12 contos brasileiros que são clássicos da literatura

Alguns contos brasileiros são verdadeiros clássicos pela importância histórica e qualidade do que foi escrito. Confira 12 destes contos e leia um pouco mais sobre o autor de cada um deles.

1. O homem que sabia javanês de Lima Barreto

Capa do livro O homem que sabia javanês de Lima Barreto

Ano: 1911
Gênero: humor, ironia sobre a sociedade

Castelo descobre que o Barão de Jacuecanga busca alguém que saiba javanês para ler o que está escrito num livro em javanês. Castelo resolve então fingir que sabe javanês para arranjar o emprego e outras oportunidades que possam ser dadas pelo Barão. Num modo irônico, Lima Barreto nos faz ver até onde Castelo chegará com a sua mentira. Um dos grandes contos da literatura brasileira.

— Em onde aprendeu o javanês? Indagou ele, com aquela teimosia peculiar aos velhos.

Não contava com essa pergunta, mas imediatamente arquitetei uma mentira. Contei-lhe que meu pai era javanês. Tripulante de um navio mercante, viera ter à Bahia, estabelecera-se nas proximidades de Canavieiras como pescador, casara, prosperara e fora com ele que aprendi javanês.

Baixe o conto O homem que sabia javanês de Lima Barreto.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em 13 de maio de 1881, no Rio de Janeiro, e falecido em 1 de novembro de 1922, também no Rio de Janeiro. Fez parte do Pré-Modernismo, sendo um escritor de linguagem simples, que escrevia sobre a vida cotidiana das classes populares e criticava as injustiças sociais do seu tempo. O livro Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915) foi considerado a sua obra-prima.

2. Pai contra mãe de Machado de Assis

Ano: 1906
Gênero: ironia, crítica

Publicado no livro Relíquias da Casa Velha, este conto aborda a escravatura no Brasil e o período posterior da abolição. Na história, Cândido Neves torna-se caçador de escravos. Após Clara, sua companheira, engravidar, a vida do casal fica mais complicada financeiramente. Ambos são aconselhados a abandonar o filho na Roda dos Enjeitados, mas Cândido poderá salvar a vida de seu filho, caso encontre algum escravo. Uma história que entra numa realidade cruel brasileira, contando sobre a escravidão e sobre as ironias de uma sociedade repleta de desigualdades.

O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado.

Baixe o conto Pai contra mãe de Machado de Assis.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em 21 de junho de 1839, Rio de Janeiro, e falecido em 29 de setembro de 1908, na mesma cidade. É um dos grandes autores da literatura brasileira do século XIX. Com um estilo realista, Machado de Assis ficou muito conhecido por explorar as fraquezas de seus personagens, aprofundando-se no lado psicológico deles. Falar da hipocrisia das relações humanas era algo constante na sua obra.

3. Baleia de Graciliano Ramos

Ano: 1938
Gênero: romance regionalista e modernista

Um conto que tem, como protagonista, a cachorra Baleia. É uma história que se relaciona com o livro Vidas Secas de Graciliano Ramos.

A cadela Baleia está com a saúde fraca e seu dono, suspeitando que ela esteja com hidrofobia, resolve matá-la. Aos poucos, a história entra também na perspectiva da cachorra. Baleia tem um comportamento mais racional, menos instintivo do que o da família.

Ela também tinha o coração pesado, mas resignava-se: naturalmente a decisão de Fabiano era necessária e justa. Pobre da Baleia.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em 27 de outubro de 1892, Quebrangulo, e falecido em 20 de março de 1953, Rio de Janeiro. Integrante da Segunda Fase do Modernismo, ficou conhecido por abordar temas da difícil realidade nordestina, como os problemas sociais. Ainda, o modo como analisava criticamente as relações humanas foi uma das suas maiores qualidades. Uma das suas grandes obras foi Vidas Secas.

4. Uma Galinha de Clarice Lispector

Ano: 1960
Gênero: ficção infanto-juvenil

Um breve conto de Clarice Lispector. Uma família escolhe uma galinha viva para comer, mas ela foge antes de ser morta para o almoço. Após a terem novamente encontrado, a galinha é levada à cozinha e coloca então um ovo. Assim, a filha da família implora para que a galinha não seja mais morta. A galinha vira, por um período, um animal doméstico, mas logo acaba esquecida e volta a ser uma refeição.

Um conto forte que traz várias reflexões sobre nossos hábitos alimentares, sobre o modo como os animais domésticos são tratados e também sobre o comportamento humano.

— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!

Um pouco mais sobre a autora: nascida em Chechelnyk, 10 de dezembro de 1920, e falecida no Rio de Janeiro, 9 de dezembro de 1977. Clarice foi uma grande escritora ucraniana naturalizada brasileira. Sua obra é repleta de reflexão e poesia, trazendo temas profundos para sua escrita. Fez parte do Terceiro Tempo Modernista.

