Coleção pessoal de VeronicaMiyake

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SE…


Se fosse a vida toda reescrita
e o tempo fosse pássaro enjaulado,
talvez houvesse mais amor guardado
e eu não seria esta parasita…

Se eu fosse o quanto pensa, tão bonita,
de peito aberto, olhar apaixonado,
teria do rancor me libertado
e minha paz seria infinita…

E se, talvez, a noite fosse dia
e o vento me levasse a agonia
que sinto sem, sequer, saber por que,

quem sabe, em seu abraço eu estaria?
Talvez, amor, se não houvesse o “se”,
eu me apaixonaria por você.

DROGA MORTAL


Mas que droga foi esta que provei?
Vem tirando-me o sono… Oh, meu Deus!
Espalhei por teus mundos os meus “eus”
mas de mim, quase nada é que sei…

Uma flor com espinhos eu plantei,
colhi sonhos que nunca foram meus…
Assim, eles se foram: sem adeus,
e mais só do que antes eu fiquei.

Esta droga do amor é mui potente,
pois tocar as estrelas sou capaz,
mesmo sendo tal força tão fugaz…

E se fico por vezes mais contente,
eis que vem a tristeza de repente;
desde quando provei não tenho paz…

CONFESSO QUE AINDA ESPERO…


Algum cavaleiro armado…
Sim, um príncipe encantado
montado num alazão,

que me desperte o desejo,
me ressuscite num beijo…
Me leve desta prisão!

Mas “para sempre feliz”,
do jeito que eu sempre quis,
é na verdade ilusão.

Amor pra mim é um mito,
em nada disso acredito…
E me devora o dragão!

Amo contemplar estrelas,
estão lá, sempre brilhando…
Mas eu sempre labutando,
quase nunca posso vê-las.

O QUE NINGUÉM VÊ

Vendo as horas no pulso, no qual pulsa
a batida da vida presa ao peito,
ninguém vê como o fútil é aceito,
como tratam a alma com repulsa…

E se brilha, no céu, a estrela avulsa,
ocupados estão com qualquer feito
para ver como o simples é perfeito,
já que a vida, tão breve, está convulsa.

A mim basta viver sempre à mercê
destas regras que dita a sociedade…
Quero a vida com mais serenidade!

Porque o dia que vai ninguém revê
e a estrela no céu, que ninguém vê,
se cair… Ah! Destrói qualquer cidade!

SONETO AO MEU PAI
DIA DOS PAIS

Pai, eu sei que cresci... O tempo passa;
corre rápido o rio dessa vida!
Eu bem sei quão sofrida foi a lida
que você venceu, sim, com tanta raça!

Também sei quão difícil foi a caça,
com suor toda a vida construída...
Mas eu sou muito mais agradecida
por mostrar-me o caminho, pai, da graça.

Sim, me fez da verdade tão ciente
que hoje vejo esse mundo e me comovo
com o que não mais vê todo esse povo...

Agradeço e confesso, tão carente,
que desejo que volte essa corrente
pra caber no seu colo, pai, de novo...

Mundo Cego

O tempo arrasta o mundo,
Qual um trem desgovernado
Vai sem rumo, moribundo,
Leva o homem flagelado
Pro buraco que é sem fundo.

Já não pensa toda a gente
Que só de futilidades
Vem alimentando a mente:
Não enxergam mais as grades
Por viver tão livremente.

São sutis, subliminares,
As mensagens das novelas
E as músicas populares,
Que nem são assim tão belas
Mas enganam, sim, milhares.

É materialista a era,
Este tempo que é moderno,
Onde muito se venera
O que pinta bem o inferno…
E onde Deus é só quimera.

DIAS ASSIM...

Vontade de qualquer coisa,
De fugir sem levar nada,
De chorar e dar risada
Sem precisar de motivo
Ou de qualquer incentivo…

Vontade de não sair,
Desligar o som de fora
Esquecer que corre a hora
Mergulhar só no meu mundo,
Me entender por um segundo…

Vontade de ficar só,
Conversar com meu espelho,
Suplicar-lhe um conselho
Pra depois fazer o oposto
E deixar o erro exposto.

Mas em quê fico à vontade?
Tem dias que são assim,
Uma lacuna sem fim,
Uma saudade que vem
E nem se sabe de quem…

TROCANDO OLHARES

Meus olhos te olharam
Sorriram, brilharam,
Brincaram de ver
Além das imagens
Que pintam teu ser...

Melhor sem falar:
Palavras no ar
São folhas ao vento,
Do galho desprendem
Sem cor nem alento.

As falas não cabem
Se os olhos já sabem.
Assim, só te viram
Guardaram teu rosto
E se despediram.

