Hermann Hesse

101 - 125 do total de 228 pensamentos de Hermann Hesse

Um homem da Idade Média condenaria totalmente o nosso estilo de vida atual como algo muito mais cruel, terrível e bárbaro. Cada época, cada cultura, cada costume e tradição têm o seu próprio estilo, tem sua delicadeza e sua severidade, suas belezas e crueldades, aceitam certos sofrimentos como naturais, sofrem pacientemente certas desgraças. O verdadeiro sofrimento, o verdadeiro inferno da vida humana reside ali onde se chocam duas culturas ou duas religiões... Há momentos em que toda uma geração cai entre dois estilos de vida, e toda a evidência, toda a moral, toda a salvação e inocência ficam perdidos para ela.
(O Lobo da Estepe)

Inserida por Filigranas

Os ideais serão algo que se possa alcançar?

Venho manifestando já por vezes minha opinião de que cada povo e até cada indivíduo, em vez de sonhar com falsas “responsabilidades” políticas, devia refletir a fundo sobre a parte de culpa que lhe cabe da guerra e de outras misérias humanas, quer por sua atuação, por sua omissão ou por seus maus costumes; este seria provavelmente o único meio de se evitar a próxima guerra. E por isso, não me perdoam, pois se julgam todos, sem dúvida, inocentes: o Kaiser, os generais, os grandes industriais, os políticos, os jornalistas... nenhum deles tem absolutamente nada de que recriminar-se, ninguém tem culpa alguma! Poder-se-ia até pensar que tudo foi melhor assim para o mundo, embora alguns milhões de mortos estejam embaixo da terra. E saiba, Hermínia, embora esses artigos ignominiosos não me possam atingir, às vezes me entristecem. Dois terços da gente do meu país leem esta espécie de jornal; leem de manhã e à noite coisas escritas neste tom, são trabalhados permanentemente, incitados, açulados; semeia-se neles o descontentamento e a maldade, e a meta final de tudo isto é outra vez a guerra, a próxima guerra, que já está chegando e que sem dúvida alguma será muito mais horrenda do que a última. Tudo isto é claro e simples, qualquer pessoa pode compreendê-lo; com uma hora de meditação todos poderiam chegar ao mesmo resultado. Mas ninguém quer agir assim, ninguém quer evitar a próxima guerra, quer livrar-se nem livrar a seus filhos da morte aos milhares, nem quer parar um instante e pensar voluntariamente. Uma hora de reflexão, um momento de entrar em si mesmo e perguntar a parte de culpa que lhe cabe nesta desordem e na maldade que impera no mundo... mas ninguém quer fazê-lo! E assim tudo continua como estava e a próxima guerra vai-se preparando cada dia que passa, com o auxílio de milhares e milhares de pessoas diligentes. Estas coisas sempre me desesperaram: para mim não existe “pátria”, não existe “ideal” algum. Tudo isto não passa de frases inculcadas por aqueles que preparam a próxima carnificina. Não tem sentido pensar ou escrever algo que seja humano, de nada vale ter boas ideias na mente... são duas ou três pessoas que agem assim em compensação, há milhares de jornais, de revistas, de conferências, reuniões públicas ou secretas que, dia após dia, insistem no contrário e acabarão por alcançá-lo. Hermínia permaneceu ouvindo com interesse.
— Sim — disse em seguida — você tem razão. Naturalmente haverá outra guerra; não é preciso ler nos jornais para saber disto. É certo, embora isso nos entristeça, que o homem, apesar de tudo e de todos, apesar do que possa fazer, o homem tem inevitavelmente de morrer. A luta contra a morte, meu caro Harry, é sempre uma coisa bela, nobre, prodigiosa e digna, da mesma forma que a luta contra a guerra. Mas há de ser sempre uma quixotada sem esperanças.
— Talvez seja verdade — exclamei enérgico — mas com verdades semelhantes a esta de que temos todos de morrer e que, por conseguinte, tudo é igual, é que convertemos a vida em algo monótono e estúpido. Desta forma teremos de renunciar a tudo, ao espírito, às aspirações; teremos de destruir a Humanidade, teremos de permitir que reine o egoísmo e o dinheiro e esperar a próxima guerra com um copo de cerveja à mão.
Estranho foi o olhar que Hermínia me dirigiu; um olhar de regozijo, cheio de ironia e malícia, de compreensão e camaradagem, mas também cheio de arrogância, de consciência e de profunda seriedade.
— Isto não se aplica a você — disse em tom maternal. — Sua vida não será monótona nem estúpida, embora saiba que sua luta é inútil. É muito mais lisonjeiro, Harry, lutar-se por alguma coisa bela e ideal e saber ao mesmo tempo que não se conseguirá alcançá-la. Os ideais serão algo que se possa alcançar? Viveremos para acabar com a morte? Não, vivemos para temê-la e também para amá-la, e precisamente por causa da morte é que nossa vida vez por outra resplandece tão radiosa num breve instante.
(de O Lobo da Estepe)