5. Um cinturão de Graciliano Ramos

Capa da livro Infância (onde está o conto um cinturão de Graciliano Ramos)

Ano: 1945
Gênero: ficção infanto-juvenil, crítica

Publicado no livro Infância, nesta história um pai começa a buscar seu cinturão e, sem encontrá-lo, culpa seu filho pequeno, espancando-o. O pai depois encontra o cinturão perdido, mas não pede desculpas para o filho, que tem uma atitude passiva, sem reclamar da situação que sofreu. Este conto de Graciliano Ramos está historicamente contextualizado na época da ditadura de Vargas e tem uma associação à própria vida do autor, que sofreu com as injustiças da ditadura.

Onde estava o cinturão? Hoje não posso ouvir uma pessoa falar alto. O coração bate-me forte, desanima, como se fosse parar, a voz emperra, a vista escurece, uma cólera doida agita coisas adormecidas cá dentro. A horrível sensação de que me furam os tímpanos com pontas de ferro.

6. A balada do Falso Messias de Moacyr Scliar

Ano: 1976
Gênero: ficção infanto-juvenil

No livro de mesmo nome, é um conto que se inspira na Palestina do século XVII quando Shabtai Zvi é proclamado Messias por seu “profeta” Natan de Gaza. Apesar disto, depois Shabtai acaba por converter-se ao Islã, por presão do sultão do Império Otomano. Baseado nessa passagem história, Moacyr coloca Zvi e Natan em outro período histórico judeu, em 1906, dentro de um navio a caminho do Brasil.

Nesse velho navio, nós, judeus, estávamos deixando a Rússia; temíamos os pogroms. Acenavam-nos com a promessa da América e para lá viajávamos, comprimidos na terceira classe. Chorávamos e vomitávamos, naquele ano de 1906. Eles já estavam no navio, quando embarcamos. Shabtai Zvi e Natan de Gaza. Nós os evitávamos. Sabíamos que eram judeus, mas nós, da Rússia, somos desconfiados. Não gostamos de quem é ainda mais oriental do que nós.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em Porto Alegre, em 23 de março de 1937, e falecido em 27 de fevereiro de 2011, também em Porto Alegre. Médico e escritor, Moacyr ficou conhecido por suas mais de 60 obras, entre contos, crônicas e livros infanto-juvenis.

7. Negrinha de Monteiro Lobato

Ano: 1927
Gênero: ficção infanto-juvenil, realismo, crítica

Um conto famoso de Monteiro Lobato. No livro de mesmo nome, este conto está inserido numa época em que a escravidão já tinha sido abolida, mas ainda havia muitos hábitos e atitudes típicas da escravatura. No conto, Dona Inácia é uma rica fazendeira e faz Negrinha, protagonista, ser mantida na sua propriedade, sendo tratada como uma escrava. Entretanto, a vida da menina começa a mudar quando Dona Inácia recebe duas meninas como visita, e estas trazem uma boneca. Isto traz novas perspectivas para Negrinha, de um mundo até então desconhecido.

Era de êxtase, o olhar de Negrinha. Nunca vira uma boneca e nem sequer sabia o nome desse brinquedo. Mas compreendeu que era uma criança artificial.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em Taubaté, em 18 de abril de 1882, e falecido em São Paulo, em 4 de julho de 1948. Pré-modernista, escreveu livros, fábulas e criou o famoso e polêmico personagem Jeca Tatu.

8. O Moço do Saxofone de Lygia Fagundes Telles

Ano: 1969
Gênero: mistério, suspense, drama

Um chofer de caminhão começa a frequentar um restaurante de uma pensão e fica intrigado com o som de um saxofone vindo do andar de cima. O restaurante é um ambiente bastante diverso, repleto de pessoas atípicas. Entre elas, há o moço do saxofone, que toca músicas tristes para sua esposa. Um conto interessante e misterioso, ganhando uma posição nos melhores contos clássicos brasileiros.

O que é isso? eu perguntei ao tipo das giletes. Era o meu primeiro dia de pensão e ainda não sabia de nada. Apontei para o teto que parecia de papelão, tão forte chegava a música até nossa mesa. Quem é que está tocando?

É o moço do saxofone.

Um pouco mais sobre a autora: nascida em São Paulo, em 19 de abril de 1923, Lygia Fagundes Telles é uma grande escritora modernista brasileira, com inúmeros romances e contos na sua trajetória, entre os quais se destacam: As Meninas (1973), As Horas Nuas (1989) e o conto Antes do Baile Verde (1970).

