7 melhores poemas de Carlos Drummond de Andrade

Equipe editorial do Pensador
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Criado e revisado pelos nossos editores

Poeta, contista, cronista, e “O Pensador”, como é nomeado em sua famosa estátua no calçadão da praia de Copacabana.

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) é, provavelmente, o maior poeta “no meio do caminho” da história da literatura brasileira. Considerado um dos principais nomes da segunda geração modernista, o escritor tem uma obra marcada por liberdade formal, bom humor e uma linguagem capaz de cativar qualquer pessoa.

Com um percurso literário que durou mais de 60 anos, sua carreira sustenta a publicação de mais de 30 obras no Brasil, entre antologias poéticas, livros de prosa e livros infantis.

1. Poema Quadrilha

QUADRILHA

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

-- Carlos Drummond de Andrade

Simples, poucos versos e cheio de ironia. Está aí uma versão de Drummond que muitos de nós já vimos em aulas de português e literatura. Este poema é mais que simples desencontros amorosos, é sobre a vida como ela é: imprevisível, tempestuosa e com destinos muitas vezes inesperados, como o J. Pinto, que entrou de repente na história.

Quadrilha

2. Poema de sete faces

POEMA DE SETE FACES

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
(...)

Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
(...)

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
(...)

-- Carlos Drummond de Andrade

Entre os mais famosos do autor, este poema mostra uma versão de Drummond desesperada, indignada e cheio de conflitos: com seus próprios desejos, sua infância, até mesmo Deus. São sete faces distribuídas em sete estrofes cheias de sentimento de um coração mais vasto que o mundo.

Mundo vasto mundo

3. Poema José

JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
(...)
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho do mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

Quantas e quantas vezes não nos sentimos "Josés"? Tomados pôr incertezas e medo. Quando Drummond escreveu este poema, o mundo estava em plena Segunda Guerra Mundial e o Brasil entrando na ditadura, com o Estado Novo de Getúlio Vargas. Incrível como, mesmo em um contexto histórico diferente, este poema com uma simples pergunta nos leva a pensar em gritos que ainda são sufocados pela indiferença.

José

4. Poema as sem-razões do amor

AS SEM-RAZÕES DO AMOR

Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

-- Carlos Drummond de Andrade

Drummond consegue colocar em palavras simples um sentimento tão complexo com o amor. Um amor que ultrapassa limites, cria novos significados, que vence até a morte e continua ali, palpitando no peito da gente, simplesmente porque existe apesar de qualquer tentativa que façamos de tentar explicá-lo.

As sem-razões do amor

5. Poema verbo ser

VERBO SER

Que vai ser quando crescer?
Vivem perguntando em redor. Que é ser?
É ter um corpo, um jeito, um nome?
Tenho os três. E sou?
Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito?
Ou a gente só principia a ser quando cresce?
É terrível, ser? Dói? É bom? É triste?
Ser; pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas?
Repito: Ser, Ser, Ser. Er. R.
Que vou ser quando crescer?
Sou obrigado a? Posso escolher?
Não dá para entender. Não vou ser.
Vou crescer assim mesmo.
Sem ser Esquecer.

Carlos Drummond de Andrade

De forma simples e cativante, como que numa voz de criança, Drummond questiona aqui a nossa própria necessidade em “ser” algo, em afirmarmos uma identidade perante a família, os colegas de trabalho, a sociedade, quando, na verdade, apenas em existir JÁ SOMOS.

Verbo ser

6. Poema da necessidade

POEMA DA NECESSIDADE

É preciso casar João,
é preciso suportar António,
é preciso odiar Melquíades,
é preciso substituir nós todos.
É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus,
é preciso pagar as dívidas,
é preciso comprar um rádio,
é preciso esquecer fulana.
É preciso estudar volapuque,
é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.
É preciso viver com os homens,
é preciso não assassiná-los,
é preciso ter mãos pálidas
e anunciar o FIM DO MUNDO.

Carlos Drummond de Andrade

Neste poema, Drummond repete supostas “necessidades” que o dia a dia de uma vida moderna, e nos faz refletir sobre essas preocupações impostas a nós. Esse clima frenético em que vivemos até hoje é impresso no poema como um anúncio do fim do mundo que, aliás, já estamos esperando há algum tempo.

Poema da necessidade

7. Poema no meio do caminho

NO MEIO DO CAMINHO

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

Carlos Drummond de Andrade

Talvez o poema mais famoso de Drummond: por ser tão simples e por dizer tanto com quase nada. As frases repetidas embaraçam a leitura, são pedras no meio do caminho do poema, que cansam, mas ao mesmo tempo gravam o texto na memória. Se o objetivo do autor com esse texto era ser uma pedra no meio do caminho da nossa memória literária, podemos dizer que a missão foi concluída com sucesso, não foi?

No meio do caminho