Hermes Fernandes
QUEM
Quem é capaz de traçar a fronteira entre a lucidez e a loucura?
Quem é capaz de desmascarar a mentira de quem por Deus jura?
Quem é capaz de ser valente sem jamais perder a doçura?
Quem é capaz de ser gentil sem jamais perder a bravura?
Quem é capaz de admitir-se doente antes de buscar a cura?
Quem é capaz de julgar-se a si mesmo com a mesma lisura?
Quem é tolerante com o outro no quem em si mesmo atura?
Quem sabe lidar com a liberdade, sem vertigem, sem tontura?
Quem é capaz de discernir um bem tão puro, sem mistura?
Quem é capaz de enxergar em meio ao caos uma figura?
Quem que pelo belo, bom e justo suporta a mais cruel agrura?
Quem ao encontrar-se no outro dá por encerrada a procura?
Por que choras, Brasil?
Por que choras, meu Brasil?
Pra onde se foi tua alegria?
Diga-me quem que te feriu?
Quem se propôs tal covardia?
Teus próprios filhos, mãe gentil
Outrora unidos em teu regaço
Se digladiam em solo hostil
Paixão que se tornou em laço
A brava gente brasileira
Cedeu ao mais astuto ardil
Terá perdido a estribeira,
sua postura varonil?
Até por cores se disputa
Pois não há rubro em tua bandeira
Se um filho teu não foge a luta
Por que mantê-lo na coleira?
Tingir de rubro suas ruas
Reeditar Caim e Abel
Será que é pelas falcatruas?
Seu sangue clama até o céu!
Eis os grilhões em teu pescoço
Teus inimigos te cortejam
A tua fama de bom moço
Motivo pelo qual festejam
Pode-se ouvir a gargalhada
De quem de camarote assiste
A esperança estraçalhada
De um povo que já não resiste
Ao assédio, aos galanteios
De quem almeja possuir
Os seus sonhos, seus anseios
Suas riquezas, seu porvir
Acorda, oh Brasil, sai deste berço
Que de esplêndido nada tem
Quem te explora tem seu preço
De sua ganância é refém
Sacode os grilhões e as correntes
Sê tudo a que destinado estás
Orgulho dos filhos valentes
À espera do que a alvorada traz
Teu inimigo é quem te atiça a lutar contra teu irmão.
Mas não confessa a cobiça, destila ódio em seu sermão.
Há verdades que são ditas para enganar da mesma maneira que faz uma mentira. Tais verdades nos enganam na medida em que nos distraem de verdades ainda mais importantes.
Há mentiras ditas com intenções sinceras (o que não as justifica!) e há verdades ditas com intenções malignas.
A maioria das mentiras é filha do amor próprio. Geralmente, mente-se para se promover ou para se preservar. A verdade nos liberta de tal sentimento, na medida em que nos remove dos ombros o fardo de ter que provar algo a alguém.
Há raciocínios verdadeiros construídos a partir de premissas falsas. Há raciocínios falsos construídos a partir de premissas verdadeiras. A verdadeira verdade tem que ser verdadeira do início ao fim.
Há verdades sanduíches. Duas fatias de verdade recheadas de mentira. A premissa é verdadeira, a conclusão também, mas o caminho tomado é falacioso.
Assim como a Verdade em Cristo, a mentira também se faz carne quando dissimulamos o que realmente somos ou simulamos ser o que jamais fomos.
Inquietação
Quem nunca sentiu saudade de ter saudade?
Quem jamais sentiu culpa por não se sentir culpado?
E quem não se arrependeu de haver se arrependido?
Quem se orgulhou de não ter do que se orgulhar?
Quem se sentiu vencido por haver vencido?
Quem se envergonhou de se envergonhar?
Quem já se esqueceu de se esquecer?
Quem se viu triste por estar alegre
ou alegre por poder se entristecer?
Quem ignorou o quanto ignorava?
Quem soube que não sabia?
Quem achou que havia achado?
Quem desistiu de desistir?
Quem não desejou desejar?
Quem não odiou odiar?
Quem não amou amar?
Adoraria perceber que os cristãos valorizam tanto os ensinos de Jesus quanto valorizam Sua Pessoa e Sua obra salvífica. Tenho dificuldade em admitir que Ele é Salvador e Senhor de quem não seja também Mestre.
