Nao Conto Detalhes e muito menos

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Ensinamento

Minha mãe achava estudo a coisa mais fina do mundo. Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão, ela falou comigo:
“Coitado, até essa hora no serviço pesado”.
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor. Essa palavra de luxo.

Uma mulher não perdoa uma única coisa no homem: que ele não ame com coragem!
Pode ter os maiores defeitos, atrasar-se para os compromissos ...
Qualquer coisa é admitida, menos que não ame com coragem.
Amar com coragem não é viver com coragem.
É bem mais do que estar aí...
Amar com coragem não é questão de estilo, de opinião.
Amar com coragem é caráter.
Vem de uma incompetência de ser diferente.
Amar para valer, para dar torcicolo.
Não encontrar uma desculpa ou um pretexto para se adaptar.
Não usar atenuantes como “estou confuso”.
Amar com fúria, com o recalque de não ter sido assim antes.
Amar decidido, obcecado...como quem troca de identidade e parte a um longo exílio....
Amar como quem volta de um longo exílio.
Amar quase que por, por bebedeira...
Amar desavisado ... amar desatinado, pressionando...
Amar mais do que é possível lembrar.
Amar com coragem... só isso!

O dinheiro compra ansiolíticos, mas não a capacidade de relaxar. Compra jóias, mas não o amor de uma mulher. Compra um quadro de pintura, mas não a capacidade de contemplar. Compra seguros, mas não a habilidade de proteger a emoção. Compra informações, mas não o autoconhecimento. Compra lentes de contato, mas não a capacidade de ver os sentimentos não expressos. O dinheiro compra um manual de regras para educar quem amamos, mas não compra um manual de vida.

(Parte retirada do livro O Vendedor de Sonhos – E a revolução dos anônimos)

Desânimo

Estou agora triste. Há nesta vida
Páginas torvas que se não apagam,
Nódoas que não se lavam… se esquecê-las
De todo não é dado a quem padece…
Ao menos resta ao sonhador consolo
No imaginar dos sonhos de mancebo!

Oh! voltai uma vez! eu sofro tanto!
Meus sonhos, consolai-me! distraí-me!
Anjos das ilusões, as asas brancas
As névoas puras, que outro sol matiza.
Abri ante meus olhos que abraseiam
E lágrimas não tem que a dor do peito
Transbordem um momento…

E tu, imagem,
Ilusão de mulher, querido sonho,
Na hora derradeira, vem sentar-te,
Pensativa e saudosa no meu leito!
O que sofres? que dor desconhecida
Inunda de palor teu rosto virgem?
Por que tu’alma dobra taciturna,
Como um lírio a um bafo d’infortúnio?
Por que tão melancólica suspiras?

Ilusão, ideal, a ti meus sonhos,
Como os cantos a Deus se erguem gemendo!
Por ti meu pobre coração palpita…
Eu sofro tanto! meus exaustos dias
Não sei por que logo ao nascer manchou-os
De negra profecia um Deus irado.
Outros meu fado invejam… Que loucura!
Que valem as ridículas vaidades
De uma vida opulenta, os falsos mimos
De gente que não ama? Até o gênio
Que Deus lançou-me à doentia fronte,
Qual semente perdida num rochedo,
Tudo isso que vale, se padeço!

Nessas horas talvez em mim não pensas:
Pousas sombria a desmaiada face
Na doce mão e pendes-te sonhando
No teu mundo ideal de fantasia…
Se meu orgulho, que fraqueia agora,
Pudesse crer que ao pobre desditoso
Sagravas uma idéia, uma saudade…
Eu seria um instante venturoso!

Mas não… ali no baile fascinante,
Na alegria brutal da noite ardente,
No sorriso ebrioso e tresloucado
Daqueles homens que, pra rir um pouco,
Encobrem sob a máscara o semblante,
Tu não pensas em mim. Na tua idéia
Se minha imagem retratou-se um dia
Foi como a estrela peregrina e pálida
Sobre a face de um lago…

Álvares de Azevedo
Lira dos Vinte Anos

Restos do Carnaval

Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o outro ano. E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.

