Somos Passaros de uma Asamario Quintana
Uma das características humanas, é não aceitar a natureza humana. Errar e fraquejar, são exemplos disso.
Não consigo imaginar minha vida sem algumas pessoas. Talvez elas não saibam o quanto, mas ocupam uma importância sem tamanho para mim.
O amor chega em uma hora
Daqui a uma hora ele chega. Não deu tempo de consertar o esfolado da minha unha e de esfoliar decentemente os pêlos encravados. Esfolado, esfoliado. Tudo parece música e rima mas é só porque você chega em uma hora. Tem um carro que passa lá longe, enquanto eu tento abrir os olhos e encarar esse dia em que você chega. Esse carro não sabe, mas foram mil anos abrindo os olhos e ouvindo carros e ouvindo ruas e não ouvindo a sua voz. E agora a sua voz existe e você chega em uma hora. Não estou pronta. Minha barriga dói. Eu tenho vontade de vomitar. Eu não consigo comer de tanto medo que eu estou sentindo. Eu quase desmaiei agora de manhã, porque pra piorar está calor. Não lido bem com calor. Não lido bem com nada que não seja eu em minha bolha arejada de imaginações. Mentira, não lido bem com minha bolha arejada de imaginações também. Não lido bem com nada. Não deu tempo de virar mulher. A hora que ele aparecer no desembarque do aeroporto, com sua cara de homem, com sua voz de homem, eu vou ter vontade de pedir que ele volte de onde veio e espere mais cem anos. Porque não deu tempo de eu virar mulher. Eu vou ter vontade de pedir que ele me carregue no colo até a casa da minha mãe e me entregue pra ela. Eu queria tomar sopa na casa da minha mãe. Eu lembrei agora que minha mãe me dava Sustagem quando eu ficava assim, tão assustadoramente encantada pelo mistério das coisas. E ela temia que eu desintegrasse. E agora? Como faz quando se é adulta? Qual é a sustagem de agora para que eu não desintegre? Como é que se ama com um corpo de trinta e três anos se por dentro eu tenho cinco anos e estou tremendo, apavorada, pressentindo o estrago que as coisas de verdade podem causar. Por que eu chamo de estrago quando sei que, na verdade, estrago é o que as coisas que não são de verdade causam. Eu tenho tamanho pra suportar o tamanho das coisas de verdade?
O amor chega em uma hora e eu ainda não consegui comer, escolher a roupa, arrumar minha franja, decidir se já posso amar. O amor chega em uma hora e vai quebrar meu gesso mas eu não decidi se os ossos já estão bons o suficiente. Mas ele vai chegar com trinta martelos e eu vou estar esperando, forte e decidida, pra receber a porrada. E o ar que vai entrar. E mais dor. E o ar que vai entrar. E quem sabe então alguma felicidade, já que fui corajosa. Quem sabe a felicidade seja a harmonia entre a dor e o ar que entram pelos poros que temos coragem de abrir? E quem sabe só o amor seja o martelo possível?
Escrevo isso e choro. Porque quero tanto e não quero tanto. Porque se acabar morro. Porque se não acabar morro. Porque sempre levo um susto quando te vejo e me pergunto como é que fiquei todos esses anos sem te ver. Porque você me entedia e dai eu desvio o rosto um segundo e já não aguento de saudade. E descubro que não é tédio mas sim cansaço porque amar é uma maratona no sol e sem água. E ainda assim, é a única sombra e água fresca que existe. Mas e se no primeiro passo eu me quebrar inteira? E se eu forçar e acabar pra sempre sem conseguir andar de novo? Eu tenho medo que você seja um caminhão de luz que me esmague e me cegue na frente de todo mundo. Eu tenho medo de ser um saquinho frágil de bolinhas de gude e de você me abrir. E minhas bolhinhas correrem cada uma para um canto do mundo. E entrarem pelas valetas do universo. E eu nunca mais conseguir me juntar do jeito que sou agora. Eu tenho medo de você abrir o espartilho superficial que aperto todos os dias para me manter ereta, firme e irônica. Minha angústia particular que me faz parecer segura. Eu tenho medo de você melhorar minha vida de um jeito que eu nunca mais possa me ajeitar, confortável, em minhas reclamações. Eu tenho medo da minha cabeça rolar, dos meus braços se desprenderem, do meu estômago sair pelos olhos. Eu tenho medo de deixar de ser filha, de deixar de ser amiga, de deixar de ser menina, de deixar de ser estranha, de deixar de ser sozinha, de deixar de ser triste, de deixar de ser cínica. Eu tenho muito medo de deixar de ser.
Agora é menos de uma hora. Você vai chegar e automaticamente minha agenda de milhares de regras e horários e controles vai desaparecer. E eu vou ficar apavorada porque só o que eu tenho é o contorno mentiroso que eu dou para os meus dias. E você, porque me abraça e me dá outro desenho, é o vilão da minha vida programada. Você é o tufão de oxigênio que invade meu nariz mas, porque estou com tanto medo, mais parece falta de ar. Agora é menos de menos de uma hora. Preciso terminar esse texto. Mas eu tenho medo, sobretudo, de terminar esse texto. Sobre o que eu vou escrever se você for melhor do que esperar por você?
O que te escrevo não tem começo: é uma continuação. Das palavras deste canto, canto que é meu e teu, evola-se um halo que transcende as frases, você sente? minha experiência vem de que eu já consegui pintar o halo das coisas. O halo é mais importante que as coisas e as palavras. O halo é vertiginoso. Finco a palavra no vazio descampado: é uma palavra como fino bloco monolítico que projeta sombra. E é trombeta que anuncia.
