Mensagens de Autores Famosos

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E não refletiu só, devaneou também, soltando o pano todo a essa veleira escuna da imaginação, em que todos navegamos alguma vez na vida, quando nos cansa a terra firme e dura, e chama-nos o mar vasto e sem praias.

Machado de Assis
A Mão e a Luva (1874).

Seria certo que nenhum coração simpatizava com seus secretos infortúnios ou suas venturas solitárias?

Machado de Assis
Iaiá Garcia (1878).

Ah, meu caro Rubião, isto de política pode ser comparado à paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo; não falta nada, nem o discípulo que nega, nem o discípulo que vende. Coroa de espinhos, bofetadas, madeiro, e afinal morre-se na cruz das ideias, pregado pelos cravos da inveja, da calúnia e da ingratidão...

Machado de Assis
Quincas Borba (1891).

Capitu temia a nossa separação, mas acabou aceitando este alvitre, que era o melhor.

Machado de Assis
Dom Casmurro

Na vida, o olhar da opinião, o contraste dos interesses, a luta das cobiças obrigam a gente a calar os trapos velhos, a disfarçar os rasgões e os remendos, a não estender ao mundo as revelações que faz à consciência; e o melhor da obrigação é quando, à força de embaçar os outros, embaça-se um homem a si mesmo, porque em tal caso poupa-se o vexame, que é uma sensação penosa, e a hipocrisia, que é um vício hediondo.

Machado de Assis
Memórias póstumas de Brás Cubas (1881).

Que são minutos e que são meses? Paixões de largos anos, chegando ao casamento, acabam muitas vezes pela separação ou pelo ódio, quando menos pela indiferença. O amor não é mais que um instrumento de escolha; amar é eleger a criatura que há de ser companheira na vida, não é afiançar a perpétua felicidade de duas pessoas, porque essa pode esvair-se ou corrompe-se.

Machado de Assis
Helena (1876).

Era uma paixão da última hora, um ocaso ardente e abrasado entre o dia que lá ia, e a noite que não tardava a sombrear tudo.

Machado de Assis
Iaiá Garcia (1878).

Não é só o coração que lhe fala, é também a imaginação, e a imaginação, se é boa amiga, tem seus dias de infidelidade.

Machado de Assis
Iaiá Garcia (1878).

Quem tem vontade de aprender e quer fazer alguma coisa, prefere a lição que melhora ao ruído que lisonjeia.

Machado de Assis
Ressurreição (1872).

A nudez habitual, dada a multiplicação das obras e dos cuidados do indivíduo, tenderia a embotar os sentidos e a retardar os sexos, ao passo que o vestuário, negaceando a natureza, aguça e atrai as vontades, ativa-as, reprodu-las, e conseguintemente faz andar a civilização.

Machado de Assis
Memórias póstumas de Brás Cubas (1881).

Pascal é um dos meus avôs espirituais; e, conquanto a minha filosofia valha mais que a dele, não posso negar que era um grande homem. Ora, que diz ele nesta página? [...] Diz que o homem tem “uma grande vantagem sobre o resto do universo: sabe que morre, ao passo que o universo ignora-o absolutamente”. Vês? Logo, o homem que disputa o osso a um cão tem sobre este a grande vantagem de saber que tem fome; e é isto que torna grandiosa a luta, como eu dizia. “Sabe que morre” é uma expressão profunda; creio todavia que é mais profunda a minha expressão: sabe que tem fome. Porquanto o fato da morte limita, por assim dizer, o entendimento humano; a consciência da extinção dura um breve instante e acaba para nunca mais, ao passo que a fome tem a vantagem de voltar, de prolongar o estado consciente.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881).

Marcela morria de amores pelo Xavier. Não morria, vivia. Viver não é a mesma coisa que morrer.

Machado de Assis
Memórias póstumas de Brás Cubas (1881).

O desdém não se revelava por nenhuma expressão exterior; era a ruga sardônica do coração. Por fora, havia só a máscara imóvel, o gesto lento e as atitudes tranqüilas. Alguns poderiam temê-lo, outros detestá-lo, sem que merecesse execração nem temor. Era inofensivo por temperamento e por cálculo. Como um célebre eclesiástico, tinha para si que uma onça de paz vale mais que uma libra de vitória.

Machado de Assis
Iaiá Garcia

A boca desabrochava facilmente em riso, — um riso que ainda não toldavam as dissimulações da vida, nem ensurdeciam as ironias de outra idade.

Machado de Assis
Iaiá Garcia

Há pessoas que não sabem, ou não se lembram, de raspar a casca do riso para ver o que há dentro.

Machado de Assis
Gazeta de Notícias, 26 jan. 1885.

Não se compreende que um botocudo fure o beiço para enfeitá-lo com um pedaço de pau. Esta reflexão é de um joalheiro.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Typografia. Nacional, 1881.

⁠Quanto às minhas opiniões públicas, te­nho duas, uma impossível, outra realizada. A impossível é a republica de Platão. A realizada é o sistema representativo. É sobre­tudo como brasileiro que me agrada esta úl­tima opinião, e eu peço aos deuses (também creio nos deuses) que afastem do Brasil o sistema republicano, porque esse dia seria o do nascimento da mais insolente aristocra­cia que o sol jamais iluminou.

Machado de Assis
Diário do Rio de Janeiro, 5 mar. 1867.

Se eu lembrasse de deixar a vida por aborrecimento ou capricho, seria você acusado de me haver propinado o veneno?

Mas, enfim, os cabelos iam acabando, por mais que eu os quisesse intermináveis. Não pedi ao céu que eles fossem tão longos como os da Aurora, porque não conhecia ainda esta divindade que os velhos poetas me apresentaram depois; mas, desejei penteá-los por todos os séculos dos séculos, tecer duas tranças que pudessem envolver o infinito por um número inominável de vezes. Se isto vos parecer enfático, desgraçado leitor, é que nunca penteastes uma pequena, nunca pusestes as mãos adolescentes na jovem cabeça de uma ninfa... Uma ninfa!

Machado de Assis
Dom Casmurro (1899).

Coração e charuto são símbolos um do outro; ambos se queimam e se desfazem em cinzas.

Machado de Assis
O protocolo. In: Teatro de Machado de Assis. São Paulo: Martins Fontes, 2003.