Clarice Lispector Frases de Livros
Amor é achar bonita uma bota, amor é gostar da cor rara de um homem que não é negro, amor é rir de amor a um anel que brilha.
Ela estava triste. Não era uma tristeza difícil. Era mais como uma tristeza de saudade. Ela estava só. Com a eternidade à sua frente e atrás dela.
Aviso: não confundir bobos com burros.
Nota: Trecho da crônica Das vantagens de ser bobo.
...MaisCaótica, intensa, inteiramente fora da realidade da vida.
Vida não tem adjetivo. É uma mistura em cadinho estranho mas que me dá em última análise, em respirar. E às vezes arfar. E às vezes mal poder respirar. É. Mas às vezes há também o profundo hausto de ar que até atinge o fino frio do espírito, preso ao corpo por enquanto.
Eu me preparara para limpar coisas sujas mas lidar com aquela ausência me desnorteava.
Estes sonhos, de tanta interioridade, eram vazios porque lhes faltava o núcleo essencial de uma prévia experiência de – de êxtase, digamos.
Equilibro-me como posso entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus.
A Clarice Lispector é meu lado fofo. A Tati Bernardi é a minha revolta. E o Caio Fernando Abreu? Ah, o Caio simplesmente me conhece e sai contando de mim por aí.
Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.
Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece.
É que por enquanto a metamorfose de mim em mim mesma não faz nenhum sentido. É uma metamorfose em que perco tudo o que eu tinha, e o que eu tinha era eu – só tenho o que sou. E agora o que sou? Sou: estar de pé diante de um susto. Sou: o que vi. Não entendo e tenho medo de entender, o material do mundo me assusta, com os seus planetas e baratas.
Farei o possível para não amar demais as pessoas, sobretudo por causa das pessoas. Às vezes o amor que se dá pesa, quase como uma responsabilidade na pessoa que o recebe. Eu tenho essa tendência geral para exagerar, e resolvi tentar não exigir dos outros senão o mínimo. É uma forma de paz...
Nota: Trecho de carta para Elisa Lispector, escrita em 19 outubro de 1948.
...MaisTeu segredo
Flores envenenadas na jarra. Roxas azuis, encarnadas, atapetam o ar. Que riqueza de hospital. Nunca vi mais belas e mais perigosas. É assim então o teu segredo. Teu segredo é tão parecido contigo que nada me revela além do que já sei. E sei tão pouco como se o teu enigma fosse eu. Assim como tu és o meu.
Há impossibilidade de ser além do que se é – no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio, sou mais do que eu quase normalmente –; tenho um corpo e tudo o que eu fizer é continuação de meu começo. (...)
A única verdade é que vivo. Sinceramente, eu vivo. Quem sou? Bem, isso já é demais...
Ser feliz é uma responsabilidade muito grande. Pouca gente tem coragem. Tenho coragem mas com um pouco de medo. Pessoa feliz é quem aceitou a morte. Quando estou feliz demais, sinto uma angústia amordaçante: assusto-me. Sou tão medrosa. Tenho medo de estar viva porque quem tem vida um dia morre. E o mundo me violenta.
Eu tenho que ser minha amiga, senão não aguento a solidão. Quando estou sozinha procuro não pensar porque tenho medo de de repente pensar uma coisa nova demais para mim mesma. Falar alto sozinha e para “o quê” é dirigir-se ao mundo, é criar uma voz potente que consegue – consegue o quê?
