Pedro Bandeira - Identidade
O eu é a imagem provinda da interpretação da substância pensante sobre a estruturação geométrica vital, que está, tal interpretação, sobre a influência de outras imagens, isto é, eus e de suas obras (sociedade, cultura e etc.).
Às vezes eu não sei quem eu sou
Mas sei que os outros me notam
Tentam me decifrar
E jugam-me ao ler
Ler sobre mim em outras bocas
Ler sobre mim em outras visões
Mas de mim mesmo... Não compreendem
Eu sei que sou uma pessoa difícil de conviver
Mas porque facilmente já me entreguei a pessoas rasas demais
Nas quais eu achava ter profundidade
E então me curar de tudo isso nunca foi fácil e por tanto me tornaram difícil
Sou assim sem máscaras
Sem disfarces
Não consigo agradar só porque deve ser o convencional
Não consigo ser
Só porque tenho que ser normal
Eu sou o oposto doque dizem ser falso
Eu sou real.
A maioria se agarra ao passado como quem teme o vazio — são moldadas por ausências, traumas e repetições que não cessam. Caminham carregando escombros de si mesmas, como se a dor fosse identidade. Mas eu sou inquietação em carne. Não aceito ser resultado, sou processo. Não me prendo ao que me moldou, porque sei: o que me molda agora é o próprio caminhar. Recuso as certezas confortáveis do que fui. Refaço-me, mesmo sem garantias. Há algo de sagrado nessa travessia sem mapa, como se o próprio ato de transformar-se fosse o destino. Não sei o propósito — talvez ele nem exista —, mas sigo, porque estagnar é morrer, e eu escolho o abismo de me tornar.
"Se as pessoas só identificam você como cristão pelo jeito como se veste, tem algo de muito errado no seu cristianismo".
Nem todo escuro é abrigo
Já estive lá também, sabe...
Onde o escuro se disfarça de acolhimento
e sussurra verdades com voz de promessa.
Mas nem toda sombra é momento.
Nem toda venda liberta.
Às vezes, ela apenas esconde.
Querer o desejo da entrega como voo...
Mas e se for só vertigem?
Vontade de cair?
E se deixar ir for só se perder de si mesma?
Silêncios nem sempre sussurram uma voz.
Às vezes, ensurdecem.
E o toque que busca... pode também ferir.
Tremores não são bússolas para sentimentos.
Desejo e medo dançam juntos no mesmo compasso.
E o que parece casa... pode ser só saudade do que você já foi.
Não, ninguém te leu.
Ninguém sequer te imaginou.
E você calou mais do que consentiu.
Tem quem se ache especial por descobrir alguém.
Mas você teve que aprender a seguir
sem precisar de olhos que te adivinhem,
sem depender de respirações alheias para lembrar quem é.
Nem toda noite guarda epifanias.
Algumas só passam.
E tudo bem.
Porque às vezes,
ver é mais seguro que sentir.
E seguir inteira,
é incendiar-se por dentro
e deixar as cinzas se tornarem solo fértil
para crescer, de novo, em si mesma.
Augusto Silva.
Somos notas dispersas em uma partitura, cada uma com seu tom e timbre únicos, todas essenciais para a música que só a vida sabe compor.
Dualidade Unida
Nasci na Alemanha, num pedaço de terra que acolhe e cuida. Filho de pais portugueses, trago comigo as raízes profundas de uma pátria distante. Sim, amo dois países. Um foi mãe, outro é pai. E assim, cresci entre dois mundos, onde o patriotismo não se anula, mas se completa, como as estações que se sucedem, cada uma com a sua beleza.
O melhor de ambas as culturas marcou a minha educação, tal como o sol e a lua marcam o dia e a noite. Da Alemanha, aprendi a ordem e a disciplina, o respeito pelo tempo e pelo espaço. De Portugal, recebi a alma poética, a saudade que me abraça e a simplicidade das coisas.
Guardo ambos no meu coração, sem conflito, sem divisão. São como duas árvores que crescem lado a lado, as suas raízes entrelaçadas, as suas folhas tocando-se ao vento. E assim, sou inteiro, sou completo, porque levo comigo a essência de dois lugares que me formaram e me fazem ser quem sou.
A cultura é o vento que alarga as velas da mente, para que ela não se encoste às margens de uma vida pequena.
