Frases de poesia: 100 trechos inesquecíveis de 20 grandes poetas brasileiros

Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes

Selecionamos para vocês 100 trechos de poemas de 20 grandes poetas do Brasil.

1. Vinicius de Moraes

Tomara Que a tristeza te convença Que a saudade não compensa

Vinicius de Moraes (1913 — 1980) foi um poeta, cantor, compositor e dramaturgo carioca que também desempenhou as funções de diplomata e jornalista. Conhecido, carinhosamente, como "poetinha", se destacou principalmente no campo da poesia. As suas composições de amor continuam inspirando casais apaixonados de todas as idades.

Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz

Vinicius de Moraes

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Vinicius de Moraes

Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai que bom que isso é meu Deus
Que frio que me dá o encontro desse olhar

Vinicius de Moraes

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

Vinicius de Moraes

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Vinicius de Moraes

2. Cora Coralina

Entre pedras que me esmagavam Levantei a pedra rude dos meus versos.

Anna Peixoto Bretas (1889 — 1985), conhecida pelo pseudônimo Cora Coralina, é apontada como uma das maiores escritoras nacionais de todos os tempos. Embora escrevesse desde a juventude, a autora trabalhava como doceira e apenas começou a publicar depois dos 70 anos de idade. Sua obra poética se foca no cotidiano do interior brasileiro, sobretudo Goiás.

Quebrando pedras
E plantando flores
Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude dos meus versos.

Cora Coralina

Quis ser um dia, jardineira
de um coração.
Sachei, mondei - nada colhi.
Nasceram espinhos
e nos espinhos me feri.

Cora Coralina

Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

Cora Coralina

Não morre aquele
que deixou na terra
a melodia de seu cântico
na música de seus versos.

Cora Coralina

o verso;
o tão famoso e inesperado verso que
te deixará pasmo, surpreso, perplexo...
eu te amo, perdoa-me, eu te amo...

Cora Coralina

3. Carlos Drummond de Andrade

Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar?

Carlos Drummond de Andrade (1902 — 1987) é considerado o maior poeta nacional do século XX. Autor de obras de contos e crônicas, se destacou na poesia, integrando a segunda fase do Modernismo brasileiro. Suas composições refletem sobre questões sociais e emoções humanas, pensam o lugar do indivíduo no mundo, e se mantêm atuais com o passar dos anos.

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Carlos Drummond de Andrade

Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.

Carlos Drummond de Andrade

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Carlos Drummond de Andrade

Amor é bicho instruído.
Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem,
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.

Carlos Drummond de Andrade

4. Manuel Bandeira

Beijo pouco, falo menos ainda. Mas invento palavras Que traduzem a ternura mais funda

Manuel Bandeira (1886 — 1968) foi um poeta, crítico literário, tradutor e professor brasileiro que integrou a primeira fase do Modernismo nacional, que começou com a Semana de Arte Moderna de 1922. A sua obra é melancólica e quebra as tradições, utilizando formas que eram desvalorizadas até aí, como o "poema-piada".

Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
Que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.

Manuel Bandeira

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Manuel Bandeira

Quero ser feliz
Nas ondas do mar
Quero esquecer tudo
Quero descansar.

Manuel Bandeira

Encerra em ti tua tristeza inteira
E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira...

Manuel Bandeira

5. Castro Alves

Ver nossas vidas quais dois mansos rios, Juntos, juntos perderem-se no oceano

Antônio Frederico de Castro Alves (1847 — 1871) foi um poeta nascido na Bahia, visto como o maior entre os seus contemporâneos. Castro Alves fez parte do movimento romântico brasileiro e ficou conhecido por ser um grande humanitário. Desde a juventude, o autor publicava poesias nas quais denunciava a barbárie da escravidão, se posicionando contra ela.

Ver nossas vidas quais dois mansos rios,
Juntos, juntos perderem-se no oceano,
Beijar teus lábios em delírio insano
Nossas almas unidas, nosso alento,
Confundido também, amante, amado
Como um anjo feliz... que pensamento!?

Castro Alves

Eu já não tenho mais vida!
Tu já não tens mais amor!
Tu só vives para o riso,
eu só vivo para dor.

Castro Alves

Oh! Bendito o que semeia
Livros à mão cheia
E manda o povo pensar!
O livro, caindo n'alma
É germe – que faz a palma,
É chuva – que faz o mar!

Castro Alves

Prendi meus afetos, formosa Pepita...
mas, onde?
No tempo? No espaço? Nas névoas?
Não rias...
Prendi-me num laço de fita!

