Poesia sobre poesia

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A partir desta data,
Aquela mágoa sem remédio
É considerada nula
E sobre ela, silêncio perpétuo.

Sabe humanidade... Não me Importo o que pensem sobre isso...
Mas quando temos a mente aberta e nosso coração é bom verdadeiramente...
Conseguimos esse dom
De sentir como são as pessoas antes de até conhecê-las
Assim podendo ajudar as más pessoas a se tornarem boas...
e se unindo às boas que já existem

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.

Me recuso a dar informações
Sobre o paradeiro das minhas idéias malditas
Elas se escondem bem demais

Só eu sei o caminho só eu sei
Em quem dói mais

Martha Medeiros
MEDEIROS, M. Poesia Reunida. Porto Alegre: L&PM, 1999.

Aqueles que escapam do inferno
nunca falam sobre isso
e nada mais incomoda eles
(...)
Quero dizer, coisas como
falta de uma refeição,
ir para a cadeia,
bater seu carro
ou mesmo morrer.

Quando você perguntar-lhes,
"como as coisas estão indo? "
eles vão responder: "bem, muito bem ... "

Uma vez que você foi para o inferno e voltou
é o bastante
é a mais silenciosa celebração conhecida.

Uma vez que você foi para o inferno
e voltou, você não olha para trás
quando o chão range.
o sol está no alto a meia-noite

E coisas como os olhos de ratos
ou um velho pneu em um terreno baldio
pode torná-lo feliz.
(...) Uma vez que você foi para o inferno
e voltou.

NOITE DE SAUDADE

A Noite vem poisando devagar
Sobre a Terra, que inunda de amargura...
E nem sequer a bênção do luar
A quis tornar divinamente pura...

Ninguém vem atrás dela a acompanhar
A sua dor que é cheia de tortura...
E eu oiço a Noite imensa soluçar!
E eu oiço soluçar a Noite escura!

Por que és assim tão escura, assim tão triste?!
É que, talvez, ó Noite, em ti existe
Uma Saudade igual à que eu contenho!

Saudade que eu sei donde me vem...
Talvez de ti, ó Noite! ... Ou de ninguém...
Que eu nunca sei quem sou, nem o que tenho!!

O Sono

O sono que desce sobre mim,
O sono mental que desce fisicamente sobre mim,
O sono universal que desce individualmente sobre mim —
Esse sono
Parecerá aos outros o sono de dormir,
O sono da vontade de dormir,
O sono de ser sono.

Mas é mais, mais de dentro, mais de cima:
E o sono da soma de todas as desilusões,
É o sono da síntese de todas as desesperanças,
É o sono de haver mundo comigo lá dentro
Sem que eu houvesse contribuído em nada para isso.

O sono que desce sobre mim
É contudo como todos os sonos.
O cansaço tem ao menos brandura,
O abatimento tem ao menos sossego,
A rendição é ao menos o fim do esforço,
O fim é ao menos o já não haver que esperar.

Há um som de abrir uma janela,
Viro indiferente a cabeça para a esquerda
Por sobre o ombro que a sente,
Olho pela janela entreaberta:
A rapariga do segundo andar de defronte
Debruça-se com os olhos azuis à procura de alguém.
De quem?,
Pergunta a minha indiferença.
E tudo isso é sono.

Meu Deus, tanto sono! ...

Álvaro de Campos
PESSOA, F. Poesias de Álvaro de Campos. Lisboa: Ática. 1944 (imp. 1993). p. 82

A Ideia

De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!

Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!

Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas da laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica...

Quebra a força centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No molambo da língua paralítica!

Augusto dos Anjos
ANJOS, A. Eu e Outras Poesias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

A uma mulher

Quando a madrugada entrou eu estendi o meu peito nu sobre o teu peito
Estavas trêmula e teu rosto pálido e tuas mãos frias
E a angústia do regresso morava já nos teus olhos.
Tive piedade do teu destino que era morrer no meu destino
Quis afastar por um segundo de ti o fardo da carne
Quis beijar-te num vago carinho agradecido.
Mas quando meus lábios tocaram teus lábios
Eu compreendi que a morte já estava no teu corpo
E que era preciso fugir para não perder o único instante
Em que foste realmente a ausência de sofrimento
Em que realmente foste a serenidade.

Rio de Janeiro, 1933

“Quando considero a brevidade da existência dentro do pequeno parêntese do tempo e reflito sobre tudo o que está além de mim e depois de mim, enxergo minha pequenez.
Quando considero que um dia tombarei no silêncio de um túmulo, tragado pela vastidão da existência, compreendo minhas extensas limitações e, ao deparar com elas, deixo de ser deus e liberto-me para ser apenas um ser humano.
Saio da condição de centro do universo para ser apenas um andante nas trajetórias que desconheço...”

Tão sutilmente em tantos breves anos
foram se trocando sobre os muros
mais que desigualdades, semelhanças,
que aos poucos dois são um, sem que no entanto
deixem de ser plurais:
talvez as asas de um só anjo, inseparáveis.
Presenças, solidões que vão tecendo a vida,
o filho que se faz, uma árvore plantada,
o tempo gotejando do telhado.
Beleza perseguida a cada hora, para que não baixe
o pó de um cotidiano desencanto.

