Fernando Pessoa

Fernando Pessoa

Poeta português
401 - 425 do total de 946 pensamentos de Fernando Pessoa

Descobri que a leitura é uma espécie de sonho escravizador, se devo sonhar porque não sonhar os meus próprios sonhos.

Dantes eu queria
Embeber-me nas árvores, nas flores,
Sonhar nas rochas, mares, solidões.
Hoje não, fujo dessa idéia louca:
Tudo o que me aproxima do mistério
Confrange-me de horror. Quero hoje apenas
Sensações, muitas, muitas sensações,
De tudo, de todos neste mundo — humanas,
Não outras de delírios panteístas
Mas sim perpétuos choques de prazer
Mudando sempre,
Guardando forte a personalidade
Para sintetizá-las num sentir.
Quero
Afogar em bulício, em luz, em vozes,
— Tumultuárias [cousas] usuais —
o sentimento da desolação
Que me enche e me avassala.
Folgaria
De encher num dia, [...] num trago,
A medida dos vícios, inda mesmo
Que fosse condenado eternamente —
Loucura! — ao tal inferno,
A um inferno real.

Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

Sei que nunca terei o que procuro
E que nem sei buscar o que desejo,
Mas busco, insciente, no silêncio escuro
E pasmo do que sei que não almejo.

Se nada existisse, minhas irmãs?... Se tudo fosse, de qualquer modo, absolutamente coisa nenhuma?

Inserida por vicknogueira

Navegar é preciso; viver não é preciso.

Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina. Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.

Fernando Pessoa
PESSOA, F. Odes de Ricardo Reis. Lisboa: Ática. 1946 (imp.1994). P. 92

Nota: Pelo heterônimo Ricardo Reis.

...Mais

O Universo não é uma idéia minha.
A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos,
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso

Sou metade sonânbulo e outra parte nada

Há tanta suavidade em nada se dizer e tudo se entender.

G. Junqueiro? Tenho uma grande indiferença pela obra dele. Já o vi... Nunca pude admirar um poeta que me foi possível ver.

Sou feito das ruínas do inacabado e é uma paisagem de desistências que definiria meu ser.

Mesmo a circunstância de eu ir publicar um livro vem alterar a minha vida. Perco uma coisa - o ser inédito.

Inserida por adetunedradio

E perder um defeito, ou uma deficiência, ou uma negação, sempre é perder.

Este livro é a biografia de alguém que nunca teve vida...

E subia-nos o choro à lembrança, porque nem aqui, ao sermos felizes, o éramos...

E nós não nos peruntávamos para que era aquilo, porque gozávamos o saber que aquilo não era para nada.

Com este sonhar tudo, tudo na vida te farás sofreres mais.
Será a tua cruz.

E tudo aquilo - toda esta frescura lenta da manhã leve, era análogo a uma alegria que ele nunca pudera ter.

Exprimir é sempre errar.

Assim éramos nós obscuradamente dois, nenhum de nós sabendo bem se o outro não era ele-próprio, se o incerto outro viveria...

Inserida por adetunedradio

O meu ideal seria viver tudo em romance, repousando na vida - ler as minhas emoções, viver o meu desprezo delas.

Lá fora passarão civilizações, escacharão revoltas, turbilhonarão festas, correrão mansos quotidianos povos.. E nós, ó meu amor irreal, teremos sempre o mesmo gesto inútil, a mesma existência falsa.

A recordação é uma traição à natureza,
Porque a natureza de ontem não é natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.

Eu sou o intervalo entre o meu querer e o que a vontade dos outros fez de mim.

Fernando Pessoa

Nota: Adaptação de trecho do poema "Começo a conhecer-me" de Álvaro de Campos