Cronicas de Luiz Fernando Verissimo Pneu Furado
O velho marciano morto, nunca pensara nisso, ele não parecia que um dia iria morrer. Isso alterava fundamentalmente a sua vida? Ou não lhe traria sequer a mais ligeira modificação no modo de ser e encarar as coisas - sempre fora, era assim, sempre seria, ele vivendo, a morte do pai já em sua vida incorporada. Mais uma época ali se encerrava? Acaso não vivia sempre encerrando épocas e inaugurando outras? De onde vinha? para onde ia? Que sentido tinham as coisas? Nenhum, nenhum , se dizia, sentindo finalmente seus olhos se encheram de lágrimas.
Sou feita do amor daqueles que me tanto amaram nesta vida passageira, sou feita do afeto tão precioso dos meus escassos, porém dedicados amigos. Sou a princesinha que cansou de sonhar acordada com seu príncipe encantado, sou a donzela que largou a vida de rainha atrás de aventuras, sou a adulta que não suporta a ideia de velhice… Sou o que perdi.
Pedi tão pouco à vida e esse mesmo pouco a vida me negou. Uma réstia de parte do sol, um campo, um bocado de sossego com um bocado de pão, não me pesar muito o conhecer que existo, e não exigir nada dos outros nem exigirem eles nada de mim. Isto mesmo me foi negado, como quem nega a esmola não por falta de boa alma, mas para não ter que desabotoar o casaco.
Resisti à tentação de dizer que não, subiria também, não podia passar mais uma noite longa dela. Tentação de abraçá-la, esquecer tudo que havia passado, subir também. Mas alguma coisa me dizia que o meu lugar era embaixo, que eu era apenas uma testemunha, um espectador, o lado passivo do seu mistério.
"Nem esta obra, nem as que se lhe seguirão têm nada que ver com quem as escreve. Ele nem concorda com o que nelas vai escrito, nem discorda. Como se lhe fosse ditado, escreve; e, como se lhe fosse ditado por quem fosse amigo, e portanto com razão lhe pedisse para que escrevesse o que ditava, achava interessante - porventura só por amizade - o que, ditado, vai escrevendo"
Falo das paixões cotidianas. Daquelas que, sem pedir permissão, irrompem peitos de todas as idades e tamanhos e lá se abrigam temporariamente. A intromissão pode acontecer numa manhã despretensiosa, numa tarde gélida ou numa noite solitária. Desde que seja executada de forma surpreendente. Sim, as sedutoras também são maquiavélicas. Preparam o clima fria e calculisticamente para que o alvo caia feito um patinho na história.
Tudo se me evapora. A minha vida inteira, as minhas recordações, a minha imaginação e o que contém, a minha personalidade, tudo se me evapora. Continuamente sinto que fui outro, que senti outro, que pensei outro. Aquilo a que assisto é um espectáculo com outro cenário. E aquilo a que assisto sou eu.
Tudo me interessa e nada me prende. Atendo a tudo sonhando sempre; fixo os mínimos gestos faciais de com quem falo, recolho as entoações milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto, estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção do que nela se disse, da minha parte ou da parte de com quem falei. Assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, pergunto-lhe de novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro palavras fotográficas, o semblante muscular com que ele disse o que me não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com que recebeu a narrativa que me não recordava ter-lhe feito. Sou dois, e ambos têm a distância - irmãos siameses que não estão pegados.
Como dizia o poeta
Quem já passou
Por esta vida e não viveu
Pode ser mais, mas sabe menos do que eu
Porque a vida só se dá
Pra quem se deu
Pra quem amou, pra quem chorou
Pra quem sofreu, ai
Quem nunca curtiu uma paixão
Nunca vai ter nada, não
Não há mal pior
Do que a descrença
Mesmo o amor que não compensa
É melhor que a solidão
Abre os teus braços, meu irmão, deixa cair
Pra que somar se a gente pode dividir?
