Giovanni Papini

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O homem deseja e odeia a verdade. Quer mentir aos outros - quer que o enganem (prefere a ficção à realidade), mas por outro lado receia o engano, quer o fundo das coisas, o verdadeiro verdadeiro, etc.
Somente a razão conduz à verdade. Mas só os fanáticos, os visionários e os iluminados fazem as coisas grandiosas, mudanças, descobertas. A verdade, de tanto se tornar necessária, conduz à secura, à dúvida, à inércia - à morte.
É muito natual que os homens odeiem aqueles que dizem ou tentam dizer a verdade. A verdade é triste (dizia Renan) - mas, com maior frequência, é horrível, temível, anti-social. Destrói as ilusões, os afectos. Os homens defendem-se como podem. Isto é, defendem a sua pequena vida, apenas suportável à força de compromissos, de embustes, de ficções, etc. Não querem sofrer, não querem ser heróis. Rejeição do heroísmo-mentira.

O Triunfo dos ImbecisNão nos deve surpreender que, a maior parte das vezes, os imbecis triunfem mais no mundo do que os grandes talentos. Enquanto estes têm por vezes de lutar contra si próprios e, como se isso não bastasse, contra todos os medíocres que detestam toda e qualquer forma de superioridade, o imbecil, onde quer que vá, encontra-se entre os seus pares, entre companheiros e irmãos e é, por espírito de corpo instintivo, ajudado e protegido. O estúpido só profere pensamentos vulgares de forma comum, pelo que é imediatamente entendido e aprovado por todos, ao passo que o génio tem o vício terível de se contrapor às opiniões dominantes e querer subverter, juntamente com o pensamento, a vida da maioria dos outros.
Isto explica por que as obras escritas e realizadas pelos imbecis são tão abundante e solicitamente louvadas - os juízes são, quase na totalidade, do mesmo nível e dos mesmos gostos, pelo que aprovam com entusiasmo as ideias e paixões medíocres, expressas por alguém um pouco menos medíocre do que eles.
Este favor quase universal que acolhe os frutos da imbecilidade instruída e temerária aumenta a sua já copiosa felicidade. A obra do grande, ao invés, só pode ser entendida e admirada pelos seus pares, que são, em todas as gerações, muito poucos, e apenas com o tempo esses poucos conseguem impô-la à apreciação idiota e ovina da maioria. A maior vitória dos néscios consiste em obrigar, com certa frequência, os sábios a actuar e falar deles, quer para levar uma vida mais calma, quer para a salvar nos dias da epidemia aguda da loucura universal.

O valor dos invejosos

“Aqueles que são invejados entristecem-se com o rancor que sentem à sua volta; se são orgulhosos, por receio de algum prejuízo; se generosos, por compaixão dos que invejam. Mas depressa se alegram: se me invejam, isso quer dizer que tenho um valor, dos méritos, das graças; quer dizer que sentem e reconhecem a minha grandeza, o meu triunfo. A inveja é a sombra obrigatória do gênio e da glória, e os invejosos não passam, de forma odiosa, de admiradores rebeldes e testemunhas involuntárias. Não custa muito perdoar-lhes, quando existe o direito de me comprazer e desprezá-los. Posso mesmo estar-lhes, com frequência, gratos pelo fato de o veneno da inveja ser, para os indolentes, um vinho generoso que confere novo vigor para novas obras e novas conquistas. A melhor vingança contra aqueles que me pretendem rebaixar consiste em ensaiar um voo para um cume mais elevado. E talvez não subisse tanto sem o impulso de quem me queria por terra.
O indivíduo verdadeiramente sagaz faz mais: serve-se da própria difamação para retocar melhor o seu retrato e suprimir as sombras que lhe afetam a luz. O invejoso torna-se, sem querer, o colaborador da sua perfeição.”

Giovanni Papini, in Relatório Sobre os Homens

Todos os homens se imaginam no bem, no passado ou no futuro. Todos os homens se esquecem dos verdadeiros fins e fazem dos meios os seus objetivos. Para onde quer que os homens se voltem, encontram o impossível. Todos os homens se julgam mais que os outros. Não basta aos homens possuir um bem, se não for maior que o do próximo.
Papini (o que pensam os homens)

Inserida por EmOutrasPalavras

Os homens nunca revelam os verdadeiros objetivos pelos quais atuam. Intimamente, exageram os motivos baixos, materiais; publicamente, anunciam os motivos nobres, espirituais. Mentem em ambos os casos. Os homens não conhecem os outros nem a si próprios. A maior parte dos homens vive de instinto, hábito e imitação, animalmente - por vezes, com intermédios de felicidade...

de "Os reais motivos"

Inserida por DavidFrancisco

Fábrica governativa, de constante rotação, que produz advogados, médicos, farmacêuticos, engenheiros, professores. Esses animais domésticos, após devidamente envernizados de sapiência oficial, são registrados e selados e, em seguida, entregues à pátria, a qual (infeliz!), por sua vez, se entrega a eles.

Inserida por DavidFrancisco

Em um ponto o ódio é mais inteligente que o amor: o ódio é capaz de ver o lado bom da pessoa odiada, e o amor é incapaz de ver o lado mau da pessoa amada.

