Cerrado
SONETO DE MIM
Na quietude e silêncio do cerrado
dos pensamentos eu me desligo
e o sentimento se põe aí calado
esta é a emoção onde me abrigo
Num vazio do tempo desfolhado
da saudade, sair eu não consigo
sou o ressecado chão empoeirado
e d' alma em evasão sou mendigo
E é neste legado de um passado
que saudosar tornou-se castigo
e o castigo sacrossanto enfado
Assim, tudo o que trago comigo
é amor, apenas sou... um fado!
Que tentou ser primavero e amigo...
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
LIBERDADE (cerrado)
O que mais me fascina no cerrado
não é o torto se fazendo admirado
e as melancolias nas tuas cabeiras
nem as tuas singelas flores rasteiras
e teus mistérios - pleno de arrepios
tampouco teu horizonte nos vazios
encarnados e cheios de diversidade
O que mais me encanta, maravilha
é a tua imensidão tão cheia de ilha
de oásis, banhadas na pluralidade
e a vida na vida pulsando liberdade!
Luciano Spagnol
Novembro, 2016
Cerrado goiano
ACASO (soneto)
Onde será que o cerrado começa
Ou cá termina as minhas miragens
Será a minha ilusão em mensagens
Ou o começo do fim que cá cessa?
Da saudade fiz pranto e roupagens
Dos sonhos viagens que atravessa
As quimeras na vida sem promessa
Porém, queria era outras paisagens
Como no fado o tempo é remessa
E na pressa se perde as bagagens
Cá fico, e cá minha alma confessa
Quem sabe, cá tenha boas aragens
Tecendo o sertão no quebra cabeça
E o acaso segui pra outras paragens
Luciano Spagnol
Dezembro, 2016
Cerrado goiano
Sou alma do cerrado, pé no chão, do triângulo, do chapadão... Pão de queijo com café, fogão de lenha, das vilas ricas, arraiais, sou filho de Araguari, das Gerais...
Luciano Spagnol
Poeta do cerrado
Amargura do cerrado
Aqui no centro do cerrado
Onde a chuva não chove
Chora o pó sulcado
Ressecado, onde o verde escorre
Pelo vento que levanta o chão
De sede que a existência morre
E o céu que rubra em explosão
O cinza que por ai colore
O rincão árido de erosão
O caboclo queixa por água
Nas promessas em oração
Das fendas escorregam bágua
Suspirando bafo de sequidão
De queimadas que frágua
A amargura do sertão
Poetado com carvão e mágoa
O estio do cerrado em aflição...
Contrição do poeta do cerrado
De que vale ter saudade
Aqui no meio do cerrado
Se caminhasse hoje chegaria tarde
No ponto de partida,
bom é ficar calado
A vida não é covarde
Apanha-se o semeado
Não adianta ter alarde
No descuido que tenhas plantado
Nem remorso que na razão arde
Viva sua arte, encarnado...
O cerrado é um gole d'água na secura
Amargo, após saciado, vê-se o cerrado
Em sua candura árida, em sua ventura
Melancolicamente torto e cascalhado
Horizonte do por do sol que se agiganta
Um poema desigual, igual ser amado
Cerrado, gole na admiração que encanta
Caminhei entre os cascalhos da vida...
No chão árido e arbustos tortos, do cerrado,
me arranhei em espinhos e colhi margaridas.
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
Saudação ao cerrado goiano
Caro cerrado goiano
te saúdo
e sem ter engano
mesmo eu este carrancudo
és soberano.
Aqui, pude te apreciar
aprender a lhe ver
diria até amar
mesmo daqui eu não ser
me sinto parte do seu despertar
belo, e também do entardecer.
Ali, cá, acolá
chão cascalhado
de frutos que são maná
arbusto desencontrado
flores, como não elogiar
tão mágico cerrado.
Então, minha gratidão
por tudo, pouco é o enaltecer
e o sentir que se leva no coração
e se saudade haver
volto, pra mais uma saudação.
Luciano Spagnol
Junho, 2016
Cerrado goiano
Encantamento
O tempo cá no cerrado
me fez um bom aprendizado
tudo veloz passava
no meu eu versado
assim, pude apreciar onde estava
e na saudade fui encantado.
E eu nem imaginava...
Luciano Spagnol
Junho de 2016
Cerrado goiano
CERRADO NUM SONETO
Bendito és tu, cerrado de cascalhos
que em tuas ramas o belo derrama
num céu imenso e cheio de drama
de exóticas flores e tortos galhos
Escancaraste a janela num monograma
dum horizonte rubro e de secos borralhos
num contraste de luz e sombra em talhos
que a admiração esculpe num panorama
Bendito sejas tu, trançado em retalhos
de relva rastejantes que no chão flama
refrescantes nascentes, e áridos atalhos
E do seu sol poete, poemas declama
ipês florescentes e avoengos carvalhos
que encenam vida, e a vida proclama...
Luciano Spagnol
Outubro, 2016
Cerrado goiano
Cerrado
...do seu sol poete, poemas declama
ipês florescentes e avoengos carvalhos
que encenam vida, e a vida proclama...
Luciano Spagnol
Cerrado goiano
SONETO MELANCÓLICO
Chove, embrusca o céu do cerrado
o horizonte ribomba em trovoada
nuvens prenhas, parindo gota d'agua
"cachoeirando" o telhado poeirado
Tomba galhos, ventos na esplanada
um cárcere sombrio, espírito calado
a alma com os seus ais embrulhado
contempla os sonhos em disparada
E o tempo a ver, o chão ensopado
escorrendo devaneios pela fachada
dos sonhos, em rodopios atordoado
Salpica na janela, medos em pancada
melancolia, num espanto não desejado
dos meu olhos em pranto, numa cilada...
Luciano Spagnol
Novembro, 2016
Cerrado goiano
SONETO ENCARNADO
Cerrado, pinta o céu de encarnado
por não poder pintar a noite estrelada
assim, vesti a sombra da esplanada
de prata, do luar em tom apaixonado
Pra extinguir o rubro desta tal cilada
e aprisiona-la até o arrebol no prado
o sol se demole num gesto nacarado
tão cansado, retirando-se em toada
No breu, a cor, escarlate enevoado
permanece, então, na noite trancada
pra de novo no dia surgir encantado
Então, no empalecer da luz arrozada
dorme desmaiada, do dia acalorado
no ciclo do cerrado, em sua jornada...
Luciano Spagnol
Poeta do cerrado
Novembro, 2016
Cerrado goiano