Castro Alves

Na hora em que a terra dorme
enrolada em frios véus,
eu ouço uma reza enorme
enchendo o abismo dos céus

Castro Alves

6. João Cabral de Melo Neto

Saio de meu poema como quem lava as mãos.

João Cabral de Melo Neto (1920 — 1999) foi um poeta e diplomata brasileiro que nasceu no Recife, considerado um dos maiores nomes da literatura nacional. A sua obra poética é cerebral e marcada pelo rigor estético, com influências bastante diversificadas, como as composições populares e o surrealismo.

Saio de meu poema
como quem lava as mãos.

João Cabral de Melo Neto

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e
minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu
silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

João Cabral de Melo Neto

Mesmo sem querer fala em verso
Quem fala a partir da emoção

João Cabral de Melo Neto

No Sertão a pedra não sabe lecionar,
E se lecionasse, não ensinaria nada;
Lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
Uma pedra de nascença, entranha a alma.

João Cabral de Melo Neto

No fim de um mundo melancólico
os homens lêem jornais.
Homens indiferentes a comer laranjas
que ardem como o sol.

João Cabral de Melo Neto

7. Hilda Hilst

Amar o perecível, o nada, o pó, é sempre despedir-se.

Hilda Hilst (1930 — 2004) foi uma das maiores escritoras brasileiras, com uma vasta produção literária de vários gêneros: poesia, ficção, teatro e crônicas. Encarada pela sociedade do seu tempo como provocadora ou subversiva, é lembrada acima de tudo pelos seus versos apaixonados.

Como te amar, sem nunca merecer?
Amar o perecível,
o nada,
o pó,
é sempre despedir-se.

Hilda Hilst

Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.

Hilda Hilst

Ama-me. Ainda é tempo. Interroga-me.
E eu te direi que nosso tempo é agora.

Hilda Hilst

Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
Se à lucidez dos poucos
Te juntares.

Hilda Hilst

Como se te perdesse nos trens, nas estações
Ou contornando um círculo de águas
Removente ave, assim te somo a mim:
De redes e de anseios inundada.

Hilda Hilst

8. Paulo Leminski

não discuto com o destino o que pintar eu assino

Paulo Leminski (1944 — 1989) foi um escritor, tradutor e crítico literário de Curitiba que escreveu obras de poesia e de prosa. A sua poesia se destacou pelas formas curtas, os jogos de palavras e a subversão de ditados populares, entre outras características. Leminski também era músico e letrista, tendo incorporado influências da MPB nos seus versos.

não discuto
com o destino
o que pintar
eu assino

Paulo Leminski

isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além

Paulo Leminski

o mar o azul o sábado
liguei pro céu
mas dava sempre ocupado

Paulo Leminski

Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante

Paulo Leminski

Sinto muito,
sentir é muito lento.

Paulo Leminski

9. Adélia Prado

Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado (1935) é uma escritora, filósofa e professora brasileira que publica obras de contos e poemas. Uma das autoras mais famosas da literatura nacional, Prado fez parte do movimento modernista e contribuiu para a valorização e a propagação das narrativas femininas na nossa cultura.

Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado

A vida é muito bonita,
basta um beijo
e a delicada engrenagem movimenta-se,
uma necessidade cósmica nos protege.

Adélia Prado

Fui dormir umas vezes tão feliz, que, se
soubesse minha força, levitava.
Em outras, tanta foi a tristeza que fiz versos

Adélia Prado

Súbito é bom ter um corpo pra rir
e sacudir a cabeça. A vida é mais tempo
alegre do que triste. Melhor é ser.

Adélia Prado

Não quero faca, nem queijo. Quero a fome.

Adélia Prado

10. Cecília Meireles

Tenho fases de ser tua, tenho outras de ser sozinha.

Cecília Meireles (1901 – 9 de novembro de 1964) foi uma poetisa, professora e jornalista carioca. A sua obra poética é intimista, atravessada por reflexões profundas sobre temas como a solidão, a efemeridade da vida e a identidade. A autora ficou conhecida, contudo, pelos seus poemas escritos para o público infantil que continuam apaixonando adultos e crianças.

Tenho fases, como a lua.
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Cecília Mereles

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Cecília Meireles

Aprendi com as primaveras a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira.

Cecília Meireles

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Cecília Meireles

A vida só é possível
reinventada.

Cecília Meireles

11. Manoel de Barros

Ser menino aos trinta anos, que desgraça Nesta borda de mar de Botafogo!

Manoel de Barros (1916 — 2014) foi um poeta nascido em Cuiabá que integrou o pós-modernismo brasileiro. Considerado pelo próprio Drummond "o maior poeta brasileiro vivo" (na época), Manoel escrevia composições focadas na natureza e nos sentidos, marcada por uma linguagem próxima da oralidade.

