Poemas de Caio Fernando Abreu

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Te quero imensamente bem, fico pensando se dizendo assim, quem sabe, de repente você até acredita. Acredite.

Tudo isso fazia de mim uma pessoa desinteressante. Mas eu não queria ser interessante, era muito difícil.

Sabe, eu me sinto como se tivesse acabado. Parece que nada mais vai ser bonito outra vez.

Abaixo a razão e o pensamento! O negócio é só sentir, meu irmão, só sentir. Pensar já era. Pensar acabou, não se usa mais.

Agora me tornarei uma pessoa daquelas que se cuidam para não se envolver. Já tenho um passado, tenho tanta história.

Não queria que ele pensasse que eu andava bebendo, e eu andava, todo dia um bom pretexto.

Nossa, como estou generoso hoje. Deve ser carência generalizada. Mas olhando bem, a média geral não passa de cinco. Com muito boa vontade.

Deixe que ele respire, como uma coisa viva. Respire você também, como essa coisa viva que você é.

Você pode estender a mão para ele, tentar uma carícia desinteressada. Mas será melhor não fazer gesto algum.

(...) Está tudo partido, fragmentado, e eu acho que a grande esperança seria a de voltarmos a ser um. Ou sermos todas as coisas numa só, que é o que não conseguimos.

E bati, e bati outra vez, e tornei a bater, e continuei batendo sem me importar que as pessoas na rua parassem para olhar, eu quis chamá-lo, mas tinha esquecido seu nome, se é que alguma vez o soube, se é que ele o teve um dia, talvez eu tivesse febre, tudo ficara muito confuso, idéias misturadas, tremores, água de chuva e lama e conhaque batendo e continuava chovendo sem parar, mas eu não ia mais indo por dentro da chuva, pelo meio da cidade, eu só estava parado naquela porta fazia muito tempo, depois do ponto, tão escuro agora que eu não conseguiria nunca mais encontrar o caminho de volta, nem tentar outra coisa, outra ação, outro gesto além de continuar batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, batendo, na mesma porta que não abre nunca.

Então me invades outra vez com o mesmo jogo e embora supondo conhecer as regras, me deixo tomar inteiro por tuas estranhas liturgias.

Ela gostava quando, depois de muito tempo calada, ele pegava no seu queixo perguntando: - O que foi, guria?

E sendo assim preciso te dizer: mudei, embora continue o mesmo. Sei que você compreende...

Muito mais que com amor ou qualquer outra forma tortuosa da paixão, será surpreso que o olharás agora, porque ele nada sabe de seu poder sobre ti, e neste exato momento poderias escolher entre torná-lo ciente de que dependes dele para que te ilumines ou escureças assim, intensamente, ou quem sabe orgulhoso negar-lhe o conhecimento desse estranho poder, para que não te estraçalhe entre as unhas agora calmamente postas em sossego, cruzadas nas pontas dos dedos sobre os joelhos.[...]

Sinto muito, mas ele sempre está lá. Incógnito, invisível, inviável. In, enfim.

Mesmo consciente de que nasci sozinho do útero de minha mãe, berrando de pavor para o mundo insano, e que embarcarei sozinho num caixão rumo a sei lá o quê, além do pó. O que ou quem cruzo esses dois portos gelados da solidão é vera viagem: véu de maya, ilusão, passatempo. E exigimos o eterno do perecível, loucos.

Mergulho no cheiro que não defino, você me embala dentro dos seus braços, você cobre com a boca meus ouvidos entupidos de buzinas, versos interrompidos, escapamentos abertos, tilintar de telefones, máquinas de escrever, ruídos eletrônicos, britadeiras de concreto, e você me beija e você me aperta e você me leva pra Creta, Mikonos, Rodes, Patmos, Delos, e você me aquieta repetindo que está tudo bem, tudo bem.

Então me sinto protagonista de um filme chamado: Criaturas que o mundo esqueceu.

Ela sentia algum ódio, mas não dizia nada, toda madura repetindo isso-passa-questão-de-tempo-tudo-bem.