Poemas de Caio Fernando Abreu

Cerca de 2422 poemas de Caio Fernando Abreu

É estranho quando as coisas simplesmente têm de terminar. É o estágio onde todos os sentimentos já evoluíram para um nada. É o nada que você optou para parar de sentir dor. No início você briga, chora, faz drama mexicano. Então percebe que é cansativo demais manter esse jeito de levar as coisas. Acostuma-se. Não que pare de doer, mas que cai no seu entendimento que às vezes perdemos algo e não há solução. No fim você coloca um sorriso no rosto e finge que é sincero, até que a vida o faça realmente ser. Talvez os amores eternos sejam amenos e os intensos, passageiros. É isso.

Enxergue as pessoas como elas realmente são. Tire o photoshop, a trilha sonora, o close de melhor ângulo, a maquiagem e as roupas de marca e o cheiro do melhor perfume. Adicione o mau humor, as olheiras, os problemas, as manias, os defeitos. Agora sim, decida-se.

Você pode. Se quiser, você pode conquistar o seu destino, inventar a sua verdadeira vida. Sim, você pode.

Vou viver um dia de cada vez, como um alcoólatra, um dia isso desaparece e eu começo a viver de novo, estou com muita fé que as coisas vão mudar, que eu vou mudar.

O domingo está acabando — já é tarde — amanhã a gente começa de novo. Eu me sinto às vezes tão frágil, queria me debruçar em alguém, em alguma coisa. Alguma segurança. Invento estorinhas para mim mesmo, o tempo todo. Me conformo, me dou força. Mas a sensação de estar sozinho não me larga.

Os cabelos lisos caíram sobre o rosto. Para afastá-los, ela levantou a cabeça, e então viu o céu tão claro que não era o céu normal de Sampa, com uma lua quase cheia e Júpiter e Saturno muito próximos. Vista assim parecia não uma moça vivendo, mas pintada em aquarela, estatizada feito estivesse muito calma, e até estava, só não sentia mais nada, fazia tempo.

É difícil olhar no fundo de seus olhos e não conseguir imaginar as infinitas possibilidades que teríamos se o destino nos permitisse.

Os poetas mentiram pra mim, Roberto Carlos mentiu para a gente. O amor não é manso assim. Ele pega, invade e devora a gente.

A vida tem caminhos estranhos, tortuosos, às vezes difíceis: um simples gesto involuntário pode desencadear todo um processo.

Eu te olho sim profundamente, eu sou sim indecifrável, sempre fui um enigma, sempre fui assim, mas daí vem você e descobre meus segredos, decifra meus pensamentos, entende o meu olhar, aprende meus gostos, entende minhas manias… e você ainda me pergunta se eu amo você.

Às vezes, temos que enfrentar nossos medos. De amar, se decepcionar e estar só! Enfrentar a escuridão, abrir as janelas, deixar a luz entrar! Mesmo que não seja fácil, podemos sempre nos curar, custe o tempo que for. Pois se não foi, não era pra ser. Talvez não nos mereciam e talvez só nos serviu pra nos amadurecer e nos ensinar a aguardar por algo melhor no futuro. Às vezes fazemos com que pequenos sentimentos cresçam muito rápido, damos um valor e uma importância muito grande a isto. Mas não podemos esquecer que são pequenas coisas, e que se apegar nisto, só nos fará sofrer no final!

Meu coração está ferido de amar errado. De amar demais, de querer demais, de viver demais. Amar, querer e viver tanto que tudo em volta parece pouco. Seu amor, comparado ao meu, é pouco. Muito pouco. Mas você não vê. Não vê, não enxerga, não sente. Não sente porque não me faz sentir, não enxerga porque não quer. A mulher louca que sempre fui por você, e que mesmo tão cheia de defeitos sempre foi sua. Sempre quis ser só sua. Sempre te quis só meu. E você, cego de orgulho bobo, surdo de estupidez, nunca notou.

Não por ser forte, e sim pelo contrário… Por saber que é fraca o bastante para não conseguir ter ódio no seu coração, na sua alma, na sua essência. E ama, sabendo que vai chorar muitas vezes ainda…

Perdoem o silêncio, o sono, a rispidez, a solidão. Está ficando tarde, e eu tenho medo de ter desaprendido o jeito. É muito difícil ficar adulto.

Caio Fernando Abreu
Caio Fernando Abreu: Cartas. Rio de Janeiro: Aeroplano Editora, 2002.

Acho que a gente tem que vencer. Ou lutar. E ficar bem. Feliz. Criar. Fazer. Se mexer.

Fissura, estou ficando tonta. Essa roda girando girando sem parar. Olha bem: quem roda nela? As mocinhas que querem casar, os mocinhos a fim de grana pra comprar um carro, os executivozinhos a fim de poder e dólares, os casais de saco cheio um do outro, mas segurando umas. Estar fora da roda é não segurar nenhuma, não querer nada. Feito eu: não quero ninguém. Nem você. Quero não, boy. Se eu quiser, posso ter. Afinal, trata-se apenas de um cheque a menos no talão, mais barato que um par de sapatos. Mas eu quero mais é aquilo que não posso comprar. Nem é você que eu espero, já te falei. Aquele um vai entrar um dia talvez por essa mesma porta, sem avisar. Diferente dessa gente toda vestida de preto, com cabelo arrepiadinho. Se quiser eu piro, e imagino ele de capa de gabardine, chapéu molhado, barba de dois dias, cigarro no canto da boca, bem noir. Mas isso é filme, ele não. Ele é de um jeito que ainda não sei, porque nem vi. Vai olhar direto para mim. Ele vai sentar na minha mesa, me olhar no olho, pegar na minha mão, encostar seu joelho quente na minha coxa fria e dizer: vem comigo. É por ele que eu venho aqui, boy, quase toda noite. Não por você, por outros como você. Pra ele, me guardo. Ria de mim, mas estou aqui parada, bêbada, pateta e ridícula, só porque no meio desse lixo todo procuro o verdadeiro amor. Cuidado, comigo: um dia encontro.

Sabes de tudo sobre esse possível amargo futuro. Sabes também que já não poderias voltar atrás, que estás inteiramente subjugado e as tuas palavras, sejam quais forem, não serão jamais sábias o suficiente para determinar que essa porta a ser aberta agora, logo após teres dito tudo, te conduza ao céu ou ao inferno. Mas sabes principalmente, com uma certa misericórdia doce por ti, por todos, que tudo passará um dia, quem sabe tão de repente quanto veio, ou lentamente, não importa. Só não saberás nunca que neste exato momento tens a beleza insuportável da coisa inteiramente viva.

A gente tem o vício (eu, pelo menos) de matar a alegria com mil análises críticas que geralmente não têm nada a ver.

Eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tarde, ou manhãs, não importa a cor, éé, a cor, o tempo é só uma questão de cor não é?

De repente me passa pela cabeça que a minha presença ou a minha insistência pode talvez irritá-lo. Então, desculpa não insistirei mais. (...) eu queria dizer que eu estava com você, e a menos que você não me suporte mais, continuaria te procurando e querendo saber coisas. Bobagens? Pois é, se quiser ria como você costuma rir para se defender. Não estou me defendendo de nada. Estou perguntando a você se permite que eu tenha carinho por você, seu idiota. Mas estou aqui, continuo aqui não sei até quando, e quando e se você quiser, precisar, dê um toque. Te quero imensamente bem, fico pensando se dizendo assim, quem sabe, de repente você até acredita. Acredite.