Clarice Lispector Frases de Livros
O grande castigo neutro da vida geral é que ela de repente pode solapar uma vida; se não lhe for dada a força dela mesma, então ela rebenta como um dique rebenta – e vem pura, sem mistura nenhuma: puramente neutra.
Mas por que eu? Mas por que não eu. Se não tivesse sido eu, eu não saberia, e tendo sido eu, eu soube – apenas isso. O que é que me havia chamado: a loucura ou a realidade?
Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir – era tão bom.
E também: como ligar-se a um homem senão permitindo que ele a aprisione? como impedir que ele desenvolva sobre seu corpo e sua alma suas quatro paredes? E havia um meio de ter as coisas se que as coisas a possuíssem?
Vou adiante de modo intuitivo e sem procurar uma ideia: sou orgânica. E não me indago sobre os meus motivos. Mergulho na quase dor de uma intensa alegria – e para me enfeitar nascem entre os meus cabelos folhas e ramagens.
O que importa na vida é estar junto de quem se gosta
Pois o que de repente eu soube é que chegara o momento não só de ter entendido que eu não devia mais transcender, mas chegara o instante de realmente não transcender mais. E de ter já o que anteriormente eu pensava que devia ser para amanhã.
Quem vive totalmente está vivendo para os outros, quem vive a própria largueza está fazendo uma dádiva, mesmo que sua vida se passe dentro da incomunicabilidade de uma cela.
Eu escrevo para fazer existir e para existir-me. Desde criança procuro o sopro da palavra que dá vida aos sussurros.
E “amor” ela não chamava de amor, chamava de não-sei-o-quê.
O que deve fazer alguém que não sabe o que fazer de si?
Não estou à altura de ficar no paraíso porque o paraíso não tem gosto humano!
E amanhã eu vou ter de novo um hoje. Há algo de dor e pungência em viver o hoje.
Difícil aspirar as pessoas como o aspirador de pó.
Ela se afasta fazendo uma trancinha nos cabelos escorridos. Nunca nunca nunca sim sim, canta baixinho. Aprendeu a trançar um dia desses.
Tudo o que mais valia exatamente ela não podia contar. Só falava tolices com as pessoas. Quando dizia a Rute, por exemplo, alguns segredos, ficava depois com raiva de Rute. O melhor era mesmo calar.
A visão consistia em surpreender o símbolo das coisas nas próprias coisas.
Eu que não me lembrara de lhe avisar que sem o medo havia o mundo.