*** DESGASTE ***

As coisas mais bonitas foram ditas
Na paz e na leveza d’um começo…
Por que vivemos hoje sem apreço,
Nas horas que não mais são infinitas?

Nenhum poema mais tu me recitas
Pudera, se anoiteces, amanheço…
Quem sabe seja este nosso preço,
Pelas palavras, hoje, tão restritas?

Eu só vi cinzas quando amanheceu,
O mesmo sol, sem ter qualquer valor,
Teus passos com os meus, aonde for…

Do que será que a gente se esqueceu?
Não bastou ser eu tua e seres meu…
Não foi regada a flor, que é o amor.

TRAUMA

O tempo arrastou a dor e o pranto,
Levou as folhas secas do meu mal…
E tudo passou, feito temporal,
Levando minha angústia a qualquer canto.

Ainda que o drama fosse tanto,
Esperei... já que tudo tem final!
Assim, nasceram flores no quintal
Trazendo nova vida, novo encanto.

Talvez até bastasse este presente,
Os instantes, pequenas alegrias
Ou esta tarde fria, tão somente…

Mas há horas que ainda são vazias
E há lembranças vis na minha mente:
Pesadelos devolvem estes dias!

DOIS EXTREMOS

E lá fora a vida aflora...
Um céu limpo, um sol quente...
Corre feliz toda a gente
Antes que se acabe a hora,
Antes que o relógio pare
E leve a vida embora.

Mas o dia lá de fora
É reflexo d’um instante,
A loucura mais distante
D’um inconstante “agora”,
Porque aqui dentro chove,
Aqui dentro ninguém mora...

PALAVRAS

Elas se perdem no ar,
Evaporam-se no espaço,
E tendo ouvidos de aço,
Podem p'ra sempre ecoar...

Não voltam, isso é certo,
Mas têm tamanho poder
De fazer ou desfazer,
Afastar ou trazer perto.

E há quem as faz refém
Fazendo tudo promessa,
Também quem as arremessa
Feito pedras, contra alguém.

E não se pode guardá-las
Porque quem fala se esquece,
Nem todo querer é prece.
Talvez por isso, te calas...

PEDRA

Pelos dias que passaram,
Pelos que passam em vão,
Pelas pessoas que ficam,
Por aquelas que se vão,
Pelo tempo que voou
Entre os dedos destas mãos,
Pelo que me magoou,
Pela vida, pelos “nãos”,
Pelos sonhos destruídos,
Pelos que nem asas têm…
Pela voz, pelos ruídos,
Pela fé que me mantém,
Os segundos se demoram
E o choro já não vem…

Bem sei que pedras não choram.

Inda quero florescer
Numa outra estação…
Deus, não deixe endurecer
O meu frágil coração!

SONETO SEM FIM

Não há ninguém no fundo de um poço,
Quem adivinha as voltas deste mundo?
E quem já sente “a corda no pescoço”
Descobre que o poço não tem fundo.

Quem sabe a vida seja só esboço,
De tão breve que é cada segundo?
Pois há no mundo ainda o alvoroço
De um fim - e eu ainda me confundo…

Eu escondi meus “nãos” ao dizer sim,
Descobri no que a vida aqui, consiste:
Só trago o que guardei dentro de mim!

Esboço riso e torno ao olhar triste,
Minha tristeza nunca chega ao fim,
Pois o fim realmente não existe!

Cartas

Eu sinto saudade
Da carta escrita,
Tão leve e bonita
Na simplicidade
Da intimidade
De quem escrevia…
Hoje, todavia,
É brega, passado,
Foi posta de lado
Nesta era fria…

As coisas pequenas
Perderam valor.
Moldaram o amor,
Puseram antenas
E formas obscenas
Nas coisas mais belas…
Ficaram nas telas,
O calor, a vida
A mão não sentida
Nas frases singelas…

Ah, modernidade…
Engoliste cartas,
Fizeste lagartas
Que sem qualidade
E sem humildade
Se julgam normais
(por serem iguais)
Vivendo de abraços,
Sorrisos e laços
Que são virtuais…

Quero viver o que me dá o dia,
Deixar os medos e seguir adiante,
Ouvir os pássaros, ser melodia!
Mas eu desejo também, não obstante,
Que finde a morte minha estadia,
Pois sou no mundo, apenas viajante!

Ninguém deixa de comer ou beber, mas são poucos os que se lembram de alimentar a alma...

Seja o amor irmão da esperança,
Um sábio ancião dos sentimentos,
E que não viva só numa aliança,
Tampouco morra, preso aos casamentos.

É sempre noite, não mais amanhece
Quando se guarda dores d’outro dia.