Tão fielmente adaptam-se as almas destes corpos
que uma em outra pode se trocar,
sem que alguém de fora o percebesse nunca.

Lya Luft
Mulher no palco

POEMA DE CANÇÃO SOBRE A ESPERANÇA

I

Dá-me lírios, lírios,
E rosas também.
Mas se não tens lírios
Nem rosas a dar-me,
Tem vontade ao menos
De me dar os lírios
E também as rosas.
Basta-me a vontade,
Que tens, se a tiveres,
De me dar os lírios
E as rosas também,
E terei os lírios —
Os melhores lírios —
E as melhores rosas
Sem receber nada.
A não ser a prenda
Da tua vontade
De me dares lírios
E rosas também.

II

Usas um vestido
Que é uma lembrança
Para o meu coração.
Usou-o outrora
Alguém que me ficou
Lembrada sem vista.
Tudo na vida
Se faz por recordações.
Ama-se por memória.
Certa mulher faz-nos ternura
Por um gesto que lembra a nossa mãe.
Certa rapariga faz-nos alegria
Por falar como a nossa irmã.
Certa criança arranca-nos da desatenção
Porque amámos uma mulher parecida com ela
Quando éramos jovens e não lhe falávamos.
Tudo é assim, mais ou menos,
O coração anda aos trambulhões.
Viver é desencontrar-se consigo mesmo.
No fim de tudo, se tiver sono, dormirei.
Mas gostava de te encontrar e que falássemos.
Estou certo que simpatizaríamos um com o outro.
Mas se não nos encontrarmos, guardarei o momento
Em que pensei que nos poderíamos encontrar.
Guardo tudo,
(Guardo as cartas que me escrevem,
Guardo até as cartas que não me escrevem —
Santo Deus, a gente guarda tudo mesmo que não queira,
E o teu vestido azulinho, meu Deus, se eu te pudesse atrair
Através dele até mim!
Enfim, tudo pode ser...
És tão nova — tão jovem, como diria o Ricardo Reis —
E a minha visão de ti explode literariamente,
E deito-me para trás na praia e rio como um elemental inferior,
Arre, sentir cansa, e a vida é quente quando o sol está alto.
Boa noite na Austrália!

... Amando noites afora
Fazendo a cama sobre os jornais
Um pouco jogados fora
Um pouco sábios demais
Esparramados no mundo
Molhamos o mundo com delícias
As nossas peles retintas
De notícias...

Opinião masculina sobre o corpo feminino

Não importa o quanto pesa. É fascinante tocar, abraçar e acariciar o corpo de uma mulher. Saber seu peso não nos proporciona nenhuma emoção. Não temos a menor idéia de qual seja seu manequim. Nossa avaliação é visual, isso quer dizer, se tem forma de guitarra... está bem. Não nos importa quanto medem em centímetros - é uma questão de proporções, não de medidas.

As proporções ideais do corpo de uma mulher são: curvilíneas, cheinhas, femininas...Essa classe de corpo que, sem dúvida, se nota numa fração de segundo. As magrinhas que desfilam nas passarelas, seguem a tendência desenhada por estilistas que, diga-se de passagem, são todos gays e odeiam as mulheres e com elas competem. Suas modas são retas e sem formas e agridem o corpo que eles odeiam porque não podem tê-los.

Sobre A Violência

A corrente impetuosa é chamada de violenta
Mas o leito do rio que a contem
Ninguém chama de violento.

A tempestade que faz dobrar as bétulas
E tida como violenta
E a tempestade que faz dobrar
Os dorsos dos operários na rua?

O que a ação revela sobre a pessoa?
Ouça um bom conselho
que lhe dou de graça
Inútil dormir
Que a dor não passa
Espera sentado ou você se cansa
Está provado
Quem espera nunca alcança

Foi um Momento

Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não ?

Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve!...

Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há muita coisa Incompreendida...

Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?

Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.

Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz.

Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.
Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Restos do Carnaval.

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Filtro Solar

Nunca deixem de usar o filtro solar
Se eu pudesse dar só uma dica sobre o futuro
seria esta: usem o filtro solar!
Os benefícios a longo prazo do uso de Filtro Solar
estão provados e comprovados pela ciência,
Já o resto de meus conselhos não tem outra base
confiável além de minha própria experiência errante.
Mas agora eu vou compartilhar esses conselhos com
vocês...

Aproveite bem, o máximo que puder, o poder e a beleza
da
juventude.
Ou, então, esquece... Você nunca vai entender mesmo o
poder e a beleza da juventude
até que tenham se apagado.
Mas pode crer que daqui a vinte anos você vai evocar
as suas fotos,
E perceber de um jeito que você nem desconfia hoje em
dia,
Quantas, tantas alternativas se escancaravam a sua
frente.
E como você realmente estava com tudo em cima,
Você não está gordo ou gorda...

Não se preocupe com o futuro.
Ou então preocupe-se, se quiser, mas saiba que
pré-ocupação é tão eficaz quanto mascar chiclete para
tentar
resolver uma
equação de álgebra.
As encrencas de verdade em sua vida tendem a vir de
coisas que nunca passaram pela sua cabeça preocupada,
E te pegam no ponto fraco às 4 da tarde de uma
terça-feira modorrenta.

Todo dia, enfrente pelo menos uma coisa que te meta
medo de verdade.

Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Crônica Saudade.

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