Fernanda R. Mesquita

Encontrados 9 pensamentos de Fernanda R. Mesquita

Lágrimas

Gotinhas húmidas e transparentes
queimam o meu rosto cansado!
Mas não são lume!
São lágrimas fortes e quentes,
são um grito silenciado
num silencioso queixume.

São um livro fechado
tão quase depois de o abrir,
são o poema inacabado
que a meio quis partir.

E nessa lágrima transparente,
nesse silencioso queixume,
morreu o sorriso inocente
numa gotinha quente
que queima sem ser lume!

Fernanda Rocha Mesquita

A ironia dos outros

Por vezes a ironia dos outros,
sobretudo daqueles que são mais importantes para mim,
são mágoas das quais eu tento rir
para não lhes dar demasiada importância.

Fernanda R. Mesquita

Inserida por carlosroque

Nasceu em Portugal. Vive no Canada.

Textos retirados do blog pessoal da autora.

'' 1961. Quantas coisas podem acontecer no ano em que nascemos ou numa data em que algo importante nos acontece! Com menor ou maior importância todas as ocorrências ramificam a sociedade, mesmo as que não florescem.
Pensando bem foi uma época cheia de vontade para mudar. Os direitos das mulheres começavam a ganhar voz e surgia devagar o direito ao divórcio. A televisão nascida recentemente funcionava um pouco como um manto para esconder a realidade de Portugal e para entreter os olhares dos portugueses. Os artistas, os escritores e os cineastas iam-se impondo com uma certa dificuldade, mas impunham-se. Como cantores destacavam-se Simone de Oliveira, Madalena Inglesias, António Calvário e Artur Garcia. Nesse verão,a 13 de Agosto, Mário Silva vencia a volta a Portugal em bicicleta. Vingava uma das maiores empresas alimentares de Portugal; as Carnes Primor. Eusébio tornou-se jogador do Benfica, em Maio de 1961, já com a época quase a terminar, mas ainda a tempo de se tornar campeão nacional no seu 1º ano ao serviço ao Benfica. Era criado o Instituto Gulbenkian da Ciência. João Osório, um dos fundadores da Casa da Comédia estreava a sua primeira peça literária `` D. Henrique de Portugal``, no Teatro Nacional D. Maria. Almada Negreiros decorava as fachadas dos edifícios na Cidade Universitaria de Lisboa e nascia Ricardo Pinto, escritor de literatura fantástica e uns dias antes de eu nascer, estalava a Guerra de África.
Vivi a ditadura e o dia em que nos libertamos dela.
Da História antes do 25 de Abril? A História de Portugal, eu conhecia através da matéria que dera na Escola de Ensino Primário e no Ciclo Preparatório. Mas não só! Aprendi a conhecer o ambiente político do país onde nascera e vivia, pelas inúmeras histórias contadas pelos adultos, sobretudo pelo meu avô

Guardo na memória, a sala de aula na pequena escola da aldeia... a minha tão amada sala de aula! No entanto, hoje, seu sei, que o que lhe dava vida, eram os nossos sonhos de meninos. Ela tinha cheiro a aventura. Era como um navio, onde entrávamos e podíamos viajar pelo mundo inteiro, sem sair dali. Mas, eu não sabia ainda, que tudo ali era comandado pelos ideais políticos de um só homem; Salazar. Lembro-me da enorme cruz, no meio das molduras escuras, com as fotos a preto e branco do Presidente da República e do Presidente do Concelho. Todas as manhãs, antes do início das aulas, ficávamos de pé, solenemente direitos, para cantar o Hino Nacional. A importância deste ritual não era sentida apenas, ´´ antes do início das aulas``, porque, este ritual obrigatório, estendia-se e fazia-se sentir em toda a nossa educação. Muito mais tarde, viria a entender o poder da figura de Salazar na vida do povo português. Até ali, ele não passara de mais um personagem nas história que o meu avô contava, após a ceia, em frente à lareira, que nos aquecia nas noites frias de Inverno. Anos depois compreendi, o verdadeiro significado do tom mais baixo, que ele usava quando falava do Estado Português. Por vezes ele falava de alguém que se tinha excedidos nas palavras e simplesmente desaparecera, sem que mais ninguém soubesse dele.
Depois chegou a liberdade. Uma liberdade que convidou muitos portugueses a emigrarem.

Somos um povo mais aberto, podemos circular por toda a Europa e sabemos o que vai pelo Mundo. Todas as casas (quase) têm esgotos, electricidade, são equipadas com eletrodomésticos mas não existem condições monetárias para pagar tudo isso. É como se a liberdade tivesse sido ganha pela metade. As famílias que continuam a perder as suas casas, os velhos condenados a reformas precárias e cada vez com menos direitos que os ajudem a envelhecer com dignidade e as crianças que vão para a escola com fome, são a fotocópia perfeita do resultado de um governo desequilibrado, arrogante e insensível. A agricultura, as várias indústrias e comércios vivem de incertezas, abalados pelos limites que lhe são impostos.

- Não terão escasseado as uvas, porque as cepas foram cortadas a troco de dinheiro estéril?

Viva a poesia!

Viva o amor!


