Coleção pessoal de SilvioFagno

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⁠Já é Morrer —

Meu desespero, minha agonia
não é a solidão de uma
vida triste.

Meu desespero, minha
angústia, minha
agonia,
é a insignificância de uma
vida medíocre. — medíocre,
solitária e triste.

⁠A Receita —

Eu poderia dar a receita àqueles
que querem destruir-me.
É tudo muito simples,
fácil.

Há, porém, um detalhe:
A grande crueldade é que,
ironicamente, não
funciona para
o inimigo.

Somente os que têm meus
mais sinceros sentimentos
conseguem destruir-me
facilmente.

Os inimigos ainda correm
algum risco.

⁠Até Caber Neste Silêncio —

Tem sido muito difícil,
extremamente complicado ter que
matar algo que nasceu tão bonito — inesperadamente lindo — cheio de vida
e possibilidades.

Mais ainda, porque vem sendo minha inspiração maior desde que chegou.
Desde então, me resgatou, me
acolheu, me impulsionou pra vida.

Eu senti que poderia voar. — voos maiores,
de desafios maiores — e quando precisasse (sereno), poderia voltar ao chão e descansar em braços quentes, seguros e acolhedores.

Mas não.

Houve sempre algo mais importante que eu;
Alguém mais interessante que eu.
E não importava o que eu fizesse (e fiz tanto): eu era sempre deixado de lado.
Virava algo qualquer — comum — incondicionalmente descartável.

Assim vi,
com o tempo,
que as derrotas,
as mágoas, as decepções
foram me diminuindo, me encolhendo,
reduzindo-me até caber neste
silêncio. — que agora é tudo.

⁠Objeto Pontiagudo —

Um jogo de futebol na TV
quase sempre me salva.

Uma bebida, uma conversa com um amigo,
a leitura de um poema me salvam.

Um cochilo de quinze minutos à tarde;
uma corrida de meia hora; um dia frio de chuva, todas essas coisas,
momentaneamente
me salvam.

Me salvam durante o tempo em que
estou ali concentrado, distraído.

A realidade crua da vida me cai como
um objeto pontiagudo sobre a pele nua,
por dentro: na alma. — e isso dói tanto.

⁠52 hz —

É inútil gritar em silêncio.

⁠Um Grande Inferno —

⁠Aquela situação (o sentimento — de anos — não correspondido, a saudade, o ciúme), tudo aquilo me consumia de uma maneira assustadora, e eu não podia controlá-la, não encontrava uma saída.

Eles eram jovens e saudáveis — embora
idiotas — e faziam parte da geração dela.
Eu não poderia nunca vencê-los fazendo o mesmo que eles.
Eu só poderia vencê-los, de alguma maneira, fazendo, naturalmente, diferente. — sendo o diferencial na vida dela.

Assim, quando ela lembrasse de um deles, lembraria de todos eles ao mesmo tempo.
Mas quando, por ventura, lembrasse-se de mim, então lembraria somente de mim.

Naquela noite eu fui dormir sabendo que ela estava com outro, fazendo tudo que se pode fazer com um outro e, aquela noite, como tantas outras, foi uma noite longa, terrivelmente longa e dolorosa,
e meu sentimento — nobre — que, por grandeza, deveria ter morrido ao amanhecer, acordou comigo, levantou-se comigo, (droga!), vive vivo comigo,
e isso é um grande inferno,
meu Deus!

⁠Abreviada —

⁠Certo dia,
numa conversa com
uma adolescente de 16 anos,
(através de uma rede
social),
eu fiz-lhe duas perguntas em
que as respostas, de um
ponto natural,
eram as mais simples:
sim ou não.

Mas ela conseguiu "simplificar"
ainda mais:
A primeira respondeu-me
com um "Nn".
E para a segunda ela usou
um "Ss".

Ainda um pouco confuso,
pensativo,
eu deduzi que esses
"sinais",
seriam abreviações do
sim e do não,
e então questionei-me:

O que será desta e das
próximas gerações?

(Ora, a grande maioria das pessoas
já não é lá grande coisa,
imagina só abreviada).

⁠A Pedrada e o Silêncio —

Foi um dos golpes mais
duros que eu
já recebi:

Ouvi tudo que sempre
quis ouvir e, feliz,
extremamente
feliz,
virei-me para
continuar a andar,
mas, passos
depois,
a pedrada e o silêncio.

(Alguém tocou a vida
normalmente depois
disso:

E não fui eu).

