O Mundo me Espera
O mundo é uma caricatura perpétua de si mesmo; e a cada momento ele é a derrisão e a contradição do que pretende ser.
Na maior parte das vezes, uma ideia nova não passa duma banalidade, velha como o mundo, de cuja realidade nos apercebemos subitamente.
Enquanto o mundo existir, haverá seres humanos que considerem injusto o poder e conciliábulos ocultos para derrubá-lo.
Os loucos progrediram como tudo neste mundo. Agora reflectem e falam como os outros homens. Para distinguir um louco de um espírito são tem de se consultar um especialista.
A mocidade expande-se para conhecer o mundo e os homens, a velhice contrai-se por havê-los conhecido.
A amizade, como o dilúvio universal, é um fenômeno do qual todo o mundo fala, mas que ninguém ainda viu com os seus próprios olhos.
Todo o espírito que existe no mundo é inútil para quem não o tem; ele não tem perspectivas sobre nada e é incapaz de aproveitar as dos outros.
Nada há no mundo que não tenha o seu momento decisivo e o expoente do bom procedimento é reconhecer e agarrar essa ocasião.
Quando se ama alguém tem-se sempre tempo para essa pessoa. E se ela não vem ter connosco, nós esperamos. O verbo esperar torna-se tão imperativo como o verbo respirar. E aprendemos a respirar na espera, a viver nela, afeiçoando-nos a um sonho como se fosse verdade. A vida transforma-se numa estação de comboios e o vento anuncia-nos a chegada antes do alcance do olhar. O amor na espera ensina-nos a ver o futuro, a desejá-lo, a organizar tudo para que ele seja possível. É mais fácil esperar do que desistir. É mais fácil desejar do que esquecer. É mais fácil sonhar do que perder. E para quem vive a sonhar, é muito mais fácil viver.
Eu queria arrancar o romantismo de dentro de mim. Queria que meus anticorpos se tocassem e partissem para o combate contra todo esse blá blá blá de amor. Cansei de esperar a declaração de alguém como nos filmes e livros,
ninguém está esperando pra me dizer que me amou a vida toda. Cansei de me apaixonar por olhos piedosos, de viver a espera de alguém que talvez nem exista, cansei!
Os melhores beijos acontecem quando a gente menos espera, mas quando acontece, a gente sente que queria te-lo há muito tempo, e percebe então que valeu a pena esperar.
A espera
Fiquei sentado,
esperando
a campainha
(que não tocou).
Afinal o que sou?
Um pobre coitado,
um incompreendido,
um mal amado?
Olho figuras que passam,
cavalgando na mente
estórias não realizadas.
De repente,
estou só,
a ruminar
em meu estábulo
dourado,
sentado,
esperando a campainha
(que não tocou).
Por que não grita,
meu Deus,
esta máquina infernal
que me revela
a triste lembrança
de um nada?
Brinquedo de criança
em ruas desertas
de minha meninice,
em desabaladas carreiras,
liberto.
Risos apertados,
traquinices,
de um – quem é?
perdido no vazio.
Mas, eu agora
já não rio,
sentado,
esperando,
esperando,
no meu estábulo dourado,
ruminando,
a dor,
a descrença,
a solidão.
Seja o que for,
que me faz alheio,
apartado de tudo
e de todos,
sentado,
esperando a campainha
(que não tocou).
(1968)