Luto
sem justiça, sem perdão — só protocolo
ninguém é salvo.
alguns só têm boa assessoria.
há quem confunda resposta com redenção.
mas o que é dito publicamente
raramente se parece com o que sangra no privado.
o mundo aprendeu a pedir desculpas
como quem emite um recibo:
com data, com cálculo, com linguagem neutra.
desculpa hoje vem com asterisco.
com planejamento de imagem.
com legenda que diz “aprendi muito”
sem dizer o quê.
ninguém quer ser perdoado.
só esquecido.
e rápido.
a justiça também virou performance.
é lenta onde devia ser urgente.
é veloz onde devia ter escuta.
e se você gritar,
vão dizer que perdeu a razão.
se ficar em silêncio,
vão chamar de consentimento.
não há saída fácil
quando quem escreve as regras
também decide quem merece exceção.
no filme,
a ilha prometia liberdade.
e entregava anestesia.
a dor era arquivada.
os traumas, redesenhados.
o passado, editado para caber numa narrativa rentável.
não é ficção.
é estrutura.
é o feed onde tudo parece harmonia,
mas ninguém pergunta quem limpou o chão depois da festa.
o mundo não quer justiça.
quer justificativa.
e isso — isso é o mais desolador.
perdão, aqui,
não nasce de consciência.
nasce de conveniência.
e a paz?
ela existe —
mas só pra quem pode pagar pela versão limpa da própria história.
quem sobrevive,
sabe:
não há reconciliação onde o poder segue intacto.
há só o silêncio de quem entendeu tarde demais
que perdoar também virou moeda.
e que a justiça, hoje,
é só uma sala com espelhos.
e ninguém mais reflete.
Juliana Umbelino
I. a parte em que ninguém percebe
há dias em que o mundo continua ~
mas eu não.
eu me arrasto dentro da roupa.
cumpro compromissos como quem finge
ainda habitar o próprio nome.
me sento onde sempre me sentei,
mas algo em mim não chega.
o corpo levanta,
mas não comparece.
•
há horários que evito.
nomes que pulo.
itens na gaveta que não toco há meses.
não é superstição.
é autodefesa.
ninguém entende.
porque continuo funcionando.
mas já não pertenço à máquina.
•
II. a parte que só eu escuto
há um som que só eu ouço.
não é voz,
não é memória,
não é aviso.
é uma frequência baixa
que vibra quando tudo está em silêncio.
uma presença que não se mostra,
mas me atravessa.
me obriga a manter as janelas fechadas,
a não reorganizar os móveis,
a conservar os espaços como estavam
no dia anterior ao que nunca mais passou.
•
não estou esperando nada.
mas também não fui.
é isso que ninguém entende:
o não ir.
o continuar por engano.
o viver como quem segura a respiração
no fundo da piscina
sem saber se ainda é possível subir.
•
III. a parte em que eu entendo
as coisas não melhoram.
elas se adaptam.
e chamam isso de cura.
eu aprendi a conversar sem falar.
a sorrir sem acionar músculo.
a dormir com a sensação
de que algo ainda respira ao lado.
talvez seja eu.
talvez não.
mas sigo deitada.
olhando pro teto
como quem espera uma explicação
que não chega.
•
e então amanhece.
como se nada tivesse acontecido.
como se meu corpo não estivesse carregando
o peso exato
do que ninguém ousa perguntar.
e eu levanto.
porque a vida, ao contrário da morte,
não precisa pedir permissão pra continuar.
Juliana Umbelino • O Luto Sou Eu
#LeitoraVoraz #Luto #Sentimentos #Lar #LiteraturaBrasileira
há coisas que não escrevi em papel.
mas continuam aparecendo nas minhas mãos.
•
talvez seja isso que chamam de seguir em frente:
continuar tocando o mundo com dedos que ainda tremem do que não foi dito.
não é culpa.
não é saudade.
é o tipo de presença que já não tem nome
mas ainda sabe o caminho até minha cama.
•
essa semana, encontrei seu nome
no fundo de uma gaveta
onde não guardo mais nada.
mas ali estava ele.
como se nunca tivesse saído.
às vezes, as lembranças têm a audácia
de se esconder nas coisas limpas.
