Quanto mais me Conheco Fernando Pessoa
Sente porque não me faz sentir, não enxerga porque não quer. A mulher louca que sempre fui por você, e que mesmo tão cheia de defeitos sempre foi sua. Sempre fui só sua. Sempre quis ser só sua. Sempre te quis só meu. E você, cego de orgulho bobo, surdo de estupidez, nunca notou. Nunca notou que mulheres como eu não são fáceis de se ter; são como flores difíceis de cultivar. Flores que você precisa sempre cuidar, mas que homens que gostam de praticidade não conseguem. Homens que gostam das coisas simples. Eu não sou simples, nunca fui. Mas sempre quis ser sua. Você, meu homem, é que não soube cuidar. E nessa de cuidar, vou cuidar de mim. De mim, do meu coração e dessa minha mania de amar demais, de querer demais, de esperar demais. Dessa minha mania tão boba de amar errado. Seja feliz.
Impossível que você não perceba como é doloroso para mim mesmo encarar este rompimento. Afinal, a afeição que nutro por você é um fato.
Você ama tanto que quer ficar morando dentro dele, dela. Quer ver toda hora. Absorve o jeito do outro, e esse jeito absorvido da coisa pela qual você está apaixonado, você fica aplicando no cotidiano, feito você fosse aquela própria coisa apaixonante. Que nos tira de nós, alarga.
Tenho urgência de ti, meu amor. Para me salvar da lama movediça de mim mesmo. Para me tocar, para me tocar e no toque me salvar. (…) preciso de você para dizer te amo outra e outra vez. Como se fosse possível, como se fosse verdade, como se fosse ontem e amanhã.
Copiei a frase numa agenda. E seja lá o que possa significar “ficar bem” dentro desse desconforto inseparável da condição, naquele momento justo e breve — fiquei bem.
Quem me via assim molhado não via nosso segredo, via apenas um sujeito molhado sem capa nem guarda-chuva, só uma garrafa de conhaque barato apertada contra o peito.
Às vezes me espanto e me pergunto como pudemos a tal ponto mergulhar naquilo que estava acontecendo, sem a menor tentativa de resistência. Não porque aquilo fosse terrível, ou porque nos marcasse profundamente ou nos dilacerasse — e talvez tenha sido terrível, sim, é possível, talvez tenha nos marcado profundamente ou nos dilacerado — a verdade é que ainda hesito em dar um nome àquilo que ficou, depois de tudo. Porque alguma coisa ficou.
Olha: foi bom demais te conhecer. Me deu uma fé, uma energia. Sei lá. Ainda não consegui aterrizar bem da viagem e estou sofrendo um pouco, mas tudo bem. Te escrevo mais logo.
Tenho assim… aquela coisa… como era mesmo o nome? Aquela coisa antiga, que fazia a gente esperar que tudo desse certo, sabe qual? (…) Esperança!
O que é que você quer?
Ela sorriu. Estendeu as mãos, tocou-o também. Vontade de pedir silêncio. Porque não seria necessária mais nenhuma palavra um segundo antes ou depois de dizerem ao mesmo tempo:
- Quero ficar com você.
Dei conselhos a ele, disse que admitia que cada um fizesse o que bem entendesse, mas que devia-se resguardar um limite de decência, de respeito pelo outro e por si próprio, que se deve ter uma diretriz na vida, senão fica tudo vazio, sem sentido.
E no momento — como dizer? — de certa forma eu estou gostando de estar me sentindo assim, desamparado. Porque é como um teste. Agora eu quero ver como eu me viro, entende? E sozinho.
Mas estou disposto a correr o risco. É preciso agora concretizar a ideia. Tirá-la dos limites do pensamento, arrancá-la apenas do papel e torná-la um pedaço de mim.
Então, admitiu o medo. E admitindo o medo permitia-se uma grande liberdade: sim, podia fazer qualquer coisa, o próximo gesto teria o medo dentro dele e portanto seria um gesto inseguro, não precisava temer, pois antes de fazê-lo já se sabia temendo-o, já se sabia perdendo-se dentro dele finalmente, podia partir para qualquer coisa, porque de qualquer maneira estaria perdido dentro dela.
- Relacionados
- Frases de Fernando Pessoa
- Frases para namorada que mostram o quanto ela é especial para você
- Poesia Felicidade de Fernando Pessoa
- Frases de alegria para inspirar e tornar o seu dia mais feliz
- Feliz aniversário para pessoa guerreira e batalhadora
- Textos de Fernando Pessoa
- Poemas de Fernando Pessoa