Eu francamente já não quero nem saber
De quem não vai porque tem medo de sofrer
Ai de quem não rasga o coração
Esse não vai ter perdão
— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.
(Morte e Vida Severina - Introdução)
Os rios que eu encontro
vão seguindo comigo.
Rios são de água pouca,
em que a água sempre está por um fio.
Cortados no verão
que faz secar todos os rios.
Rios todos com nome
e que abraço como a amigos.
Uns com nome de gente,
outros com nome de bicho,
uns com nome de santo,
muitos só com apelido.
Mas todos como a gente
que por aqui tenho visto:
a gente cuja vida
se interrompe quando os rios.
Como aceitara ir
no meu destino de mar,
preferi essa estrada,
para lá chegar,
que dizem da ribeira
e à costa vai dar,
que deste mar de cinza
vai a um mar de mar;
preferi essa estrada
de muito dobrar,
estrada bem segura
que não tem errar
pois é a que toda a gente
costuma tomar
(na gente que regressa
sente-se cheiro de mar).
O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato
O amor comeu meus cartões de visita
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minha dieta
O amor comeu todos os meu livros de poesia
O amor comeu meu Estado, minha cidade
O amor comeu minha paz, minha guerra, meu dia e minha noite
Meu inverno, meu verão
Comeu meu silencio, minha dor de cabeça
O meu medo da morte
Depois de anos tentando compreender a natureza humana com o objetivo de resolver as suas questões de sofrimento, percebi que a maioria da morbidez humana vem do aprendizado que as religiões divulgam. Sei muito bem que as religiões gostam que acreditemos que ela é necessária, pois nos inspira ao bem social. Mas isto é uma grande mentira, pois seus efeitos na formação da personalidade humana é devastadora.
Lerdeza
A frase que o Everton mais ouvia da mãe era "levanta e vai buscar", geralmente seguida de um epíteto, como "seu preguiçoso" ou, pior, "lerdeza". Porque o que o Everton mais fazia, atirado no sofá na frente da TV na sua posição de costume (que a mãe chamava de "estrapaxado"), era pedir para lhe trazerem coisas. Uma Coca. Uns salgadinhos...
- Levanta e vai buscar!
- Pô, mãe.
- Lerdeza!
O Everton já estava com quinze anos e era uma luta convencê-lo a sair do sofá e ir fazer o que os garotos de quinze anos fazem. Correr. Jogar bola. Namorar. Ou pelo menos ir buscar sua própria Coca.
- Esse menino um dia ainda vai se fundir com o sofá...
Everton não queria outra coisa. Ser um homem-sofá. Um estofado humano, alimentado sem precisar sair do lugar. E sem tirar os olhos da TV. E como era filho único, e insistente, sempre conseguia que lhe trouxessem o que pedia. Quando não era a mãe, sob protestos ("Toma, lerdeza, mas é a última vez") era Marineide, a empregada de vinte e poucos anos cujo decote era a única coisa que fazia o Everton desviar os olhos da TV, e assim mesmo por poucos segundos.
***
Um dia, estrapaxado no sofá, o Everton se deu conta de que estava sozinho em casa. A mãe tinha saído, o pai estava no trabalho, a Marineide de folga, e ele sem ninguém para lhe trazer uma Coca, uns chips de batata e uns Bis. Levantar-se e ir buscar estava fora de questão.
Fechou os olhos e concentrou-se. Concentrou-se com força. Depois de alguns minutos, ouviu ruídos vindo da cozinha. A geladeira abrindo e fechando. Uma porta de armário abrindo e fechando. Depois silêncio. Quando abriu os olhos, a Coca, os chips e os Bis pairavam no ar, à sua frente. Ele só precisou estender a mão.