O que realmente conta é o que fica quando tudo o mais se desfaz. As palavras dos outros, os títulos que nos dão, são sombras de um jogo que o tempo apaga sem esforço. No fim, o que sobra é o que sempre foi, aquela parte de nós que não se altera com as mudanças do mundo. E eu permaneço. Não sou moldado pelos nomes que me impõem, nem pelos olhares que me pesam. Sou aquilo que sou, e isso basta.
Não é teimosia manter-me assim. É antes uma certeza, uma verdade silenciosa que dispensa aplausos. Não preciso de aprovação, de ser mais ou parecer outro. Ser é o suficiente. Ser, sem procurar adornos, sem correr atrás de uma imagem que não me pertence, é a única coisa que faz sentido. O resto são máscaras que o vento leva, sem deixar rastro.
A constância em mim não é imobilidade. É uma firmeza tranquila, a tranquilidade de quem não se aflige com o que é transitório. O que sou já me basta, porque conheço a minha essência, e nada fora de mim a pode mudar. Nessa simplicidade, encontro liberdade. Não há pressa, não há necessidade de ser mais. Ser, só ser, já é uma plenitude. O que sou é completo por si só, sem precisar de artifícios, porque a maior liberdade é não precisar de nada para ser quem sou.
O que conta de verdade é o que permanece quando os rótulos se desfazem — e eu permaneço, igual, inalterado. Não preciso de nada além do que sou.
O que conta de verdade é o que permanece quando os rótulos se desfazem — e eu permaneço, igual a mim mesmo. A única certeza que tenho é a essência do que sou.
Ser, só ser, já é uma plenitude, porque a maior liberdade é não precisar de nada para ser quem sou.
Entre a Grécia e Tróia
Sou quem sou,
mas o mundo exige máscaras,
um rosto moldado ao gosto dos outros,
um reflexo que não se quebra.
Se cedo, perco-me.
Se resisto, sou pedra que incomoda.
Agradar é um jogo sem vencedor,
onde quem pede mudança
nunca se sacia.
Que mal tem não ser lutador?
Nem todo combate vale a espada,
nem toda guerra precisa de sangue.
Há força em quem não levanta a voz,
em quem escolhe o chão firme do silêncio.
Estou entre a Grécia e Tróia,
terra de ninguém,
onde cada passo desagrada a um lado,
e o silêncio é visto como afronta ao outro.
Mas que me importa?
O vento sopra onde quer,
e eu sigo, inteiro,
sem me dobrar ao peso de aplausos fáceis
ou censuras vãs.
Sobre o risco de não ser
Há quem passe a vida
a desejar outro lugar,
outra pele,
outro nome.
Acredita que será mais inteiro
se for como os outros,
se parecer com os que brilham,
se for aceite
nos salões onde se aplaude o vazio
como se fosse grandeza.
Mas o que brilha
nem sempre ilumina.
E o que parece
quase nunca é.
O esforço de parecer
rouba a paz de ser.
E quando se apaga a chama
do que nos tornava únicos,
fica apenas o eco
de quem já não sabe quem é,
nem para onde voltar.
Não há perda maior
do que perder-se de si mesmo.
Não há engano mais cruel
do que acreditar
que a dignidade depende do olhar dos outros.
Ser quem se é
— com verdade, com firmeza, com simplicidade —
é tarefa para os que recusam dobrar-se
à mentira do mundo.
É caminho sem prémios,
mas com sentido.
E só o sentido,
mesmo que nos isole,
nos salva do nada.
Quem rejeita a sua natureza
para caber onde não pertence,
corre o risco de não pertencer a parte nenhuma.
Nem aos outros,
nem a si.
Cuidado com a ilusão dos que se dizem grandes,
mas vivem de fingimento e vaidade.
Ser visto não é o mesmo que ser verdadeiro.
Ser aplaudido não é o mesmo que ser digno.
Acredito que não nascemos para caber em moldes.
Nascemos para ser inteiros.
A dignidade,
se é que tem morada,
não vive nos olhos dos outros.
Vive, talvez,
na coerência secreta
entre o que se sente
e o que se é.
E há uma solidão peculiar
em já não pertencer
nem ao mundo que se tentou imitar,
nem ao que se abandonou.
O que assusta não é falhar —
é perder-se no caminho
por ter querido ser outro,
sem nunca ter sido inteiro.
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