No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.

E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.

Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça - eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.

Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com os quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.

Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga - talvez atendendo a meu mudo apelo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel - resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.

Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada: minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo, embaixo da fantasia usaríamos combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse pelo menos estaríamos de algum modo vestidas - àidéia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de vergonha - mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quando ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.

Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.

Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto essa não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge - minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa - mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil - fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros me espantava.

Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido, sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.

Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos já lisos de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.

Clarice Lispector
Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

AMOR PACÍFICO E FECUNDO!

Não quero amor que não saiba dominar-se,
desse, como vinho espumante,
que parte o copo e se entorna,
perdido num instante.

Dá-me esse amor freso e puro como a tua chuva,
que abençoa a terra sequiosa,
e enche as talhas do lar.

Amor que penetre ate o centro da vida,
e dali se estenda como seiva invisível,
até os ramos da árvore da existência,
e fça nascer
as flores e os frutos.
Dá-me esse amor que conserva tranquilo o coração,
na plenitude da paz!

Vê se me esquece
Já que você não aparece,
venho por meio desta
devolver teu faroeste,
o teu papel de seda,
a tua meia bege,
tome também teu book,
leve teu ultraleve
carteira de saúde,
tua receita de quibe,
de quiabo, de quibebe,
do diabo que te carregue,
te carregue, te carregue
teu truque sujo, teu hálito,
teu flerte, tua prancha de surf,
tua idéia sem verve,
que nada disso me serve
Já que você não merece,
devolva minhas preces,
meu canto, meu amor,
meu tempo, por favor,
e minha alegria que,
naquele dia,
só te emprestei por uns dias
e é tudo que lhe pertence

PS: Já que você foi embora por que não desaparece?"

Angústia pode ser não ter esperança na esperança. Ou conformar-se sem se resignar. Ou não se confessar nem a si próprio. Ou não ser o que realmente se é, e nunca se é. Angústia pode ser o desamparo de estar vivo. Pode ser também não ter coragem de ter angústia – e a fuga é outra angústia. Mas angústia faz parte: o que é vivo, por ser vivo, se contrai.
Esse mesmo rapaz perguntou-me: você não acha que há um vazio sinistro em tudo? Há sim. Enquanto se espera que o coração entenda.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica O que é angústia.

...Mais

Não venha me falar de razão.
Não me cobre lógica.
Não me peça coerência.
Eu sou pura emoção.
Tenho razões e motivações próprias.
Sou movido por paixão.
Essa é minha religião e minha ciência.
Não meça meus sentimentos.
Nem tente compará-los a nada.
Deles sei eu.
Eu e meus fantasmas.
Eu e meus medos.
Eu e minha alma…

Nossa liberdade é parcial, todos sabem. Não me refiro ao país, e sim à nossa liberdade individual, minha e sua. Sempre que toco nesse assunto me vem à cabeça aquela frase que citei outras vezes: 'O máximo de liberdade que podemos almejar é escolher a prisão em que queremos viver.' É isso aí. E quais são essas prisões? Pode ser um casamento, ou, ao contrário, um compromisso com a solidão. Pode ser um emprego ou uma cidade que não conseguimos abandonar. Pode ser a maternidade. Pode ser a política. Pode ser o apego ao poder. Enfim, todas as nossas escolhas, incluindo as felizes, implicam algum confinamento, em alguma imobilidade, e não há nada de errado com isso, simplesmente assim é a vida, feita de opções que nos definem e nos enraízam.

Mas às vezes exageramos. Costumamos nos acorrentar também a algumas certezas e pensamentos como forma de dizer ao mundo quem somos. É como se redigíssemos uma constituição própria, para através dela apresentar à sociedade nossos alicerces: sou contra o voto obrigatório, sou a favor da descriminação das drogas, sou contra a pena de morte, sou a favor do controle de natalidade, sou contra a proibição do aborto, sou a favor das pesquisas com célula-tronco. Esse é apenas um exemplo de identidade que forjamos ao longo da vida. Você deve ter a sua, eu tenho a minha.