Os ideais serão algo que se possa alcançar? Viveremos para acabar com a morte? Não, vivemos para temê-la e também para amá-la, e precisamente por causa da morte é que nossa vida vez por outra resplandece tão radiosa num breve instante.

Inserida por Filigranas

...como admirava, então, aquelas enevoadas tardes de outono ou de inverno! Como respirava, ansioso e embevecido, a sensação de isolamento e melancolia, quando, noite adentro, enrolado em meu capote, atravessava as chuvas e tempestades de uma natureza hostil e revoltada, e caminhava errante, pois naquele tempo já era só, mas ia repleto de profunda satisfação e de versos, que mais tarde escrevia, em meu quarto, à luz de uma vela, sentado à beira da cama.
(O Lobo da Estepe)

Como não haveria de ser eu um Lobo da Estepe e um mísero eremita em meio a um mundo cujos objetivos não compartilho, cuja alegria não me diz respeito! (...) E, de fato, se o mundo tem razão, se essa música dos cafés, essas diversões em massa e esses tipos americanizados que se satisfazem com tão pouco têm razão, então estou louco. Sou, na verdade, o Lobo da Estepe, como me digo tantas vezes – aquele animal extraviado que não encontra abrigo nem alegria nem alimento num mundo que lhe é estranho e incompreensível.

Todo homem é uno quanto ao corpo, mas não quanto à alma.


(O Lobo da Estepe)

...agora me visto e saio, vou visitar o professor e troco com ele algumas frases amáveis, mais ou menos falsas, tudo isso contra a minha vontade, assim procede a maioria dos homens que vivem e negociam todos os dias, todas as horas, forçadamente e sem na realidade querê-lo; fazem visitas, mantêm conversações, sentam-se durante horas inteiras em seus escritórios e fábricas, tudo à força, mecanicamente, sem vontade; tudo poderia ser realizado com a mesma perfeição por máquinas ou não se realizar; e essa mecânica eternamente continuada é o que lhes impede, assim como a mim, de exercer a crítica à sua própria visa, reconhecer e sentir sua estupidez e superficialidade, sua desesperada tristeza e solidão. E têm razão, muitíssima razão, os homens que assim vivem, que se divertem com seus brinquedinhos, que correm atrás de seus assuntos, em vez de se oporem à mecânica aflitiva e olharem desesperados o vazio, como faço eu, homem marginalizado que sou.
(O Lobo da Estepe)

Inserida por Filigranas

Aprenda a levar a sério o que merece ser levado a sério, e a rir de tudo mais!


(O lobo da estepe)

O olhar do Lobo:

O olhar do Lobo da Estepe penetrava todo o nosso tempo, toda a afetação, toda a ambição, toda a vaidade, todo o jogo superficial de uma espiritualidade fabricada e frívola. Ah! Lamentavelmente o olhar ia mais fundo ainda, ia além das simples imperfeições e desesperanças de nosso tempo, de nossa espiritualidade, de nossa cultura. Chegava ao coração de toda a Humanidade; expressava, num único segundo, toda a dúvida de um pensador, talvez a de um conhecedor da dignidade e sobretudo do sentido da vida humana. Esse olhar dizia: “Veja os macacos que somos! Veja o que é o homem!” E toda a celebridade, toda a inteligência, toda a conquista do espírito, todo o afã para alcançar a sublimidade, a grandeza e o duradouro do humano se esboroava de repente e não passava de frívolas momices!
(O Lobo da Estepe)

Solidão é o modo que o destino encontra para levar o homem a si mesmo.

