Machado e Juca Luiz Antonio Aguiar
A sabedoria crística nos mostrou a necessidade de nos adequarmos ao mundo quando ensinou: "Sê manso como as pombas e astuto como as serpentes" (Mt 10:16). Mas ao lidar com tais extremos no convívio diário me arriscaria a completar: "...mas não esqueça de ser manso COM as pombas, e astuto COM as serpentes!"
Se você vê em mim um cabeça-dura para incorporar suas ideias, sugiro que se debruce mais sobre elas: as razoáveis e inteligentes eu não espero que se diga duas vezes para acatá-las!
Infeliz a nação que precisa de leis para seus cidadãos fazerem o que desde sempre já deveriam estar fazendo.
Decididamente não me encaixo na tônica desses novos tempos: ainda prefiro ter vida privada do que transformar minha rotina num palco onde o único sentido da vida é uma caçada insana por "likes".
Houve um tempo em que guardávamos fotos dos momentos importantes, e os amigos compartilhavam vídeos de viagens inesquecíveis. Hoje morbidamente compartilham-se as doenças, o batonzinho novo e até se o cocô do bebê saiu duro ou mole. Seria a internet fazendo crer que se precisa ser famoso ou um novo entendimento de que a vida só faz sentido quando levada a público?
Sentir-me honesto, antes de tudo, é assumir minhas próprias dúvidas e enxergar-me como um eterno buscador, ainda que nunca chegue ao fim do caminho, antes de adotar verdades consagradas que meu íntimo não identifica como minhas. É não temer ser condenado por um ser supremo que, pela minha lógica, plantou-me dúvidas para que eu não aceitasse, sem questionar, as verdades de outrem.
Com toda essa onda de violência e insegurança que hoje integra nosso cotidiano, percebo vários dos meus amigos que passaram a ter medo de sair de casa ou ir a todos os lugares que gostariam. Como eles, eu também sinto muitos desses medos. Mas tem um em especial que me assusta mais do que todos: é o de que eles se tornem maiores do que minha vontade de sentir a vida, e então os desafio aproveitando-a tanto quanto possa.
Uma única dúvida sincera vale mais que toda a tua fé incorporada de outrem. Se o medo de te posicionares contra Deus te impede de assumi-la, pense que Ele pode tê-la semeado em ti exatamente para que não fosses induzido a erro.
A negação de Deus, pura e simples, é tão improvável quanto a afirmação de sua existência. Assim, o caminho mais honesto entre as duas visões é a sua dúvida.
Você não é melhor do que qualquer malfeitor quando não faz maldades para não ser punido por elas. Você se mostra melhor quando sabe que não deve fazê-las.
O dia que o mundo cortar a cabeça de governantes que roubam, em vez das mãos de crianças que assaltam, poderemos pensar em recomeços.
Todos os que são colocados em nossas vidas, mesmo os que não gostaríamos, entram nela como instrutores para nosso crescimento. Os mais próximos, especialmente, permanecem ali para nos lembrar do caminho que não deve ser trilhado.
Autodomínio é a consciência de que todo problema atinge o tamanho que permitimos. Muitos regridem não pela declaração de guerra, mas pela postura de não resistência, que inverte o sentido de uma força maior do que a mínima para nos pôr de joelhos.
Fazer-se maior não é o mesmo que exibir sua força. As águas dos rios nos mostram que sua vitória sobre as pedras no caminho para o mar não é lançar-se sobre elas, mas contorna-las sem as quebrar, livrá-las de suas arestas e deixar-lhes o limo para que não firam. Assim podem seguir sua missão de compor um poderoso oceano que herdou deles humildade para se posicionar abaixo de todos os rios do mundo.
Firmar posição de que a Terra é o único lugar com vida inteligente no universo, frente à minúscula dimensão do planeta que habitamos, não só se mostra de uma pretensão igualmente ridícula como também de ignorância comparável a de quem refuta a vida em uma caverna porque a escuridão o impede de enxergar dentro dela. Diante do que não entende a mente deveria buscar na dúvida sua única afirmação de inteligência.
A morte, ainda que perturbadora, não pode ser tida como perversa, pois que jamais nos ilude com promessas de não virá em algum momento. Bem mais cruéis são os que nos deixam sempre sem respostas, pois que aprisionam nossas vidas no sórdido cárcere das incertezas corrosivas e imobilizantes.
Ao contrário do que se acredita, a ameaça à humanidade não virá do espaço através de uma invasão alienígena inesperada. Ela vai sendo introduzida quase imperceptivelmente por quem já está entre nós, estendendo sutilmente sua rede de poder bem nas barbas de uma massa acomodada e conivente que, no momento do golpe final, se apresentará como seus primeiros adeptos e, ao longo do tempo, como principal força de sustentação.
O estado de direito com que um dia sonhei foi o que nos daria advogados para levar justiça aos inocentes, promotores para que a impunidade não se tornasse ancoradouro de culpados, e juízes capazes de entender a diferença entre ambos. Bastaria esses estatutos se mostrarem fiéis a seus propósitos para mudar a realidade que nos foi vendida como “direitos humanos”.
O processo de compreensão pode, no máximo, ser auxiliado, mas nunca induzido, de modo a que o direito de escolha permaneça inviolável a qualquer agente externo sob risco de abrir-se mão da liberdade, traduzida pelo acesso aos próprios princípios e valores.