No dia seguinte, Everton testou seu poder recém-descoberto na Marineide, que até hoje não sabe como a sua blusa desabotoou sozinha e seu soutien simplesmente voou longe daquele jeito, e logo na frente do menino. Everton também acendeu a TV e mudou de canais sem precisar usar o controle remoto, e fez um vaso voar pela sala só com a força do seu pensamento. Apagou a TV e ficou, atirado no sofá, refletindo sobre o que significava aquilo. Ele era um fenômeno. Tinha um poder único - fazia as coisas acontecerem apenas pela sua vontade. Contaria aos pais, claro. Eles poderiam ganhar dinheiro com seu poder. O pai saberia como. Ele se transformaria numa celebridade. Cientistas do mundo inteiro o procurariam, sua capacidade extraordinária seria usada em benefício da humanidade. No combate ao crime, por exemplo. Nas comunicações. Na medicina a distância.
***
E se aquilo fosse, de alguma forma, um poder religioso? Até onde a revelação do seu dom milagroso seria um sinal de que ele tinha uma missão a cumprir na Terra? Até onde aquilo o levaria? Fosse o que fosse, uma coisa era certa. Ele teria que sair do sofá.
***
- Mãe.
- Ahn?
- Eu quero daquelas coisinhas de queijo. E uma Coca.
- Levanta e vai buscar.
- Pô, mãe.
- Tá bem. Mas esta é a última vez.
E já a caminho da cozinha:
- Lerdeza!
O Assalto
Quando a empregada entrou no elevador, o garoto entrou atrás. Devia ter uns dezesseis, dezessete anos. Desceram no mesmo andar. A empregada com o coração batendo. O corredor estava escuro e a empregada sentiu que o garoto a seguia. Botou a chave na fechadura da porta de serviço, já em pânico. Com a porta aberta, virou-se de repente e gritou para o garoto:
- Não me bate!
- Senhora?
- Faça o que quiser, mas não me bate!
- Não, senhora, eu…
A dona da casa veio ver o que estava havendo. Viu o garoto na porta e o rosto apavorado da empregada e recuou, até pressionar as costas contra a geladeira.
- Você está armado?
- Eu? Não.
A empregada, que ainda não largara o pacote de compras, aconselhou a patroa, sem tirar os olhos do garoto:
- É melhor não fazer nada, madame. O melhor é não gritar.
- Eu não vou fazer nada, juro! disse a patroa, quase aos prantos. – Você pode entrar. Pode fazer o que quiser. Não precisa usar de violência.
O garoto olhou de uma mulher para outra. Apalermado. Perguntou:
- Aqui é o 712?
- O que você quiser. Entre. Ninguém vai reagir.
O garoto hesitou, depois deu um passo para dentro da cozinha. A empregada e a patroa recuaram ainda mais. A patroa esgueirou-se pela parede até chegar à porta que dava para a saleta de almoço.
Disse:
- Eu não tenho dinheiro. Mas o meu marido deve ter. Ele está em casa. Vou chamá-lo. Ele lhe dará tudo.
O garoto também estava com os olhos arregalados. Perguntou de novo:
- Este é o 712? Me disseram para pegar umas garrafas no 712.
A mulher chamou, ocm voz trêmula:
- Henrique!
O marido apareceu na porta do gabinete. Viu o rosto da mulher, o rosto da empregada e o garoto e entendeu tudo. Chegou a hora, pensou. Sempre me indaguei como me comportaria no caso de um assalto. Chegou a hora de tirar a prova.
- O que você quer? – perguntou, dando-se conta em seguida do rídiculo da pergunta. Mas sua voz estava firme.
- Eu disse que você tinha dinheiro – falou a mulher.
- Faço um trato com você – disse o marido para o garoto – dou tudo de valor que tenho na casa, contanto que você não toque em ninguém.
E se as crianças chegarem de repente? pensou a mulher. Meu Deus, o que esse bandido vai fazer com as minhas crianças? O garoto gaguejou:
- Eu… eu… é aqui que tem umas garrafas para pegar?
- Tenho um pouco de dinheiro. Minha mulher tem jóias. Não temos confres em casa, acredite em mim. Não temos muita coisa. Você quer o carro? Eu dou a chave.