´´Vivi várias realidades; a algumas, àquelas de péssima índole,
cheias de códigos maliciosos e de raízes malignas... voltei as costas.
Depois de uma regularidade excessiva em campo de batalha,
entendi que não falávamos a mesma língua...
E como não queria viver na sombra ou em permanente conflito,
consumida por ódios e lágrimas, converti-as ao isolamento.
Tranquei a porta, pregando eu mesma, tábua a tábua...
(Senão, não me sobraria tempo para viver e amar.)
Agora sei que morrerei nova, ainda que morra com cem anos de idade!``

Inserida por carlosroque

Mais do que arte / Plus que de l’art- poesia traduzida por Angela Viegas


Plus que de l'art, je l'appellerais sentiment
celui qui tout en aimant le monde, sur la vie s’est concentré
et qui sur la terre peint un tableau qui rend réel ce moment,
où la pluie chante la chanson que le vent lui a enseigné.

La nuée sombre par la foudre éclaircie,
balance en l'air sans le moindre signe de douleur
et vêtue de sa royauté naturelle, accepte ravie
la voix forte du tonnerre qui sait lui parler d’amour.

Et chaque goutte d'eau est comme un baiser sur la terre,
où le sol se sent comme un ventre enchanté,
germinant la semence dans les plaines ou dans les montagnes,
demeurant dans mes yeux comme un long baiser.

À qui dois-je remercier pour une telle beauté
pour pouvoir sentir que pendant la nuit tant de vie s’anime,
si le nuage cache la lune, le soleil l’illumine
et la pluie devient libre en tombant sur la feuille qui l’a capturée


Et le texte original:
Mais do que arte

Mais do que arte, eu chamaria de sentimento
àquele que amando o mundo, na vida se concentrou
e na terra pintou um quadro que torna real este momento,
onde a chuva canta a canção que o vento lhe ensinou.

A nuvem negra pelo relâmpago aclarada,
balança no ar sem o menor sinal de dor
e vestida da sua natural realeza, aceita encantada
a forte voz do trovão que lhe sabe falar de amor.

E cada gota de água é como um beijo na terra,
onde o solo se sente como ventre encantado,
germinando a semente na planície ou na serra,
demorando nos meus olhos como um beijo demorado.

A quem devo agradecer tamanha beleza
ao poder sentir que na noite tanta vida se acende,
se a nuvem esconder a lua, o sol a fará luz acesa
e que a chuva se liberta ao cair na folha que a prende.

O corvo e a tempestade


A noite ficou escura e o vento sopra torvo,
a chuva bate tão solitária na janela,
talvez fuja do agouro do corvo
que bate as negras asas atrás dela.

Porque chove assim, canta o corvo e sopra o vento
se nem sequer é Dezembro mas sim Agosto.
Espreito pela vidraça e vejo o vento violento
a fazer girar o corvo que brinca bem disposto.

Murmurei lenta alguns ais,
sem entender a negrura dos espaços celestiais,
para de seguida sorrir enternecida ao perceber,

que enquanto eu fiquei desorientada, aborrecida
por uma tempestade que chegou perdida
o corvo abriu as asas, quis brincar... quis viver!

Inserida por carlosroque

Vestígios


Sinto na tua camisa lavada,
neste tecido que abraço
a tua pele marcada,
do teu corpo que adormeceu
vencido pelo cansaço,
descansando sobre o meu.
Lanço o olhar àquela hora
em que o teu respirar se perdeu
no meu peito que agora
respira triste sem o teu.
E sobre este tecido que aperto
cai uma lágrima cansada
como um grito que cai certo
na tua camisa lavada!

Inserida por joanasilva

Tempo de alma

Ai! O nosso tempo esfuma-se nesta distância fria
E eu vou morrendo triste, em desalento,
restos mortais de uma flor que em melancolia
se desfaz no ar ao sabor do tempo.

Que romântico delirío, que desengano
quereres segurar o tempo, que sonho vão
quando se podem contar os dias num ano
em que eu sinto a tua mão na minha mão.

Um dia estarei velha desfiando o novelo
Do tempo que passou e não atendeu ao meu apelo.
Velhinha, sentada na porta olhando o horizonte distante,

Tentando ver-te a ti, também já velhinho, pois...
Ou será que o tempo dará tempo a nós dois
De vivermos, ainda jovens, este amor por um instante?

Inserida por joanasilva

Força


Sento-me muitas vezes
no colo da criança que fui;
como é bom o seu abraço,
entregar-me à sua inocência,
reaprender a sorrir
e relembrar-me que o galho quando quebra,
torna à terra, transmuta-se em adubo
e germina árvore em flor,
com mais vida do que nunca.

Inserida por joanasilva

Contemplação


Na imensidade dos anos que passam tão rápido
´´readmiro`` o subtil encanto de certos detalhes
requintados e penetrantes da vida.
Cegos por atingir grandes quantidades de êxtase
presos às ideais aparências
embebemos os dias em imagens falsamente decoradas,
vazias...
Contemplação que nos cansa tão rapidamente,
tão rapidamente perde o seu encanto!
Passivos ao esplendor da vida
e ansiosos por novas faíscas de emoções,
com um poder mais sedutor,
dirigimos a atenção do nosso olhar
para outros rumos tão pouco necessários
que perpetuam desconcertantes influências,
que nos roubam o fundo da nossa alma
e nos conduzem à inferioridade do ser humano,
tornando-nos incapazes de descobrir
o caminho mais curto para a felicidade,
onde desabrocha mais pura
a verdade harmoniosa
que nos oferece felicidade na hora certa em que precisamos dela
e que nós não queremos por ser simples demais...
( Antes de contemplarmos as estrelas no céu,
deixemos que os nossos olhos vejam o que brilha ao nosso lado!)

Inserida por joanasilva