Dá uma segurança danada saber exatamente o que queremos e o que não queremos, no que cremos e no que desacreditamos. Mas onde é que está escrito, de fato, que temos que pensar sempre a mesma coisa, reagir sempre da mesma forma?

Ao trocar de opinião ou de hábitos, infringimos nossas próprias regras e passamos adiante uma imagem incômoda: a de que não somos seres confiáveis. As pessoas à nossa volta já haviam aprendido tudo sobre nós, sabiam lidar como nossos humores e nossos revezes, estava tudo dentro do programa e, de repente, ao mudarmos de idéia ou fazermos algo que nunca havíamos feito, subvertemos a ordem natural das coisas.

Quando visito algumas escolas, encontro estudantes um pouco assustados com as escolhas que farão e que lhe parecem definitivas. Tento aliviá-los: pensem, repensem, mudem quantas vezes vocês quiserem, é permitido voltar atrás. Digo isso porque eu mesma já reprimi muito meus movimentos, minhas alternâncias, numa época em que eu achava que uma pessoa séria tinha que morrer com suas escolhas. Ainda há quem considere leviana a pessoa que se questiona e se contradiz, mas já bastam as prisões necessárias - para que cultivar as desnecessárias?

Optei pelas medidas provisórias. Por isso, todos os anos eu faço uns picotes na minha constituição imaginária e jogo os pedacinhos de papel pela janela: é assim que comemoro o Dia da Independência. Da minha.

Trocando em miúdos

Eu vou lhe deixar a medida do Bonfim
Não me valeu
Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim?
O resto é seu
Trocando em miúdos, pode guardar
As sobras de tudo que chamam lar
As sombras de tudo que fomos nós
As marcas de amor nos nossos lençóis
As nossas melhores lembranças

Aquela esperança de tudo se ajeitar
Pode esquecer
Aquela aliança, você pode empenhar
Ou derreter
Mas devo dizer que não vou lhe dar
O enorme prazer de me ver chorar
Nem vou lhe cobrar pelo seu estrago
Meu peito tão dilacerado

Aliás
Aceite uma ajuda do seu futuro amor
Pro aluguel
Devolva o Neruda que você me tomou
E nunca leu
Eu bato o portão sem fazer alarde
Eu levo a carteira de identidade
Uma saideira, muita saudade
E a leve impressão de que já vou tarde

Se alguém me chama "egoísta", o que está a dizer-me?
Está a dizer-me "não penses em ti, pensa em mim."
Quem é o egoísta?

Desde há três ou quatro mil anos que o Talmude diz:
Se eu não pensar em mim, quem o fará?
E se eu só pensar em mim, quem serei eu?
E se não for agora, quando?

Existem três categorias de pessoas:
Uma, a que, quando tem frio oferece toda a sua roupa de agasalho.
Outra, a que, quando sente frio, veste a sua roupa de agasalho.
E uma terceira que, quando sente frio, acende uma fogueira para se aquecer a si mesma e a todos os que queiram desfrutar do calor.
A primeira pessoa é suicida: irá morrer de frio.
A segunda é miserável: irá morrer sozinha.
A terceira é um ser humano normal, adulto e egoísta (acende a fogueira porque ele tem frio).
Eu quero ser aquele que acende milhares de fogueiras e, mais ainda, quero ser o que ensina milhares de seres humanos a acender fogueiras.

Definitivamente, não sou humilde.

