Entre Papéis Falam. Sempre falam.... Daniel Serpa

Entre Papéis
Falam. Sempre falam. Muito. Às vezes demais. Às vezes na medida. E se não falassem? Silêncio. Processo sem voz. Juiz sem contraponto. Decisão sem disputa. Sem ardor. Sem sal.
Ajusta a gravata. Gesto automático. Herdado do pai. Também advogado. Tensão no ar. Olhar diz tudo. Mais uma disputa. Será que consigo?
Toga nos ombros. Gira caneta entre os dedos. Olhar fixo. Espera. Sabe que vem surpresa. Um artigo esquecido? Uma súmula recém parida? Um pedido impensável? Quem sabe?
Respira fundo. Fecha o código. Encosta na cadeira. Deixa vir. Advogado entra. Rompe silêncio. Voz firme. Clara. Sustenta. Argumenta. Justifica. Pede. Mira direto nos olhos. Juiz escuta. Impassível. Ou quase. Na mente giram engrenagens.
Advogado sabe. Mas finge que não. Juiz levanta a sobrancelha. Advogado percebe. Brilha o olhar. Ali tem coisa. Insiste. Juiz folheia o processo. Devagar. Mudez.
E então? E então nada. Ou tudo. Porque advogado bom instiga. Juiz bom reflete. Nenhum existe sem o outro.
Processo sem debate? Documento velho. Papel morto. Só números. Só burocracia.
Advogado dá cor. Movimento. Alma. Processo ganha vida. Juiz dá ordem. Equilíbrio. Justiça. Processo ganha solução.
Dois papéis. Um único propósito.
Advogado é voz. Juiz ouvido atento. E o Direito? É o que acontece entre eles.
Rivalidade? Criada. Alimentada. Vendida como verdade. Bobagem. Advogado não é inimigo. Juiz não é adversário. Processo não é guerra. Mas há os que gostam.
Espadas. Escudos. Petições. Embargos. Movimentos táticos. Ataques. Defesas. Golpes jurídicos.
Teatro? Jogo? Guerra? Não. Direito.
Pausa. Cafezinho. Pelando. Ranger de xícaras nos pires. Tom muda. Sobre a cadeira. Toga dobrada. Advogado conta caso engraçado. Risadas. Baixas. Outro advogado. Entra. Outro juiz. Acena.
E antes que o café esfrie. Entre um gole e outro. Admiração. Recíproca. Escondida. Não dita. Mas sentida. Basta.
Amizade? Jardim se florescer. Se não, paz. Respeito? Sempre. Parceria? Inevitável. Reconciliação? Mais que possível. Necessária.
E o processo? Continua. Sempre continua. Porque o Direito não para.