Padre Fabio de Melo Cultivo
E aí depois daquele dia, eu não o procurei mais. Não estava a fim de bancar o compreensível. Preferi evitar conversa.
Parece que a gente procura exatamente o que é capaz de doer ainda mais fundo, qualquer coisa que seja capaz de sangrar, pisotear. Colecionamos palavras malditas, escolhemos a música perfeita, melancólica. Aí assistimos o filme novamente, relemos o bilhete deixado, nos maltratamos sem nenhuma dó. A gente mesmo provoca punhaladas nas costas quando inventa de revirar cada palavra, cada melodia, cada cena, tudo milimetricamente desordenado, até a dor ser consumida, ser abafada ou transformada em outra coisa.
E principalmente à noite, antes de dormir, fico pensando que nunca mais vai acontecer de novo, que durou muito pouco, e que vai ficar marcado para sempre.
Uma gente que esquece da outra com facilidade. Que se diz amiga, mas some no momento exato que você precisa.
Agora, mais do que nunca, eu precisava ir adiante. Precisava ir além desses pensamentos mesquinhos e limitados.
Acordei muito bem hoje. Muito decidido, irreconhecível, confiando em mim pra valer. Eu estou entrando em outro ciclo, depois de ter passado por dias escuros, bastante dolorosos. Então, só pra que ficasse mais claro, abri todas as portas de casa, deixei o que não era pra ser sair pelas janelas. Estou com uma sensação de que, pela primeira vez na vida, as coisas estão começando a dar certo.
Ali, naquela chuva, quando os olhos de um se encontraram nos olhos do outro, perceberam que se esperavam por muito tempo, por vidas talvez.
Sabe aquela vontade de amar o que realmente importa? Então, é disso que eu estou falando. Nas últimas semanas eu mudei muito, passei a ter mais orgulho de mim.
E tive que prender várias vezes a vontade de chorar. Ainda tento. Mas, às vezes, é tão forte que eu agarro o travesseiro, à noite, e choro, choro e choro muito, até que uma hora, quem sabe, eu pegue no sono.
Eu não o culpo mais. Na verdade, nem sei se ele teve realmente culpa por tudo isso. Só sei que, às vezes, me lembro dele. E não sinto mais aquelas dores de antes. Não sinto raiva, nem saudade. Não fico mais triste e nem perdido. Só permaneceu a certeza que eu sempre tive: uma hora o tempo iria passar.
De todos os rapazes que eu tinha visto ali, naquela manifestação, ele era o mais entregue, parecia um filósofo platônico, sabia se portar, tinha umas coisas que fazia a gente não tirar os olhos. E quando o vi, em meio àquelas fumaças de gás lacrimogêneo, mesmo sendo tudo muito rápido e assustador, tive certeza de que havia sido feito unicamente para ele.
Na pior (ou melhor) das hipóteses, não diga. Mesmo que ele demonstre alguma coisa, ainda que ele diga palavras bonitas que faça você sentir uma coisa forte por dentro, não conte. Não confesse, não se declare, caia fora. Deixe que ele faça isso por você.
Eu pediria você. Se Papai Noel existisse, se estrelas cadentes realizassem sonhos, e se moedas na fonte funcionassem como nos filmes, eu pediria você para sempre. Isso não é novo, eu sempre te peço, sempre te desejo, sempre acredito no que nem é pra acreditar. Quando as velinhas do bolo do meu aniversário se apagaram e eu fechei os olhos foi por você que eu pedi no assopro. Não existe outro pedido. Nesse natal, se um velho gordo e de barba branca com uma sacola vermelha nas costas aparecesse em um trenó e perguntasse o que eu queria de presente, mesmo que eu pudesse escolher qualquer coisa melhor e mais valiosa no mundo, eu juro que o meu desejo seria que você saísse no meio das renas, de braços abertos pra mim. Eu queria que você estivesse embrulhado no papel de presente mais lindo da cidade. E só. No meio dos piscas-piscas que enfeitam os postes da avenida e os maiores castelos, eu queria que fosse o seu sorriso que eles desenhassem no céu. Se o mundo realmente acabasse, a minha última súplica seria você. É você. E eu continuo pedindo, forte, que não deixe de ser nunca. Porque, por mais que você negue e responda “não” para todas as minhas súplicas, e nunca venha, eu ainda serei o único que pede por você.
"E hoje eu tô igual bala perdida. E nem quero saber quem disparou o gatilho. Só sei que se atravessar meu caminho. Eu derrubo."
Douglas Melo
Olha, pelo visto, eu nunca vou sair daqui. Nem vou tentar mais fazer esforços pra isso, eu sei. A cada minuto tudo se torna um pouco mais difícil. Cansei de ficar tentando. E vou admitir que é quase impossível que isto aqui, algum dia, se torne uma história interessante.
No final do dia, volto pra casa, cansado, encosto a cabeça na janela do ônibus e começo a lembrar da gente de todas as maneiras possíveis. Então, rindo sozinho e depois formando lágrimas nos olhos, consigo entender que nunca vou esquecê-lo. Eu não ia admitir, mas vou confessar que morro de saudades de tudo, principalmente das coisas mais bobas e mais engraçadas. Tenho saudade da gente brigando pelo último pedaço da pizza, de acordar sua mãe porque rimos muito alto de coisas aleatórias no meio da madrugada, do seu quarto sempre bagunçado, da cara feia que você fazia quando eu pedia pra ir ao banheiro quando estávamos indo embora de uma festa. Da paciência que você tinha com meus quase seis anos a menos, da mania que você tinha de esquecer a chave do carro nos lugares. Sinto saudade de levar sua toalha enquanto você tomava banho e de quando você fazia cócegas no meu pé, no escuro, e murmurava baixinho: eita, olha como esse menino é só drama. E eu sei que isso que eu sinto não é um sentimento possessivo. Não escolhi sentir saudade dessas coisas. De vez em quando bate uma saudadezinha. Às vezes é leve, às vezes é pesada demais, e eu vou levando.
E quem diria, né? Quem diria. Mais cedo, conversando com uns amigos, eles me disseram que eu mudei muito em poucas semanas, que eu estou mais seguro de mim e, de tão diferente, eu não pareço ser mais eu. Então eu consegui. Estão começando a notar.
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