Errei, pensou o marido. Se sair com o carro, ele vai querer ter certeza de que ninguém chamará a policia. Vai levar um de nós com ele. Ou vai nos deixar todos amarrados. Ou coisa pior…
- Vou pegar o cinherio, está bem? disse o marido.
O garoto só piscava.
- Não tenho arma em casa. É isso que você está pensando? Você pode vir comigo.
O garoto olhou para a dona da casa e para a empregada.
- Você está pensando que elas vão aproveitar para fugir, é isso? – continuou o marido. – Elas podem vir junto conosco. Ninguém vai fazer nada. Só não queremos violência. Vamos todos para o gabinete.
A patroa, a empregada e o Henrique entraram no gabinete. Depois de alguns segundos, o garoto foi atrás. Enquanto abria a gaveta chaveada da sua mesa, o marido falava:
- Não é para agradar, mas eu compreendo você. Você é uma vitima do sistema. Deve estar pensando, ” Esse burguês cheio da nota está querendo me conversar”, mas não é isso não. Sempre me senti culpado por viver bem no meio de tanta miséria. Pode perguntar para minha mulher. Eu não vivo dizendo que o crime é um problema social? Vivo dizendo. Tome. É todo o dinheiro que tenho em casa. Não somos ricos. Somos, com alguma boa vontade, da média alta. Você tem razão. Qualquer dia também começamos a assaltar para poder comer. Tem que mudar o sistema. Tome.
O garoto pegou o dinheiro, meio sem jeito.
- Olhe, eu só vim pegar as garrafas…
- Sônia, busque suas jóias. OU melhor, vamos todos buscar as jóias.
O quatros foram para a suíte do casal. O garoto atrás. No caminho, ele sussurrou para a empregada:
- Aqui é o 712?
- Por favor, não! – disse a empregada, encolhendo-se.
Deram todas as jóias para o garoto, que estavam cada vez mais embaraçado. O marido falou:
- Não precisa nos trancar no banheiro. Olhe o que eu vou fazer.
Arrancou o fio do telefone da parede.
- Você pode trancar o apartamento por fora e deixar as chaves lá embaixo. Terá tempo de fugir. Não faremos nada. Só não queremos violência.
- Aqui não é o 712? Me disseram para pegar umas garrafas.
- Nós não temos mais nada, confie em mim. Também somos vitímas do sistema. Estamos do seu lado. Por favor, vá embora.
A empregada espalhou a notícia do assalto por todo o prédio. Madame teve uma crise nervosa que durou dias. O marido comentou que não dava mais para viver nesta cidade. mas achava que tinha se saído bem. Não entrara em pânico. Ganhara um pouco da simpatia do bandido. Protegera o seu lar da violência. E não revelara a existência do cofre com o grosso do dinheiro, inclusive dólares e marcos, atrás do quadro da odalisca.
Certas palavras tem o significado errado. Falácia, por exemplo, devia ser o nome de alguma coisa vagamente vegetal. As pessoas deveriam criar falácias com todas as suas variedades. A Falácia Amazônica. A misteriosa Falácia Negra.
Hermeneuta deveria ser o membro de uma seita de andarilhos herméticos. Onde eles chegassem, tudo se complicaria.
- Os hermeneutas estão chegando!
- Ih, agora que ninguém vai entender mais nada…
Os hermeneutas ocupariam a cidade e paralisariam todas as atividades produtivas com seus enigmas e frases ambíguas. Ao se retirarem deixariam a população prostrada pela confusão. Levaria semanas até que as coisas recuperassem o seu sentido óbvio. Antes disso, tudo pareceria ter um sentido oculto.
- Alo…
- O que é que você quer dizer com isso?
Traquinagem deveria ser uma peça mecânica.
- Vamos ter que trocar a traquinagem. E o vetor está gasto.
Plúmbeo deveria ser barulho que um corpo faz ao cair na água.
