Dizer Adeus com Vontade de Ficar
“E assim existimos, indo aos tantinhos, passinhos e beijinhos; sendo um bocado de Beatles e umas mordidas de bossa nova. Pão de Ló: não somos mais que um punhado de purpurina que o vento ainda vai soprar. Deixe brilhar, deixe voar, deixe estar, deixe amar.”
Até ideias falsas e ruins de filmes querem viver. Como se crescessem no seu cérebro, substituindo ideias reais. É o que as torna perigosas.
“Uau” é uma exclamação que serve para tudo. Acabei de perceber. Pode significar que você adorou ou que não tem palavras para descrever a porcaria que é.
Ele é um amor. É sensível. Ele me escuta e é inteligente. Mas há algo inefável, profunda, impronunciável e irreparavelmente errado aqui.
Suspeito de que os humanos sejam os únicos animais que sabem a inevitabilidade de suas mortes. Outros animais vivem no presente. Os humanos não podem, então inventaram a esperança.
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si
Carrega o dom de ser capaz
E ser feliz;
Todo mundo ama um dia
Todo mundo chora
Um dia a gente chega
E no outro vai embora
Prosa Patética
Nunca fui de ter inveja, mas de uns tempos pra cá tenho tido... As mãos dadas dos amantes tem me tirado o sono... Ontem, desejei com toda força ser a moça do supermercado. Aquela que fala do namorado com tanta ternura. Mesmo das brigas ando tendo inveja. Meu vizinho gritando com a mulher, na casa cheia de crianças... Sempre querendo, querendo... Me disseram que solidão é sina e é pra sempre. Confesso que gosto do espaço que é ser sozinho. Essa extensão, largura, páramo, planura, planície, região. No entanto, a soma das horas acorda sempre a lembrança... Do hálito quente do outro. A voz, o viço... Hoje andei como louca, quis gritar com a solidão... Expulsar de mim essa Nossa senhora ciumenta. Madona sedenta de versos. Mas tive medo. Medo de que ao sair levasse a imensidão onde me deito... Ausência de espelhos que dissolve a falta, a fraqueza, a preguiça. E me faz vento, pedra, desembocadura, abotoadura e silêncio. Tive medo de perder o estado de verso e vácuo... Onde tudo é grave e único. E me mantive quieta e muda. E mais do que nunca tive inveja. Invejei quem tem vida reta, quem não é poeta... Nem pensa essas coisas. Quem simplesmente ama e é amado. E lê jornal domingo. Come pudim de leite e doce de abóbora... A mulher que engravida porque gosta de criança... Pra mim tudo encerra a gravidade prolixa das palavras: Madrugada, mãe, ônibus, olhos, desabrocham em camadas de sentido... E ressoam como gongos ou sinos de igreja em meus ouvidos. Escorro entre palavras, como quem navega um barco sem remo. Um fluxo de líquidos. Um côncavo silêncio. Clarice diz, que sua função é cuidar do mundo. E eu, que não sou Clarice nem nada, fui mal forjada... Não tenho bons modos nem berço. Que escrevo num tempo onde tudo já foi falado, cantado, escrito. O que o silêncio pode me dizer que já não tenha sido dito? Eu, cuja única função é lavar palavra suja... Nesse fim de século sem certeza? Eu quero que a solidão me esqueça.
Quem seria eu para questionar um sentimento, por que era isso que havia entre nós, e que existe ainda hoje. Eu não sei como você sabia, mas sabia, e você fez tudo ficar mais fácil para mim. Você também não me fez perguntas quando eu quis ir embora e andar sozinha, e quando regressei, com os olhos cheios de lágrimas, você sempre soube em que momento eu precisava que você me abraçasse e quando simplesmente devia me deixar a sós. Mas, mais do que isso, eu percebi que tinha sido tola por um dia ter cogitado a idéia de ficar com outra pessoa, desde então nunca mais hesitei. Tivemos dias maravilhosos juntos, e penso muito nisso agora. Às vezes fecho os olhos e vejo você com salpicos grisalhos nos cabelos, sentado, enquanto as crianças brincam ao seu redor. Você foi, ao mesmo tempo, meu amigo e o meu amante, e não sei de qual lado de você eu gosto mais. Tenho grande estima pelos dois lados, assim como tenho grande estima pelo que foi a nossos momentos juntos. Você tem alguma coisa dentro de você, algo belo e forte. Bondade. Você é o homem mais generoso e sereno que conheci. Deus está com você, tem de estar. Sei que você me acha doida por escrever a nossa história, após finalizarmos ela, mas tenho as minhas razões e agradeço pela sua paciência. Vivemos momentos que a maioria dos casais nunca chegaram sequer a conhecer, porém, quando olho para você, fico assustada por saber que tudo isto acabou. Porque ambos sabemos quais são os prognósticos e o que isso significou para nós. Vejo nossas lágrimas naquele estante, e me preocupo mais com você do que comigo mesma. Não tenho palavras para expressar meu sofrimento. Por favor, não fique irritado comigo, nos dias em que não me lembrar de você, e nós dois sabemos que esse esquecimento é necessário. Saiba que eu gosto de você, que sempre gostei e aconteça o que acontecer, saiba que eu tive os melhores momentos de minha vida com você. E se você guardar esta carta para ler outra vez, então acredite no que estou escrevendo para você. Onde quer que você esteja e seja qual for à data de hoje, eu gosto de você. Gosto agora enquanto escrevo esta carta, e gosto enquanto você está ledo esta carta. E lamento muito se não consegui ti dizer isso. Você é, e sempre foi, o meu sonho!
