Kafka
Fotografam-se coisas para expulsá-las do espírito. Minhas histórias são uma maneira de fechar os olhos
"A pergunta foi, todavia, tão inesperada que deixou o homem confuso, e o facto foi tanto mais embaraçoso quanto, sendo ele um homem obviamente conhecedor do mundo, teria sabido perfeitamente como portar-se em qualquer outro lugar e não teria de maneira nenhuma renunciado à sua natural superioridade. Contudo, neste local não sabia sequer como responder a uma simples pergunta e fitou os outros como se fosse dever deles ajudá-lo e como se ninguém pudesse esperar dele uma resposta caso o auxílio que aguardava não chegasse"
Por que Gregor estava condenado a servir numa firma em que à mínima omissão se levantava logo a máxima suspeita?
Que profissão cansativa eu escolhi. Entra dia, sai dia – viajando. A excitação comercial é muito maior que na própria sede da firma e além disso me é imposta essa canseira de viajar, a preocupação com a troca de trens, as refeições irregulares e ruins, um convívio humano que muda sempre, jamais perdura, nunca se torna caloroso. O diabo carregue tudo isso!
Certamente não entendiam mais suas palavras, embora para ele elas parecessem claras, mais claras que antes, talvez porque o ouvido havia se acostumado.
Pode-se no momento estar incapacitado para trabalhar, mas essa é a hora certa para se lembrar das realizações passadas e para se pensar que mais tarde, uma vez superados os obstáculos, sem dúvida se vai trabalhar com mais afinco e forças mais concentradas.
Tinham tanta coisa para fazer agora, com as preocupações do momento, que qualquer previsão lhes escapava.
Queria primeiro levantar-se, calmo e sem perturbação, vestir-se e sobretudo tomar o café da manhã, e só depois pensar no resto, pois percebia muito bem que, na cama, não chegaria, com as suas reflexões, a uma conclusão sensata.
Gregor já acreditava ter diante de si a melhora definitiva de todo o sofrimento.
O verdadeiro caminho passa por uma corda que não está esticada no alto, mas logo acima do chão. Parece mais destinada a fazer tropeçar do que a ser percorrida.
Todos os erros humanos são impaciência, uma ruptura precoce do que é metódico, uma aparente implantação daquilo que é aparente.
Como uma trilha no outono: mal foi varrida, cobre-se outra vez de folhas secas.
Neste lugar eu ainda nunca estive: a respiração é diferente e, mais ofuscante que o sol, brilha ao seu lado uma estrela.
Não deixe que o mal o faça acreditar que você poderia guardar segredos diante dele.
Você é a lição de casa. Por todos os lados, nenhum aluno.
Do adversário de verdade flui uma coragem sem limites para dentro de você.
Compreender a felicidade de que o solo sobre o qual você se mantém não pode ser maior que os dois pés que o cobrem.
A partir de certo ponto não há mais retorno. É este o ponto que tem de ser alcançado.
Imagine quantos pensamentos um cobertor sufoca enquanto alguém está deitado sozinho na cama, e quantos sonhos infelizes ele mantém aquecido.
Há momentos em que estou convencido de que sou inadequado para qualquer relacionamento humano.
Quando Gregor Samsa despertou, certa manhã, de um sonho agitado viu que se transformara, durante o sono, numa espécie monstruosa de insecto.
"Muitas vezes ali se deixava estar durante toda a noite, sem dormir a esfregar-se no couro, durante horas a fio. Quando não, reunia a coragem necessária para se entregar ao violento esforço de empurrar uma cadeira de braços para junto da janela, trepava para o peitoril e, arrimando-se à cadeira, encostava-se às vidraças, certamente obedecendo a qualquer reminiscência da sensação de liberdade que sempre experimentava ao ver à janela. De fato, dia após dia, até as coisas que estavam relativamente pouco afastadas se tornavam pouco nítidas; o hospital do outro lado da rua, que antigamente odiava por ter sempre à frente dos olhos, ficava agora bastante para além do seu alcance visual e, se não soubesse que vivia ali, numa rua sossegada, de qualquer maneira, uma rua de cidade, bem poderia julgar que a janela dava para um terreno deserto onde o cinzento do céu e da terra se fundiam indistintamente. Esperta como era, a irmã só precisou ver duas vezes a cadeira junto da janela: a partir de então, sempre que acabava de arrumar o quarto, tornava a colocar a cadeira no mesmo, sítio e até deixava as portadas interiores da janela abertas".
- Eu quero, Franz. Pode escrever uma peça só pra mim.
Era Ottla, a caçulinha, quem falava. Franz pegou-a no colo com muito carinho. Ele amava aquela irmãzinha.
- Então você quer uma peça só pra você? Por que não? Vou escrever uma em que você vai fazer um papel muito bonito.
- De princesa? - perguntou Ottla.
- Não, querida. De sapo.
E todos começaram a rir da cara desapontada que Ottla fez