•
tem palavras que não escrevi,
mas o corpo aprendeu.
tem hábitos que finjo que perdi,
mas reaparecem nos dias em que durmo pouco
e acordo cedo demais pra estar viva de verdade.
•
nunca fui de ter fé.
mas às vezes falo contigo
como quem reza pra algo que não acredita,
mas precisa manter por perto.
e não.
não é oração.
é hábito.
é cansaço.
é um tipo de apego que ainda late.
•
ninguém me avisou que aquilo que não se escreve
fica procurando lugar pra sair.
às vezes escorre no banho.
às vezes bate na parede da garganta.
às vezes se arruma inteiro pra aparecer de madrugada
com cheiro de antes
e a voz que eu jurei não lembrar mais.
•
tem dias em que acordo com a sensação de que alguém escreveu em mim.
e não fui eu.
como se as mãos tivessem lembrado o caminho sozinhas.
como se o corpo tivesse sonhado um gesto
e decidido repeti-lo em silêncio.
•
há coisas que eu jurei ter superado.
mas continuam me usando como hospedeiro.
coisas que encostam nos objetos,
mexem na disposição dos móveis,
ficam em pé no canto do quarto
como um pensamento que ninguém convidou
e não tem educação pra sair.
•
as palavras não saem.
mas a sensação fica.
e ela sabe usar minha mão pra lembrar.
•
ninguém vê.
mas tem algo aqui dentro
que escreve por mim.
não escreve bonito.
não escreve pra curar.
escreve pra lembrar que eu ainda sinto.
•
o que não é escrito,
às vezes cresce.
às vezes pesa.
às vezes te escreve de volta.
sem papel.
sem tinta.
só a memória viva do que você tentou enterrar
com palavras que nunca chegaram a nascer.
•
e é aí que mora o perigo.
no que ficou grande demais
pra continuar calado.
mas educado demais
pra gritar.
Juliana Umbelino
eu cresci ouvindo duas vozes.
uma dizia: abaixe a cabeça.
a outra perguntava: até quando?
•
no começo, obedeci.
porque ensinaram que ser boa
era o mesmo que não incomodar.
que ser certa
era não querer mais do que te dão.
e eu quis.
quis tudo.
quis entender o que havia em mim
que doía mesmo quando tudo estava calmo.
quis saber se a fé podia existir sem promessa.
se era possível amar sem se oferecer em sacrifício.
•
foi assim que aprendi a diferença entre culpa e chamado.
culpa grita quando você se escolhe.
chamado sussurra quando você esquece de si.
•
tem gente que ouve Deus nas igrejas.
eu ouvi dentro de mim.
no dia em que parei de fingir que tava tudo bem.
no dia em que parei de repetir o nome dos outros
como se fosse meu.
•
não me tornei melhor.
me tornei honesta.
com a raiva.
com o medo.
com a sede de parar de agradar
quem nunca teve fome de mim.
•
há quem diga que a vida é sobre encontrar paz.
mas ninguém avisa que, às vezes,
a paz é barulhenta.
ela chega quebrando os móveis
onde você guardava a versão que os outros aceitavam.
•
no fim, eu entendi:
o inferno não são os outros.
é a tua própria voz
cada vez que você se cala pra caber.
e o céu?
o céu talvez seja esse instante exato
em que você decide nunca mais se explicar.
—
Juliana Umbelino
#Literatura #AmoLer #Leitora #Leitura
os ombros aprenderam a subir.
sozinhos.
pra se defender de um impacto que não vem mais,
mas continua esperado.
e ninguém percebe.
porque do lado de fora,
parece só postura.
•
os olhos seguem.
mas sem foco.
não procuram.
se movem por convenção.
há muito deixaram de querer encontrar.
•
a respiração encurta
em lugares muito cheios,
em mensagens muito longas,
em olhares que demoram mais que dois segundos.
não é fobia.
é memória corporal de quando tudo doía demais
pra ser dito em voz alta.
•
o toque —
não importa se vem por afeto ou distração —
é lido como ameaça.
o corpo se retrai antes de entender.
o corpo entende antes da razão.
sempre entendeu.