As vezes olho pro céu e me pergunto quando o sinal de que tudo vai dar certo vai chegar? Não sei! Só sei que quando deitar em minha cama, não quero pensar em arrependimentos, em tristezas, não quero ver meus sonhos quebrados pelo chão pois eu sei que só eu vou me machucar ao pisar neles, então vou acreditar! Acreditar que um dia vou chegar la, que um dia vou olhar pra traz e ver que tudo isso foi um aprendizado e que cada acontecimento, seja ele triste ou feliz, me ajudou a ser quem eu sou, me fez levantar e não me importar com o quanto já me fizeram chorar mas sim com a minha vontade de escancarar um sorriso! A final, como diria Caio Fernando Abreu:
E tem o seguinte, meus senhores: não vamos enlouquecer, nem nos matar, nem desistir. Pelo contrário: vamos ficar ótimos e incomodar bastante ainda.
MEDITAÇÃO DO DUQUE DE GANDIA
SOBRE A MORTE DE ISABEL DE PORTUGAL
Nunca mais
a tua face será pura limpa e viva,
nem teu andar como onda fugitiva
se poderá nos passos do tempo tecer.
E nunca mais darei ao tempo a minha vida.
Nunca mais servirei senhor que possa morrer.
A luz da tarde mostra-me os destroços
do teu ser. Em breve a podridão
beberá os teus olhos e os teus ossos
tomando a tua mão na sua mão.
Nunca mais amarei quem não possa viver
sempre,
porque eu amei como se fossem eternos
a glória, a luz e o brilho do teu ser,
amei-te em verdade e transparência
e nem sequer me resta a tua ausência,
és um rosto de nojo e negação
e eu fecho os olhos para não te ver.
Nunca mais servirei senhor que possa morrer.
Nunca mais te darei o tempo puro
Que em dias demorados eu teci
Pois o tempo já não regressa a ti
E assim eu não regresso e não procuro
O deus que sem esperança te pedi.
Sophia de Mello Breyner Andresen
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
POEMA
A minha vida é o mar o abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita
Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará
Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento
A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto
Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento
E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada
A arquitetura como construir portas,
de abrir; ou como construir o aberto;
construir, não como ilhar e prender,
nem construir como fechar secretos;
construir portas abertas, em portas;
casas exclusivamente portas e tecto.
O arquiteto: o que abre para o homem
(tudo se sanearia desde casas abertas)
portas por-onde, jamais portas-contra;
por onde, livres: ar luz razão certa.
Até que, tantos livres o amedrontando,
renegou dar a viver no claro e aberto.
Onde vãos de abrir, ele foi amurando
opacos de fechar; onde vidro, concreto;
até fechar o homem: na capela útero, com confortos de matriz, outra vez feto.
Por trás do que lembro,
ouvi de uma terra desertada,
vaziada, não vazia,
mais que seca, calcinada.
De onde tudo fugia,
onde só pedra é que ficava,
pedras e poucos homens
com raízes de pedra, ou de cabra.
Lá o céu perdia as nuvens,
derradeiras de suas aves;
as árvores, a sombra,
que nelas já não pousava.
Tudo o que não fugia,
gaviões, urubus, plantas bravas,
a terra devastada
ainda mais fundo devastava.
Rasas na altura da água
começam a chegar as ilhas.
Muitas a maré cobre
e horas mais tarde ressuscita
(sempre depois que afloram
outra vez à luz do dia
voltam com chão mais duro
do que o que dantes havia).
Rasas na altura da água
vê-se brotar outras ilhas:
ilhas ainda sem nome,
ilhas ainda não de todo paridas.
Ilha Joana Bezerra,
do Leite, do Retiro, do Maruim:
o touro da maré
a estas já não precisa cobrir.
O Engenheiro
A luz, o sol, o ar livre
envolvem o sonho do engenheiro.
O engenheiro sonha coisas claras:
Superfícies, tênis, um copo de água.
O lápis, o esquadro, o papel;
o desenho, o projeto, o número:
o engenheiro pensa o mundo justo,
mundo que nenhum véu encobre.
(Em certas tardes nós subíamos
ao edifício. A cidade diária,
como um jornal que todos liam,
ganhava um pulmão de cimento e vidro).
A água, o vento, a claridade,
de um lado o rio, no alto as nuvens,
situavam na natureza o edifício
crescendo de suas forças simples.
A um rio sempre espera
um mais vasto e ancho mar.
Para a agente que desce
é que nem sempre existe esse mar,
pois eles não encontram
na cidade que imaginavam mar
senão outro deserto
de pântanos perto do mar.
Por entre esta cidade
ainda mais lenta é minha pisada;
retardo enquanto posso
os últimos dias da jornada.
Não há talhas que ver,
muito menos o que tombar:
há apenas esta gente
e minha simpatia calada.
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