Poemas curtos de Clarice Lispector
Sempre fui uma tímida muito ousada.
Era uma falsa revolta, uma tentativa de libertação que vinha sobretudo com muito medo de vitória.
Respeite a você mais do que aos outros, respeite suas exigências, respeite mesmo o que é ruim em você – respeite sobretudo o que você imagina que é ruim em você – pelo amor de Deus, não queira fazer de você uma pessoa perfeita – não copie uma pessoa ideal, copie você mesma – é esse o único meio de viver.
O que me importa são instantâneos fotográficos das sensações – pensadas, e não a pose imóvel dos que esperam que eu diga: olhe o passarinho! Pois não sou fotógrafo de rua.
Agora me lembrei de uma coisa engraçada. Um amigo nosso em Argel achou a moça do restaurante muito bonitinha e perguntou-lhe se queria ir ao cinema com ele. Ela respondeu um pouco ofendida e muito digna: Pas moi, je suis vierge!
Não é tão engraçado? Ele disse que teve vontade de responder: C’est pas ma faute...
Esse primeiro calor ainda fresco trazia: tudo. Apenas isso, e indiviso: tudo.
E tudo era muito para um coração de repente enfraquecido que só suportava o menos, só podia querer o pouco aos poucos.
Quem já não se perguntou: sou um monstro ou isto é ser uma pessoa?
Quero antes afiançar que essa moça não se conhece senão através de ir vivendo à toa.
Tudo tem que ser bem de leve para
eu não me assustar e não assustar os
que amo.
Pedem-me pouco, pedem-me quase nada.
O terrível é que eu tenho muito para dar
e tenho que engolir esse muito e ainda
por cima dizer com delicadeza: obrigada
por receberem de mim um pouquinho de mim.
Haverá um ano em que haverá um mês, em
que haverá uma semana em que haverá um
dia em que haverá uma hora em que haverá
um minuto em que haverá um segundo
e dentro do segundo haverá o não tempo
sagrado da morte transfigurada.
Eu queria escrever um livro. Mas onde estão as palavras? esgotaram-se os significados. Como surdos e mudos comunicamo-nos com as mãos. Eu queria que me dessem licença para eu escrever ao som harpejado e agreste a sucata da palavra. E prescindir de ser discursivo. Assim: poluição.
Escrevo ou não escrevo?
Há um tipo de choro bom e há outro ruim. O ruim é aquele em que as lágrimas correm sem parar e, no entanto, não dão alívio. Só esgotam e exaurem. (...)
Homem chorar comove. Ele, o lutador, reconheceu sua luta às vezes inútil. Respeito muito o homem que chora. Eu já vi homem chorar.
Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar como entrei no inexpressivo que sempre foi a minha busca cega e secreta.
E "eu te amo" era uma farpa que não se podia tirar com uma pinça. Farpa incrustada na parte mais grossa da sola do pé.
Ah, e a falta de sede. Calor com sede seria suportável. Mas ah, a falta de sede.
Não havia senão faltas e ausências. E nem ao menos a vontade. Só farpas sem pontas salientes por onde serem pinçadas e extirpadas.
Será que Deus sabe que existe?
Acho que Deus não sabe que existe. Tenho quase a certeza de que não. E daí vem a sua veemente força.
Enquanto escrever e falar vou ter que fingir que alguém está segurando a minha mão.
Oh, pelo menos no começo, só no começo. Logo que puder dispensá-la, irei sozinha. Por enquanto preciso segurar esta tua mão – mesmo que não consiga inventar teu rosto e teus olhos e tua boca.
Silêncio.
Se um dia Deus vier à terra, haverá um silêncio grande.
O silêncio é tal que nem o pensamento pensa.
Vagamente pensava de muito longe e sem palavras o seguinte: já que sou, o jeito é ser. (...)
Era muito impressionável e acreditava em tudo o que existia e no que não existia também. Mas não sabia enfeitar a realidade. Para ela a realidade era demais para ser acreditada. Aliás a palavra “realidade” não lhe dizia nada. Nem a mim, por Deus.
O futuro é meu enquanto eu viver.
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