⁠⁠Uma Breve História Sobre Ana –

Naquela manhã chuvosa e fria, de uma quarta-feira de novembro, Ana, para não se atrasar, decidiu sair um pouco mais cedo, devido às condições meteorológicas.
Assim, precisou cumprir suas tarefas em menos tempo que o habitual.
Então, enquanto caminhava até o ponto de ônibus mais próximo, que ficava a cerca de duzentos metros de sua casa, percebeu, já próximo ao local, que havia esquecido a trava de segurança do botijão de gás aberta.
Meticulosa, às pressas, precisou voltar até sua casa para arrumar o descuido.
Ao chegar em frente à porta, enquanto enfiava a mão esquerda na bolsa à procura das chaves, ouviu, ao fundo, alguém chamando-a pelo nome.
— Dona Ana, bom dia!
Demorei um pouco, por conta desse mau tempo, mas cheguei para consertar aquele vazamento no banheiro.
— Bom dia!
Mas eu solicitei o trabalho de vocês há três dias, meu Senhor.
E alguém havia me dito que viriam naquele mesmo dia que, por sinal, foi este domingo agora e, portanto, eu estava o dia inteiro em casa.
Mas agora?!
Eu estou de saída, preciso trabalhar.
— Mas a gente avisou segunda-feira à tarde pelo número que a senhora entrou em contato,
que viríamos hoje, neste horário.
— Nossa!
Foi o número do meu filho e, provavelmente, ele esqueceu de avisar-me ou não viu a mensagem.
Bom, mas acontece que, neste momento, eu não posso estar em casa, estou indo trabalhar.
— Mas, senhora, como eu vou voltar metade da cidade sem ter feito meu
trabalho? — eu perderei meu dia.
— Então, o senhor quer que eu perca meu dia de trabalho para não perder o seu, é isso?
Desculpa, mas eu não posso sair para trabalhar e deixar uma pessoa que eu não conheço na minha casa.
E já estou me atrasando.
Mais dez minutos e eu perderei o ônibus que me levará a tempo até meu trabalho.
Sem esse, terei de pegar um outro que me atrasará, pelo menos, trinta minutos.
— Entendo, dona Ana.
Mas eu estou há menos de quinze dias nesse emprego, e se eu voltar sem ter feito o serviço, serei, certamente, despedido ao final do mês ou antes mesmo. E eu não posso ficar, outra vez, desempregado.
Pois moro de aluguel e tenho uma esposa e três filhos para sustentar, Senhora.
— Quanto tempo o senhor acha que levará para terminar o serviço?
— Bom, pelo o que a senhora nos passou, acho que não mais que quarenta minutos.
— Quarenta minutos é muito, meu senhor!
E olha lá meu ônibus indo... droga!
Pronto, agora o outro passa em dez minutos e eu não posso perder esse.
— A senhora não tem uma pessoa: um vizinho, um conhecido que possa ficar aqui enquanto eu faço o serviço?
— Neste horário não, meu senhor. — todos estão trabalhando.
Eu moro com meu filho, mas, neste momento, ele está viajando.
Olha, desculpa, meu senhor, se eu esperar mais, perderei o segundo ônibus que passa em menos de dez minutos.
E o terceiro só em quarenta e cinco minutos.
E como sei que o seu local de trabalho fica de um lado da cidade e o meu do outro, o senhor não poderá me dar uma carona.
Portanto, eu preciso ir.
Sinto muito!

Enquanto ela abria a porta e entrava em casa para baixar a trava do botijão e voltar, o quanto antes, até o ponto de ônibus para tentar alcançar o segundo, foi até a janela da sala para fechar as cortinas, quando avistou o senhor em passos lentos, desolado, voltando até seu veículo de trabalho.
E enquanto pensava em si mesma e seu filho, lembrava do conforto que, de certa forma, ainda tinha, mas que parecia faltar àquele homem e sua família.
Então, aos gritos, chamou-o, pedindo que fizesse o seu trabalho, enquanto servia-lhe uma xícara de café com torradas.

Enquanto ela sentava no sofá da sala e pegava seu celular para comunicar ao chefe sua ausência naquele dia, o telejornal local noticiava que, devido às fortes chuvas daquela madrugada, o congestionamento na via que dava acesso ao seu local de trabalho, ultrapassava os setenta quilômetros de lentidão.
E, assim, ela pôde entender que realmente havia feito a escolha certa.
Então, descansou os pés sobre uma almofada cinza, e a mente e o coração em um livro de poesia, ouvindo ao fundo, entre uma martelada e outra, Seu Régis assobiar sua canção favorita.

⁠Instante Infinito -

Estou com excesso de palavras
presas ao peito.
Excesso de vontades vorazes
— abraços e beijos não dados —
e uma falta gigantesca de qualquer
coisa nossa.

É uma canção por terminar,
um verso por concluir,
um... quase
isto.

E no meio disso tudo,
no instante infinito que
separa a gente,
eu quase não
existo.

