Meu Caminho So

⁠Minha filha não conheceu meus pais
mas eu conheci meu neto

Por isso faço versos
para que ele saiba
o que meus retratos sentiam por dentro

⁠Não posso dormir
meu sonho está acordado
e eu estou atrás dele

⁠Eu e meu neto, juntos, brincamos de infância, explorando o mundo com olhos de criança, que os adultos esqueceram de ver

⁠Meu casamento tem um prazo de validade de cem anos. Depois, cada um vai para um lado do céu, em busca de outro anjo

⁠Passo pela vida incógnito, desapercebido e secreto.
O destino do meu anonimato é desaparecer no esquecimento da eternidade

⁠Meu rosto foi moldado pelos traços mnêmicos e os orifícios não preenchidos da alma

⁠E eu aqui com meu dente doendo
e eu aqui com meu saldo bancário
e eu aqui preso no trânsito engarrafado
e eu aqui com o cartão de crédito atrasado
e eu aqui com o namoro acabado
e eu aqui desempregado procurando trabalho
e eu aqui estressado e arretado
tem dias que a gente não devia ter acordado

⁠O tempo não tem memória, assim como a casa da minha avó que não se lembra do meu passado.

⁠Nunca me medi em centímetros ou metros.
Nunca me pesei em quilos ou gramas.
Mas meu pequeno
tem a leveza do tamanho de uma infância

⁠Tenho mais lembranças do meu passado do que de ontem.
Talvez o ontem esteja perto demais para ser lembrado.

⁠Se soubesse antes
que meu ontem hoje ia acabar
transformaria ele em memória
e me lembraria agora o que comi
no café da manhã
no almoço e no jantar

⁠Não posso ir além do meu passado, pois assim invadiria a privacidade da memória dos meus pais

⁠Vou revisitar meu baú de ossos
explorar todas minhas lembranças
esmiuçar os cantos e recantos da memória
pois um dia até ela haverá de não existir

⁠Tudo em meu corpo e fora de mim é transitório. Permanente é a memória, até a transitoriedade me devorar.

⁠Meu sonho preferido é acordar e ver você dormindo ao lado.

⁠Não existo sem meu cérebro, mas não me resumo a ser apenas um cérebro.

Meu primeiro tesouro foi minha mãe.
Meu primeiro pirata foi meu pai.
Depois disso, nunca mais encontrei
meu mapa

⁠Quando meu Complexo de Édipo se encontra com o teu, tornamo-nos multidão

⁠Não sou quem ama minha mulher. É meu amor quem a ama

⁠Quando amarrei meu bode à tua ovelha, não sabia que seria feliz para sempre