Ser menino aos trinta anos, que desgraça
Nesta borda de mar de Botafogo!
Que vontade de chorar pelos mendigos!
Que vontade de voltar para a fazenda!

Manoel de Barros

A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.

Manoel de Barros

Você vai encher os vazios
com as suas peraltagens,
e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos!

Manoel de Barros

Todas as coisas cujos valores podem ser
disputados no cuspe à distância
servem para poesia

Manoel de Barros

Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as
insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado e chorei.
Sou fraco para elogios.

Manoel de Barros

12. Mario Quintana

Todos esses que aí estão Atravancando meu caminho, Eles passarão... Eu passarinho!

Mario Quintana (1906 — 1994) foi um poeta, jornalista e tradutor nascido no Rio Grande do Sul. Conhecido como "o poeta das coisas simples", Quintana escrevia composições com formas populares e linguagem acessível que carregavam grandes questionamentos e sábias lições de vida.

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

Mario Quintana

Não te irrites, por mais que te fizerem
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio.

Mario Quintana

Da vez primeira em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.

Mario Quintana

O mais feroz dos animais domésticos
é o relógio de parede:
conheço um que já devorou
três gerações da minha família.

Mario Quintana

Eu agora — que desfecho!
Já nem penso mais em ti…
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Mario Quintana

13. Ferreira Gullar

Uma parte de mim é todo mundo: outra parte é ninguém: fundo sem fundo.

José Ribamar Ferreira (1930 – 2016), mais conhecido pelo pseudônimo Ferreira Gullar, foi um escritor, crítico de arte e ensaísta nascido em São Luís, Maranhão. Conhecido pela sua militância pelo Partido Comunista Brasileiro, foi exilado na época da ditadura militar. Membro do movimento da poesia concreta, Ferreira Gullar é lembrado pela sua inovação.

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Ferreira Gullar

Como dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
embora o pão seja caro
e a liberdade pequena

Ferreira Gullar

Meu povo e meu poema crescem juntos
como cresce no fruto
a árvore nova

Ferreira Gullar

Sou um homem comum
de carne e de memória
de osso e esquecimento.

Ferreira Gullar

O que passou passou.
Jamais acenderás de novo
o lume
do tempo que apagou.

Ferreira Gullar

14. Ariano Suassuna

meu coração é um Almirante louco Que abandonou a profissão do Mar.  Ariano Suassuna

Ariano Suassuna (1927 — 2014) foi um escritor e professor nascido na Paraíba que escreveu, sobretudo, obras de poesia, romance e teatro, entre outros gêneros literários. Defensor e representante da cultura do Nordeste, Suassuna publicou clássicos dedicados a essa temática, como o Auto da Compadecida (1955).

bebendo o Sol de fogo e o Mundo oco,
meu coração é um Almirante louco
Que abandonou a profissão do Mar.

Ariano Suassuna

Só o teu nome é o que importa!
Todos os outros são erros.
Tu tens a chave da porta
dos sonhos e pesadelos.

Ariano Suassuna

Por isso, não vou nunca envelhecer:
com meu Cantar, supero o Desespero,
sou contra a Morte e nunca hei de morrer.

Ariano Suassuna

Sopra o vento – o Sertão incendiário!
Andam monstros sombrios pela Estrada
e, pela Estrada, entre esses Monstros, ando!

Ariano Suassuna

Ave Musa incandescente
do deserto do Sertão!
Forje, no Sol do meu Sangue,
o Trono do meu clarão:
cante as Pedras encantadas
e a Catedral Soterrada,
Castelo deste meu Chão!

Ariano Suassuna

15. Ana Cristina Cesar

Apaixonada, saquei minha arma, minha alma, minha calma, só você não sacou nada.

Ana Cristina Cesar (1952 — 1983) foi uma poeta, tradutora, crítica literária e professora carioca, também conhecida como Ana C. A autora foi um dos nomes mais importantes da geração mimeógrafo, movimento artístico marginal da década de 70. Os seus poemas se destacaram pelo seu intimismo e também pelo uso de uma linguagem coloquial.

Apaixonada,
saquei minha arma,
minha alma,
minha calma,
só você não sacou nada.

Ana Cristina Cesar

Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal.

Ana Cristina Cesar

Tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada.
Não há razão
para conservar
este fiapo de noite velha.

Ana Cristina Cesar

Angústia é fala entupida.

Ana Cristina Cesar

Acreditei que se amasse de novo
esqueceria outros
pelo menos três ou quatro rostos que amei...
organizei a memória em alfabetos
como quem conta carneiros e amansa
no entanto flanco aberto não esqueço
e amo em ti os outros rostos.

