Um Estranho Impar Poesia
PREMONIÇÃO
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Em um dia de meio dia,
meus olhos, somente os olhos,
tiveram uma visão.
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Lembro-me que a luz me doía
como uma ponta de sabre
no corpo do coração.
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Lembro-me, sem muito assombro,
que tudo quedava incompleto,
como se as luzes buscassem em vão
o preenchimento das coisas.
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Na sintonia das imagens
dissecavam-se as paisagens
sem mistificação:
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Não obstante o colorido,
ficavam os homens repartidos
como se feitos de pão.
A uns: o ouro e a prata;
a outros: a fome e a crença;
a esses: a esperança;
para aqueles: quitutes em lata.
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Tanto sol doía
nos ombros da nação
(talvez não houvesse justiça
em sua distribuição).
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E talvez por ser evidente,
ficavam doídas e claras
as sombras dos coqueiros.
Ali, onde outrora era verde
espreitam crianças no desamparo.
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Desamparadas, porém livres,
querem construir a nação
– mas faltam-lhe os instrumentos:
os braços, e as mãos...
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Igualmente iluminados,
os andarilhos nas estradas:
pés descalços, chapéus de palha,
– ou capacetes e mãos de graxa –.
Todos, embora cansados,
querendo correr o chão.
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Mas falta-lhes segmento:
as pernas da multidão.
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Arre!
Tanto sol
arde como uma tarde
de Verão...
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BARROS, José D'Assunção. Publicado na revista Insurgências, 2024]
O ANJO
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Enquanto bebia seus drinques, um antes do outro,
começaram a lhe crescer asas cada vez maiores:
bem desenhadas, cheirosas... brancas e polidas.
O sorriso verteu-se puro, sincero, acolhedor.
Falava agora a deliciosa língua dos anjos
com suas palavras estranhas e belas
a soar qual música nos ouvintes
e a reluzir como imagens
no pleno espaço.
Puro êxtase
profano
e sacro
de quem via.
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As cores do paraíso a ele se abriram, como se misturadas em um crisol.
A inteligência, não mais em greve, discorria sobre todos os arranjos:
cinema, viagens, lares e lugares... filosofia, arte, sabores e amores.
Com a luz que de si emana... contava piadas de cair o siso!
Iluminava, fundo e profundo, as jovens rosas no gineceu...
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Até que a noite, por fim, se pôs... cedendo caminho ao sol.
O sono chegou leve, pois Deus viera buscar seus anjos
espalhados pelos bares, festas e casas de flores...
Fechou cada pestana, junto ao sutil sorriso.
Depois, na paz do mundo, adormeceu.
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Na tarde seguinte, ao despertar,
as asas tinham regredido.
Transfiguraram-se
em uma ressaca
confusa e cinza.
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BARROS, José D'Assunção. Publicado na revista Ipotesi, 2023]
O QUE APRENDI SOBRE O AMOR
Aprendi sobre um amor oculto, violento, persuasivo, escondido, que eu torcia para que o outro decidisse porquê, quando, como e quanto tempo duraria.
Aprendi sobre um amor errado, que deveria ser encaixado, para ser aceito e valorizado para que eu não ficasse desolado e parecesse cometer um pecado.
Aprendi sobre um amor passageiro, que se não fosse alimentado por dopamina, estética, submissão e dinheiro, seria um amor derradeiro ou feito de roteiro.
Aprendi sobre um amor raro, que eu devia agradecer pelo amparo, mesmo que no fundo não me entendia, mas que diante de tantos temores era muito mais do que merecia.
Aprendi sobre um amor ficção, que só na imaginação deveria me bastar, já que os traumas me tornariam insensível, como um bisturi capaz de cortar e cicatrizar sem deixar sangrar.
Aprendi sobre um amor verdadeiro, que eu desconhecia dentro de mim, mas que protegi por não me conformar com o amor em pedaços e crer merecer o amor inteiro.
Inquieta, eu, poeta, paro e penso.
Às vezes, preciso beber um gole
denso de silêncio.
Tomar um porre fluido de nevoeiro,
Um cálice poético evidente.
Poder inspirar pela tangente,
Preciso me embrenhar,
Gritar, silêncio...
Silêncio...
MEDO DE TIGRE-ARANHA
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Tinha um medo crônico de tigres.
Podia ser até mesmo dos que estão nos filmes
enjaulados dentro de uma intransponível tela de Cinema
e incapazes de saltar para a nossa dimensão.
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Se vislumbrava um cartaz de propaganda
estampado com uma só destas feras,
ali mesmo deixava litros de medo
escorrerem por entre as pernas.
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O medo de tigres fora o companheiro
de toda a sua vida.
Desde a mais tenra infância
chorava ao ver desenhos de tigrinhos
nos pijamas e invólucros de refrigerantes.
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Isso tudo, apesar
de não haver tigres em seu continente,
e de sua pequena cidade jamais ter sido visitada
nem mesmo por um velho tigre desdentado,
protegido pela jaula de um circo.