•
tem dias em que visto a roupa com cuidado
pra que ela esconda
onde dói mais.
e se encaixe nos ombros
como um escudo.
ninguém repara.
mas eu visto pra não ser tocada.
•
os pés não fazem barulho ao andar.
não por elegância.
mas porque aprendi que ser invisível
é, às vezes, mais seguro do que ser querida.
•
há partes minhas que desativaram.
não por escolha.
por sobrevivência.
ninguém nota.
mas eu parei de acenar.
parei de chamar.
parei de responder ao próprio nome
com entusiasmo.
•
isso não é trauma.
é adaptação.
o corpo se acostuma a não esperar retorno.
e começa a existir
com o mínimo necessário
pra não sumir.
•
mas o mais cruel é que, por fora,
parece força.
parece autonomia.
parece “nossa, como você lida bem com tudo isso”.
mal sabem
que foi o ombro subindo sozinho
que contou o resto da história.
—
Juliana Umbelino
Em cada palavra que ensinou, a professora Silvaneide semeou dignidade; que sua partida não seja silenciada pela rotina cruel do descaso, mas ecoe como um grito por justiça e respeito àqueles que sustentam a educação com o próprio corpo.
Às vezes, tudo o que precisamos é isso: um passo. Um sopro. Umanovapágina.
(trecho do livro: Quando a Morte Sentou ao Meu Lado)
A morte não veio como carrasca, mas como confidente. Ela não deve inspirar temor — não é inimiga,ejamaisserá.
(trecho do livro: Quando a Morte Sentou ao Meu Lado)
A última vez que falei com a senhora foi na quinta-feira. Como sempre, com aquele cuidado carinhoso de quem se importa de verdade:
"Como está o trabalho?"
"E a faculdade, está gostando?"
"Ainda está estudando pra concurso?"
A senhora nunca deixava de demonstrar atenção, mesmo nas coisas mais simples. Sempre presente com palavras que acolhiam, sempre interessada em saber como eu estava, mesmo quando o mundo parecia girar depressa demais.
Receber a notícia da sua partida foi como um silêncio que ecoa. Seu jeito singelo, mas firme, dava brilho à nossa família.
O que mais me dói é não poder estar presente neste momento. Dói não poder contribuir fisicamente com o que talvez fosse meu último gesto de cuidado com quem tanto me cuidou.
Mas levo comigo a esperança de que, de alguma forma, eu possa honrar a sua memória com a minha caminhada.
Descanse em paz, minha vó. E obrigado por tanto.
Uma poesia tardia: peRdA
A dor se aprofunda em nosso ser e confunde a nossa existência. Ela se alimenta de nossa perda inestimável e fere, sem cessar, a nossa alma. Não há palavra que traga consolo. Só te peço: deixe-me sofrer em paz.
Cabelos caindo
Dentes lascando
Língua sangrando
Cansaço frequente
Fraqueza anormal
Alimentação ruim
Unhas fracas
Dentes ficando amarelos
Higiene regredindo
Impulsividade fora do controle
Apatia...
Esperança de te encontrar na próxima página desse caderno velho...
Esperança de te reencontrar na av sete de setembro
Esperança de sentir seu calor novamente, seu amor, sua saudade
A gente só sente saudade de algo quando a gente perde algo, e quando foi mesmo que eu te perdi? Eu nem me lembro mais...
Eu ainda te amo
Você soa como palavras não ditas num discurso de ódio, ou melhor, de amor...
Melhor ainda... Você apenas soa como palavras não ditas dentro da minha cabeça
Você ainda vive dentro de mim
Tudo ainda tá aqui, o que mudou é que o tudo que era nosso não tá mais com você.
Você ainda vive aqui dentro de mim, naquele sítio que eu te prometi, de como você me contava de quando você e sua mãe brigavam, e sem pensar duas vezes eu te prometia te tirar daquele inferno cotidiano assim que você completasse 18 anos, mas como ditado diz...
Quem jura, mente...
Eu não estava mentindo, só que o destino não queria isso pra gente.
Você ainda vive dentro de mim...
Você e a Millena e o sítio, e a briza fria da manhã num dia ensolarado, era assim que eu te descrevia meu doce girassol.
Eu te amo, não se esqueça nunca de mim girassol
Eu nunca vou te esquecer, vou te levar pra sempre comigo, com a gente....