Ana Cristina Cesar

16. Conceição Evaristo

Eu fêmea-matriz. Eu força-motriz. Eu-mulher

Conceição Evaristo (1946) é uma escritora e militante, nascida em Belo Horizonte, que escreve romances, poemas e contos. Suas obras refletem sobre questões raciais, de gênero e de classe, sublinhado as múltiplas opressões experienciadas pelas mulheres negras no Brasil.

Eu fêmea-matriz.
Eu força-motriz.
Eu-mulher
abrigo da semente
moto-contínuo
do mundo.

Conceição Evaristo

Nem todo viandante
anda estradas,
há mundos submersos,
que só o silêncio
da poesia penetra.

Conceição Evaristo

Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
o eco da vida-liberdade.

Conceição Evaristo

Sim, eu trago o fogo,
o outro,
aquele que me faz,
e que molda a dura pena
de minha escrita.

Conceição Evaristo

A noite não adormece
nos olhos das mulheres
a lua fêmea, semelhante nossa,
em vigília atenta vigia
a nossa memória.

Conceição Evaristo

17. Olavo Bilac

Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas.

Olavo Bilac (1865 — 1918) foi um escritor e jornalista nascido no Rio de Janeiro. Autor de obras de poesia, contos e crônicas, Bilac é apontado como o maior representante do parnasianismo brasileiro.

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.”

Olavo Bilac

E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.

Olavo Bilac

E mais eleva o coração de um homem
Ser de homem sempre e, na maior pureza,
Ficar na terra e humanamente amar.

Olavo Bilac

Pois sabei que é por isso que assim ando:
Que é dos loucos somente e dos amantes
Na maior alegria andar chorando.

Olavo Bilac

Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que não há na vida!

Olavo Bilac

18. Alice Ruiz

A gaveta da alegria já está cheia de ficar vazia

Alice Ruiz (1946) é uma poetisa, tradutora e letrista nascida em Curitiba. Sua poesia se distingue pelo uso de formas breves, como os haicais (composições que seguem uma forma poética de origem japonesa).

A gaveta da alegria
já está cheia
de ficar vazia

Alice Ruiz

Neve ou não neve
onde há amigos
a vida é leve

Alice Ruiz

Que viagem
assim que você chega
a abóbora vira carruagem

Alice Ruiz

Você deixou tudo a tua cara
Só pra deixar tudo
Com cara de saudade.

Alice Ruiz

Que tudo seja leve
de tal forma
que o tempo nunca leve.

Alice Ruiz

19. Pagu

Mata tua sede na pedra que se fez fonte, E te encanta com a paisagem contraditória do meu ser.

Patrícia Galvão (1910 — 1962), mais conhecida pelo pseudônimo de Pagu, foi uma escritora, tradutora, artista, diretora de teatro e militante nascida no estado de São Paulo. Integrante da causa comunista, foi presa mais de vinte vezes ao longo da vida. Sua obra literária contem poemas, contos policiais e romances.

Lê nos meus olhos todos os consentimentos,
Mata tua sede na pedra que se fez fonte,
E te encanta com a paisagem contraditória do meu ser.

Pagu

Sonhe, tenha até pesadelo se necessário for, mas sonhe.

Pagu

Sou a única atriz.
É difícil para uma mulher
interpretar uma peça toda.
A peça é a minha vida,
meu ato solo.

Pagu

Procurei acender de novo o cigarro.
Por que o poeta não morre?
Por que o coração engorda?

Pagu

Nada mais sou que um canal
Seria verde se fosse o caso
Mas estão mortas todas as esperanças

Pagu

20. Angélica Freitas

tenho sempre para a Musa um poema na traqueia uma prosa sob a blusa

Angélica Freitas (1973) é uma poeta e tradutora nascida em Pelotas, Rio Grande de Sul. A escritora contemporânea já está publicada em vários países, como Portugal, Alemanha, Espanha, Argentina e Estados Unidos. Sua obra poética tem pensado questões sociais de grande importância como os direitos das mulheres.

tenho sempre
para a Musa
um poema na traqueia
uma prosa
sob a blusa

Angélica Freitas

Um útero é do tamanho de um punho.

Angélica Freitas

particularmente sou uma mulher
de tijolos à vista
nas reuniões sociais tendo a ser
a mais mal vestida

digo que sou jornalista

Angélica Freitas

uma mulher incomoda
é interditada
levada para o depósito
das mulheres que incomodam

Angélica Freitas

meu avô não gostava de agosto
dizia agosto mês de desgosto
quando passava dizia agora não morro mais

Angélica Freitas

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