Swami Paatra Shankara
Em uma discussão alguém me disse: "Você acha que tudo tem a ver com você?" Acho. È simples, tudo tem a ver com a vida de qualquer pessoa. Essa expressão é pura filosofia de boteco, coisa de gente que não tem argumentação alguma quando confrontada pelo mal que faz a alguém, no caso, eu. Ou com qualquer pessoa. Tem a ver com os meus sonhos perdidos, tem a ver com a minha dignidade ferida, tem a ver com meus conceitos, tem a ver com fazer tudo para que exista felicidade e harmonia, mas a outra pessoa não quer, pois o que ela é, tem a ver com ela. Mas o limite sempre é ultrapassado, pois cada um acha que "é" alguma coisa, se esquecendo miseravelmente que os outros também "são" alguma coisa. Qualquer pessoa formada em botecos vão falar em ego, que o meu ego é maior, etc, entre outras coisas infelizes, pois ninguém nunca está dentro de ninguém para experienciar como cada coisa repercute em cada ser humano. Pode ser ego, que seja, para confortar os experts em ego, mas e o ego da outra pessoa, não conta? Minha intenção nunca foi moldar ninguém, a forma já vem pronta e se alguém não está disposto a ceder em nada, mesmo que meus apelos sejam simplesmente querer ser feliz junto a ela, então sim, tudo tem a ver comigo, com o meu sofrimento diante disso e a outra pessoa conservando intactos o seu caráter e personalidade, mesmo que afunde emocionalmente a outra pessoa, certamente voltamos ao início: tudo tem a ver com cada pessoa. O que vale mesmo é a interação que fazemos e como fazemos. Podemos oferecer felicidade ou apenas baseados no que "somos", oferecer infelicidade. O resto, bem, é o resto: pura conversa fiada.
Para alguns, as costas dos outros sempre são mais largas que as próprias. Fica assim mais fácil colocar o peso das nossas culpas e convenientemente se esquecendo que outros podem imaginar que suas costas são boas depositárias. É um ciclo que não termina nunca, pois ninguém quer carregar o peso pessoal sem ser dividido ou jogado completo no outro, pois peso, embora seja seu fardo, poucos querem carregar.
Ah, tá, me engana que eu gosto: você diz ser quem é por causa dos outros. Sei, claro, etc. Não. Você é o que é pela mínima compreensão de si mesmo e também dos outros. No final, cada ato cometido, cada palavra expressada sairá de quem você é e não dos outros, que já estão ocupados em ser também.
Vivemos ou não, crescemos ou não, amamos ou não, sofremos ou não, e morremos; é um ciclo. Se pensarmos que um dia tenhamos ajudado de verdade uma única pessoa, já terá sido boa essa passagem por aqui.
Vejo isso muito em casos policiais, onde ocorrem até assassinatos por isso, quando alguma mulher descobre que o marido está tendo um caso com alguma dona qualquer. Ela vai lá com a outra tirar satisfações e entre algumas escaramuças verbais, parte-se para a agressão física, ás vezes até com morte. Isso acontece com homens também, mas peraí, não entendi muito bem: pra alguém ter um caso fora com alguém é preciso dois. Se o sujeito não quer, não acontece nada e se a mulher não quer também não acontece nada. A quem deveria se passar o rodo é o traidor (a) dentro de casa e não quem está lá fora. Isso é defesa de território, como os animais fazem? Agride-se o outro ou outra, mas em casa, tudo bem? Claro que alguns casos acabam em separação, mas vejo que muita gente, que já conheci, perdoam a "falta" de quem está do lado, mas arrebenta quem estava do outro. Eu vivo, vejo o que posso, mas não consigo entender certas coisas básicas e elementares. Pra entender o ser humano, só sendo psicanalista. E louco, idem.
Não importa o que os gurus do impossível possam prometer: ninguém evolui espiritualmente a partir das palavras e ensinamentos que outros tentam passar. Podem servir de norte para o modelo da própria evolução, mas nunca será igual para ninguém, nem em qualidade e muito menos que se sirva necessária à necessidade que todo espírito sente em evoluir, por vezes impedidos pelo nosso pensamento cartesiano, produto do meio em que vivemos e que seguimos sem descer dos próprios trilhos para apreciar a paisagem. Bom para alguns, ruim para outros. Só existem duas formas distintas de evolução: pelo polimento interno ou pelo sofrimento. O interno é a atitude necessária a isso. O sofrimento é simples: quem quer sofrer? Apesar de ser algo subliminarmente um tanto hipócrita, o sofrimento, servindo de mola propulsora, tem lá seus encantos. Apenas o que dizemos de nós para nós mesmos, no âmago do ser, não importa como, ´que fará ressonância com o que somos e o que podemos almejar ser. Esqueça os gurus, mas nem tanto assim, ouça, leia seus conselhos, mas os passe por uma peneira consciencional: eles tem o mesmo trabalho para com sua própria evolução.