Você ainda vive dentro de mim.... E vou levar você, a nossa linda filha e o nosso momento pra sempre dentro do meu peito.
Viva com ele, como você nunca viveu dentro de mim...
O envelhecimento é um processo de despedidas contínuas. Envelhecer é se despedir da vida, pouco a pouco. E, às vezes, isso pode gerar lutos simultâneos e até inconscientes.
Meus sentimentos não passam de leve — eles rasgam, queimam, vibram na pele.
Tudo em mim sente demais, vive demais, doa demais. Deus me livre de atravessar essa vida de forma mecânica, anestesiada, e sem alma.
O que me torna tão humana é justamente essa vulnerabilidade em sentir tudo. Essa entrega sem defesas, essa coragem de sentir até o que machuca.
Porque até a dor, quando vivida por inteiro, me lembra que ainda estou aqui — viva, presente, pulsando.
E eu sou grata por isso.
Porque a vida é breve, e talvez essa seja a única chance que eu tenha de sentir tudo o que há pra sentir
eu sou profundamente grata por não ser feita de indiferença.
Pois ser indiferente seria desperdiçar o milagre de estar viva.
Carrego as marcas do racismo e a dor de não ser visto, a saudade da minha mãe e a solidão de quem busca respostas na própria mente. Mas também sinto pulsar a força da reinvenção, o alcance infinito da polimatia, e como aprendi com a Dra. Shaira Zion, o alento da minha - quarkiana, leptônica e bosonica - fé. Faço do meu trauma um testemunho; da minha dor, símbolos; da minha perda, poesia.
Talvez um dia minha tristeza dê dinheiro, o triste disso... é que talvez não esteja mais vivo, mais triste que é isso, é pensar (as-sim) nisso.
Minha vida tem tantas portas...
Tem vias retas... tem vias tortas.
Toda manhã ao sol nascer...
qual delas quero trilhar...
tranquilamente posso escolher.
Vou seguindo nesse espaço infinito.
Num compasso tão bonito...
Dois pra cá... dois pra lá...
Fazendo meus dias formosos.
Gravando na alma tudo em que acredito...
Tenho força, tenho entusiasmo, tenho ânimo...
Tenho fé... acima de tudo
Um futuro leve e cheio de paz.
Para qualquer dor, tenho um escudo.
Todavia...
As vias nem sempre como quero se desenham...
Apesar de todo meu empenho...
Lá vem nuvens pesadas devagarinho...
Seu intuito: fazer sombras pelo meu caminho.
Tenho toda a força do mundo...
Luto... esmurro... grito... rujo como um leão...
Mas o mundo tem-me feito muitas vezes um frio e insensível vagabundo.
Luto, sim... mas, às vezes, esmorece meu coração.
E tá tudo bem 😉
Para quem fica é sofrimento pois perdemos pessoas especiais para o mistério da morte que nunca à compreenderemos, mas para quem se foi é mero descanso causado pelo sofrimento dos problemas vivenciados na terra antes da sua partida.
Só resta para quem ficou, buscar forças em Deus para superação da dor.
Todas as perdas são irreparáveis, porém nada se compara a dor de uma mãe que perde tão precocemente seu filho.
Sendo que nem havia aliviado o coração do luto pela perda do esposo.
Só nos resta orar pedindo a Deus para fortalecer esta vida tão aflita.
(Força minha prima!😭)
Quando nós conhecermos, senti-me sobrecarregada por gratidão, senti-me presenteada, como se uma prece fosse atendida.
Ao partir sem se despedir, senti que todas as orações de agradecimento tivessem se perdido.
Será que é por isso que te foste tão cedo e sem se despedir?
Será que é por este motivo que tive que reaprender a viver sem você?
Para aonde vão às orações perdidas?
Ainda me recordo de você e continuarei recordando-me. Descanse em paz!
Os poemas que líamos juntos, foram escritos por nós dois.
Fomos autores da nossa própria história, e quando você partiu, tornei-me um livro incompleto, uma narrativa sem fim.
As pessoas tentam-me ler, mas as páginas estão incompletas e as que ainda existem, eles não intendem. Talvez ninguém nunca saberá ler-me da forma que você me leu.
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