Mas, nenhuma palavra me fascinava tanto quanto defenestração.
A princípio foi o fascínio da ignorância. Eu não sabia o seu significado, nunca me lembrava de procurar no dicionário e imaginava coisas. Defenestrar deveria ser um ato exótico praticado por poucas pessoas. Tinha até um certo tom lúbrico. Galanteadores de calçada deveriam sussurrar ao ouvido de mulheres:
- Defenestras?
A resposta seria um tapa na cara. Mas, algumas… Ah, algumas defenestravam.
Também podia ser algo contra pragas e insetos. As pessoas talvez mandassem defenestrar a casa. Haveria, assim, defenestradores profissionais.
Ou quem sabe seria uma daquelas misteriosas palavras que encerram os documentos formais? “Nesses termos , pede defenestração..” Era uma palavra cheia de implicações. Devo até tê-la usado uma ou outra vez, como em?
-Aquele é um defenestrado.
Dando a entender que era uma pessoa, assim, como dizer? Defenestrada. Mesmo errada era a palavra exata.
Um dia, finalmente, procurei no dicionário. E aí está o Aurelião que não me deixa mentir. “Defenestração” vem do francês “Defenestration”. Substantivo feminino. Ato de atirar alguém ou algo pela janela.
Ato de atirar alguém ou algo pela janela!
Acabou a minha ignorância, mas não minha fascinação. Um ato como esse só tem nome próprio e lugar nos dicionários por alguma razão muito forte. Afinal, não existe, que eu saiba, nenhuma palavra para o ato de atirar alguém ou algo pela porta, ou escada a baixo. Por que então, defenestração?
Talvez fosse um hábito francês que caiu em desuso. Como o rapé. Um vício como o tabagismo ou as drogas, suprimido a tempo.
- Lês defenestrations. Devem ser proibidas.
- Sim, monsieur le Ministre.
- São um escândalo nacional. Ainda mais agora, com os novos prédios.
- Sim, monsieur lê Mnistre.
-Com prédios de três, quatro andares, ainda era possível. Até divertido. Mas, daí para cima vira crime. Todas as janelas do quarto andar para cima devem ter um cartaz: “Interdit de defenestrer”. Os transgressores serão multados. Os reincidentes serão presos.
Na Bastilha, o Marquês de Sade deve ter convivido com notórios defenestreurs. E a compulsão, mesmo suprimida, talvez ainda persista no homem, como persiste na sua linguagem. O mundo pode estar cheio de defenestradores latentes.
- É essa estranha vontade de jogar alguém ou algo pela janela, doutor…
- Humm, O Impulsus defenestrex de que nos fala Freud. Algo a ver com a mãe. Nada com o que se preocupar – diz o analista, afastando se da janela.
Quem entre nós nunca sentiu a compulsão de atirar alguém ou algo pela janela? A basculante foi inventada para desencorajar a defenestração. Toda a arquitetura moderna, com suas paredes externas de vidro reforçado e sem aberturas, pode ser uma reação inconsciente a esta volúpia humana, nunca totalmente dominada.
Na lua-de-mel, numa suíte matrimonial no 17º andar.
-Querida…
- Mmmm?
-Há uma coisa que preciso lhe dizer…
-Fala amor.
-Sou um defenestrador.
E a noiva, na inocência, caminha para a cama:
- Estou pronta pra experimentar tudo com você. Tudo!
Uma multidão cerca o homem que acaba de cair na calçada. Entre gemidos, ele aponta para cima e balbucia:
- Fui defenestrado…
Alguém comenta:
- Coitado. E depois ainda atiraram ele pela janela.
Agora mesmo me deu uma estranha compulsão de arrancar o papel da máquina, amassa-lo e defenestrar essa crônica. Se ela sair é porque resisti.