A melhor e mais eficaz oração é aquela que fazemos através de nossos pensamentos, sentimentos e, por consequência, de nossas ações. Se uma imagem representa mil palavras, uma boa ação representará mil orações. Mais atitude e menos sangue nos joelhos. A Divindade, como quer que A conceba não está interessada nas repetições constantes das mesmas orações se elas saem da boca e não do coração. Fale com Ela, as melhores orações não são as repetidas à exaustão, mas como que conversar com um Amigo. Sentir-se-á melhor, acredite, pois se fazemos parte da Criação e Ela cinge tudo, então está dentro de nós também. Se oramos ou conversamos, estamos falando para nós mesmos. Aquiete a mente e tente ouvir.
Em discussão acalorada, a verborragia irá num crescendo até atingir o limite da exaustão quando os envolvidos tiverem a certeza para si mesmo que "disseram toda a sua verdade". Os sentimentos são mútuos e todos sairão exatamente como entraram antes dela. Verdades pessoais são intransferíveis, pois batem no escudo das verdades do outro.
Dependendo do momento, há pessoas que sofrem de amnésia seletiva. Só lembram daquilo que é conveniente que se lhes traga alguma vantagem.
Quanto a acreditar que o que aconteceu, já passou, não é bem verdade: todos nós, sem exceção, temos um passado que se vindo à tona e nos absorver e se ainda não tivermos dignidade e humildade para praticar o perdão de forma irmã e mútua, pode fazer um grande estrago no presente.
Todos somos moldados de forma positiva ou negativa pelo que já fizemos no passado. Quando há um conveniente esquecimento do que fizemos de negativo, escondido e subterrâneo, esquecemos de praticar uma bem mais preferível humildade, apesar que isso é bem humano: esquecer o que fizemos para praticar nossa “personalidade” para tentar abafar nossa própria consciência, mas infelizmente, ou felizmente para alguns, esta não esquece nada.
A consciência não esquecer nada seria absolutamente normal, mas cada dia que passa me surpreendo com algumas pessoas: as consciências apesar de estarem ali, de prontidão, estas não lhes pesam e elas continuam a praticar o roteiro - como diria o poeta - cínico, nas suas vidas. Nessa eu me incluo, acredite, pois também sou um ser humano. Procurando sempre evoluir, mas apenas um ser humano.
Nossas vidas não funcionam como um pano fechado de teatro. Há ouvidos e olhos nos observando o tempo todo e a carapaça de ferro que julgamos ter, pode se constituir apenas num vidro muito frágil que pode se espatifar num átimo de tempo.
Destarte, ser ignorante, no sentido de ignorar certas coisas, pode ser um presente de Deus nas nossas vidas. Por isso e por outras tantas que praticar a humildade seria como uma espécie de remissão divina em função deste presente d'Ele.
Deus perdoa tudo. Os Homens não, mas Deus sim. Sei que a redenção do que somos pode parecer pequeno para nós, mas é um grande passo aos olhos de Deus, na nossa escala evolutiva.
Viemos aqui para evoluir, para sermos melhores a cada dia e deixar Deus orgulhoso com Sua Obra.
Ninguém é melhor que ninguém. Quem acha isso, já retrocedeu e imagino que a prepotência faz por nublar os olhos a essa singularidade.
O dia que conseguir pensar por mim, eu serei você. Por enquanto, se não consegue e imagino que nunca vai conseguir, deixe ser eu mesmo com meus pensamentos e faça a gentileza de me progredir a sua ausência. Pensamentos podem ser pequenos até, mas é importante cada um reconhecer a sua própria pequenez. Principalmente quando ao querer julgar o pensamento de outra pessoa. Viver de julgamentos aos alheios é estar preso à teia, onde não há nada senão a prisão filosófica. Críticos, como cães, latem contra quem tem medo ou alguma coisa sombria qualquer, como viver sem ideias e ir contra qualquer pensamento que não seja seu. Não tenha medo de mostrar a sua própria exiguidade. No fim dos tempos, não fará mesmo a menor diferença.