Não há intimidade sem liberdade, nem liberdade sem confiança, nem confiança sem conquista, nem conquista sem amor.
O beija-flor é atraído pelo perfume das flores. O abutre pelo fedor da carniça. Quando vemos urubus sobrevoando um terreno, o que podemos esperar encontrar lá?
SEM PERDER A DOÇURA
Não me deixe perder a doçura
Não se apague de mim tal centelha
Que a raiz de qualquer amargura
Nem me faça franzir a sobrancelha
Não me deixe enganar por quem jura
Mas esconde de mim o ferrão
Se deixar de fazer o meu mel
Sobra tempo para até ser cruel
Não me deixe perder a postura
Quem protege a colmeia é o zangão
Que com toda a sua bravura
Sua melhor ideia é ação
Só reflexo, sem reflexão
Tão complexo feito um bufão
Como o alfa de uma alcateia
Sua vida é guardar a colmeia
Mas colmeia existe pra quê?
Senão pra oferecer o seu mel
Inundar o paladar de prazer
Adoçar até lábios de réu
Eu não passo de uma abelha
Pelo néctar sempre à procura
Na doçura da flor se espelha
Para nunca perder a ternura
Sem colmeia se vive ao léu
Ao sabor de qualquer aventura
Liberdade é feito um troféu
Só pra quem tem jogo de cintura
"Espero poder ajudar a levantar os mil que caírem ao meu lado, e os dez mil prostrados à minha direita. Somente isso justificaria o fato de não haver sido atingido."
O GRITO DOS BRAVOS
Onde se testou nossa bravura?
Onde se esgotou a vã doçura?
Onde se expôs tanta loucura
Capaz de destilar tão vil agrura?
Não, não foi nos campos de batalha
Onde o ódio se esvai, fogo de palha
Como nos tornamos desumanos?
Tão sagrados, tão profanos.
Tão sensatos, tão insanos.
D’onde vêm os gemidos que ouço?
Ecos vindos de um frio calabouço
Nada excede a frieza e a feiura
De quem covarde aos seus dedura
Que beleza pode haver na captura?
Na verdade extraída sem lisura?
Requintes de crueldade
Obsoleto – 28/4/2016
Lá vou eu, sem despedidas
Arrastando-me, numa marcha que descarta
Galopes de quem tem pressa de chegar
Ateu de deuses homicidas
Resta-me esta graça que me farta
Trafego a estrada que me aparta
Ao sabor do que o destino reservar
Corajoso, do chão me afasto, me articulo
Ajusto o foco ou me anulo
Só vejo tudo se inverter
Urgência aqui é algo nulo
Lamento o quanto me estimulo
O sol parece não vencer
Beirando a morte, ninguém sequer se intrometa
Obcecado por uma vida obsoleta
Retiro-me a fim de me metamorfosear
Bocejando enquanto rompo a mureta
Olhando firme a silhueta
Lampejo de um novo mundo a explorar
Estreio um novo ser sem etiqueta
Tal qual, meu sonho é só gorjeta
Abro as asas para da liberdade desfrutar
Gemidos da criação
A terra treme
Os mares rugem
Nossos tesouros viraram ferrugem
De nossa cidade restaram escombros
Nossa coragem tornou-se assombro
Os ventos são Seus mensageiros
anunciando “tudo é passageiro”
Desta mudança, o que virá?
Nossa lembrança, como apagar?
Não é o fim dos tempos
Como alguém sugere
Seus pensamentos não há quem altere
A natureza está gestante
A hora do parto virá num instante
Tragédias são as contrações
a despertarem os corações
Em sua defesa quem clamará?
e com gentileza a conduzirá?
Os seus gemidos se intensificam
nossos anseios se multiplicam
Afinal… o que será?
Nosso futuro não será abortado
Todo este mundo será restaurado
Estou seguro, Deus não volta atrás
Em um segundo, Ele pode, Ele faz
Mas Ele conta com aquele que crê
que em meio a tragédia é capaz de ver
Disposto a trabalhar
sem duvidar
que o Renovo virá
e não tardará
o Renovo virá
Não tardará
O Supremo Obstetra
o parto fará
Novo céu, nova terra
à luz trará
O Amor entre os povos
triunfará
A Justiça do Reino
se implantará