9. A Cartomante de Machado de Assis

Capa do livro A Cartomante de Machado de Assis

Ano: 1884
Gênero: romance, ficção, ironia

Rita é casada com Vilela e amante de Camilo. Estes dois - Camilo e Vilela - são amigos. Certo dia, Camilo passa a receber cartas que afirmam que que Vilela sabe da traição. Numa delas, Camilo recebe uma carta do próprio Vilela, que o chama para ir à sua casa. Com medo de que Vilela tenha descoberto tudo, Camilo resolve ir a uma cartomante, que então lhe assegura que não há nada para se preocupar. Entretanto, o desfecho da história não é assim tão favorável.

Um conto bastante conhecido e maduro de Machado de Assis que, como costuma fazer, toca nas ironias de uma sociedade corrupta e mentirosa.

A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas. três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela curioso e ansioso.

— As cartas dizem-me...

Baixe o conto A Cartomante de Machado de Assis.

10. Feliz Ano Novo de Rubem Fonseca

Ano: 1975
Gênero: crime, violência, humor

Um conto típico de Rubem Fonseca, que foge um pouco do estilo dos outros contos clássicos desta lista. Publicado no livro de mesmo nome, retrata a violência das cidades nos grandes centros urbanos. Com a sua linguagem bastante informal e seu jeito seco, narra a realidade das ruas do Rio de Janeiro sem filtros, mostrando a sociedade no seu lado mais "sujo" e corrupto. Pelo linguajar utilizado, seu livro chegou a ser censurado pela ditadura.


Eles estavam bebendo e dançando num salão quando viram a gente.
É um assalto, gritei bem alto, para abafar o som da vitrola. Se vocês ficarem quietos ninguém se machuca.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em Juiz de Fora, em 11 de maio de 1925, e falecido no Rio de Janeiro, em 15 de abril de 2020. Um escritor famoso por escrever sobre o mundo policial e de violência nas ruas. Um dos seus conhecidos livros foi: Agosto (1990).

11. O Burrinho Pedrês de Guimarães Rosa

Capa do livro O Burrinho Pedrês de Guimarães Rosa

Ano: 1946
Gênero: regionalismo universal, misticismo

Baseado numa história real, o conto literário se passa no interior de Minas Gerais, com um acontecimento envolvendo um grupo de vaqueiros. O burrinho Sete-de-Ouros, um velho e cansado animal, tem um papel importante na história, sendo um herói. O conto acaba por ter um estilo muito similar ao das fábulas, por dar, aos animais, um comportamento mais humanizado. Burrinho Pedrês foi publicado no livro de contos Sagarana.

Era um burrinho pedrês, miúdo e resignado, vindo de Passa-Tempo, Conceição do Serro, ou não sei onde no sertão. Chamava-se Sete-de-Ouros, e já fora tão bom, como outro não existiu e nem pode haver igual. Agora, porém, estava idoso, muito idoso.

Um pouco mais sobre o autor: nascido em 27 de junho de 1908, Cordisburgo (Minas Gerais), e falecido em 19 de novembro de 1967, Rio de Janeiro. Médico, diplomata e escritor, o escritor falava fluentemente inglês, espanhol, francês, italiano, russo e alemão. Nascido no sertão brasileiro, sua obra é muitas vezes baseada nessa região, com uma linguagem popular, fazendo também uso de expressões arcaicas, o que o levou a inventar inúmeras palavras.

12. O Bebê deTalatana Rosa de João do Rio

Ano: 1925
Gênero: mistério, romance

Heitor de Alencar narra sua própria história: é carnaval, há vários grupos na rua e máscaras são usadas pelos festeiros. Já no fim da noite, Heitor encontra uma bela pessoa, que define de o bebê de talatana rosa. Beijam-se e encontram-se em outras noites do carnaval. Há algo de curioso no rosto bebê, mais especificamente no seu nariz.

No conto, há um caminho que vai da luxúria esperada de um carnaval ao pavor do que se encontra.

– Oh! Uma história de máscaras! Quem não a tem na sua vida? O carnaval só é interessante porque nos dá essa sensação de angustioso imprevisto... Francamente. Toda a gente tem a sua história de carnaval, deliciosa ou macabra, algida ou cheia de luxúrias atrozes. Um carnaval sem aventuras não é carnaval. Eu mesmo este ano tive uma aventura...

Baixe o conto O Bebê deTalatana Rosa de João do Rio (página 47).

Um pouco mais sobre o autor: pseudônimo de Paulo Barreto, nasceu em 5 de agosto de 1881, Rio de Janeiro, e faleceu em 23 de junho de 1921, na mesma cidade. Jornalista e escritor, escrevia sobre a cidade do Rio de Janeiro, política, sociedade, futebol e comportamento humano.