A ambição pode ser algo saudável em sua vida desde que esse sentimento não se torne algo obsessivo. Obcecado tem origem no latim obcaecare, que indica um estado de cegueira. Isto porque o indivíduo obcecado não consegue avaliar os seus comportamentos e a própria realidade. Uma combinação de ambição com abnegação pode equilibrar as coisas. Escadas servem para subir e descer.
Será mesmo que não fazemos mal aos outros por ser puros de coração ou é puro medo das escrituras, medo do karma, pura vaidade para ser reconhecido como uma pessoa boa, pura maneira de se sentir especial. Será mesmo que o objetivo da nossa bondade, realmente é o objetivo da nossa bondade ou apenas um veículo para exaltação pessoal? Bondade, do latim “bonidate”, é a qualidade de quem tem boa índole. Ter bondade é ser benevolente, ser amável, é procurar ajudar o outro, um verdadeiro bonachão. Sei não, é fácil ser bondoso e mais fácil ainda falar publicamente sobre a própria bondade. Eu preferiria não ter uma pessoa bondosa a me ajudar e sim misericordiosa, pois é um sentimento. Ser misericordioso é ter compaixão do coração e significa ter capacidade de sentir aquilo que a outra pessoa sente, aproximar seus sentimentos dos sentimentos de alguém, ser solidário com as pessoas. Quem sabe a compaixão e a bondade façam uma boa dupla, sem a segunda fazer propaganda para dentro de si mesmo ou pior, para ser amado pelos outros. “Não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita.”, diz o adágio popular.
Karma não é e nem nunca será algo ruim. É apenas sinônimo de oportunidade quando algo aparentemente mau tem a ver com coisas pretéritas e nesse caso, basta a pessoa usar o dharma (atitudes) para corrigir. Karma pode ser considerado uma coisa muito boa também. Constantemente estamos dentro do karma e estamos criando karma a cada segundo da nossa existência. Se o karma é bom ou ruim, depende do que plantamos, pois vamos colher aquilo que crescer.
O caminho é de cada um, ensinamentos de mestres e gurus podem ajudar, mas é apenas a ideia deles e não a sua. O bom caráter de alguém, se já existe, é apenas reforçado com conhecimentos. Na falta de caráter, não há ensinamento algum que possa resolver algo que só pode ser resolvido dentro de cada um.
A lei espiritual não serve para você ser ou estar enganado, porquanto ela não é boa e nem má, e sim justa. Então não se faça de humilde e caridoso porque alguém disse que você tem que ser assim. Isso nasce naturalmente no coração de cada um. O que se dá a outros por caridade, dá-se daquilo que nos sobra sem retirar o nosso pão. Damos o que temos para dar e não aquilo que ainda nos falta. Dar o que nos vai fazer falta, isso não é ser humilde e sim subserviente.
Sentiremos falta - um dia - daqueles que não nos deixam sentir o que é solidão. A solitude, tão alardeada nos meios espirituais, pode ser bonita nas palavras, no papel, mas o ser humano não nasceu para ser só.
Se todo mundo que escrevesse ou mesmo apenas gostasse de uma coisa boa escrita e fizesse essa coisa boa, o mundo seria bem melhor de viver. Penso que escrever frases bonitas de amor ou ajuda não passa apenas de algo que gostaríamos que fosse assim. Alguns poucos conseguem, isso já é um alento.
A falsa percepção de quem somos pode nos dar uma visão errada do que os outros tem que suportar no que realmente veem em nós, pois cada um tem a sua percepção também.
Passamos e perdemos tanto tempo na vida tentando ser melhores para os outros que nos perdemos em ser melhores para nós mesmos. Podem chamar isso de egoismo, dizem os egoístas, mas quem é mais importante? Se não somos melhores para nós mesmos, certamente o que somos para os outros nunca terá estofo consistente. Não ajude ninguém se o que você intimamente quer é ser reconhecido. Não ajude ninguém se precisa dizer ou mostrar para alguém que o fez, isso não é ajuda e sim uma maneira de mostrar o quanto você é "bom". Isso pode servir ao seu ego e quem sabe até uma ajuda ao próximo, mas vendo de forma espiritual, não saiu da infância ainda. É até uma coisa simples de entender, mas de difícil consecução. Quem sabe, um dia.
Swami Paatra Shankara
Nada nos atinge tão seriamente quanto aquilo que de forma consciente ou inconsciente achamos de nós mesmos, para o bem ou para o mal.
