Emigrou da Itália, novo ainda,... Alessandro Lo-Bianco

Emigrou da Itália, novo ainda, acompanhado de duas irmãs. Ficou em Niterói. Filho de um oficial reformado da Marinha, tinha, certamente, forte inclinação para a carreira Naval. No Brasil, porém, circunstâncias adversas não lhe permitiam satisfazer esse desejo, ser oficial da Marinha. Optou, então, pelo magistério, matriculando-se na Escola Normal de Niterói, onde os três obtiveram o diploma de professor primário. Tão grande já era seu amor pelo Brasil que, ao preencher o formulário para matricular-se na Escola Normal, mentiu e declarou-se natural de Campos. Falava à brasileira. Por falar assim, muitos dos que com ele conviveram, ainda hoje, desconhecem sua origem.Depois de lecionar durante muitos anos dedicou-se, após a jubilação, ao comércio de livros usados, os sebos. Jornalista, iniciou suas atividades no periódico manuscrito e composto em papel almaço pelos próprios redatores, valia, por isso, como prova de caligrafia dos "responsáveis", contou. Deixando de circular O Normalista, passou a colaborar em alguns jornais, evidenciando profundos conhecimentos sobres problemas educacionais apontando falhas e soluções. Prevendo a pouca rentabilidade da profissão de jornalista e, quem sabe, desiludido pela inoperância dos artigos que escrevia, frente à pouca sensibilidade das autoridades da época, passou a escrever apostilas de aritmética e geografia para o curso primário chegando a editar uma Taboada Elementar adotada nas escolas de Niterói. Era também de sua autoria um abecedário na qual as letras eram memorizadas já compondo palavras como ave, banco, casa, dado, etc. Livreiro, instalou-se na Rua Marechal Deodoro quase chegando à Rua da Praia, pelo lado direito de quem desce a rua, em frente ao antigo Tesouro do Estado, junto a antiga loja Rosa de Ouro. Não tinha auxiliares, ele mesmo abria a loja e invariavelmente encerrava bem antes do horário normal, segundo dizia, para evitar despesa com a eletricidade. Mentia para sair mais cedo e encontrar os amigos no Clube de Literatura da cidade, onde recitavam concursos de trovas. Foi dele a autoria da primeira cartilha que li. Circulava lentamente entre rumas de livros, com um indefectível boné de seda preta na cabeça, marcando preços, separando livros por assuntos, colando folhas soltas ou rasgadas. Aos nossos olhos de criança, seu rosto parecia com os dos reis coloridos dos baralhos antigos. Após o almoço, dormia na cadeira, no fundo da livraria, por trás do balcão, com o abafado som de Nelson Gonçalves na vitrola. Não era raro, por isso, nessas ocasiões, o freguês bater palmas para acordá-lo. E, invariavelmente, restava a mim essa função. Bons tempos.