Quanto mais me Conheco Fernando Pessoa

Pesos desnecessários causam sempre dores desnecessárias.

Eu sou muito jeca afetivamente.

Quero te fazer compreender que não é assim, que tenho um medo cada vez maior do que vou sentindo em todos esses meses, e não se soluciona.

Você sabe que vai ser sempre assim. Que essa queda não é a última. Que muitas vezes você vai cair e hesitar no levantar-se, até uma próxima queda. Prefere jogar-se numa atitude que seria teatral, não fosse verdadeira, sentir os espinhos rasgando carne, as pedras entrando no corpo, o rosto espatifado contra o fim desconhecido. Precisa ir até o fundo.

Não se esforce. Pelo menos, não tanto. Não fique aí remando contra a maré, dando murro em ponta de faca. Se não for pra ser, não vai ser.

Ainda mando o tempo te colocar em um envelope, te selar todinho e enviar para mim.

De alguma forma absurda, nunca estive tão bem. Armado com as armas de Jorge. Os muros continuam brancos, mas agora são de um sobrado colonial espanhol que me faz pensar em García Lorca; o portão pode ser aberto a qualquer hora para entrar ou sair; há uma palmeira, rosas cor-de-rosa no jardim. Chama-se Menino Deus este lugar cantado por Caetano, e eu sempre soube que era aqui o porto.

E outra coisa – não se esforce. Pelo menos, não tanto. Não fique aí remando contra a maré, dando murro em ponta de faca.

Talvez se eu não tivesse chegado tão perto, nem te tocado tão fundo, nem sido tão eu... talvez houvesse alguma possibilidade.

Não ver, não ouvir, não tocar, não sentir.

Eu sorri. Quer dizer contraí os músculos da face para mostrar os dentes.

Sofrer dói. Dói e não é pouco. Mas faz um bem danado depois que passa(...) Mas agora, com sua licença. Não dá mais para ocupar o mesmo espaço. Meu tempo não se mede em relógios. E a vida lá fora, me chama.

Eu acho que as coisas que ficam fora da gente, essas coisas como o tempo e o lugar, essas coisas influem muito no que a gente vai dizer.

Que fique o bom, o belo.

Hoje é dia de não tentar compreender absolutamente nada, não lançar âncoras para o futuro.

Eu me sinto às vezes tão frágil, queria me debruçar em alguém, em alguma coisa... Alguma segurança.

Assim: dentro do que se podia tocar, escondido, vivia também o que só era visível quando o olho ficava tão inundado de luz que enxergava esse invisível no meio no tocável. Eu não sabia.

Repito que não vão acabar comigo. Haja fé.

O pouco é muito pra mim. O simples é tudo que cabe nos meus dias.

Ando com uma vontade tão grande de receber todos os afetos.