A bola nova
Essa bola amarela, não sei não. Antigamente as bolas de futebol tinham a cor do couro com que eram feitas. Pintadas de branco, só em jogo noturno. Lembro do meu espanto ao saber que, em cada jogo oficial de campeonato usavam uma bola nova, o que me levava a sonhar com montes de bolas usadas uma vez só, estocadas em algum lugar. Uma visão do paraíso. E era uma bola por partida, substituída, com autorização do juiz, apenas em caso de perda de esfericidade, o nome científico de murchamento. Isto significava que quando a bola espirrava para fora do campo, era devolvida pelo público para que o jogo pudesse continuar. A bola era devolvida pelo público! Talvez nada na nossa história recente tenha a importância simbólica deste fato: no tempo da Número 5 cor de couro a torcida devolvia a bola. Se a bola demorasse a voltar para o campo havia manifestações de impaciência e quem a retivesse - só por farra, ninguém era ladrão - era hostilizado pelos outros torcedores. Não se sabe se a torcida passou a ficar com a bola quando começaram a usar várias por partida ou se foi algo na nossa alma que mudou. Há quem atribua a uma reversão dos pólos magnéticos da Terra lá pelos anos 40 e 50 a deterioração do caráter do brasileiro. Não sei. Seja como for, uma das suas primeiras manifestações foi não devolverem mais a bola.
Ela era branca só em jogo noturno porque ajudava a visibilidade, até se darem conta de que o branco também favoreceria a visibilidade de dia, pois seu contraste com o verde do gramado era maior do que o do marrom. Agora houve um retrocesso. A cor da nova bola não é marrom, é amarelo cocô-de-criança. Os goleiros estão se queixando de que ela é mais difícil de pegar, mas talvez estejam só com nojo. O contraste com o verde decididamente piorou. Não demora aparecer uma teoria conspiratória alegando que a troca foi para atrapalhar o Brasil na Copa deste ano. Um reconhecimento de que o Brasil era imbatível com a bola antiga, o campeão definitivo da bola branca. Como todos estranharão a bola nova da mesma maneira, estaria começando outra era com tudo reequilibrado, e com chance até para Trinidad-Tobago.
Além da bola, o Brasil precisará se preocupar com a soberba. O clima nacional está um pouco como o de 82, lembra? Aquele time que foi para a Copa da Espanha, com Falcão, Cerezo, Sócrates, Zico, Eder, também não podia perder para ninguém, com qualquer bola. Nos anais da Fifa não consta, mas quem ganhou aquela Copa foi a Soberba. Vai ser nosso principal inimigo na Alemanha.
ORAÇÃO PELOS POLICIAIS
Senhor dos Exércitos!
Tu nunca perdeste uma batalha.
Teus subordinados, dos quais delegastes autoridade, enquanto Te serviram lealmente, nunca foram feridos de morte pelo inimigo, e os preservastes com vida para louvor do Seu Santo Nome.
Atenta agora para a oração de Teu Servo, que aqui se pronuncia. Vigia a minha entrada e a minha saída. Dá ordens aos Teus anjos ao meu respeito, para que me guardem de todo mal, e livrem-me da armadilha montada pelo inimigo. Sê Tu meu escudo e proteção. Guarda também minha família, Senhor, das mãos dos malfeitores. Permita que meu trabalho pelos cidadãos e pela comunidade, possa prolongar o bem estar e a segurança da população, protegendo o ser humano da violência. E que eu possa ser guiado pelo Seu Espirito, agindo com honestidade, sem fazer acepção de pessoas, para melhor servir e proteger. Em nome do Teu filho Jesus, Amém!
...Porque a vida não é certa... Nada aqui é certo.O que é certo mesmo é que temos que viver cada momento, cada segundo, amando, sorrindo, chorando, emocionando, pensando, agindo, querendo, conseguindo...Quando a gente acha que encontrou todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas"
✨ Às vezes, tudo que precisamos é de uma frase certa, no momento certo.
Receba no seu WhatsApp mensagens diárias para nutrir sua mente e fortalecer sua jornada de transformação.
Entrar no canal do Whatsapp