Ao meu irmão

Quando revemos nossa casa, agora,
andamos encantados pelos cômodos,
ficamos longo tempo no jardim
onde – meninos levados – brincávamos.

E de todos os outros esplendores
que pelo mundo afora conquistamos,
nenhum mais nos alegra nem agrada
quando o sino da igreja faz-se ouvir.

Calados repisamos velhas trilhas
cruzando o verde terreno da infância:
e elas no coração tornam-se vivas,
grandes e estranhas, como um belo conto.

Mas tudo o que estaria à nossa espera
já não há de ter mais o puro brilho
de outrora – quando, ainda rapazolas
no jardim caçávamos borboletas.

Inserida por carlosmachado67

O brando é mais forte que o duro; a água, mais forte que a rocha;
o amor, mais forte que a violência.

(Extraído do livro em PDF: Hermann Hesse para desorientados [recurso eletrônico] / Allan Percy; [tradução Michelle Strzoda]. Rio de Janeiro: Sextante, 2013.)

Inserida por portalraizes

Nenhum ser humano pode ver e entender em outro o que ele mesmo não viveu.

(do livro em PDF: Hermann Hesse para desorientados [recurso eletrônico])

"Só é capaz de se comportar com delicadeza quem tem necessidade dessa delicadeza."

Minha história é, no entanto, para mim, mais importante do que a de qualquer poeta é para ele, pois é a minha própria história, e é a história de um homem – não de um personagem inventado, possível ou inexistente em qualquer outra forma, mas a de um homem real, único e vivo.
(Demian)

Homem algum chegou a ser completamente ele mesmo; mas todos aspiram a sê-lo, obscuramente alguns, outros mais claramente, cada qual como pode.
(Demian)

Inserida por Filigranas

Pela primeira vez saboreei a morte, e ela tinha um gosto amargo, pois é nascimento, é angústia e pavor ante uma renovação aterradora.
(Demian)

E eu, que já era Caim e levava a marca na fronte, imaginara naquele instante exato que o sinal não era um estigma infamante, mas antes um distintivo e que minha maldade e infelicidade me faziam superior a meu ai, superior aos homens bons e piedosos.
(Demian)

Hoje sei muito bem que nada na vida repugna tanto ao homem do que seguir pelo caminho que o conduz a si mesmo!

Hermann Hesse
Demian: historia da juventude de Emil Sinclair (1919).

Quando um animal ou um homem orienta toda sua atenção e toda sua força de vontade para determinado fim, acaba por consegui-lo.
(Demian)

Inserida por Filigranas

As palavras engenhosas não têm qualquer valor, absolutamente nenhum. Só conseguem afastar-vos de nós mesmos. E afastar-se de si mesmo é um pecado. É preciso que se saiba encerrar-se em si mesmo, como a tartaruga.
(Demian)

Inserida por Filigranas

Exatamente como a árvore do outono que não sente o perder de suas folhas nem quando a chuva, a geada e o sol lhe resvalam pelo tronco, e a vida se retira para o mais íntimo e recôndito de si mesma. Ela não morre. Espera.
(Demian)

No fundo eu era assim! Eu que caminhava pelo mundo, insulado em meu desprezo! Eu, que sentia o orgulho da inteligência e compartilhava de pensamentos de Demian! Isso é que eu era: lixo, escória, bêbado e mesquinho, repugnante e grosseiro, uma besta selvagem dominada por instintos asquerosos. (…) Eu, que havia dominado a música de Bach e as belas poesias! Dominado pelo asco e pela indignação, ouvia ainda o meu próprio riso, um riso ébrio, desenfreado, que fluía aos borbotões, estúpido. Aquilo era eu!
(Demian)

A parte de minha vida que tive de arrancar às potências sombrias ofereci-a em sacrifício aos poderes luminosos. Meu fim não era o prazer, mas a pureza; não a felicidade, mas a espiritualidade e a beleza.
(Demian)

Nem todo mundo é Fausto.

(Demian)

Inserida por Filigranas