Guimarães Rosa

51 - 75 do total de 304 pensamentos de Guimarães Rosa

Sorte é isto. Merecer e ter.

Os outros têm uma espécie de cachorro farejador, dentro de cada um, eles mesmos não sabem. Isso feito um cachorro, que eles têm dentro deles, é que fareja, todo o tempo, se a gente por dentro da gente está mole, está sujo ou está ruim, ou errado... As pessoas, mesmas, não sabem. Mas, então, elas ficam assim com uma precisão de judiar com a gente...

O calor do dia abrandava. Naqueles olhos e tanto de Diadorim, o verde mudava sempre, como a água de todos os rios em seus lugares ensombrados. Aquele verde, arenoso, mas tão moço, tinha muita velhice, muita velhice, querendo me contar coisas que a idéia da gente não dá para se entender - e acho que é por isso que a gente morre. De Diadorim ter vindo, e ficar esbarrado ali, esperando meu acordar e me vendo meu dormir, era engraçado, era para se dar a feliz risada. Não dei. Nem pude nem quis. Apanhei foi o silêncio dum sentimento, feito um decreto:
- Que você em sua vida toda toda por diante, tem de ficar para mim, Riobaldo, pegado em mim, sempre!... - que era como se Diadorim estivesse dizendo.

"Mãe, o que é que é o mar, Mãe?" Mar era longe, muito longe dali, espécie duma lagoa enorme, um mundo d´água sem fim, Mãe mesma nunca tinha avistado o mar, suspirava. "Pois, Mãe, então mar é o que a gente tem saudade?"

O amor? Pássaro que põe ovos de ferro.

Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

Todas as coisas surgidas do opaco.

Talvez não devesse, não fosse direito ter por causa dele aquele doer, que põe e punge, de dó, desgosto e desengano.

Representar é aprender a viver além dos levianos sentimentos, na verdadeira dignidade.

Na própria precisão com que outras passagens lembradas se oferecem, de entre impressões confusas, talvez se agite a maligna astúcia da porção escura de nós mesmos, que tenta incompreensivelmente enganar-nos, ou, pelo menos, retardar que prescrutemos qualquer verdade.

(Nenhum, nenhuma)

Guimarães Rosa
Primeiras estórias

O passado é que veio até mim, como uma nuvem, vem para ser reconhecido; apenas não estou sabendo decifrá-lo.

A gente cresce sempre, sem saber para onde.

(Nenhum, nenhuma)

Guimarães Rosa
Primeiras estórias

No que vagueia os olhos, contudo, surpreende-se-lhe o imanecer da bem-aventura, transordinária benignidade, o bom fantástico.

Inútil fugir, inútil resistir, inútil tudo.

Guimarães Rosa
Primeiras estórias

As coisas mudam no devagar depressa dos tempos.

Há uma hora certa,
no meio da noite, uma hora morta,
em que a água dorme.

Todas as águas dormem:
no rio, na lagoa,
no açude, no brejão, nos olhos d'água,
nos grotões fundos
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir...

Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.

O orvalho sonha
nas placas da folhagem
e adormece.
Até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes...

Mas nem todas dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono...

As coisas assim a gente não perde nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas.

Viver para odiar uma pessoa é o mesmo que passar uma vida inteira dedicado à ela.

Penso que chega um momento na vida da gente, em que o único dever é lutar ferozmente por introduzir, no tempo de cada dia, o máximo de "eternidade".

Guimarães Rosa

Nota: 24 Cartas de João Guimarães Rosa a Antonio Azeredo da Silveira.

Eu sou é eu mesmo. Divirjo de todo o mundo…
Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.

Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.

Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

No mais, mesmo, da mesmice, sempre vem a novidade.

Cada um rema sozinho uma canoa que navega um rio diferente, mesmo parecendo que esta pertinho.

As pessoas não morrem, ficam encantadas!

Guimarães Rosa

Nota: Trecho do discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 16 de novembro de 1967.

Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.

O medo é a extrema ignorância em momento muito agudo.