Mas, em relação à minha vida, o que está acontecendo é uma busca muito grande de felicidade que eu estou encontrando...
Mas vou sair dessa, veja, já estou enxugando as lágrimas, mas procurando meu celular para fazer uma ligação qualquer, esses compromissos que a gente inventa para fingir que a vida continua.
Fiz uma faxina na minha vida vida. Joguei fora o desnecessário, eliminei o que não presta, separei o que é preciso, adicionei coisas novas […] Não sofro mais por excesso de lixo!
(...) vou pôr um anúncio em negrito: precisa-se de alguém homem ou mulher que ajude uma pessoa a ficar contente porque esta está tão contente que não pode ficar sozinha com a alegria, e precisa reparti-la. Paga-se extraordinariamente bem: minuto por minuto paga-se com a própria alegria.
Uma pessoa é sempre bruta com você? Não é obrigatório conviver com ela.
O cara está enrolando muito? Beije-o primeiro.
A resposta do emprego ainda não veio? Procure outro enquanto espera.
Paciência só para o que importa de verdade. Paciência para ver a tarde cair. Paciência para sorver um cálice de vinho. Paciência para a música e para os livros. Paciência para escutar um amigo. Paciência para aquilo que vale nossa dedicação.
Pra enrolação...atalho.
O sol às vezes bate na janela com uma intenção humanamente insana de clarear. Esquentando o ambiente, penetrado por raios ultra-violetas que impregnam a pele "vez-em-quando". Mal sabe ele, ou sabe muito bem, que não estamos dispostos a aceitar essa tal claridade intangível e mórbida. Mas mesmo assim, ele insiste. Insiste a tal ponto de querer nos fazer sair desse ambiente morno e contemplá-lo por completo...
Quero fazer uma homenagem aos excluídos emocionais, os que vivem sem alguém para telefonar no final do dia, os que vivem sem alguém com quem enroscar os pés embaixo do cobertor. São igualmente famintos, carentes de um toque no cabelo, de um olhar admirado, de um beijo longo, sem pressa pra acabar. A maioria deles são solteiros, os sem-namorado. Os que não têm com quem dividir a conta, não têm com quem dividir os problemas, com quem viajar no final de semana. É impossível ser feliz sozinho? Não, é muito possível, se isso é um desejo genuíno, uma vontade real, uma escolha. Mas se é uma fatalidade ao avesso – o amor esqueceu de acontecer – aí não tem jeito: faz falta um ombro, faz falta um corpo
De tanto andar uma região
que não figurava nos livros
acostumei-me às terras tenazes
em que ninguém me perguntava
se me agradavam as alfaces
ou se preferia a menta
que devoram os elefantes.
E de tanto não responder
tenho o coração amarelo.
Que um mundo de vilezas e desigualdades seja uma realidade aceitável e presente, e que um mundo justo e fraterno seja uma realidade distante e utópica é o maior atestado da incompetência, do egoísmo, da fraqueza e da mísera evolução humana.
Aprendi que uma coisa (mal) dita não tem nada que apague. A palavra proferida é um tiro na alma. Pode matar um sentimento. Pode acabar com o amor de alguém. Pode destruir uma amizade. Pode arruinar uma família. Uma palavra pode valer mais do que mil gestos. Pode machucar mais do que um tapa na cara. Pode separar mais do que a distância. Com palavras, eu magoei muita gente que eu amo. Eu perdi gente que eu amei. Mas foi só quando eu tomei uma surra de palavras na cara que eu aprendi.
Quando vejo num caminhão uma placa dizendo: “Inflamável” – então me encho de glória.
Mas é que também não sei que forma dar ao que me aconteceu. E sem dar uma forma, nada me existe. E – e se a realidade é mesmo que nada existiu?! Quem sabe nada me aconteceu? Só posso compreender o que me acontece mas só acontece o que eu compreendo – que sei do resto? O resto não existiu. Quem sabe nada existiu! Quem sabe me aconteceu apenas uma lenta e grande dissolução? E
que minha luta contra essa desintegração está sendo esta: a de tentar agora dar-lhe uma forma? Uma forma contorna o caos, uma forma dá construção à substância amorfa – a visão de uma carne infinita é a visão dos loucos, mas se eu cortar a carne em pedaços e distribuí-los pelos dias e pelas fomes – então ela não será mais a perdição e a loucura: será de novo a vida humanizada.
Já que tenho de salvar o dia de amanhã, já que tenho que ter uma forma porque não sinto força de ficar desorganizada, já que fatalmente precisarei enquadrar a monstruosa carne infinita e cortá-la em pedaços assimiláveis pelo tamanho de minha boca e pelo tamanho da visão de meus olhos, já que fatalmente sucumbirei à necessidade de forma que vem de meu pavor de ficar delimitada – então que pelo menos eu tenha a coragem de deixar que essa forma se forme sozinha como uma crosta que por si mesma endurece, a nebulosa de fogo que se esfria em terra. E que eu tenha a grande coragem de resistir à tentação de inventar uma forma.
Eu trocaria uma eternidade de depois da morte pela eternidade enquanto estou viva.
A vida é tão contínua que nós a dividimos em etapas, e a uma delas chamamos de morte. Eu sempre estivera em vida, pouco importa que não eu propriamente dita, não isso a que convencionei chamar de eu. Sempre estive em vida.
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