Inserida por DavidFrancisco

Muitos pescadores de anzol não são mais que filóso­fos, disfarçados assim para passarem inadvertidos entre os imbecis.

Inserida por DavidFrancisco

Todo ser humano gostaria de ser o primeiro entre seus iguais: ser superior, de um modo ou de outro, aos que o rodeiam. Quer dominar, mandar, parecer maior e mais rico, mais bonito e mais sábio... A história do gênero humano é pouco mais que o pavor da inferioridade."

Inserida por DavidFrancisco

O destino não reina sem a cumplicidade secreta do instinto e da vontade.

Inserida por AdagioseAforismos

Entre as definições da ilha planetária em que nos encontramos desterrados, uma das mais apropriadas seria: uma grande sala de espera. Uma terça parte da vida é anulada numa semi-morte, outra gasta em fazer mal a nós mesmos e aos outros e a última esboroa-se e consome-se na expectativa. Esperamos sempre alguma coisa ou alguém - que vem ou não, que passa ou desilude, que satisfaz ou mata.

Inserida por DavidFrancisco

A EXPECTATIVA:

Começa-se, em criança, a esperar a juventude com impaciência quase alucinada; depois, quando adolescente, espera-se a independência, a fortuna ou porventura apenas um emprego e uma esposa. Os filhos esperam a morte dos pais, os enfermos a cura, os soldados a passagem à disponibilidade, os professores as férias, os universitários a formatura, as raparigas um marido, os velhos o fim. Quem entrar numa prisão verificará que todos os reclusos contam os dias que os separam da liberdade; numa escola, numa fábrica ou num escritório, só encontrará criaturas que esperam, contando as horas, o momento da saída e da fuga. E em toda a parte - nos parques públicos, nos cafés, nas salas - há o homem que espera uma mulher ou a mulher que espera um homem. Exames, concursos, noivados, loterias, seminários, operações da Bolsa - são formas e causas de expectativa.
(...) Todos, com diferentes paixões, esperam - sobretudo, as fortunas repentinas, as mudanças imprevistas, o insólito e, com frequência, o impossível.

Inserida por DavidFrancisco

O SUPORTE DA EXPECTATIVA E O SABOR DE DERROTA DA VITÓRIA:

A imaginação trabalha, a fantasia floresce, a paciência suporta, a visão beatífica da hora de contemplação preenche as longas horas da vigília. Quando acontece ou se alcança o esperado, abrem-se todas as comportas da alegria. Mas por pouco tempo, pois a meta não é tão atraente como parecia de longe, ao longo do caminho - toda a vitória, no dia imediato, tem o mesmo sabor da derrota.
Ou então surge demasiado tarde, quando o espírito se modificou e já não dispõe de forças para saborear o bem esperado durante tanto tempo; a mulher perfeita que se oferece, finalmente, quando o jovem ardente se tornou um velho saciado, árido ou flácido. Todo o seu amor se consumou debaixo das janelas, no frio das noites infinitas - quando é lançada a escada, as pernas e os braços não obedecem ou o inflamado partiu.

Inserida por DavidFrancisco

EMBALADOS PELA EXPECTATIVA ESQUECEMOS DE VIVER O PRESENTE:

Mas a desilusão, em vez de conduzir à renúncia, incita a novas expectativas. (...) E toda a vida do homem, apesar de todos os adiamentos e paragens, não passa de um esperar a vida, a bela vida, a verdadeira, a nossa. Todo o presente e o possuído afigura-se-nos apenas um adiantamento para a nossa fome ou um mau prefácio de um livro maravilhoso. E, enquanto esperamos a vida, esquecemo-nos de viver ou vivemos sem economia e prudência, não pensando em destilar dos minutos de hoje, única propriedade certa, todo o sabor e substância.

Inserida por DavidFrancisco

VENDA DA ALMA E VENDA DO CORPO

[A prostituição é muito mais ampla do que costumamos a imaginar]
Não só as mulheres que casam sem amor, mas apenas por conveniência; não só as esposas que continuam a comer o pão daquele que já não amam e enganam; não só as mulheres se prostituem. É prostituto o escritor que coloca a pena ao serviço das ideias em que não crê; o advogado que defende causas que reconhece injustas; quem finge a adesão aos mitos e interesses dos poderosos para obter recompensas materiais e morais; o ator e o bobo que se expõem diante dos idiotas pagantes para arrecadar aplausos e dinheiro; o poeta que abre aos estranhos os segredos da sua alma, amores e melancolias, para obter em compensação um pouco de fama, de dinheiro ou de compaixão; e, acima de tudo, é prostituto o político, o demagogo, o tribuno que a todos devem acariciar, seduzir, a todos promete favores e felicidade e a todos se entrega por amor à popularidade - justamente chamado homem público, quase irmão de toda a mulher pública.

Mas quem de entre nós, pelo menos um dia da sua vida, não simulou um sentimento que não tinha e um entusiasmo que não sentia e repetiu uma opinião falsa para obter compensações, cumplicidades, sorrisos ou benefícios? Quem dá uma parte de si por vantagens pessoais prostitui-se como a mulher que atribui um preço à sua docilidade. Mas a prostituição da alma praticada pelos homens é mais ignominiosa do que a do corpo, e mais irremissível.

