada.
Oferta
Quem sabe
Se algum dia
Traria
O elevador
Até aqui
O teu amor
Escapulário
No Pão de Açúcar
De Cada Dia
Dai-nos Senhor
A Poesia
De Cada Dia.
Balada do Esplanada
Ontem à noite
Eu procurei
Ver se aprendia
Como é que se fazia
Uma balada
Antes de ir
Pro meu hotel.
É que este
Coração
Já se cansou
De viver só
E quer então
Morar contigo
No Esplanada.
Eu qu'ria
Poder
Encher
Este papel
De versos lindos
É tão distinto
Ser menestrel
No futuro
As gerações
Que passariam
Diriam
É o hotel
Do menestrel
Pra m'inspirar
Abro a janela
Como um jornal
Vou fazer
A balada
Do Esplanada
E ficar sendo
O menestrel
De meu hotel
Mas não há poesia
Num hotel
Mesmo sendo
'Splanada
Ou Grand-Hotel
Há poesia
Na dor
Na flor
No beija-flor
No elevador
O medroso
A assombração apagou a candeia
Depois no escuro veio com a mão
Pertinho dele
Ver se o coração ainda batia.
Fim e começo
A noite caiu com licença da Câmara
Se a noite não caíse
Que seriam dos lampiões?
Digestão
A couve mineira tem gosto de bife inglês
Depois do café e da pinga
O gozo de acender a palha
Enrolando o fumo
De Barbacena ou de Goiás
Cigarro cavado
Conversa sentada
Poema da cachoeira
É a mesma estação rente do trem
Toda de pedra furadinha
Meu pai morou alguns anos aqui
Trabalhando
Um dia liquidou
Ativo passivo
Cinco galinhas
E deram-lhe uma passagem de presente
Para que eu nascesse em São Paulo
Como não houvesse estrada de rodagem
Ele foi na de ferro
Comprando frutas pelo caminho