O HOMEM DO VALE-TRANSPORTE Quando eu era... Fábio Murilo

O HOMEM DO VALE-TRANSPORTE

Quando eu era pré-adolescente, nos meus 14 anos, todo sábado ia ajudar minha tia a trazer uns pacotes para abastecer um armarinho que ela tomava conta. Reparava sempre, no meio do caminho, num cidadão magro, moreno, alto, na conhecida Praça do Diário (Praça da Independência), pedido vale transportes, uma vez até eu dei ao pobre, mas ficava meio assim... (Todo sábado lá, e ele vem pro centro da cidade só com a passagem só de ida e fica pedindo a de volta. Estranho. Ai fui sacando a dele, o cara ia pedindo com uma mão, com cara de choro, nem falar falava, só balbuciava algo incompreensível, e juntado com a outra, daqui a pouco ele começava a vender o que tinha juntado, recebido). Não é que um tempo desses e o entrecortei na Rua da Concórdia, incrível, e pedindo passagem ainda, e me pediu passagem, quer dizer, agora dinheiro, melhorou, não se usa mais vales-transportes. Eu disse: Me erra cara! Te conheço desde menino! Ele não se fez de rogado, virou pra outro lado e continuou pedido a outras pessoas. Hoje, pela manhã, no comecinho da rua Nova Nova, pasmem! Tava ele lá! O próprio! Tirei até uma foto pra guardar de prova, com os cabelos agora já grisalhos, compleição física, no entanto a mesma, sequinho, sem barriga, pedindo passagem ainda com cara de choro e a pouca voz, vida toda. Daqui a pouco se aposenta nesse ramo. Mas o Brasil tá de um jeito tal, atualmente, que ele até dá pena, face ao atual cenário de corrupção desmedida. Tantos agindo sem tanta visibilidade, sem tanto esforço. Subtraindo mais, incomparavelmente mais e saindo bem na foto, posando de bom moço, bem vestidos, nos enrolando direitinho, roubando algo mais precioso: nossa alegria, tranquilidade, respeito, nossa paz, boa fé, nossa confiança, nossa esperança, crença nos homens de boa vontade.

(18.02.2017)