⁠Em Silêncio –

⁠Os instantes do dia em que eu
fico em silêncio (pensando),
são sempre os momentos em
que,
essencialmente,
me ouço.

A fala,
diante de um interlocutor,
é corruptível.

Somos,
verdadeiramente,
honestos,
em pensamento.

⁠O Peso do Vazio –

Os dias de dor e solidão em
que eu ainda encontro
a luz da escrita,
são dias ruins,
mas não são
os piores.

Os piores dias são aqueles
em que há a angústia,
o sofrimento,
e falta-me a ideia,
a palavra.

Nesses dias
eu meio que sinto um
gosto precoce da morte
ou, talvez,
do processo de morrer.

Uma espécie de erro:
um espaço não habitável,
habitado por algo — ao mesmo
tempo íntimo e desconhecido.

Um estranho peso:
o peso do


vazio.

⁠O Inferno de Um Amor –

E enquanto aquela velha angústia
— intimamente — despedaçava
minh'alma que, por vezes,
já não reagia mais,
eu pensava:

O grande risco eram as grandes paixões confessas — com suas urgências,
suas entregas, suas intensidades —
dolorosa e amargamente
silenciadas, quebradas,
emudecidas.

Assim,
o inferno de um amor é a mistura de
rejeição e esperança, transformada
em ciúmes, ódio e saudades.

E não há poesia pra isso.

⁠Cegos de Coração –

É bem provável que a grande maioria
das pessoas que veem as coisas,
simplesmente não
as sinta.

Por isso todo esse desapego nos
desejos e gestos;
Por isso toda essa superficialidade
nos gastos e gostos;
Por isso todo esse desperdício,
toda essa futilidade, toda
essa cegueira.

Talvez sejam esses, cegos de coração.

⁠Divino –

Olhei‐a e pensei:
"Como? — ela consegue ser tão bonita
quanto uma criança bonita."

Eu não sei, mas, quando uma mulher
é tão bonita quanto uma criança,
há, nela, alguma coisa
de Divino.

⁠Um Quase Amor (Eterno?) –

Estou tentando me desfazer
do sonho do quase-amor-eterno
que fomos.

Porque fomos linhas de um quase
poema (imortal);
Fomos versos de uma quase canção
(atemporal);
E fomos sonhos de um quase amor
(eterno?).

É estranho:
Às vezes eu sinto, eu sinto, como
num susto, que a gente está
tão perto, tão mais perto.
Tão perto como nunca, ainda que tão
longe como sempre.

Ainda ontem,
a brisa do fim de tarde
me trouxe o teu cheiro, e eu lembrei
o teu rosto, o teu riso, o teu gosto,
o tom da tua voz.

Eu te amo! — e isso dói.

⁠Um Novo Eu –

Deixarei de escrever até que encontre
novos nomes,
novos motivos, novos
rumos — um novo sentido, uma
nova vontade, uma nova inspiração.

Até lá,
queimarei cartas,
rasgarei fotos, apagarei
versos.
Até lá,
jogarei fora poemas,
presentes, canções.
Até lá,
esquecerei olhos, vozes,
gestos, gostos, manias, cheiro,
sorrisos.

Matarei lembranças, desejos, sonhos.

E quem sabe assim, um novo
eu apareça.
Ainda que reduzido, um pouco
mais leve de alma.
Ainda que esquecido, um pouco mais consciente da vida.
Ainda que sozinho,
um pouco mais perto de
si próprio. — com novos motivos
para escrever à vida, e sobre
ela novos temas, talvez
novas cores, novos
sonhos.

⁠Aos Sete –

Quando estou diante do meu filho,
acontece algo que, talvez, o Tempo
e outros deuses, não o concebam
muito bem. — até mesmo eles.

Como uma sensação, como um desejo,
e mais, como uma evolução, diante
do meu filho, eu costumo inverter
a ordem, aparentemente
natural da vida:

Eu quero ser como ele.

⁠⁠Uma Fotografia —

Era só uma fotografia,
e eu fiquei ali, irreversivelmente
parado, fitando-a.

Uma simples foto como,
aparentemente tantas outras,
mas que, a mim, trazia o Ônus:

Um cálido meio sorriso,
olhos pontiagudos e anoitecidos,
de um amor utópico, contínuo,
antigo. — jamais começado,
tampouco esquecido.

⁠De Cinza –

Era, quem sabe,
aquele dia ou aquela
semana ou aquele mês.
Era, talvez, o ano, talvez a década...
a vida.

Ainda que haja — e há — motivos
e motivos para sorrir, cantar,
brindar à vida,
aqueles que me conhecem
sabem:
Ao me encontrar, há de haver
sempre alguma coisa
vestida de cinza.
Seja
o dia,
o corpo
ou a alma.