Sonhos

Quero sempre poder ter um sorriso estampado em meu rosto, mesmo quando a situação não for muito alegre... E que esse meu sorriso consiga transmitir paz para os que estiverem ao meu redor.
Quero poder fechar meus olhos e imaginar alguém...E poder ter a absoluta certeza de que esse alguém também pensa em mim quando fecha os olhos, que faço falta quando não estou por perto.
Queria ter a certeza de que apesar de minhas renúncias e loucuras, alguém me valoriza pelo que sou, não pelo que tenho... Que me veja como um ser humano completo, que abusa demais dos bons sentimentos que a vida lhe proporciona, que dê valor ao que realmente importa, que é meu sentimento... E não brinque com ele. E que esse alguém me peça para que eu nunca mude, para que eu nunca cresça, para que eu seja sempre eu mesma.
Não quero brigar com o mundo, mas se um dia isso acontecer, quero ter forças suficientes para mostrar a ele que o amor existe... Que ele é superior ao ódio e ao rancor, e que não existe vitória sem humildade e paz.
Quero poder acreditar que mesmo se hoje eu fracassar, amanhã será outro dia, e se eu não desistir dos meus sonhos e propósitos, talvez obterei êxito e serei plenamente feliz.

Adriana Britto

Nota: Trecho adulterado de um poema da autora.

HUMILDADE

Tanto que fazer!
livros que não se lêem, cartas que não se escrevem,
línguas que não se aprendem,
amor que não se dá,
tudo quanto se esquece.

Amigos entre adeuses,
crianças chorando na tempestade,
cidadãos assinando papéis, papéis, papéis...
até o fim do mundo assinando papéis.

E os pássaros detrás de grades de chuva.
E os mortos em redoma de cânfora.

(E uma canção tão bela!)

Tanto que fazer!
E fizemos apenas isto.
E nunca soubemos quem éramos,
nem pra quê.

O Estrangeiro

Todos deveriam sentir-se estrangeiros um dia.

Não simplesmente turistas, por que turismo é diversão, nem viajando a trabalho, por que o trabalho consome todas nossas emoções, mas estrangeiros mesmo, que é quando se chega a um lugar com a intenção de ficar, mas sem conhecer um único metro do que se está à frente.

É algo desafiador chegar a um lugar sem conhecer nada nem ninguém, sem saber onde ficar ou o que irá fazer ao certo. Cada passo parece ser um passo em falso, cego, sem destino.

Um frio corre tua espinha a cada instante, tal qual estivesses à beira de um abismo, ou caindo no próprio abismo, sem nada nem ninguém para te amparar.

Neste momento conhece-se o Homem dentro de nós, sua força, sua capacidade de dominar o meio, interagir com ele, fazer amizades, vencer o medo.

Descobre-se que o mundo não é assim, um “bicho de sete cabeças...”

Descobre-se que estar sozinho não é condição intrínseca ao meio, mas intrínseca a nós mesmos e que podemos transformar para melhor qualquer realidade.

Isso faz lembrar o que eu sempre disse a mim mesmo e que a cada dia consigo mais razões para acreditar: Se tu queres voar, supera teu medo, vai à beira de um abismo e lança-te no ar. Não hesite. Ou tu cairás ou alçarás vôo, mas acredite, tu voarás!

Como bem disse Henry Ford, “em todas as áreas de atividades existem mais pessoas que desistem do que pessoas que fracassam.” O sucesso é questão de Coragem!!

Não quero ser o último a comer-te

Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde

em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde

a esperar que limpasses toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,

para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.

Estou desorganizada porque perdi o que não precisava? Nesta minha nova covardia – a covardia é o que de mais novo já me aconteceu, é a minha maior aventura, essa minha covardia é um campo tão amplo que só a grande coragem me leva a aceitá-la –, na minha nova covardia, que é como acordar de manhã na casa de um estrangeiro, não sei se terei coragem de simplesmente ir.

É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo. Até agora achar-me era já ter uma ideia de pessoa e nela me engastar: nessa pessoa organizada eu me encarnava, e nem mesmo sentia o grande esforço de construção que era viver. A ideia que eu fazia de pessoa vinha de minha terceira perna, daquela que me plantava no chão. Mas e agora? estarei mais livre?

Não. Sei que ainda não estou sentindo livremente, que de novo penso porque tenho por objetivo achar – e que por segurança chamarei de achar o momento em que encontrar um meio de saída. Por que não tenho coragem de apenas achar um meio de entrada? Oh, sei que entrei, sim. Mas assustei-me porque não sei para onde dá essa entrada. E nunca antes eu me havia deixado levar, a menos que soubesse para o quê.