"Relatório Sobre os Homens"

Inserida por OswaldoWendell

Mas quem de entre nós, pelo menos um dia da sua vida, não simulou um sentimento que não tinha e um entusiasmo que não sentia e repetiu uma opinião falsa para obter compensações, cumplicidades, sorrisos ou benefícios? Quem dá uma parte de si por vantagens pessoais prostitui-se como a mulher que atribui um preço à sua docilidade. Mas a prostituição da alma praticada pelos homens é mais ignominiosa do que a do corpo, e mais irremissível.

"Relatório Sobre os Homens"

Inserida por OswaldoWendell

... cada um de nós é, a seu modo, um capitalista.
Além dos proprietários de terras, de mercadorias, de máquinas e de dinheiro, existem, ainda mais numerosos, os proprietários de capitais pessoais, que se podem alugar, vender ou fazer frutificar como os outros. São os proprietários e locadores de força física - camponeses, operários, soldados - e proprietários e prestadores de forças intelectuais - médicos, engenheiros, professores, escritores, burocratas, artistas, cientistas. Quem aluga os seus músculos, o seu saber ou o seu engenho obtém um rendimento, que pressupõe um patrimônio.
(Relatório sobre os homens)

Inserida por OswaldoWendell

Um demagogo ou um dirigente de partido pode viver pobremente, mas se milhões de homens estão dispostos a obedecer a uma palavra sua, é, na realidade, um capitalista, que, em vez de possuir milhões de liras, possui milhões de vontades.

(Relatório sobre os homens)

Inserida por OswaldoWendell

O talento visual de um pintor, a eloquência de um advogado, o espírito inventivo de um mecânico são verdadeiros capitais e medem-se pelo preço que deve pagar, para obter os seus produtos, quem não os possui e carece deles. E não existe ninguém, a menos que seja paralítico ou néscio, que não possua uma porção de capitais da segunda espécie, ainda que seja a sua capacidade de trabalho físico, vendível, como qualquer outro bem, com um contrato verdadeiro e apropriado.
(Relatório sobre os homens)

Inserida por OswaldoWendell

Um proprietário de terras, mesmo que possua meio país, é como se não tivesse nada, se não encontra camponeses que façam frutificar os seus latifúndios; o grande fabricante tem de vender como sucata as suas excelentes máquinas, se não conta com operários que as façam funcionar e produzir lucros; o político está às ordens do especulador, mas este não poderá efetuar os seus negócios, se não dominar, por meio daquele, a opinião pública e o Estado; e se médicos, advogados e professores não poderiam viver sem doentes, culpados e ignorantes, é igualmente verdade que os segundos, em determinados momentos, não podem prescindir dos primeiros. Até o aleijado, o cego e o leproso obtêm um certo rendimento das suas muletas, da sua escuridão e das suas chagas. Por conseguinte, aqueles a que os instigadores da plebe chamam «possuidores de nada», «destituídos» ou «deserdados» não existem.
(Relatório sobre os homens)

Inserida por OswaldoWendell

Desde que Adão resolveu imitar Eva e mordeu o fruto, somos, a despeito da nossa ilusão em contrário, uma sucessão infinita de cópias. Um único cunho - em regra, chamado gênio - basta para imprimir milhares e milhares daquelas moedas vulgares que circulam pela Terra. E o gênio nem sempre se liberta da servidão universal da imitação. Toda a vida é um mosaico de plágios.

Inserida por EmOutrasPalavras

Toda a vida é um mosaico de plágios.
A maioria imita por preguiça, para se poupar o trabalho de procurar e inventar, ou por prudência, que aconselha os caminhos percorridos e as experiências coroadas de êxito.

Se viver é distinguir-se, o orgulhoso deveria providenciar para não se parecer com ninguém. Mas a inveja, sob a sonante designação da emulação, trai-os: os soberbos vêem antes os modelos honrados e celebrados e querem ser celebrados e honrados a par deles, ou mesmo superá-los e desalojá-los, e não se dão conta de que são obrigados, para começar, a colocar os pés nas suas pisadas e no seu caminho.

Inserida por EmOutrasPalavras

Em todas as multidões, como em toda a Humanidade, os medíocres são infinitamente mais que os grandes, os calmos que os violentos, os simples que os profundos, os primitivos que os civilizados, e é a maioria que cria a alma comum que imbrica e nivela todo o agrupamento de homens.

Inserida por EmOutrasPalavras

Mas há em cada um de nós, mesmo no maior, um eu inferior, antiquíssimo, bestial, infantil, esquecido, renegado, oculto, refreado - amortecido, mas não morto. Quando os homens se reúnem, o eu superior anula-se e os inferiores, despertados, reconhecem-se e assumem a supremacia. A multidão é niveladora e gosta de decapitar, ainda que metaforicamente. Já não são intelectos ou sentimentos que contrastam, mas instintos elementares que combatem.

Inserida por EmOutrasPalavras