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Tigres...
Esse pânico o acompanhou sempre
a cada dia, a cada instante de sua vida.
Foi a psicólogos caros, mas sem resultados.
Lá estavam, no fundo, sempre os mesmos tigres...
Espreitando, ferozes e listrados, no covil do inconsciente.
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[BARROS, José D’Assunção. Publicado na revista Simbiótica, 2023]
Se um dia eu alcançar a perfeição de algo que faço, logo,
deixarei de fazer.
Alcançar o limite,
lhe cria um teto;
limita o homem.
E não quero nada que impeça de chover sob minha cabeça.
Fabulosamente eu desejo
Um dia dizer para você que
Te quero do tamanho do Universo,
Um dia isso irá acontecer quando
Reunidos estivermos apaixonados,
Orgulhosos e nos mesmos passos.
Pelas corredeiras do rio
de fogo do seu silêncio,
Ofereço um Aaru
feito pelos cocozus,
E o meu amoroso
bom humor porque se é
para ser os próximos
movimentos serão seus
porque o coração já tens
e todos os poemas meus.
Folhas verdes de Bananeira
para te mimar com um
bem feito e carinhoso Abalá,
E algo que continuo
desejando o tempo todo,
Tudo meu em ti
só tende a aumentar,
Quando estivermos juntos
é o amor que por nós irá falar.
Carta para a ''Garota de bom gosto''
Entre os três acordes que aprendi
Encontrei um conforto maligno
Que aquele pouco já bastava
E mesmo com esse aconchego
Tenho o desejo
De não sentir essa angústia
A distância que me separa da "garota de bom gosto"
Que em seu repertório de memórias
Esteja pelo menos a minha voz
Para que ela me reconheça
Sem nem ter visto essa figura que sou
E nesse dia talvez
Eu tenha nos dedos aqueles versos que tanto...
Ama.
A liberdade não é apenas um conceito;
é um espaço que deve ser vivido,
e em Moçambique, ainda estamos a lutar por ela, nas ruas, nos bairros e nos silêncios das casas.
Mas quantos ainda terão de perder a voz
para que a justiça nos alcance? Quantos pescoços serão de ser apertados para que a Justiça nos alcance? E quantas velas serão de ser apagadas para que a justiça nos alcance?
07/10
Perder é um medo que não tenho
Escolhi ter asas e anseio
Rebeldia e brio
Dona do meu nariz
E do meu destino
Rio até mesmo do perigo
Não existe um só
dia que não faça
uma linda viagem
pela estrada
com o rádio ligado
e ouvindo a música
do coração que tocado
foi pela tua intenção.
Ganhei uma urupema
para fazer um Acaçá
com todo o amor
que existe e existirá,
Agora só falta mesmo
para ficar perfeito
alguém vir para cá,
Tudo em mim está
acontecendo do jeito
igual que contigo está.
Todo mundo se esquece
que antes da saideira
tem sempre a abrideira,
Um alguém há de
amar uma vez na vida
queira ou não queira
(Poema da sexta-feira)
Tudo depende do momento
que se escreve um poema
que pode ser de paz
ou virar um Acangapema,
O quê importa é o quê
se deseja ser capaz.
(O restante o tempo faz)
Colocaste um Acangatara
em mim e os teus olhos
dentro dos meus olhos,
Assim inteiro passaste
a morar nos meus sonhos.
Te emprestar o sono
como se fosse um
inquieto Acutipuru,
Porque ainda tens
tudo de levado curumim,
Nasci para você
e nasceste para mim.
Mais do que palavras soltas sãos os versos vivos de um poema feito com amor e as frases sentidas de uma linda música cantada com a alma como o que é falado nas páginas de um bom livro, um "Eu te amo" que não é dito apenas da boca para fora sem nenhum tipo de compromisso.
Assim, a poesia e o canto são duas formas de arte que se correspondem facilmente, ambas demonstram uma melodia que passa fortes emoções, verdades do íntimo, as intensidades de corações, a rara profundidade de uma sensibilidade incrível baseada em memoráveis ocasiões.
Das mais simples até as mais grandiosas, sejam pessoais ou alheias, um sincero desabafo, um sábio conselho, momentos vividos ou muito desejados, fruto de alguns receios, de algo que é melhor ser evitado, uma similaridade notória de muita expressividade, lindo resultado.
Notas e trechos reunidos por uma bela dança, uma voz que ecoa, que recita, quando podem dançar livremente no ritmo emocionado da vida, dos sentimentos recíprocos, uma relação genuína, inconfundível, felizarda à semelhança dos atos de afetos correspondidos, mais do que palavras.
hoje vou cometer um crime
quando estiver sozinha no meu quarto
mas será um bom crime
que não prejudicará ninguém
e você
já que não lava roupa
mas lava dinheiro
não estará aqui pra saber
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