Ontem, no entanto, perdi durante horas e horas a minha montagem humana. Se tiver coragem, eu me deixarei continuar perdida. Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação.

Como é que se explica que o meu maior medo seja exatamente em relação: a ser? e no entanto não há outro caminho. Como se explica que o meu maior medo seja exatamente o de ir vivendo o que for sendo? como é que se explica que eu não tolere ver, só porque a vida não é o que eu pensava e sim outra como se antes eu tivesse sabido o que era! Por que é que ver é uma tal desorganização?

E uma desilusão. Mas desilusão de quê? se, sem ao menos sentir, eu mal devia estar tolerando minha organização apenas construída? Talvez desilusão seja o medo de não pertencer mais a um sistema. No entanto se deveria dizer assim: ele está muito feliz porque finalmente foi desiludido. O que eu era antes não me era bom. Mas era desse não-bom que eu havia organizado o melhor: a esperança. De meu próprio mal eu havia criado um bem futuro. O medo agora é que meu novo modo não faça sentido? Mas por que não me deixo guiar pelo que for acontecendo? Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade.

Clarice Lispector
A paixão segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Deus Sabe

Quando você está cansado e desencorajado por esforços que não deram frutos, Deus sabe o quanto você tentou. Quando você chorou por longo tempo, com o coração cheio de angústia, Ele contou suas lágrimas. Se você sente que sua vida está perdida e que muito tempo também se perdeu, Ele está confortando você. Quando você está solitário e seus amigos estão muito ocupados para um simples telefonema, Ele acompanha você. Quando você sente que já tentou de tudo e não sabe por onde recomeçar, Ele tem a solução. Quando nada mais faz sentido e você se sente frustrado e deprimido, Ele tenta lhe mostrar respostas.

Se, de repente, tudo lhe parece mais brilhante e você percebe uma luz de esperança, nesse momento, Ele soprou nos seus ouvidos. Quando as coisas vão bem e você tem muito para agradecer, Ele está festejando com você. Quando algo lhe traz muita alegria e você se sente refortalecido, Ele está sorrindo para você. Quando você tem um propósito a cumprir e um sonho para seguir, Ele abre seus olhos e o chama pelo nome.

Lembre-se que onde você estiver, seja na tristeza ou na felicidade, mesmo que ninguém mais saiba, com certeza, Deus sabe.

Eu tinha dito que iria propor tirar a palavra utopia do dicionário. Mas, enfim, não vou a tanto. Deixe ela lá estar, porque está quieta. O que eu queria dizer, é que há uma outra questão que tem de ser urgentemente revista. Tudo se discute neste mundo, menos uma única coisa: a democracia. Ela está aí, como se fosse uma espécie de santa no altar, de quem já não se espera milagres, mas que está aí como referência. E não se repara que a democracia em que vivemos é uma democracia seqüestrada, condicionada, amputada.

O poder do cidadão, o poder de cada um de nós, limita-se, na esfera política, a tirar um governo de que não se gosta e a pôr outro de que talvez venha a se gostar. Nada mais. Mas as grandes decisões são tomadas em uma outra grande esfera e todos sabemos qual é. As grandes organizações financeiras internacionais, os FMIs, a Organização Mundial do Comércio, os bancos mundiais. Nenhum desses organismos é democrático. E, portanto, como falar em democracia se aqueles que efetivamente governam o mundo não são eleitos democraticamente pelo povo? Quem é que escolhe os representantes dos países nessas organizações? Onde está então a democracia?

(...) Soa maravilhosamente. Um admirável novo mundo. Não há nada disso realmente, há?
- Você não acredita nele?
- O senhor acredita?
- Há sempre um admirável novo mundo - disse Poirot - mas, sabe, só para algumas categorias especiais de pessoas. As felizes. Aquelas que trazem dentro de si mesmas a criação desse mundo.

Noite das Bruxas

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